Serra reúne aliados para tentar conter Lula









Serra reúne aliados para tentar conter Lula
Governadores e líderes decidem manter tática de ataques e reforçar a campanha de rua

BRASÍLIA – O candidato do PSDB à Presidência, José Serra, reuniu ontem líderes e governadores aliados para ajustar a tática de confronto com o PT nesta reta final da campanha, numa tentativa de evitar que a eleição seja decidida já no primeiro turno, em 6 de outubro. Serra teve aval de todos para manter o tom agressivo contra Luiz Inácio Lula da Silva (PT), amparado por pesquisas qualitativas que mostram que o eleitor não viu seus ataques como “baixaria de campanha”.

“Estou bastante otimista e convencido de que vou para o segundo turno”, disse Serra ao final.

Vamos agora aprofundar o debate político para que o eleitorado faça a melhor escolha e tome a melhor decisão”. Diante da proposta do candidato e da queixa de sua vice, Rita Camata, que ao pedir o empenho geral lembrou que no pior momento da campanha ela e Serra ficaram sozinhos, nem mesmo os que fazem reparos à estratégia de ataque ao PT contestaram a decisão.

A avaliação é que a duas semanas do primeiro turno não resta alternativa. É tudo ou nada. Afinal, como disse o prefeito do Rio, César Maia (PFL), na chegada do encontro, a possibilidade de Lula vencer no primeiro turno é real. E todo o cuidado é pouco, pois também há risco de o herdeiro dos votos não consolidados de Lula (o equivalente a 6% do eleitorado) ser Anthony Garotinho (PSB), e não Serra. “Antecipamos a campanha do segundo turno e o início foi ontem”, resumiu o líder do PSDB na Câmara, Jutahy Júnior (BA).

Na abertura do encontro, que teve a participação de governadores, prefeitos, deputados e senadores do PFL, PMDB e PSDB, o cientista político Antonio Lavareda e o publicitário Nelson Biondi mostraram a consistência das pesquisas qualitativas. “O Lula acabou ocupando o espaço do centro porque foi construído com uma estética cosmética cujo rótulo é o Lulinha paz e amor.

Precisamos devolvê-lo para sua origem”, disse Lavareda. Ele considera fundamental afunilar a campanha entre o PT e Serra, para que os votos perdidos por Lula não parem na conta de Garotinho.

O marqueteiro Nizan Guanaes apareceu num vídeo exibido aos presentes e fez um apelo para que todos se envolvam na campanha: “Nós (o marketing) somos a aviação e os políticos a infantaria; não se ganha eleição só com programa de TV.” Acabou aplaudido.

Unânime – “Quem fez crítica do lado de fora, lá dentro se calou. Foram só aplausos”, disse o líder do PMDB na Câmara, Geddel Vieira Lima (BA). Até os candidatos tucanos a governos estaduais Geraldo Alckmin (SP) e Aécio Neves (MG), favoráveis a centrar a campanha no debate de idéias, concordaram com a estratégia. Motivo: a campanha nacional anti-Lula acaba estancando um pouco o crescimento dos petistas que disputam governos estaduais, o que facilita, por tabela, a vida de tucanos como Alckmin e Aécio.

“O que não pode é haver mentira. Como o que dissemos é verdade, não vejo problema (nos ataques)” disse Alckmin, referindo-se às diferenças entre Lula e Serra mostradas no horário eleitoral. Aécio não apoiou os ataques, mas ponderou: “Nós vamos discutir as contradições do PT que votou contra o Real e contra a lei de responsabilidade fiscal”.

O resultado prático do encontro foi o apelo em favor do empenho geral na campanha de rua. Além disso, Serra fará campanha no estilo do ex-presidente americano Bill Clinton. Para massificar sua candidatura, visitará de seis a oito cidades do Sul, Norte e Nordeste nos dois fins de semana que antecedem o primeiro turno.

