Vaga no conselho da ONU une Brasil e Alemanha









Vaga no conselho da ONU une Brasil e Alemanha
Os dois países trabalham em conjunto para eliminar resistências e garantir posto de membros permanentes

BRASÍLIA – O Brasil e a Alemanha vão investir numa aliança política em favor da reforma do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU). O objetivo será eliminar as resistências à ampliação do conselho e garantir a condição de membros permanentes para os dois países. Prioridade da agenda externa brasileira, o tema deverá consumir boa parte da conversa reservada entre o presidente Fernando Henrique Cardoso e o chanceler alemão, Gerhard Schroeder, na manhã de hoje, no Palácio do Planalto.

O chanceler chegou ontem a São Paulo, onde tinha agendado visitas ao governador Geraldo Alckmin (PSDB) e à prefeita Marta Suplicy (PT). Hoje estará em Brasília, para o sexto encontro reservado com Fernando Henrique. Segundo uma fonte do Planalto, os dois têm mantido desde 1999 um “diálogo intenso” sobre temas de interesse comum. A ONU é um tópico repetido nessas conversas.

Derrotada na 2.ª Guerra Mundial (1939-1945), a Alemanha foi mantida distante do Conselho de Segurança, apesar do crescimento de seu poderio econômico e de sua influência no plano político internacional. Mesmo tendo participado da guerra do lado dos vencedores e assumido a condição de maior economia latino-americana, o Brasil só integrou o conselho como membro rotativo, sem poder de veto. A expectativa é que a discussão sobre a reforma do organismo seja retomada este ano.

Argumento – O acesso do Brasil a uma vaga permanente em um Conselho de Segurança reformado, na lógica do Planalto, marcaria a elevação do País a um novo modelo decisório mundial, mais adequado ao cenário atual. A diplomacia brasileira critica a atual composição do conselho – limitada a Estados Unidos, França, Reino Unido, Rússia e China – por considerar que representa a ordem internacional do fim da 2.ª Guerra. A Alemanha, em princípio, segue a mesma lógica.

No ano passado, Fernando Henrique assumiu a tarefa de alinhavar o apoio necessário para a elevação do status do Brasil – não só na ONU, como também num projeto de ampliação do G-8, os grupo dos sete países mais ricos, mais a Rússia. O presidente conversou sobre o tema, reservadamente, com o primeiro-ministro britânico, Tony Blair, com o presidente do Gabinete de ministros da Espanha, José María Aznar, e com o presidente da França, Jacques Chirac. Ao presidente americano, George W. Bush, ele afirmou que o Brasil precisa ter “uma voz mais ativa no mundo”.

Plano de ação – Boa parte dos interesses políticos comuns dos dois países deve ser mencionada no documento Parceria Brasil-Alemanha, Plano de Ação. O texto será assinado hoje por Fernando Henrique e Schroeder. Ele prevê a criação de um grupo de trabalho para tratar de oportunidades de investimento nas áreas de infra-estrutura, energia, meio ambiente e educação. Também define a formação de um mecanismo de diálogo entre representantes da sociedade civil dos dois países.

Além do plano, os dois chefes de Estado assinam hoje memorando de entendimento na área espacial, que envolverá a definição de campos comuns de atuação entre a Agência Espacial Brasileira e o Centro Alemão Aeroespacial. Trata-se de um acordo geral, mas ele pode permitir a futura cooperação tecnológica entre os dois países e o eventual uso pela Alemanha da Base de Lançamento de Satélites de Alcântara, no Maranhão.

Fernando Henrique e Schroeder firmarão ainda um acordo de cooperação em projetos de preservação de florestas tropicais, no valor de 66,5 milhões de euros. Atualmente, a Alemanha coopera com o Brasil em vários projetos de proteção da mata atlântica e de manejo da floresta amazônica.

Segundo a chancelaria alemã, o acordo a ser assinado hoje destinará recursos para a preservação ambiental nos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Santa Catarina e Paraná. Em novembro de 2001, a Alemanha já havia acertado com o Brasil um fomento de áreas de reserva natural para a Região Amazônica, para o qual foram destinados 15,3 milhões de euros.


Lula aceita ajuda do PL em programa econômico
Para o líder petista, quem critica aliança com os liberais "não quer que o PT ganhe"

MONTES CLAROS - Na ofensiva para conquistar o apoio do PL, o PT optou por oferecer a possíveis aliados uma participação mais efetiva na montagem de seu programa de governo. Os liberais estão reivindicando uma atuação no no plano econômico do partido. Na prática, esta é a primeira vez que a cúpula do PT admite a possibilidade de aceitar sugestões fora da esquerda na seara econômica.

