Serra lança candidatura e defende governo









Serra lança candidatura e defende governo
Num discurso de tom conciliador, ministro afirmou manter compromisso com as conquistas da gestão FH

Com o lema “Nada contra a estabilidade. Tudo contra a desigualdade”, foi lançada ontem a candidatura à Presidência pelo PSDB do ministro da Saúde, José Serra, em Brasília.

À mesa, organizada sob medida para demonstrar a unidade tucana, Serra ficou entre o governador do Ceará, Tasso Jereissati, e José Aníbal (SP), presidente do PSDB. Serra e Tasso se dirigiram um ao outro apenas uma vez. O tom da reunião foi dado pelo presidente da Câmara, Aécio Neves:
– É o PSDB se encontrando e se reencontrando.

Tasso foi aplaudido quando Aécio lembrou que ele desistira da candidatura.
– O PSDB iniciará e terminará essa jornada unido – disse Aécio.

Mantendo um tom conciliador em seu discurso, Serra afirmou compromisso de manter as conquistas do atual governo. O único político vivo não-tucano citado foi governador de Minas Gerais, Itamar Franco (PMDB), pré-candidato à Presidência. O ministro fez questão de lembrar que foi Itamar, durante seu governo, que levou FH ao ministério da Fazenda. Foi o atual presidente quem lançou o Real, base de sua candidatura em 1994.

O ministro afirmou que o Plano Real ajudou a melhorar a vida das pessoas, e que irá fazer “aquilo que não foi possível realizar no atual governo”, sem, no entanto, citar o que teria ficado para trás. Em seu pronunciamento, que durou 25 minutos, Serra disse que o país precisa produzir mais, exportar mais e gerar grandes excedentes comerciais. Para o ministro, isso permitirá, associado à estabilidade da moeda, a redução dos juros.

O ministro disse ainda que, para haver progresso, é necessária a redução das desigualdades regionais. Ele ressaltou que está combatendo a desigualdade nas áreas de educação e saúde e que é preciso o mesmo empenho na redução nas grandes cidades, onde há grandes focos de violência.

Citou ainda a luta do governo para quebrar “em circunstâncias justificadas” patentes de remédios considerados essenciais. No final, Serra acenou para o diálogo com os outros partidos da base governista. O ministro falou também sobre sua carreira política, sobre o exílio e sobre sua atuação atual no ministério. Foram citados como exemplos de presidentes que mudaram o país, Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek. Ele foi aplaudido várias vezes.

Os governadores que prestigiaram a solenidade destacaram a unidade do partido, a expectativa em torno da aliança, e o otimismo quanto a sua eleição.
– O piloto é experiente, não tem medo de tempo ruim, a rota é segura e nós vamos fazer uma bela jornada – previu o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin.

Depois da cerimônia, Serra retornou ao ministério e despachou normalmente. Ele ficou apenas 15 minutos no restaurante Porcão, onde ocorreu o almoço de confraternização do PSDB. À noite, seguiu para o Rio Grande do Norte. Hoje, inaugura uma nova ala do Hospital Tarcísio Maia, em Mossoró, onde também lançará o Bolsa-Alimentação.


Aliados e adversários avaliam chances do ministro da Saúde
Setores do PSDB defendem aliança depois de junho

O lançamento oficial da candidatura do ministro da Saúde, José Serra (PSDB), ontem, em Brasília, foi mais um passo para a definição do quadro eleitoral para outubro e provocou reações em todo o meio político.

Uma das pedras no sapato do candidato Serra – o fraco desempenho nas pesquisas de intenção de voto – foi minimizada pelo governador de Goiás Marconi Perillo. Ele recordou que até conseguir a vitória para o governo do Estado só obtinha 3% nas pesquisas.

A possibilidade de alianças com partidos da base governista foi lembrada pelo governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, e pelo ministro de Minas e Energia, José Jorge. Os dois sustentam que o PSDB e o PFL devem manter candidaturas próprias até o meio do ano, quando será avaliada a possibilidade de uma aliança.

