Sarney ataca Serra e FHC e vê democracia ameaçada









Sarney ataca Serra e FHC e vê democracia ameaçada
Senador aponta conspiração, mas não apresenta provas durante discurso inflamado

Num discurso contundente, de uma hora e 15 minutos, o senador José Sarney (PMDB-SP) acusou ontem o pré-candidato do PSDB à Presidência, José Serra (SP), de usar o aparato do governo para espionar e montar dossiês com o objetivo de afastar seus principais adversários da corrida sucessória.

Da tribuna, Sarney disse que sua filha, Roseana Sarney (PFL), governadora do Maranhão, foi vítima de manobra arquitetada para tirá-la da sucessão presidencial. E responsabilizou o presidente Fernando Henrique Cardoso, na condição de chefe de Estado, pelo suposto envolvimento do governo na ofensiva contra a pefelista, aconselhando: "Presidente, vigie seus maus amigos".

Ele não apresentou provas documentais. Exibiu recortes de reportagens de jornais e citou dados que diz ter obtido com pessoas ligadas a serviços de informação.

O senador ameaçou ""bater às portas da ONU Organização das Nações Unidas", da OEA [Organização dos Estados Americanos", do InterAction Council e onde for necessário, pedindo observadores para as eleições, a fim de assegurar a vigilância internacional da nossa sucessão, sobre como o processo decorre, as pressões, a legislação e os métodos". Nesse ponto, foi aplaudido pelo plenário, que estava lotado de senadores e deputados.

Sarney disse que os métodos usados pelos aliados de Serra atentam contra a democracia e comprometem a lisura do processo eleitoral. E citou ações judiciais nas quais o tucano figura como réu -lembrando que nem por estar sendo processado ele foi vítima de operações da PF.

Em defesa da filha, disse que a única coisa formal contra ela é o fato de ter presidido a reunião em que foi aprovado o projeto Usimar, uma fabricante de peças para o setor automotivo que está sendo investigada por desvio de verbas da extinta Sudam.

Segundo Sarney, Roseana fez o que qualquer governador teria feito: levar empreendedores para o Estado. E que nada tem a ver com liberação de verbas.

Sarney disse ter lido ""perplexo e decepcionado" a declaração de FHC de que a crise gerada pela operação da PF na Lunus era ""tempestade em copo d'água". Citou essa declaração três vezes, em tom irônico.
Em nova linha de ataque, Sarney apontou o ministro da Justiça, Aloysio Nunes Ferreira, como o responsável hierárquico pela ação na Lunus, pois a PF é subordinada a ele. Lembrou que o diretor-geral da PF, Agílio Monteiro Filho, é filiado ao PSDB.

Polícia política
Para Sarney, a PF foi transformada em polícia política, a serviço do pré-candidato tucano.
""O aparato do Estado espalha, sem defesa, versões, documentos e calúnias. É assim que funcionavam o Dops, a Gestapo. Pior hoje, neste tempo de comunicação em tempo real, em que a imagem de defesa é impossível", disse.

Ele revelou trechos de conversas suas com FHC, a quem teria denunciado a presença de agentes da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) no Maranhão, Piauí e Pará para investigar os Sarney.

Revelou também trechos de conversas que manteve com o general Alberto Cardoso, que, segundo ele, teria admitido poder ""ser possível" que o deputado Márcio Fortes (PSDB-RJ), secretário-geral do PSDB e um dos coordenadores da campanha de Serra, tivesse contratado agentes do ex-SNI para fazer uma devassa na vida de Roseana. Leia a seguir trechos do discurso.

VERSÕES - "São muitas as versões sobre o que vou dizer. Umas, que venho apenas defender minha filha, outras, que venho destilar um sentimento de ira e vingança contra o presidente da República. Outras, que venho entrar no lodo de invadir a vida das pessoas. Não sou responsável por nenhuma dessas versões. Não tenho mais idade para mudar. O Brasil conhece meu temperamento."