O governador de Santa Catarina, Esperidião Amin (PPB), propôs que os governadores presentes, como Alckmin, Amazonino Mendes (PFL), do Amazonas, Jaime Lerner (PFL), do Paraná, e o pernambucano Jarbas Vasconcelos (PMDB) vasculhem as prefeituras petistas em seus Estados. Amin sugeriu que tentem encontar licitações viciadas e irregularidades.


Lula 'errado' leva cúpula a sair em defesa de tucano
BRASÍLIA - Um mal-entendido foi responsável ontem por um dos momentos mais engraçados da reunião da cúpula da campanha do tucano José Serra. Quando o encontro foi aberto para imagens, o fotógrafo do jornal Folha de S. Paulo Luiz Marques, conhecido como Lula, ficou perto demais de Serra, atrapalhando os colegas, que passaram a gritar "Lula!, Lula!" para chamar sua atenção e pedir que saísse da frente.

A vice Rita Camata, reagiu de imediato: começou a gritar "Serra!, Serra!", para revidar o que lhe parecia uma manifestação pró-Lula. Rita foi acompanhada pelos integrantes da mesa, como o próprio Serra, o vice-presidente Marco Maciel (PFL) e o coordenador da campanha, o tucano Pimenta da Veiga, todos fazendo o V da vitória com os dedos e rindo.


Ciro e Garotinho atacam para garantir 2.º turno
No Vox Populi, Lula chega a 42%, Serra tem 17%, Ciro 15% e todos os rivais batem no líder

A tendência de crescimento eleitoral do petista Luiz Inácio Lula da Silva, já revelada pelo Ibope, foi confirmada ontem por uma nova pesquisa Vox Populi e provocou imediata reação nos comandos de campanha de seus rivais. O Vox indica que Lula subiu 3 pontos e seus dois adversários imediatos caíram 2. O petista foi de 39% para 42%, José Serra (PSDB), de 19% para 17% e Ciro Gomes (PPS), de 17% para 15%, enquanto Anthony Garotinho (PSB) continuou com 12%. Foi o que bastou para que Lula passasse a ser atacado pelos três – e não apenas por Serra, como ocorria até o final da semana. O que era estratégia do tucano tornou-se prioridade de todos: ou o petista pára de subir já (ele tem, no Ibope e no Vox, 48% dos votos válidos) ou a disputa acaba dentro de 16 dias.

Assim, além do encontro do PSDB com seus aliados, em Brasília para definir as próximas investidas, em São Paulo o candidato Ciro Gomes também foi ao ataque, dizendo que o PT “é doce e agressivo, fora do poder”, mas, quando ocupa cargos, “com poucas exceções, gera desemprego, caos adminstrativo e esquece o que prometeu”. Em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, Garotinho também bateu. Ele disse em uma palestra que Lula “parece um docinho de coco para os banqueiros”.

Os números do Vox apontam vantagens confortáveis para o petista no segundo turno: ele ganharia de Serra por 53% a 31%, de Ciro por 55% a 28% e de Garotinho por 54% a 27%. Um segundo turno entre Serra e Ciro daria empate técnico, com 37% a 35% para o tucano.

A pesquisa, encomendada pelo Correio Brazilienze, foi feita nos dias 15 e 16. A margem de erro é de 1,9 ponto percentual.

No Ibope, Lula já tem a maioria de votos válidos na Região Sul, entre o eleitorado masculino, os moradores de capitais e os eleitores que têm renda familiar acima de 10 salários mínimos.

Na opinião da analista de pesquisas eleitorais Fátima Pacheco Jordão, para Lula se eleger no primeiro turno, ele precisaria conquistar o eleitorado feminino, segmento em que tem um de seus desempenhos mais fracos. Além disso, segundo Fátima, ele pode investir nos segmentos em que está quase alcançando os 50% dos votos válidos, como os eleitores com ensino médio, das cidades que com mais de 100 mil eleitores e da Região Nordeste.

De acordo com ela, para garantir o segundo turno, Serra precisa crescer em áreas em que seu desempenho é abaixo da média, como capitais e periferias.