O senador Pedro Simon, pré-candidato à Presidência pelo outro partido da base aliada, o PMDB, declarou que o PSDB acatou uma decisão “de cima para baixo”, “imposta” pelo presidente Fernando Henrique ao se unir em torno da candidatura Serra:
– Nosso partido é diferente dos demais. A convenção decidiu que nosso candidato vai ser definido nas prévias. Não é como no PT onde o Suplicy é ridicularizado, e no PSDB, onde o Tasso teve de desisitir.

A aparente união dos tucanos em torno de Serra encontrou dissonâncias em Minas Gerais. O ex-governador de Minas Eduardo Azeredo criticou Serra afirmando que ele está fazendo “jogo duplo” ao trocar telefonemas e acenos com o governador de Minas, Itamar Franco (PMDB).
– O Serra é o melhor candidato no momento, mas somos pela fidelidade partidária e a lealdade. Ele vai ter de escolher o seu lado – disse o tucano.

Depois de cinco dias entre a Rússia e a Ucrânia, o presidente Fernando Henrique Cardoso deixou Kiev ontem, de volta a Brasília, decidido a não falar sobre o lançamento da pré-candidatura do ministro da Saúde, José Serra (PSDB) à Presidência da República.

Mas, no Brasil, ontem à noite estavam sendo agendadas duas viagens em que FH e Serra participariam juntos de eventos.

Uma delas está prevista para a próxima sexta-feira, para São Paulo, onde os dois devem participar de um evento na Associação Paulista de Cirurgia Dentária. Três dias depois, a agenda prevê uma viagem a Recife.

Quarta-feira, em Kiev, repórteres ouviram quando FH foi aconselhado a não dar entrevista, ao término de um evento.
– Não pára, presidente, porque eles vão perguntar sobre o lançamento do Serra – avisou um assessor.

Ontem, depois de visitar o Museu Nacional de Lavra, em Kiev, sob um frio de -14ºC, o presidente disse que iria tratar do assunto só em Brasília.


Esquenta a disputa no PT
Pesquisa do Ibope será analisada hoje pela direção nacional

Às vésperas da reunião do diretório estadual que vai discutir a sucessão do governador Olívio Dutra, cresce a expectativa no PT em torno do resultado da pesquisa encomendada ao Ibope. A pesquisa, com 40 questões, deve ser analisada hoje à tarde pela direção nacional do PT, em São Paulo.

O prefeito de Porto Alegre, Tarso Genro, está em São Paulo e, dependendo dos resultados da pesquisa, pode definir seu futuro ainda hoje. Antes de viajar, Tarso disse que se ficar provado que o governador Olívio Dutra tem iguais ou melhores condições de vencer a eleição, desistirá da candidatura e cumprirá seu mandato até o fim.

Em busca de apoio para ser indicado por consenso, o governador Olívio Dutra recebeu ontem em seu gabinete a senadora Emília Fernandes e o deputado federal Paulo Paim, pré-candidato ao Senado. Em entrevista a Zero Hora, Olívio citou os dois como bons nomes para o Senado, junto com Flávio Koutzii e Raul Pont.

O PT está dividido. No secretariado, Tarso tem o apoio declarado apenas de Adão Villaverde (Planejamento), Renato Oliveira (Ciência e Tecnologia) e Cláudio Langone (Meio Ambiente). Os demais estão com Olívio ou ainda não manifestaram preferência. Na bancada estadual, Olívio conta com Ronaldo Zülke, Edson Portilho, Cecília Hypolito, José Gomes e Elvino Bohn Gass. Tarso, com Luciana Genro, Roque Grazziotin, Luiz Fernando Schmidt e Maria do Rosário. Ivar Pavan não abriu o voto.

As correntes também estão divididas. Das quatro maiores, Olívio tem o apoio da Democracia Socialista (22% do diretório estadual) e Tarso do PT Amplo (18%). A Articulação de Esquerda (10%) está dividida ao meio e a Ação Democrática (10%) ainda não oficializou sua posição. Olívio conta também com o apoio do PSB e do PC do B, parceiros n a Frente Popular.