VIOLÊNCIA POLÍTICA - "Policiais armados, viaturas embaladas, aparato de efeito utilizados para criar um escândalo contra a candidata à Presidência da República, em ato arbitrário, ilegal, de conotação política e fora da lei. Dois tribunais assim o consideraram: o TRF [Tribunal Regional Federal" e o STJ [Superior Tribunal de Justiça", julgando que o cidadão só pode ser investigado por autoridade competente. A governadora do Maranhão não está na jurisdição do Tocantins. É um privilégio? Não. Os procuradores que a investigam e os juízes gozam das mesmas prerrogativas de serem julgados por instâncias especiais."

INQUÉRITOS CONTRA SERRA - "Acusam a governadora pela aprovação da Usimar e esquecem o ex-ministro José Serra, que responde ao processo 96.00.01079-0, por improbidade administrativa, ressarcimento ao erário, e a outra ação, 2000.34.00.0334297, com a finalidade de reparação de danos ao erário. E ainda a várias outras ações ordinárias, cautelares, civis públicas, populares."

COMPRA DE VOTOS - "O próprio presidente da República, cujo foro é o Congresso, tem parado na Câmara processo de impeachment pedido por renomados advogados, que o acusam de compra de votos para sua reeleição."

ESPIONAGEM E SERRA - "Há um fato cuja recorrência impressiona e intriga. É que toda referência a esse estilo característico de espionagem e dossiês nasce no Ministério da Saúde e envolve o ex-ministro José Serra. Não é afirmação minha, é dos jornais. Mais que uma estratégia de campanha parece uma concepção de governo."

GRAMPO - "Na Saúde, o ministro Serra multiplicou gastos com empresa de ex-chefe de Telecomunicações Eletrônicas do SNI e professor da Polícia Federal. A Fence tem contratos hoje de R$ 1,870 milhão. Seis vezes mais do que no ano passado. Muitas vezes maior que os contratos para proteger os 33 ministros do STJ."

ESPIONAGEM E FHC - "Levei estes fatos arapongas estariam investigando Roseana" ao conhecimento do presidente Fernando Henrique, avisando o que ocorria. Achei que devia adverti-lo e evitar que o aparato estatal fugisse de controle. Meu gesto era de quem confiava."

MINISTRO DA JUSTIÇA - "Quero, também, dizer uma palavra sobre o Ministério da Justiça, elo das responsabilidades hierárquicas previsto na própria Constituição. Para que se veja o estilo destas coisas, vejam-se as pessoas. O atual ministro [Aloysio Nunes Ferreira" é um homem de biografia forte. Tem demonstrado em sua vida atos de extrema violência. Comunga a teoria de que os fins justificam os meios. Já participou de operações bem mais complexas do que invadir um escritório de uma candidata à Presidência."

"ROLO COMPRESSOR" - "Estamos diante de algo preocupante. Trata-se do mais impressionante rolo compressor já montado na política recente. Dinheiro, recursos políticos, mídia, pressões, ameaças, tudo é usado para favorecer o candidato oficial. Detalhe importante: está sendo organizada uma estrutura paralela ao governo e ao seu partido, algo sem precedentes."

DINHEIRO NA LUNUS - "Aqui está o mandado de busca [cópia do documento". Não cita nome, não tipifica nenhum crime, não revela o motivo da busca. Mas o delegado Paulo de Tarso Gomes diz: "Viemos buscar ouro". É o subconsciente que fala: foram fotografar o dinheiro, fazer a foto para ser distribuída à imprensa, já que estavam espionando e gravando."

DOAÇÃO DE CAMPANHA - "O sr. Jorge Murad recebeu doação de pré-campanha. Por ela assume toda e qualquer responsabilidade e por ela responde. Que a Justiça apure sua legalidade e tome suas decisões. Não é novidade que as campanhas políticas são feitas de doações. (...) A última campanha eleitoral do presidente Fernando Henrique Cardoso custou oficialmente R$ 43 milhões, mas a Folha divulgou uma planilha que registrava R$ 53 milhões."