Já para a diretora do Ibope, Márcia Cavallari, a definição de uma vitória de Lula no primeiro turno dependerá dos resultados da mudança de estratégia da campanha de Serra. Ao adotar uma estratégia de ataques contra Lula, Márcia acredita que a campanha de Serra pode sustar o crescimento de Lula. “É possível. Dependerá do poder de convencimento ou competência dos candidatos de mostra r que é o melhor”, disse ela. Ela alertou, no entanto, para as possíveis conseqüências de ataques excessivos. “Dependendo da dose, vira briga política e as pessoas não sabem quem está com a verdade”, disse.


Ciro: ‘Quem acha que deve tocar fogo vote no Lula’
O candidato do PSB fez o mais duro ataque ao adversário em discurso a sindicalistas

Um dia depois de ser ultrapassado pelo candidato do PSB, Anthony Garotinho, Ciro Gomes (PPS) fez um dos mais duros ataques ao adversário Luiz Inácio Lula da Silva (PT). “Quem acha que está na hora de tocar fogo no País, de fazer uma experiência que não sabe aonde vai dar, vote no Lula”, afirmou em discurso para trabalhadores e sindicalistas da Social Democracia Sindical (SDS), da Central Geral dos Trabalhadores (CGT) e da Força Sindical, ontem na Casa de Portugal, em São Paulo.

Ciro explicou ter intensificado a crítica ao petista porque a dinâmica da campanha revelou claramente que “Lula desertou da luta da oposição e produziu uma versão completamente fantasiosa que prepara o Brasil para uma crise muito grave se for para a Presidência da República”. “Como é que ele vai pagar 10 milhões de empregos?”, questionou e respondeu: “Isso é uma mentira.”

Ele não tem dúvida sobre a boa intenção do candidato do PT, mas criticou o partido. Para Ciro, basta ver o que o PT está fazendo no Rio Grande do Sul, no Recife, em Pernambuco, e a diferença entre o que o PT falava e o que está fazendo na Prefeitura de São Paulo. “O PT promete salário, saúde, emprego e educação, mas em todas as experiências administrativas, com poucas exceções, gera desgoverno, descompromisso e esquece o que prometeu.”

Ciro adotou a estratégia de se mostra como alternativa aos candidatos José Serra (PSDB) e Lula.

Tanto que, para seis perguntas diferentes, deu a mesma resposta: “Quem quiser que fique tudo como está, vote no Serra; quem quiser tocar fogo no País e optar por uma aventura, vote no Lula; e quem quiser uma mudança segura, venha conosco”.

Sem acordo – Os ataques do candidato do PPS, entretanto, não ficaram restritos a Lula e a Serra. Ciro conclamou trabalhadores e sindicatos a derrotar “os barões do dinheiro, das televisões e da corrupção política”.

“Tenho fé em Deus e a cada dia que a dificuldade se mostra maior, com mais vontade eu fico, porque fui treinado assim mesmo, na batalha, na luta, e Deus nunca me negou o meu destino”, afirmou. “A luta vai ser dura, mas não há mistério. Está na mão do povo brasileiro uma chance de ouro, de a gente impor uma mudança de derrotar, de uma cambulhada só, os políticos corruptos, os que fizeram as mais ruinosas privatizações, àqueles grupos de imprensa que se venderam ao interesse internacional e ao interesse dos ladrões do dinheiro público brasileiro.”

Disse que precisará “tomar” o poder “e eu disse a palavra tomar, porque eles (os barões) não vão dar para nós, nós vamos ter que ir até lá e tomar o poder das mãos desses prepotentes.”.

Ciro repetiu as acusações de manipulação das pesquisas do Ibope – “o Vox Populi apresenta um número muito mais perceptível no embate que está aí, do que o número absolutamente manipulado que o Ibope fez” – e teve o reforço de seu vice, o sindicalista Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, que reiterou o descrédito nas pesquisas porque “temos informações de que subir nas pesquisas tem custado muito”, acusou. No início da noite, Ciro reuniu-se com empresários do setor canavieiro de São Paulo.