Fiel da balança, a Ação Democrática – corrente à qual pertencem o deputado Ivar Pavan e o secretário da Administração, Marco Maia – se reúne hoje para definir a posição que vai defender amanhã, na reunião do diretório estadual. Dos 35 prefeitos petistas, 11 pertencem à Ação Democrática. Entre eles está o de Santa Maria, Valdeci Oliveira. Os líderes da corrente defendem a escolha de um candidato de consenso, mas evitam revelar sua preferência por Olívio ou Tarso.

Na tentativa de conquistar a Ação Democrática, Tarso tem citado o deputado Ivar Pavan como um bom nome para o cargo de vice-governador, junto com o deputado Roque Grazziotin, da Articulação de Esquerda.

Marco Maia disse ontem que o grupo vai lutar por uma divisão mais equilibrada no poder, caso o PT conquiste um segundo mandato. Hoje a Democracia Socialista tem a maior parte dos cargos. A corrente sustenta que se Olívio for o candidato, o vice deve ser de outra corrente.

Com consenso ou com prévia para escolha do candidato a governador, o vice deverá ser escolhido em um encontro estadual, no qual a DS não terá maioria. O vice-governador Miguel Rossetto já manifestou a intenção de concorrer à reeleição. Como Olívio pretende se licenciar do cargo durante a campanha, se for candidato, Rossetto não poderia concorrer a outro cargo que não o atual.


Tarso compara candidatura de Roseana à de Collor
O senador Jorge Borhausen rebateu ontem as acusações

A governadora do Maranhão, Roseana Sarney, pré-candidata à Presidência pelo PFL, foi alvo de ataques do prefeito de Porto Alegre, Tarso Genro (PT).

O prefeito comparou a candidatura de Roseana à do ex-presidente Fernando Collor. Tarso também afirmou que seria preferível um confronto entre Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o ministro da Saúde, José Serra (PSDB), em um provável segundo turno:
– São propostas bastante diferentes. Mas a de Serra merece respeito.

As críticas a Roseana foram rebatidas pelo presidente nacional do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC):
– Aconselharia o prefeito a cuidar dos problemas do Olívio Dutra. Ele fez isso para fugir do assunto do Clube da Cidadania, que está muito complicado para o seu partido
Roseana, que se encontrava ontem em São Paulo gravando o programa eleitoral do PFL tambémrespondeu a Tarso:
– É a opinião dele. Não é a minha nem a do povo brasileiro – afrimou. a governadora, referindo-se aos 20% de preferência registrados nas pesquisas de intenção de voto, a favor de sua candidatura.
Em São Paulo, Tarso disse que a candidatura era uma “ameaça e aventura constrangedora, de tão parecida com a de Collor”.


Garotinho ataca governadora
O candidato do PSB à Presidência, Anthony Garotinho (RJ), criticou ontem, em Recife, a governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PFL), pré-candidata à Presidência.

O governador carioca disse que o programa de governo do PSB, baseado na redução da taxa de juros, crédito ao setor produtivo e reforma tributária, não vai gerar “a inflação do pai da Roseana, de 84% ao mês”.
Referindo-se ao ex-presidente José Sarney, Garotinho afirmou que “a maior inflação do país” não se repetirá em seu eventual governo “porque a correção monetária acabou”.
Depois, evitou polemizar.
– Minha estratégia é divulgar o meu trabalho – afirmou.
– Não preciso debater com a Roseana. Eu mostro o meu trabalho e ela mostra o dela – disse.


Encontro de Porto Alegre divide líderes da CUT
Os debates do Fórum Social Mundial, de 31 de janeiro a 5 de fevereiro, em Porto Alegre, serão desfalcados este ano de 26 dirigentes da Central Única dos Trabalhadores (CUT), uma das organizadoras do evento. São críticos do formato e das propostas do encontro, liderados pelo diretor executivo nacional da entidade, o paulista Júlio Turra, 48 anos.

Os dissidentes assinaram uma carta aberta em que condenam o que definem como contradições do fórum – a participação de Organizações Não-Governamentais (ONGs), a proposta de criação da Taxa Tobin – uma espécie de imposto sobre o capital especulativo – e a Organização das Nações Unidas (ONU). Os 26 líderes sindicais se dispõem a participar apenas da sessão plenária da CUT, dia 1º de fevereiro, na Capital, para discutir a realização de uma greve geral em março.