GUERRA DE DOSSIÊS - "O que vejo no Brasil de hoje é o medo dos dossiês, das escutas, da espionagem na vida privada das pessoas. Ninguém tem confia nça de que o aparato estatal não seja jogado contra si. (...) Está muito parecido com o Peru do tempo do ex-presidente Alberto" Fujimori."

WATERGATE - "Vejamos o exemplo de Nixon ex-presidente dos Estados Unidos". Watergate. Justamente porque procuravam derrotar o adversário por métodos amorais. Derrotou-se. Mas manchou-se Nixon perante a história. Presidente: vigie os seus maus amigos."

USIMAR - "O representante do Ministério da Fazenda não votou contra [o projeto". E, sim, aprovou sob condições, as quais enviou à mesa, por escrito. (...) Qual o governador que, estando presente a uma reunião, votaria contra seu Estado?"


Senador cita dois processos em que tucano é réu
Os dois processos nos quais o presidenciável José Serra (PSDB) figura como réu e que foram citados no discurso do senador José Sarney (PMDB-AP) tramitam na Justiça Federal em Brasília. Trata-se de uma ação de improbidade administrativa e de uma ação civil pública de ressarcimento.

Após apresentar os números dos processos, Sarney fez a pergunta: "Alguém invadiu algum local para procurar comprometê-lo ou atrás de pistas que pudessem ligá-lo às acusações?".

A ação de improbidade foi proposta pelo Ministério Público Federal em 1996 contra integrantes do Conselho Monetário Nacional -entre eles Serra, na condição de ministro do Planejamento. Segundo o processo, o CMN aprovou aporte irregular de recursos aos bancos Econômico, Mercantil e Comercial de São Paulo.

Na ação civil pública, de Caxias do Sul, reclama-se de Serra o ressarcimento aos cofres públicos dos gastos da viagem que fez em avião da Força Aérea Brasileira a Fernando de Noronha em 1995. O caso veio a público em 1999, puxado pelas viagens do procurador-geral da República, Geraldo Brindeiro, ao arquipélago.
Sarney citou ainda um processo que teria envolvido o presidente Fernando Henrique Cardoso. Disse que, quando era presidente, protegeu FHC de tentativas de envolvê-lo nas acusações de fraude na Cosipa (Companhia Siderúrgica Paulista).

Em novembro de 1987, a Cosipa sofreu intervenção federal, após apresentar déficit. Em janeiro de 88, membros do governo Sarney favoráveis à prorrogação do mandato presidencial -questão que era discutida então na Constituinte- divulgaram que os diretores da empresa teriam desviado dinheiro para a formação de um "caixa eleitoral" para o "PMDB progressista" -do qual fazia parte FHC e que era contrário aos cinco anos para Sarney.

Os diretores teriam sido indicados em 85 pelos "progressistas", que deram origem ao PSDB. FHC sempre negou as acusações.


País não precisa de ninguém para vigiar eleição, diz FHC
Presidente reage à proposta de chamar observadores internacionais para acompanhar eleição

O presidente Fernando Henrique Cardoso reagiu à proposta do senador José Sarney (PMDB-AP) de chamar observadores internacionais para acompanhar as eleições presidenciais.

"Não acredito que ele tenha dito isso. No Brasil, quem vigia as eleições é a mídia, não precisa de mais ninguém, basta", afirmou.

FHC embarcou de volta ao Brasil pouco depois de Sarney subir à tribuna do Senado. O senador é pai da governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PFL), rival do senador tucano José Serra na disputa presidencial.
Pouco antes de embarcar, o presidente falou sobre a crise na base política do Planalto e disse que insiste em recompor a aliança governista. "Como presidente, tenho a responsabilidade de conduzir o país até o fim do meu mandato com condições de governabilidade, e o PFL é um partido importante que ajudou em uma série de transformações positivas no Brasil e tem que ter um caminho de prosseguir participando da vida pública", afirmou.