Equipe – A equipe de comunicação de Ciro recebeu ontem o reforço. Além do publicitário Otoniel Santos Pereira, o coordenador Einhart Jacome da Paz contratou o também publicitário Haroldo Cardoso, que foi vice-presidente da Propeg em Salvador e trabalhou na campanha do presidente Fernando Henrique em 1994.


‘Lula não trabalha há 8 anos’, diz Garotinho
Candidato do PSB quer saber do petista ‘o que ele tem feito pelo povo brasileiro’

CAMPO GRANDE – O candidato do PSB à Presidência, Anthony Garotinho atacou ontem o adversário Luiz Inácio Lula da Silva (PT) durante entrevista em Campo Grande. Ele afirmou que “o candidato do PT ganha um salário absurdo do seu partido para ficar viajando e fazendo campanha”. “Ele não trabalha há oito anos”, criticou o candidato da Frente Trabalhista.

“Uma coisa que eu quero fazer desde o início da campanha, e com certeza vou fazer quando chegar ao segundo turno, é perguntar ao Lula: O que você tem feito pelo povo brasileiro nos últimos oito anos?”, disse o candidato. “Ele não trabalha, só viaja.”

Guarda – Garotinho chegou ontem em Campo Grande às 12h30 para oferecer apoio aos candidatos ao governo do Estado Cláudio Anache (PTC) e Cláudio Freire (PSB). Durante discurso no Clube Libanês, o presidenciável da Frente Trabalhista disse que já conseguiu “vencer o candidato do Collor”, referindo-se a Ciro Gomes (PPS). Garantiu ainda que vai chegar ao segundo turno e alcançar “o candidato apoiado pelo Sarney”, fazendo ironia com o adversário do PT.

O candidato prometeu criar uma guarda especial para vigiar as regiões de fronteira do Brasil. “Além da presença física, a guarda também vai trabalhar com satélite, monitorando toda a fronteira”, afirmou. “O ITA (Instituto de Tecnologia da Aeronáutica) já dispõe de toda a tecnologia para desenvolver esse programa.”

Segundo Garotinho, 80% dos problemas de segurança pública estão relacionados a drogas e armas. “São Paulo não produz fuzil AR-15, o Rio de Janeiro também não tem produção de cocaína nem de maconha. Temos de impedir a entrada disso tudo no País para resolver toda a questão”, ressaltou.

Juro agrícola – Outra promessa feita pelo candidato foi a redução dos juros sobre o setor agrícola, de 8,75% atuais para 6%. Garotinho comentou que pretende retomar o crédito agrícola, que chegou a R$ 170 bilhões e hoje está restrito a pouco mais de R$ 20 bilhões. Em relação ao setor industrial, o candidato defendeu uma proposta de crescimento eqüitativo e criticou a concentração de empresas nas regiões Sudeste e Sul.

Garotinho deixou Campo Grande no fim da tarde e embarcou para Chapecó (SC). No percurso entre o centro da cidade e o Aeroporto Internacional de Campo Grande foi organizada uma carreata, com a participação de mais de 200 veículos.


Tiroteio Serra-Lula continua na internet
Proibidos na TV, mas não na internet, os tucanos da campanha de José Serra à Presidência continuaram ontem, no site do candidato, com os ataques ao presidente do PT, José Dirceu, pelo discurso feito durante a greve dos professores, em agosto de 2000, em que dizia que eles (o governo Covas) deviam "apanhar" nas urnas e nas ruas. O título da matéria diz tudo:
"PT se faz de vítima mesmo quando é o agressor". O site reproduziu, também, as biografias comparadas de Lula e Serra, mostradas na TV, e acusou Lula por seu apoio a Orestes Quércia (PMDB) ao Senado, por São Paulo.