Confira, nas entrevistas nesta página, as posições de Turra contra o fórum e as do presidente nacional da CUT, João Felício, 51 anos, que defende os debates.


“Um fórum assim não leva a grande coisa”
Entrevista: Júlio Turra, diretor executivo da CUT

Zero Hora – Por que o senhor critica o fórum?
Júlio Turra – A executiva da CUT tem 25 membros, e eu fui uma voz destoante. É posição pessoal que não põe em questão a posição da central. O fórum se apresenta como iniciativa da sociedade civil e coloca no mesmo saco todo mundo, o governo, a ONU, as Ongs, os sindicatos. Um fórum assim não leva a grande coisa. As ONGs substituem o serviço público e usam trabalho precário. Isso dissolve os conflitos de classse dentro do conceito geral de sociedade civil.

ZH – Quais são os outros motivos?
Turra – O slogan do fórum diz que um outro mundo é possível. Reafirma a idéia de que é possível dar face humana à globalização. A globalização é capitalista. Não vemos como dar face humana ao capitalismo. O fórum vai realizar uma conferência sobre a paz e apresentar planos que seriam encaminhados à ONU. A ONU tem dado cobertura política às guerras dos Estados Unidos. E como dar face humana à guerra?

ZH – Por que o senhor critica também o Orçamento Participativo do Estado?
Turra – Porto Alegre foi escolhida para o fórum e recebe muitos elogios por causa do Orçamento Paticipativo. O orçamento é uma política que amortece os movimentos sociais, integrando-os à órbita do Estado. É apenas um filtro para as reivindicações populares. Joga um movimento contra o outro.

ZH – O prefeito Tarso Genro, o sociólogo Emir Sader e outros envolvidos na organização dizem que o fórum não é um evento das esquerdas. O senhor concorda?
Turra – Se dizem isso, é porque devem saber que não é. Mas quero deixar claro que nossa posição não é de boicote ao fórum. Temos apenas posição dissonante da oficial.


“O fórum não é só para as esquerdas”
Entrevista: João Felício, presidente da CUT

Zero Hora – O sindicalismo está dividido no fórum?
João Felício – Mais de 95% dos sindicalistas apóiam o fórum. A posição de Turra é individual e eu a respeito. Mas não expressa a posição da esmagadora maioria. Teremos em Porto Alegre uma plenária com mais de 3 mil sindicalistas. O fórum é aberto a todas as posições. Há quem defenda uma ruptura radical do modelo neoliberal, e outros que não chegam a tanto. O fórum aglutina os mais diversos movimentos populares.

ZH – Turra diz que é impossível dar uma face humana à globalização.
Felício – Pode ser difícil. Mas também é impossível desenvolver um modelo isolado do mundo. Uma coisa é questionar os modelos de globalização, a Alca (Área de Livre Comércio das Américas), a Comunidade Européia. Outra coisa é achar que podemos ficar isolados do resto. O que queremos no mundo do trabalho é que nossos direitos sejam respeitados. Não pretendemos humanizar a globalização, mas propor alternativas a esse modelo excludente.

ZH – As ONGs podem contribuir com essas alternativas?
Felício – Há ONGs com as quais temos profunda identidade, e outras com as quais discordamos. As Ongs vêm ao fórum para dizer o que fazem.

ZH – O senhor concorda então que o fórum não é das esquerdas?
Felício – Não é só para quem concorda com as esquerdas. Deus me livre de um espaço em que todos pensam igualzinho. É muito mais amplo do que alguns achavam que deveria ser. É para quem, com profundidade ou superficialidade, questiona os modelos mundiais. Tem posições de centro também, sem afinidade ideológica com as esquerdas.


STJ pede autorização para processar Itamar
As desavenças entre o governador de Minas Gerais, Itamar Franco (PMDB), e o presidente Fernando Henrique Cardoso podem chegar à Justiça.

O presidente interino do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Nilson Naves, pediu ontem autorização à Assembléia Legislativa mineira para processar o governador pelos crimes de injúria e difamação que teriam sido praticados contra o presidente.