Para garantir que o PFL continue votando com o governo, FHC disse que tem falado constantemente por telefone com o Brasil desde que chegou ao Chile para uma vista de Estado, na última segunda-feira.
A jornalistas chilenos, o presidente afirmou que foi por causa da votação da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira) no Congresso que ele cancelou sua viagem a Monterrey, no México, onde acontece a Conferência das Nações Unidas para o Financiamento do Desenvolvimento. "Vou insistir, como tenho insistido, para votar essa matéria de interesse social e terei toda a paciência necessária. Tenho a convicção de que os senadores terão a mesma sensibilidade que os deputados já tiveram."

Segundo FHC, além da governabilidade, o problema com o PFL envolve a questão eleitoral. "Quanto à questão eleitoral, não sou eu quem decide. Posso ter alguma influência e, até agora, a influência que tive foi no sentido de buscar alguma convergência."

Ele sinalizou que poderá haver negociações para manter o partido no governo. Na opinião de FHC, é prematuro prever o futuro das alianças eleitorais.

"A vida política depende muito das circunstâncias", disse ao conceder entrevista coletiva em Arica, no norte do Chile, onde assinou acordos de cooperação com o presidente Ricardo Lagos.


Para Amin, FHC é "o grande sedutor" do país
Os governadores Jaime Lerner (PFL-PR) e Esperidião Amin (PPB-SC) recorreram à figuras de linguagem para falar sobre a crise na base do governo, deflagrada pelo rompimento do PFL. Amin chamou o presidente FHC de "grande sedutor". Lerner comparou PMDB e PFL a "concubinas" do futuro "imperador".

A "encrenca" entre os partidos da base do governo vai se arrastar "até a última hora, o último minuto, depois de um gesto magnânimo de todos, e certamente tendo como o artífice dessa junção, o grande sedutor do Brasil, que é o Fernando Henrique", afirmou Amin.

Na defesa do retorno do PFL à base do governo, Lerner disse que os partidos da aliança "precisam olhar para além da cerca". Ao responder à pergunta sobre o avanço das negociações para uma chapa presidencial PSDB-PMDB, conduzidas por FHC, ele recorreu à viagem que fez à China.

"A guia me mostrava as instalações [de um palácio visitado" e dizia: "aqui é a do imperador, aqui a da concubina número um, aqui da número dois"." E emendou: "Para nós não interessa quem vai ser a concubina número um, a número dois, ou quem será o imperador. Interessa é a governabilidade do país". Ele ainda tentou explicar que não atribuía ao PSDB a figura de "imperador" na imagem.

"A confiabilidade de um partido numa aliança, qualquer que seja a preferência e a presença no governo, se dá pelas condições do próprio partido."

Amin e Lerner participaram, com os governadores do Rio Grande do Sul, Olívio Dutra (PT), e de Mato Grosso do Sul em exercício, Moacir Kohl (PDT), de reunião do Codesul (Conselho de Desenvolvimento e Integração Sul), no Paraná.

O PPB de Amin tem dado demonstrações de que vai apoiar a candidatura do tucano José Serra. O governador de Santa Catarina reforça essa tendência. Disse que Serra "foi o melhor ministro da Saúde que o Brasil já teve" e o considerou "competente o suficiente" para governar o país.

Ele disse que analisa o momento "com mais profundidade, para além da espuma". Amin classificou de "espuma" o discurso que o senador José Sarney (PMDB) fez ontem à tarde da tribuna do Senado, "no momento em que o partido dele mostra que vai fechar a coligação com Serra".

Para ele, o fato mais importante do dia não seria o discurso de Sarney contra o tucano, mas o avanço das conversas para formação da chapa presidencial PSDB-PMDB.

"Gente rancorosa, gente brava também é espuma", afirmou, dando a entender que falava da governadora e presidenciável Roseana Sarney (PFL-MA), e do presidente do PFL, Jorge Bornhausen.
Amin disse considerar que Bornhausen não conduz os fatos políticos.