O site não reproduz a discussão que cresceu ontem, entre círculos tucanos, sobre as vantagens de prosseguir com o mesmo tom. Mas no site do PSDB uma pequena nota informa que um tucano de prestígio, o ex-governador de Mato Grosso, Dante de Oliveira, defende a continuação das críticas (a Lula) "mas sem levar para o lado pessoal e dentro do limite".

Estagnado - Mais contido, porém atento, o comando petista informou no site de Lula, com alguma ironia, os resultados do Ibope e do Vox Populi, divulgados ontem. "Pesquisas mostram que Lula cresce e Serra está estagnado". Em pesquisas anteriores, os petistas limitavam-se a dar números e falar de seu próprio líder. Desta vez, a estocada veio no final: "as pesquisas anteriores já indicavam que a candidatura Serra tinha profundas dificuldades em superar o patamar de 20%".

Nas duas pesquisas "está caracterizado o peso de representar a continuidade do governo FHC.

Por isso é que o candidato do PSDB tenta se apresentar como novidade".

O site de Lula prosseguiu com a série "Herança Tucana", entrevistando o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, da Unicamp. Sob o título "FHC deixa armadilha de juros altos e desemprego", o texto traz notícias recentes - a queda do nível de emprego em São Paulo, o Brasil como o país de juros mais altos do mundo e a decisão do Copom de manter a taxa de juros em 18%.

"Nenhuma economia resiste a taxas dejuros desse tamanho", diz Belluzzo.


Artigos

Mais vícios das eleições proporcionais
Roberto Macedo

Volto ao tema do meu artigo anterior, com mais argumentos sobre a farsa que são as eleições proporcionais para deputado estadual e federal.

Além disso, novas matérias publicadas pelos jornais forneceram números que confirmam vícios já apontados. Em síntese, defendi a tese de que a boa escolha exige o conhecimento da lista de candidatos e de informações sobre eles, mas com seu enorme número não é possível cumprir essa exigência.

Argumentei, também, que numa boa escolha a seleção de um candidato deve excluir a de outro.

Com a transferência de votos para outros candidatos dentro da legenda, contudo, há o risco de o eleitor sufragar indiretamente um candidato que, individualmente, não teria o seu voto. Entre as danosas conseqüências, os eleitos pelo sistema atual não têm vínculo maior com os eleitores, pois recebem votos em todo o Estado. Assim, não têm condições de cultivar esse vínculo, nem os eleitores de ser mais atuantes na cobrança de sua representação. Defendi o voto distrital como saneador desses defeitos.

No último domingo, este jornal publicou matéria sobre as eleições proporcionais, mostrando que há 793(!) candidatos para 70 cadeiras na Câmara dos Deputados e 1.572(!!) postulantes aos 164 mandatos na Assembléia Legislativa. Não sem razão, a mesma matéria revelou que apenas 22% dos paulistas já sabe em quem votar nessas eleições. Faltam pouco mais de duas semanas para o pleito e, assim, mais uma lamentável vez, a escolha será feita na última hora, sem conhecer o leque de candidatos e sem ter maiores informações sobre eles. Com esses números, não dá mesmo.

Numa meritória iniciativa, este jornal passou a publicar diariamente, deste o dia 16 deste mês, a foto e um perfil de poucas linhas de quatro candidatos (dois a deputado federal e dois a deputado estadual). Como seria inviável fazer isso com todos eles, o Estado deixou a escolha para os partidos, que, assim, indicam seus favoritos. Até o dia da eleição, pode-se prever que cerca de 80 terão esse privilégio, entre os 2.365 concorrentes. A saída não está em publicar informações sobre todos eles, até porque continuariam limitadas no seu conteúdo e no seu alcance. O remédio deve ser a eleição confinada a um distrito, em que cada eleitor confrontaria um candidato de cada partido e um número ainda menor de postulantes viáveis, tal como na eleição para presidente da República, governador dos Estados e senador.