Segundo a acusação, em palestra realizada no Rio, Itamar teria afirmado que Fernando Henrique teria liberado recursos para peemedebistas em troca de votos para Michel Temer (SP) na convenção para a escolha da cúpula do partido, ocorrida no ano passado.

O caso chegou ao STJ porque o procurador-geral da República, Geraldo Brindeiro, atendeu a um pedido do então ministro da Justiça, José Gregori, que cumpria uma determinação do presidente. Ao oferecer a denúncia contra Itamar, Brindeitro afirmou que o governador atingiu a honra pessoal e funcional do presidente da República.


Governo quer direito de resposta
O governo brasileiro vai processar a revista americana Newsweek, que publicou semana passada, em sua versão latino-americana, uma reportagem de capa sobre o desempenho negativo da reforma agrária no país. A embaixada brasileira nos Estados Unidos vai tentar recuperar nos tribunais americanos mesmo espaço na mídia impressa para responder as críticas à reforma agrária do Brasil.

Segundo o ministro do Desenvolvimento Agrário, Raul Jungmann, a maior parte da reportagem foi baseada em um balanço do governo feito em 1995, período em que nenhum assentamento foi promovido.

A revista diz que "o transporte no interior dos assentamentos não é confiável" e que "eletricidade é um luxo". Segundo Jungmann, 42% dos assentamentos têm transporte várias vezes ao dia e 28%, pelo menos, uma vez por dia. Além disso, 78% dos assentamentos teriam energia elétrica. A reportagem afirma que 95% dos assentamentos não têm água potável. De acordo com os dados do ministério, 37% têm acesso à água de poços comuns, 34% dispõem de nascentes, 27% contam com poços artesianos, 18% são cortados por rios e 10% têm açudes.


Artigos

O museu que faltava
Júlio Mariani

A decisão de levar adiante a restauração da Igreja das Dores e de ali instalar o primeiro museu de arte sacra de Porto Alegre é um passo significativo para a preservação da memória rio-grandense. A Igreja das Dores, localizada no centro da cidade, em terreno que se estende da Andradas à Riachuelo, começou a ser construída no início do século 19 e é a mais antiga da Capital ainda de pé. Preservá-la de maneira adequada representa portanto uma obrigação de autoridades eclesiásticas e seculares e da própria comunidade católica.

O cenário é mais do que apropriado para abrigar o museu que recolherá as peças sagradas guardadas na Catedral Metropolitana, hoje inacessíveis ao público, além do material do próprio templo dedicado a N.S. das Dores, e que certamente receberá imagens e objetos rituais de outras paróquias. É pena que o espaço reservado seja pequeno, mas ao menos se dá um primeiro passo para reunir e apresentar ao público um acervo que de outra forma permaneceria fechado a sete chaves, cairia no esquecimento ou iria parar em coleções particulares. O fato de que grande parte da arte sacra se deva a criadores anônimos ou pouco conhecidos valoriza ainda mais o trabalho museológico especializado nesse campo.

A Capital se enobrece com a preservação da Igreja das Dores
e do acervo sagrado gaúcho

Museus de arte sacra constituem atração turística de primeiro plano em qualquer ponto do planeta. Ao contrário do que se poderia supor a partir de um ponto de vista centrado na importância atualmente atribuída ao que se poderia chamar de arte profana, é a arte sacra que ocupa o papel principal na História, tanto no Ocidente quanto no Oriente. Imagens e objetos destinados à adoração dos crentes ou que disponham de funções mágicas estão na base da aventura estética da humanidade. A arte como registro profano, espécie de crônica visual de costumes, ou como canal de expressão individual, constitui uma parcela pequena quando comparada ao mundo quase interminável das peças sagradas das várias religiões de todas as latitudes. A sagração dos objetos alcança grande parte da caminhada humana.

Por isso conservar e exibir arte sacra se inclui entre as tarefas culturais básicas, que devem merecer o apoio de todos, mesmo das pessoas que professem outras religiões que não a católica. Não se pode esquecer que, no Ocidente, a história da Igreja Católica se mistura com a própria história geral, e que esse aspecto deve ser preservado para as novas gerações com a maior riqueza possível de elementos concretos.