Para líder, senador não tem crédito
Encarregado de defender o governo e José Serra, pré-candidato tucano à Presidê ncia, o líder do presidente Fernando Henrique Cardoso no Senado, Artur da Távola (PSDB-RJ), acusou o senador José Sarney (PMDB-AP) de não ter crédito político em seu passado para acusar o atual governo de atropelar a democracia.
"Ele Sarney" não pode acusar o presidente [FHC" de estar por trás [de supostas manobras para derrubar o adversário de Serra", maquinando. Não lhe faltam méritos [a Sarney", mas lhe falta história para tanto", declarou.

Num tom mais agressivo que o de Sarney, Távola disse que o atual governo contribuiu para a derrocada das oligarquias estaduais, nas quais incluiu a família da governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PFL), filha do senador peemedebista.

"O que se vê hoje é o fim do ciclo das oligarquias estaduais, gradualmente tombadas diante da opinião pública. Oligarquias políticas que se mantiveram na época da ditadura, enriqueceram e foram beneficiadas pela distribuição política de emissoras de rádio e televisão, por exemplo."

Tiro certeiro
Foi um tiro certeiro na família Sarney, que comanda o Sistema Mirante, a maior rede de comunicação do Maranhão.

Segundo Távola, o discurso do senador "teria mais cabimento nos anos da ditadura", período no qual, lembrou ele, FHC e Serra estariam do outro lado, lutando contra o regime militar.

"Naquela época o discurso de Sarney não veio. Ao contrário. Mas agora, ele o discurso" não tem cabimento, pois o país goza das liberdades democráticas."

Na tribuna, Távola qualificou como "curioso" e "paradoxal" o fato de Sarney, filho da oligarquia, ter ajudado a redemocratização em seu governo. "Talvez purgando-se de não tê-lo feito antes."

O pai de Roseana não estava mais no plenário, mesmo sabendo que Távola ocuparia a tribuna para defender o governo. Sarney fez questão de explicar ao líder de FHC que sua ausência não era um gesto de descortesia, mas acarretado por questões de saúde.

Contra-informação
Para o orador do governo, a base do discurso do peemedebista foi a contra-informação. Ele afirmou que "fato", "informação" é o R$ 1,34 milhão que foi encontrado pela Polícia Federal na sede da Lunus, empresa da governadora Roseana Sarney e do marido dela, Jorge Murad.

Coisa diferente, ou seja, "contra-informação é dizer que foi vítima de um governo solerte: a velha política de não explicar e colocar a culpa no outro".

Na platéia, o senador João Alberto (PMDB-MA), aliado de primeira hora de Sarney e Roseana, pediu um aparte a Távola, disse que ele estava fazendo "baixaria" e, exaltado, acusou-o de classificar antigos aliados, no caso, Sarney, como oligarquia.

Já o ministro Aloysio Nunes Ferreira (Justiça), outro citado no discurso de Sarney, não quis comentar as declarações sobre seu passado de "atos violentos".

Aloysio, que assistiu ao discurso de Távola pela televisão em seu gabinete, disse por meio de sua assessoria de imprensa que endossa o discurso do líder do governo como resposta a Sarney.


PSDB convida PMDB a indicar vice de Serra
O governador de Pernambuco, Jarbas Vasconcelos, que já afirmou estar disposto a aceitar, seria o nome preferido do tucano

O PSDB formalizou ontem o convite para o PMDB indicar o vice na chapa do pré-candidato tucano ao Palácio do Planalto, José Serra, e iniciou operação para viabilizar a indicação do governador Jarbas Vasconcelos (PE), que já disse a interlocutores estar disposto a aceitar o posto.

O convite foi um ato meramente protocolar, coroando uma articulação comandada pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, como antecipou a Folha no sábado, para fazer dos peemedebistas parceiros preferenciais dos tucanos depois de o PFL ter rompido uma aliança de quase oito anos com o PSDB.