"Obviamente que, se fizermos alianças políticas, nossos aliados terão co-participação no nosso projeto", afirmou o pré-candidato do PT à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva. Ele esteve ontem em Montes Claros, no norte de Minas, acompanhado pelo senador José Alencar (PL-MG), cotado para ser vice em sua provável chapa ao Palácio do Planalto.

Para Lula, o PL "não é um partido de direita". Pragmático, o presidenciável lembrou que a bancada do PL na Câmara tem votado contra o governo nos assuntos mais importantes. "Aqueles que têm preconceito e fazem críticas pelo fato de o PL estar com a oposição são aqueles que não querem que o PT ganhe", insistiu. "A oportunidade de ganhar as eleições é extraordinariamente grande, mas é preciso que o PT faça alianças com setores que até então pareciam difíceis."

Em Montes Claros, o pré-candidato do PT visitou fábricas de Alencar, dono da maior indústria têxtil do País, a Coteminas, uma escola da empresa e a Santa Casa. "O PL vai propor que Alencar tenha uma participação efetiva na elaboração das políticas econômicas, por causa de sua vasta experiência empresarial", reforçou o deputado Valdemar Costa Neto (SP), presidente do PL.

Na opinião do presidente do PT, deputado José Dirceu (SP), não há "nenhuma incoerência" na possível ajuda dos liberais nas diretrizes econômicas petistas. "As idéias que o senador defende em relação à política econômica são idênticas às nossas", argumentou.

Fiel ao seu estilo, Alencar, preferiu a modéstia. "Posso dar uma contribuição com o meu comportamento, meu exemplo, minha vida. Mas tudo isso é pequeno diante da força que representa o PT", disse.

A aliança com os liberais, porém, enfrenta resistências nas duas legendas.

Pode causar estragos em Estados como a Bahia, em que os dois partidos são inimigos históricos. O deputado Jaques Wagner, concorrente do PT ao governo baiano, admite que um casamento deste tipo "atrapalharia" sua candidatura.

Motivo: na Bahia, o PL apóia o ex-senador Antonio Carlos Magalhães (PFL), que vai disputar o governo.

Sobre a reclamação do senador Eduardo Suplicy (PT-SP), que cobrou a realização de um debate público antes da prévia que indicará o candidato do partido à Presidência, Lula demonstrou, mais uma vez, não estar disposto a aceitar o desafio. "Nem eu nem o Eduardo inventamos o debate no PT. Quem for o candidato terá de cumprir e executar o programa", desconversou.


PSDB e PFL reforçam discurso pró-aliança
No bastidor, líderes avaliam possíveis cenários e discutem como construir a parceria

BRASÍLIA - Não é apenas o governador do Ceará, Tasso Jereissati (PSDB), que conversa com a governadora do Maranhão e presidenciável do PFL, Roseana Sarney. A articulação entre PSDB e PFL na corrida presidencial vai muito além dos telefonemas e encontros entre os governadores. Ao mesmo tempo em que Tasso sofre reparos por causa da proximidade com Roseana, tucanos ilustres e pefelistas influentes trabalham discretos, nos bastidores, para preservar os canais de diálo go e a parceria na disputa sucessória.

"Temos conversas freqüentes para manter de pé as pontes que nos unem", conta o ministro da Previdência Social, Roberto Brant, que sempre ouve dirigentes do PSDB e é ouvido por eles. Segundo Brant, o presidente nacional do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC), e o líder do governo no Congresso, deputado Heráclito Fortes (PFL-PI), também têm se empenhado para não quebrar o diálogo com os tucanos. E, garante, têm encontrado eco justamente entre ex-tassistas que aderiram à candidatura presidencial do ministro da Saúde, José Serra (PSDB): o ministro da Justiça, Pimenta da Veiga, e o presidente nacional do PSDB, deputado José Aníbal (SP).

Pesquisas - O ministro acredita que a boa vontade predominante no grupo de dirigentes dos dois partidos não se resume na disposição de barrar uma aliança entre o PSDB e o PMDB na sucessão do presidente Fernando Henrique Cardoso. Afinal, salienta, há um cenário em que PFL e PSDB poderão acabar forçados a manter suas candidaturas presidenciais, pelo bem das forças governistas, mesmo que já tenham decidido manter a aliança antes da realização do primeiro turno da eleição.