A herança artística e arquitetônica religiosa gaúcha é pobre quando comparada à riqueza transbordante de Minas Gerais e do Nordeste. Justamente por isso é importante que se trate de manter e de exibir o que existe, evitando-se perdas e extravios ainda maiores.


Colunistas

ANA AMÉLIA LEMOS

A sucessão presidencial
O lançamento da candidatura do ministro da Saúde, José Serra, à sucessão de Fernando Henrique Cardoso é o fato novo na aliança partidária que dá sustentação ao governo. Esse deve ter sido o assunto durante o vôo de 13 horas que separa Brasília de Moscou e de Kiev na fria Europa do Leste. Ontem, ao deixar a bela capital da Ucrânia, Fernando Henrique Cardoso falou com os jornalistas no pátio do Museu Lavra, quando a temperatura estava em 15 graus negativos. O frio excessivo tirou a inspiração do presidente, que evitou responder a todas as perguntas relacionadas à candidatura Serra, mesmo que tenha ficado extasiado com a beleza das obras que acabara de ver pela primeira vez e que refletem o apogeu da cultura e do império eslavos.

O líder do governo na Câmara Federal, Arnaldo Madeira, não se surpreendeu com o gesto do governador do Ceará, Tasso Jereissati, de comparecer ao lançamento da candidatura do nome que vinha contestando publicamente. Defensor de José Serra e representante do PSDB na comitiva oficial de FH na viagem à Rússia e à Ucrânia, o parlamentar deve ter ficado entusiasmado com o apoio explícito dado pelo líder do PMDB na Câmara, Geddel Vieira Lima, à candidatura do ministro da Saúde. Nesse partido, não há consenso. O prefeito de Joinville, Luís Henrique da Silveira, que integrou a comitiva oficial nas visitas à Rússia e à Ucrânia, quer que a decisão da base por candidatura própria seja respeitada. Seu candidato nas prévias do PMDB é o senador Pedro Simon. Na disputa pela presidência da Câmara e do Senado, PMDB e PSDB fizeram acordo com vistas à sucessão de Fernando Henrique Cardoso. A derrota do candidato do PFL, Inocêncio Oliveira, e a vitória de Aécio Neves abriram um flanco que pode aumentar por dois motivos: 1) a ascensão da candidatura da governadora Roseana Sarney e 2) a decisão de José Serra em adiantar o lançamento da candidatura na tentativa de melhorar sua performance nas próximas pesquisas eleitorais.

O governador do Paraná, Jayme Lerner, do PFL, disse que a candidatura própria está consolidada. Entretanto, Lerner, como FH, prefere que a aliança governista consiga até maio definir uma chapa única que confirme a aliança já no primeiro turno. Vai ser difícil. Especialmente se o nome da governadora do Maranhão continuar se consolidando como opção do eleitorado. Até maio Fernando Henrique Cardoso tem certeza de que terá condições de acomodar todas as correntes e a aliança será preservada.


JOSÉ BARRIONUEVO

Disputa pelo Senado esquenta bastidores
Enquanto a senadora Emília Fernandes conversava com o governador Olívio Dutra em seu gabinete no Palácio Piratini, o deputado federal Paulo Paim estava um andar abaixo com o vice-governador, Miguel Rossetto. Depois Paim subiu para falar com Olívio também. A pauta nos dois gabinetes era a mesma: eleições. E as intenções de Emília e Paim também coincidiam: ambos querem disputar uma das vagas do Senado e buscam o apoio dos nomes mais importantes do PT gaúcho no momento em razão dos cargos que ocupam – governador e vice-governador.
Resta saber o que será decidido no encontro estadual do PT, marcado para março, já que, além de Emília e Paim, o chefe da Casa Civil, Flávio Koutzii, também quer ser senador.

Era só o que faltava
Como se colocasse uma pedra em cima do passado, agora o governador do Rio, Anthony Garotinho, do PSB, está rondando o presidente nacional do PDT, Leonel Brizola. Em campanha pelo Nordeste, Garotinho sugeriu ao presidente do PSB, Miguel Arraes, que procure Brizola para sugerir uma aliança. Depois de tudo que ouviu de Brizola.
– É claro que Brizola pode participar da aliança, mas aí o Arraes conversa com ele e os dois se entendem – imagina Garotinho.