O próximo passo é viabilizar Jarbas na vice. O governador de Pernambuco é o preferido de FHC, de Serra e de parte da cúpula do PMDB. Na direção do PMDB, há desconfiança de que Jarbas seja mais serrista do que peemedebista.

Mais: Jarbas precisa costurar um acordo político com PSDB e PFL para manter sua hegemonia em Pernambuco. Feito isso, aceitará a vice, já que os opositores internos não se dispõem a vetá-lo, mas a apresentar outro nome caso ele recuse a empreitada.

Dois dirigentes, um tucano e um peemedebista, afirmaram que Jarbas só não será vice de Serra se não quiser.
O roteiro prevê conversas do presidente do PMDB, o deputado federal Michel Temer (SP), com governadores, prefeitos e caciques peemedebistas e uma reunião da Executiva do partido, no dia 2 de abril. Nessa reunião, o partido aceitará a proposta de aliança e deverá indicar Jarbas para vice.

Jarbas e Serra andam tão afinados que cancelaram um encontro previsto para ontem a fim de não parecer que estão atropelando o ritual político, criando um fato consumado.

"O PMDB deve se aliar ao PSDB e, sobre o nome do vice, acho inoportuno me manifestar, porque ainda não me decidi e porque há outras alternativas no partido que precisam ser ouvidas", disse o governador de Pernambuco.

Terminada a "operação vice", PMDB e PSDB deverão discutir o aumento da participação peemedebista no governo FHC enquanto são negociados acordos estaduais entre os dois partidos.

A maior participação do PMDB no governo será um sinal de que, na eventual gestão Serra, o partido terá o peso de aliado preferencial, proporcional ao que teve o PFL nos dois mandatos de FHC.

"Há um ritual a ser cumprido. A Executiva do PMDB discutirá o convite depois de serem ouvidas lideranças importantes do partido. O Jarbas tem todas as credenciais para ser vice e tomará uma decisão em consonância com todo o partido", disse o presidente do PMDB, o deputado federal Michel Temer (SP).

Depois de brindarem o convite para a aliança PSDB-PMDB com água mineral, Temer e Aníbal continuaram a operação para atrair peemedebistas da ala oposicionista para a candidatura Serra.

Assim, com uma união mais ampla possível, o PMDB espera ter maior cacife no atual e no eventual governo, e o PSDB, menos problemas com críticos duros, como o governador de Minas, Itamar Franco.

Pernambuco
Para viabilizar Jarbas como vice de Serra, PMDB e PSDB tentam um acordo com o grupo do pefelista Marco Maciel, vice-presidente da República.

Caso as regras da Justiça Eleitoral permitam, a intenção é lançar Maciel para o Senado Federal, um tucano para a outra vaga de senador e um peemedebista para o governo. Mas há chance, embora hoje pequena, de o vice de Jarbas, o pefelista Mendonça Filho, ser o cabeça-de-chapa dessa tríplice aliança.


Artigos

Cinismo, cá e lá
Clóvis Rossi

MONTERREY (México) - A palavra "cinismo" bailava na minha cabeça quando deixei o Cintermex, o centro de convenções que abriga a Conferência Internacional sobre Financiamento ao Desenvolvimento.
Mas pensava no cinismo planetário. A palavra havia sido usada pouco antes por Jeffrey Sachs, o economista que acaba de assumir as funções de, digamos, agitador da ONU para que possam ser cumpridas as metas da Cúpula do Milênio. Entre elas, a de reduzir à metade a pobreza absoluta no planeta até 2015.

Se os pobres dependessem apenas das pessoas que dizem preocupar-se com eles, já estariam ricos. Só aqui em Monterrey, são 6.500 boas almas credenciadas, jornalistas incluídos (entre os credenciados, não entre as boas almas).

Sachs jura que, desta vez, as metas serão atingidas apesar do "cinismo" reinante no ambiente.