Tampouco a televisão tem condições de resolver esse problema do enorme número de candidatos e da falta de amplas informações sobre eles. Na segunda-feira, o jornal Valor publicou matéria mostrando que, dos 793 candidatos a deputado federal, apenas 36% aparecem no horário eleitoral. Dos 286 que já apareceram, 211 deles, ou 73%, puderam ser vistos, no máximo, quatro vezes, mesmo assim apenas balbuciando seu nome e umas poucas palavras sobre suas propostas. Já os que apareceram mais - 75 - constituem um número muito próximo do número de vagas. Novamente, são os favoritos dos partidos e beneficiados com o filtro que fazem de seus candidatos. Como eleitores, somos enganados por esse destilado de candidatos e, sobretudo, pelo sistema que leva a essa farsa de "democracia representativa".

Como disse um leitor, nesse caso dos deputados temos, se tanto, uma democracia de eleitores, e não de cidadãos. Destes, a representação autêntica nunca virá de um mandato conferido numa escolha mal informada, recebido pelo outorgado sem maiores compromissos com os outorgantes e sem que estes possam cobrar de perto seu cumprimento, exercendo efetivamente sua cidadania. Aliás, já assinei e recebi várias procurações que falam do "fiel cumprimento deste mandato". Longe de vincular representados e representantes por meio de um mandato a ser cumprido com fidelidade, a eleição para deputados é a infidelidade pactuada.

E há mais vícios: a busca de votos por todo o Estado encarece as campanhas e favorece candidatos que conseguem arregimentar maior poder econômico e/ou interesses clientelísticos distribuídos pelas várias regiões. Por exemplo, se um candidato consegue arregimentar determinada categoria profissional, setor econômico ou grupo religioso, ele terá mais chances.

Resultado: há quem diga que o Brasil não precisa de lobbistas para defender interesses como esses, pois há deputados que já fazem esse trabalho. Aliás, até mesmo com maior eficiência, pois não precisam ficar nos "lobbies" dos plenários legislativos. Trabalham diretamente lá dentro. Se escolhidos dentro de um distrito, interesses desse tipo estariam naturalmente mais pulverizados, com o deputado tendo de equilibrar melhor os que predominariam na sua representação, além de ter seu trabalho mais sujeito ao escrutínio dos representados.

Cada vez que me debruço sobre esse assunto, mais me convenço de que no dia 6 de outubro estaremos, mais uma detestável vez, participando obrigatoriamente de uma farsa eleitoral, essa da eleição dos deputados. Já aprendi muito sobre seus vícios, mas confesso não saber como mudar o sistema, conforme cobrado por outro leitor. Há três dificuldades fundamentais nesse caminho, que não sei como superar. A primeira é fazer os eleitores perceberem que estão sendo vítimas desse conto-do-vigário. A segunda é mobilizá-los para a mudança. A terceira é fazer os eleitos e beneficiados pelo sistema atual votarem pela sua modificação.

Enquanto ela não vem, conforta-me saber que muitos apóiam a idéia, conforme demonstrado pelo grande número de mensagens de apoio que vêm quando escrevo sobre o assunto. Conforta-me, também, saber que este jornal tem posição semelhante, evidenciada no editorial A farsa das eleições proporcionais, publicado na segunda-feira (A3), no qual sugere a discussão do voto distrital misto, isto é, aquele que combina a eleição de representantes distritais com outros escolhidos de forma proporcional, de forma a evitar a excessiva predominância de interesses locais.

Tenho concentrado meus argumentos no voto distrital sem essa característica, pois o sistema de distritos é pouco conhecido no Brasil e é preciso mostrá-lo e enfatizar suas vantagens. Indiscutivelmente, entretanto, o distrital misto seria um enorme avanço e com maior chance de conseguir o apoio de cabeças acostumadas ao voto proporcional ou viciadas por ele. O certo é que, na linguagem do editorial, esse farsesco sistema não pode continuar.


Editorial

A 'PRECIFICAÇÃO' DE UMA VITÓRIA DE LULA

O voto do brasileiro tem preço. Na verdade, até a intenção de votar em determinado candidato, revelada nas pesquisas eleitorais, tem preço. Esse preço não é fixado nem pela Constituição nem pelas normas eleitorais.