Garotinho ironiza Serra
Garotinho aproveitou para atacar o candidato do presidente Fernando Henrique, José Serra (PSDB), bem no dia do lançamento de sua candidatura, em Brasília. Ironizou:
– Se o povo está satisfeito com o atendimento à saúde da população, se é muito bem atendido nos ambulatórios, postos de saúde e hospitais, deve votar em Serra. Ele manda R$ 1 por habitante para o Programa de Assistência Básica à Saúde dos Municípios, o povo está morrendo.

Frustração
A passagem do governador Olívio Dutra pela Procuradoria Geral do Estado causou frustração, ontem, na categoria. Há sete anos sem reajuste, os procuradores esperavam um aceno sobre o pagamento da reposição da inflação conquistada na Justiça. Olívio se limitou a sancionar a nova Lei Orgânica da Procuradoria, que dá novas atribuições à classe.

Novo boato
Em sua passagem por Caxias do Sul, ontem, o candidato a governador do PDT, José Fortunati, espalhou que há uma forte pressão dentro do partido para que Leonel Brizola dispute a Presidência da República.
– Apesar de Brizola insistir que não quer concorrer, as coordenadorias estão fazendo um abaixo-assinado e já podemos adiantar que ele deve aceitar – disse Fortunati.
Pelo ritmo da campanha, tudo indica que Fortunati nem deverá assumir o cargo de presidente da Câmara da Capital. Não terá tempo para isso, e o cargo deverá mesmo ficar com o vice, Carlos Garcia, do PSB. Para o desgosto da oposição.

Estrela Roseana
Enquanto a governadora do Maranhão, Roseana Sarney, se preparava ontem para gravar o programa político do PFL na produtora Teleimage, em São Paulo, jornalistas e fotógrafos se acotovelavam em cima de um muro para enxergá-la melhor. Espirituosa que anda, Roseana rapidamente pegou uma máquina fotográfica e focou nos profissionais, provocando uma risada geral.

Pedido de explicações
O secretário extraordinário da Reforma Agrária, Antônio Marangon, estará na Comissão de Agricultura da Assembléia na semana que vem explicando o decreto do governo que desapropria áreas produtivas do Estado. A proposta foi apresentada ontem pelo presidente da comissão, deputado Frederico Antunes, do PPB. Marangon já aceitou o convite para se explicar.

Um apoio duvidoso
Interessado na cadeira hoje ocupada pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, o senador gaúcho Pedro Simon participou ontem em São Paulo do encontro do PMDB convocado para discutir a sucessão no Palácio do Planalto.

Conversa vai, conversa vem, Simon recebeu um apoio – com direito a abraço e tudo – que só o tempo dirá se foi bom ou ruim: do ex-governador Orestes Quércia.


ROSANE DE OLIVEIRA

Melhor, impossível
Pode até não durar esse clima de lua-de-mel, mas o PSDB conseguiu dar uma demonstração de unidade no lançamento da candidatura do ministro da Saúde, José Serra. Disciplinado, o governador Tasso Jereissati trancou no armário os ressentimentos e foi a Brasília. Lá estavam todos os que em um momento ou outro postularam a vaga de candidato tucano à sucessão do presidente Fernando Henrique Cardoso. Do ministro da Educação, Paulo Renato Souza, ao governador de Mato Grosso, Dante de Oliveira, estavam todos lá.

Tasso deixou claro que é leal mas não se sente impedido de conversar com quem bem entender – leia-se a governadora Roseana Sarney. Ter ido à festa de Serra já foi muito para quem não esconde o desconforto pela forma como foi tratado pelo Palácio do Planalto. Depois da briga com o ministro da Justiça, Aloysio Nunes Ferreira, o governador do Ceará tem ainda mais motivos para só ir a Brasília em caso de força maior.

Para a simbologia da unidade, foi importante para Serra ter a seu lado a filha do falecido governador Mário Covas, Renata. A família Covas preferia Tasso, mas cerrou fileiras ao lado do ministro.