Embora torça para que Serra não decole na corrida presidencial e aposte que Roseana vai se manter à frente do PSDB, mesmo no caso de a candidatura do ministro da Saúde deslanchar, o comando pefelista admite um terceiro cenário: O de Serra conseguir bater na casa dos 20% das intenções de voto nas pesquisas eleitorais. "Se chegar lá para maio ou junho com ambos fortes - Serra com seus 20% e Roseana com 25% - terá de haver disputa", avalia Brant.

Nesse caso, de acordo com o ministro da Previdência, o PFL nem teria como pedir a Serra para abrir mão de sua candidatura em favor de Roseana, porque não seria conveniente ao PSDB nem ao PFL. "Não poderíamos arriscar, pois não seria possível prever para onde iriam os votos de Serra", explica Brant, antecipando seu temor de que os eleitores do candidato tucano, nesse cenário, acabassem fortalecendo outro nome.


Ciro desiste de encontro com Roseana
BRASÍLIA - Por causa da má-repercussão nas bases do PPS, o candidato do partido à Presidência, Ciro Gomes, tratou de desmentir o já anunciado encontro que teria, na próxima semana, com a governadora do Maranhão, Roseana Sarney, presidenciável do PFL. Ciro exagerou no desmentido. Atribuiu a informação - confirmada pela direção do PFL, pelo presidente do PPS, senador Roberto Freire (PE), e pela assessoria da governadora - a uma manobra do Palácio do Planalto para desestabilizar sua candidatura.

"Essa informação carece de total fundamento", afirmou o candidato. Ciro disse ainda que por trás da divulgação do suposto encontro está a máquina de propaganda do governo Fernando Henrique Cardoso.

O objetivo de tal manobra, segundo Ciro, seria evitar a celebração de uma aliança trabalhista em torno de seu nome e que, depois de formalizada, certamente terá a adesão de outras forças da política nacional.

O senador Roberto Freire, que na terça-feira confirmou o encontro "para o fim de semana ou para a semana que vem", disse que desde o princípio considerou a reunião "uma bobagem". Segundo ele, o candidato do partido não tem o que falar com a pefelista. "Talvez servisse apenas para se tirar uma fotografia", afirmou.

De acordo com o prefeito do Rio, Cesar Maia, coordenador da campanha de Roseana, os dois candidatos fechariam uma espécie de frente nordestina na disputa presidencial.


Brindeiro pede inquérito contra Roriz por racismo
BRASÍLIA – O procurador-geral da República, Geraldo Brindeiro, entrou ontem no Superior Tribunal de Justiça (STJ) com pedido de inquérito penal contra o governador do Distrito Federal, Joaquim Roriz (PMDB), por racismo. Em solenidade no dia 31, Roriz se referiu a um manifestante como “crioulo petista”. Para Brindeiro, o governador agiu neste e em outros episódios com “evidente intuito de exaltar ânimos, promover o racismo, a intolerância política, o preconceito e até mesmo a radicalização das ações com o uso da violência”.


Garotinho sofre revés na agenda em Portugal
LISBOA – O principal encontro previsto na visita do governador do Rio a Portugal, Anthony Garotinho, não vai se realizar. O primeiro-ministro português e presidente da Internacional Socialista, Antônio Guterres, não deverá recebê-lo. “Ele não tem horário na agenda”, explicaram assessores de Guterres, que está de saída do governo – o gabinete já foi demitido, mas fica até as eleições de 17 de março. Só uma personalidade da área socialista deverá se encontrar com Garotinho, o secretário-geral do PS português, Eduardo Ferro Rodrigues.


Artigos

Gaste mais energia...
Roberto Macedo

Há notícias de que as distribuidoras de eletricidade estão promovendo ou planejando campanhas para aumentar o consumo do serviço que oferecem e as receitas que derivam dele. Uma empresa planeja um acordo com uma rede de lojas de eletrodomésticos para que sejam oferecidos descontos aos consumidores que mostrarem a conta do consumo. Soube também que milho de pipoca em embalagem para forno de microondas seria distribuído gratuitamente, para incentivar o uso desse aparelho.