Antes de escrever, por dever de ofício, leio as notícias da brava terra brasileira. Dou de cara com o discurso do senador José Sarney em defesa da filha Roseana.

Bom como pai, Sarney peca, no entanto, como político responsável. Primeiro, não oferece provas das acusações de que houve um vasto complô para dinamitar a candidatura da filha. Acusaçõe s sem provas já são profundamente lamentáveis em mortais comuns. Na boca de um ex-presidente, não sei qual adjetivo usar.
Nem é o pior. Mais grave é a comparação com candidatos presidenciais mortos, presos ou sequestrados no México, no Zimbábue e na Colômbia, respectivamente.

Só faltou lembrar um detalhe vital: nem no México, nem no Zimbábue, nem na Colômbia se achou uma pilha formidável de dinheiro confessadamente arrecadado à margem da lei -como aconteceu no escritório do casal Roseana/Jorge Murad.

Não foi, pois, necessário "fabricar um escândalo", como Sarney afirmou. O escândalo estava lá, em dinheiro vivo, e não foi a polícia quem o plantou.


Colunistas

PAINEL

Vale-tudo
O discurso de Sarney não deu sobrevida à candidatura Roseana, mas foi uma espécie de declaração de guerra a Serra. O tucano acha que o clã do MA e ACM serão seus grandes inimigos na eleição, tentando colar à sua imagem a marca de golpista.

Calo palaciano
Para FHC, Sarney o atingiu diretamente em apenas um ponto, ao pedir a presença de observadores internacionais na eleição. Fato que, segundo o Planalto, terá repercussão externa. No restante, teria sido o desabafo de um oligarca decadente.

Sinal verde oficial
O PFL só aguarda o pronunciamento do TSE para anunciar que Roseana desistiu da eleição. O partido acredita que o tribunal vá liberar as coligações nos Estados para quem não tiver candidato à Presidência.

Unidade partidária
O PFL não deverá ter candidato próprio nem apoiará qualquer outro nome à sucessão de FHC. A cúpula pefelista acha que é o único modo de evitar um grande racha, já que ACM e os Sarneys não aceitam, em hipótese alguma, uma recomposição com o PSDB de Serra.

Distância regulamentar
Fora da eleição presidencial, o PFL liberaria seus líderes para fazer campanha para quem preferir nos Estados. Além de preservar a unidade, o partido não teria de justificar à opinião pública uma aliança com Serra.

Resposta tucana
FHC reclamou ontem com aliados que os Sarneys ainda não entregaram os cargos que controlam no segundo e terceiro escalões. Após o discurso de ontem, o tucano decidiu demitir todos os apadrinhados da família assim que retornar do Chile.

Impróprio para menores
Estudantes primários assistiam ontem à sessão do Senado. Assim que Sarney subiu à tribuna para discursar, os professores tiraram os garotos do local.

Falha na teoria
Em seu discurso, Sarney confundiu o nome do delegado que realizou a operação na empresa de Roseana. Segundo ele, teria sido o mesmo que desmontou o dossiê Caribe, Paulo de Tarso Teixeira. O delegado que atuou no MA é Paulo de Tarso Gomes.

Muro jurídico
O STF deverá responder em um mês à ação da oposição contra a decisão do TSE de verticalizar as coligações. A maioria dos ministros é contra a verticalização. Mas há boa chance de o STF dizer simplesmente que não cabe a ele analisar norma do TSE.

Ao pé do ouvido
Artur da Távola passou boa parte do discurso de Sarney conversando com Serra pelo celular. Ao final, subiu à tribuna para rebater o ex-presidente com as frases sopradas pelo tucano.

Caminho regional
As pesquisas mostradas anteontem por Antônio Lavareda a Roseana foram realizadas apenas no MA e, segundo o sociólogo, não foram feitas pelo Ibope.

Ação cultural
Uma missão do BID está em SP para tratar de um empréstimo de US$ 20 mi a um projeto da Secretaria de Estado da Cultura de prevenção à violência.