Brasília, que em fevereiro é um deserto de homens e de notícias, ontem só teve olhos para Serra. Nem o presidente Fernando Henrique Cardoso estava no país para disputar a atenção dos jornalistas. Estrategicamente, o lançamento coincidiu com o fim da viagem à Ucrânia, quando tudo o que era importante já tinha sido dito ou feito.

Serra fez o discurso da conciliação, evitou críticas à política econômica – à qual tem sabidas restrições – e se apresentou como o candidato capaz de manter o que o governo FH fez de bom e avançar sem comprometer a estabilidade. Citou , como um dos exemplos de “pessoas que vivem para impulsionar o progresso” a pediatra Zilda Arns, uma unanimidade nacional com o trabalho desenvolvido na Pastoral da Criança. Teve o cuidado de não dizer que dona Zilda é a mulher que deseja ter no Ministério da Saúde de um eventual governo seu.

Ontem, tudo saiu melhor que a encomenda para os tucanos. Os problemas de Serra começam hoje. Alvo preferencial da oposição, terá de provar ao seu próprio partido que é um candidato viável, sob pena de perder o posto antes da convenção de junho.


Editorial

O TEMOR DO POPULISMO

Os presidentes George W. Bush e Fernando Henrique Cardoso coincidiram ao diagnosticar a principal carência da Argentina neste momento de desintegração de seu tecido financeiro, político e social. Falando na sede da Organização dos Estados Americanos, em Washington, o primeiro mandatário norte-americano afirmou que os EUA estão dispostos a ajudar Buenos Aires através dos organismos multilaterais de fomento, desde que o governo Duhalde se comprometa com um plano econômico sustentável, que exclua medidas protecionistas. Já seu colega brasileiro, em entrevista que concedeu em Kiev, na Ucrânia, disse que é preciso que a Argentina estabilize sua situação institucional, para que possa apresentar à população e às nações vizinhas um plano econômico dotado de credibilidade.

No mesmo sentido se manifestou a Comissão Européia, que cobrou do presidente justicialista propostas fiscais concretas, uma definição do papel e dos objetivos do Banco Central e “um esquema confiável” para salvaguardar as instituições financeiras. Estas, por sinal, começam também a manifestar impaciência, ameaçando encerrar suas atividades no país vizinho, caso não sejam equacionadas suas perdas com a mudança do regime cambial. A ansiedade é até certo ponto compreensível: calcula-se que apenas os bancos espanhóis investiram US$ 30 bilhões em uma nação que ostentava uma estabilidade de fachada. O próprio Fundo Monetário Internacional, ao mesmo tem po em que deu o seu primeiro passo de boa vontade em relação a Buenos Aires, com o adiamento por um ano da cobrança de uma parcela de dívida vencida agora, advertiu, repetindo Bush, que qualquer novo desembolso dependerá de um programa sustentável.
Uma voz solitária soa neste momento na Argentina, apontando o lado
esquecido da grande crise

A grande dificuldade de Duhalde é responder com atos concretos a tantos chamamentos à ortodoxia econômica. Tão ingentes são os desafios que enfrenta em um país convulsionado – ainda ontem renunciou o presidente do Banco Central – que se lhe torna praticamente impossível planejar sequer a médio prazo. O temor que cresce na comunidade financeira mundial é o de que, diante das crescentes pressões internas e externas Duhalde opte por um receituário populista. A preocupação é procedente. Políticas econômicas na contramão das adotadas hoje pelos principais mercados, e que incluem invariavelmente severa disciplina fiscal, contribuiriam apenas para mais isolar uma nação concordatária.

Uma voz solitária soa neste momento em Buenos Aires apontando o lado esquecido da grande crise. O Prêmio Nobel da Paz Adolfo Pérez Esquivel defende a tese de que o caso da dívida externa seja submetida à Corte Internacional de Haia, para determinar suas partes legítima e ilegítima. Sustenta ele que na Argentina houve uma subversão econômica que saqueou a nação, e os responsáveis devem ser levados perante a Justiça. A tese é insólita, mas chama a atenção para a necessidade da busca de soluções não-ortodoxas para problemas que certamente não afetam apenas nosso parceiro continental.


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01/18/2002


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