Sarney pede reflexão sobre a questão fundiária no país e defende MST
Video: TV Senado
Ao fazer uma análise da situação fundiária no Brasil, em discurso nesta quarta-feira (23), o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), chamou a sociedade a uma reflexão sobre o problema, assinalando que o país tem atrasado o processo de reforma agrária. Ele lembrou que, embora a violência no campo venha sendo atribuída aos movimentos dos trabalhadores sem terra, o Estado e a sociedade têm a sua parcela de responsabilidade na situação atual.
- Não modernizamos nossos métodos, não atualizamos nossas leis, não fomos, em suma, capazes de superar a imensa injustiça existente no campo. Somos todos nós, se não culpados, responsáveis, e sabemos que os sem-terra são vítimas de permanente frustração de sua esperança de poder ter um pequeno pedaço de terra para produzir - afirmou o senador.
Sarney salientou que, se o Brasil foi capaz de criar uma agricultura com tecnologia de ponta, hoje decisiva para o desenvolvimento do país, não há porque "não resolver a outra ponta", ou seja, a questão fundiária.
- Temos sem dúvida violência no campo, não ligada diretamente aos movimentos sociais, mas violência disseminada, que tem colocado pequenas cidades das áreas de expansão agrícola entre as de maior índice de violência do Brasil, comparável à de Recife, São Paulo e Rio - disse o senador.
Sarney apontou, também, o potencial de crescimento do confronto, cada vez mais violento, entre os movimentos sociais, tendo à frente o Movimento dos trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e as Pastorais da Terra, entre outros grupos. Ele salientou que o fator de maior peso nesse risco e a não realização da justiça social.
- Assim é um erro olhar o problema dos sem-terra pelo lado penal, criminalizá-lo. Os excessos - e eles existem - devem ser punidos, bem como o desrespeito à propriedade. Mas não devemos radicalizar. Temos que evitar o confronto e não demonizar o MST - alertou o senador.
Sarney, que criou o Ministério da Reforma Agrária quando presidiu o país, disse que é preciso reconhecer a vontade especial e o compromisso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva com a solução do problema. No entanto, disse o senador, sua determinação e seus esforços têm sido insuficientes.
- E são insuficientes por ser este um dos problemas em que a consciência da sociedade é o ingrediente a ser, antes dos demais, abalada e reformulada - observou.
O senador lembrou discurso que fez quando era presidente da República, há mais de 20 anos, em que afirmava que "assegurar a propriedade da terra não é, apenas, ato de reparação, mas também, decisão política que atende às carências do presente e previne as necessidades do futuro".
- Desde o discurso que citei, feito quando eu era presidente da República, o que mudou? Naquele tempo, 1% das propriedades rurais representava 45% da área rural. Hoje, 1,6% dos proprietários controlam 47% da área rural. É uma mudança muito pequena. É, para não dizermos meias palavras, um fracasso - afirmou.
Sarney ressaltou que há muito o que fazer, como a regularização fundiária e a revisão das normas que indicam o que é terra produtiva. É preciso, acrescentou, dar total prioridade ao conceito de função social da terra, levando em conta os conceitos de desenvolvimento tecnológico e desenvolvimento sustentável. Ele frisou que a política social e a política ambiental têm que marchar unidas.
Sarney lembrou que o MST tem "várias faces", apontando como notável seu trabalho de organização. Ele lamentou que os casos de violência ocultem a realidade de que seu trabalho é, na imensa maioria dos casos, pacífico, voltado para a educação do homem do campo e de consolidação familiar.
Segundo o senador, 370 mil famílias foram assentadas através do MST, 90 mil estão em acampamentos da organização e mais de 400 associações e cooperativas trabalham para produzir sem transgênicos e agrotóxicos, sob sua orientação. O movimento apoia 96 agroindústrias, viabilizou em torno de 2.000 escolas com 10 mil professores, alcançando 300 mil estudantes, tem parcerias com pelo menos 50 instituições de ensino, de Universidades a Escolas Agrotécnicas.
- Mas teimamos em culpar a febre, em vez de combater a infecção generalizada - disse o senador, acrescentando que investigar o MST não contribuirá para a solução do problema da distribuição fundiária e da política agrária.
Sarney defendeu a utilização do conhecimento do Movimento dos Sem Terra e sua vivência do problema na busca de sua solução.
- Não podemos, de nenhuma maneira, demonizar os que nada têm por terem fome e sede de justiça. Se já perdemos a batalha urbana, não podemos perder a batalha rural. Essas populações do campo, acuadas, sem saída, marcharão para a violência, como já ocorre em vários países da América Latina, como a guerrilha e o terrorismo - alertou.
23/09/2009
Agência Senado
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