Visitas à Folha
Luiz Marcelo Marrey Moncau, diretor de marketing da Microsoft, visitou ontem a Folha. Estava acompanhado de Ivan Galli, gerente de Contas Corporativas, Carlos Ximenes, gerente de Relacionamento com a Imprensa, e de José Luiz Schiavoni e Antonio Alves, ambos da 52 Comunicação Integrada S/C Ltda.

Roberto Nicolsky, professor do Instituto de Física da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), membro do Conselho Empresarial de Tecnologia da Firjan e diretor-geral da Protec (Sociedade Brasileira Pró-Inovação Tecnológica), visitou ontem a Folha.

TIROTEIO

De João Paulo (PT), sobre José Aníbal (PSDB) ironizar a derrota do governador Olívio Dutra nas prévias do PT-RS:
- Acostumado ao método do dedaço, pelo qual Serra foi indicado candidato, e a uma política baseada em grampos e chantagens, é natural que Aníbal não entenda as prévias do PT.

CONTRAPONTO

Era dos dossiês
O pré-candidato do PPS à Presidência, Ciro Gomes (CE), fez uma palestra, anteontem, no 46º Congresso Estadual de Municípios, em Serra Negra (SP).
Quando deixava o auditório, um simpatizante gritou para o ex-governador do Ceará:
- Governador, cuidado com o AI-6... -referindo-se aos atos institucionais do regime militar que restringiram liberdades garantidas pela Constituição.
Ciro não entendeu:
- O que você quer dizer com isso? - respondeu.
O homem continuou:
- Eu era feliz e não sabia.
O presidenciável foi enfático:
- Não diga isso, rapaz, nada é pior do que a ditadura.
O simpatizante, gargalhando, concluiu:
- Pelo menos naquela época as coisas eram feitas à claras e a gente sabia com quem estava lidando, sabia quem era o inimigo!


Editorial

VOLTA A LOCOMOTIVA

Os membros do comitê de política monetária do Federal Reserve, banco central americano, decidiram manter pela segunda vez consecutiva a taxa de juros básica em 1,75% ao ano. Interrompeu-se o agressivo ciclo de 11 reduções durante 2001. Os mercados interpretaram a decisão como uma mudança de rumo na política monetária e uma sinalização de alta no futuro. Os mercados acionários, temendo que o Fed aumente os juros nos próximos meses, passaram a operar em baixa.

De todo modo, o Fed emitiu clara mensagem de que a desaceleração econômica deixou de ser sua principal preocupação, a despeito de alguma incerteza que ainda persista. A recomposição dos estoques industriais e a construção de novas residências vêm liderando a recuperação econômica no primeiro trimestre.

As importações dispararam. O déficit na balança comercial e de serviços cresceu 15,4% em janeiro em relação a dezembro. A recuperação dos estoques de grandes empresas está ocorrendo mediante elevação das compras externas, sobretudo nos setores têxtil, eletrônico e de vestuário.

A recuperação americana vai assim impulsionando a economia mundial, demandando importações da Ásia, da União Européia e de alguns mercados emergentes, entre eles o Brasil. Os EUA voltam a atuar como a locomotiva do crescimento global.

Mas não se sabe até que ponto os Estados Unidos podem aumentar seu déficit externo em comércio e serviços. Há uma década, esse indicador flutua em torno de 4,5% do PIB. Isso significa que os EUA sugam mais de US$ 1 bilhão por dia do resto do mundo, elevando seu já imenso passivo externo e, portanto, aumentando as suas necessidades de financiamento. O dólar, que se valorizou 30% nos últimos cinco anos, pode ficar sujeito a uma correção no sentido inverso, como ocorreu em meados da década de 80.

Se esse risco permanece no horizonte, a recuperação americana é um fator indiscutivelmente saudável para a economia mundial, em geral, e para o Brasil em particular.


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03/21/2002


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