Também não é indicado pelo Código Tributário, nem por decisões da Receita Federal.

Quem fixa o preço? O mercado financeiro, é claro. De onde mais poderia sair essa imposição? Se alguém desconhecia esse fato, passou a dispor da informação nos últimos dois dias. Segundo técnicos do setor financeiro, citados por jornalistas de vários veículos, o mercado "precificou" , ou começou a "precificar", a possível vitória de Luiz Inácio Lula da Silva no primeiro turno. Foi a reação aos novos dados do Ibope e da Vox Populi, que mostraram a ascensão do candidato petista. É impossível evitar um sentimento de admiração, diante do quase preciosismo do mercado.

O preço e a forma de pagamento variam de acordo com as possibilidades de vitória no primeiro ou no segundo turno. Isso apenas confirma a sofisticação do setor financeiro, inegável, apesar de alguns pequenos tropeços nos últimos anos - no México, por exemplo, assim como na Ásia e também nos Estados Unidos.

Algumas pessoas podem julgar compreensível, e até razoável, que haja um preço para a vitória de Lula ou de qualquer outro candidato. Procurou-se, com essa concepção, justificar boa parte da agitação no mercado cambial, nos últimos dias. Ontem, o dólar chegou a subir quase 4% e acabou fechando em alta de 3,23%, no mercado brasileiro. A crise do Iraque e más notícias da economia americana bastariam para explicar, normalmente, boa parte da inquietação. Mas as perspectivas eleitorais foram citadas, no Brasil, como fatores de especial importância. No jargão do mercado, o movimento foi descrito como um "ajuste de preços" ao risco do "Lula já". Mas essa conversa é incompleta.

Oscilações são normais em mercados. Mas dólar em disparada é algo muito diferente: cria pressões inflacionárias, infla a dívida pública, impede juros menores, dificulta o crescimento econômico e alimenta o desemprego.

Algumas pessoas e umas poucas instituições podem lucrar com isso. São, naturalmente, uma parcela muito pequena do mundo econômico, especialmente num país como o Brasil. Para mais de 95% dos brasileiros, o tumulto cambial só pode resultar em perdas e em sacrifícios.

São esses, portanto, que pagam o chamado "preço" da possível vitória deste ou daquele candidato - aquele custo fixado por quem comanda as operações financeiras. Não há, nesta afirmação, nenhum jogo retórico. É o mero registro de um fato. A conta resultante daquela "precificação" é paga pela quase totalidade dos mais de 170 milhões de brasileiros, muitos dos quais não têm sequer uma conta de poupança.

Excluído o "risco" eleitoral, uma noção das mais discutíveis, que outros motivos tem o mercado para acreditar que o Brasil esteja a um passo de um desastre? Nenhum, quando se considera o lado real da economia brasileira. O superávit comercial, segundo as últimas informações, deve ultrapassar os valores previstos pelo mercado. Até uma falha contábil surgiu como boa novidade: o governo deixou de incluir na balança comercial cerca de US$ 600 milhões de exportações de soja.

O Brasil, segundo avaliações coletadas pela Unctad, continua a ser visto como um dos países com melhores oportunidades para investimento produtivo - ou continuava até o último Ibope. O investimento direto diminuiu nos últimos dois anos, porém menos do que em muitas outras economias de nível igual ou superior de desenvolvimento. O País, apesar de todas as dificuldades externas e internas, não afundou na recessão. A substituição de importações, favorecida pelo câmbio e pelos ganhos de produtividade, continua avançando, a agricultura exibe padrões de eficiência cada vez mais invejáveis. A situação fiscal melhorou e poderá continuar melhorando.

No entanto, o mercado financeiro cria para o próximo presidente, seja quem for, um quadro imensamente desfavorável. O vencedor assumirá o posto num cenário de estragos. O novo presidente, não importa seu nome, terá excelentes motivos para ver no setor financeiro um adversário, não apenas seu, mas do País.


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09/19/2002


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