Em contraste com essas idéias de estimular a demanda de eletricidade, pelo lado da oferta as notícias são de que a crise não está definitivamente resolvida. Com as bênçãos de São Pedro, os reservatórios das usinas hidrelétricas estão voltando ao nível normal. Mas não há garantia de um equilíbrio permanente entre oferta e demanda, levando em conta a expansão futura da capacidade instalada de geração, a eventualidade de uma renovada escassez de chuvas e um aumento do consumo estimulado, entre outros fatores, pela retomada do crescimento econômico, pelo crescente uso de aparelhos eletroeletrônicos e por campanhas desse tipo.

A atitude das distribuidoras está sendo criticada por autoridades governamentais. Não sei se a legislação que regula o setor prevê ações proibitivas. Em qualquer caso, o mais importante é que o consumidor não caia nesse canto de sereia e volte a acelerar, com crescente velocidade, o giro do seu medidor de consumo. Nessa história da crise, o consumidor deu uma grande lição de cidadania e de criatividade ao ajustar-se às metas governamentais, ou até mesmo ultrapassando-as. Esse mérito tem sido reconhecido aqui e internacionalmente.

Em retrospecto, entretanto, muita gente percebeu que consumia além do necessário, porque até então não havia uma preocupação com o assunto. Em particular, não havia um passado de restrições ao consumo, para muitos a conta responde por pequena porcentagem do orçamento doméstico e muitas das comodidades da vida são movidas a eletricidade. Em síntese, não havia a preocupação de economizar. Longe de uma virtude, isso revelava um comportamento econômico distorcido, pois que distante dos padrões consagrados de uso eficaz e eficiente de um recurso escasso e, nos orçamentos domésticos, de cultivo da poupança como um caminho que leva a uma melhor condição econômica, ao permitir maior segurança financeira e bem-estar em geral. Uma grande lição da crise foi, portanto, a de trazer a empresas e famílias essa percepção de que era possível economizar no uso da eletricidade.

Seria um contra-senso abandonar essa mudança. Como qualquer empresa, as distribuidoras estão preocupadas em maximizar seu lucro, e há aí um caso em que o interesse privado confronta com o interesse público. Independentemente de ações que o governo possa tomar contra as campanhas de aumento do consumo, sua atuação deve, como na crise, focalizar sobretudo o consumidor, renovando o apelo de moderação, sem calar-se por conveniências político-eleitorais, ou concentrando-se apenas em ações junto às empresas.

D e sua parte, também precisam mobilizar-se os órgãos de defesa do consumidor e todos aqueles que se empenham em difundir a cultura do consumo bem planejado, combinado com uma indispensável poupança. O mais importante é que o consumidor perceba que lhe convém a manutenção de práticas que, adotadas para cumprimento de metas, revelaram também a ocorrência de desperdícios.

Foi nessa crise que mesmo economistas e engenheiros aprenderam muito em matéria de usar melhor a eletricidade. No âmbito doméstico, providências como o uso de lâmpadas de menor potência, a troca por outras que reduzem o consumo para uma potência equivalente, o desligamento de algumas delas, de um freezer desnecessário, da energia que alimenta permanentemente os controles remotos e a substituição de aquecedores de água elétricos por outros a gás, entre outras, revelaram que muito poderia ser economizado em matéria de eletricidade.

Para que deixar isso de lado? Para quem ainda não se convenceu, cabe um argumento adicional. Volte ou não a crise, os preços da eletricidade vão ficar mais altos, inclusive por conta das medidas destinadas à superação da escassez da oferta. Vi notícia de um aumento da tarifa de 21,8% acima da inflação, entre 2002 e 2006. Ou seja, quem não poupar no medidor do consumo vai ter seu gasto aumentado ainda mais pelo medidor do bolso.

Enfim, se nessa história há uma energia a ser gasta a mais, é aquela que o consumidor deve dedicar no empenho de evitar que seu consumo de eletricidade volte ao que era antes da crise. Mesmo que pairem dúvidas quanto ao uso de fontes energéticas alternativas, é preciso que as empresas interessadas em atrair o consumo daquilo que oferecem demonstrem claramente a vantagem do que estão alardeando.

Assim, quanto ao milho de pipoca para forno de microondas, minha curiosidade de economista pede uma demonstração do seu custo relativamente ao produto tradicional que passa por uma panela de fogão a gás, levando em conta preços atuais e futuros desse combustível e da eletricidade, tudo comparado ao custo do pipoqueiro de carrinho, onde às vezes me abasteço, sem o compromisso de abandonar esse hábito. Enquanto essa demonstração não vem, sugiro passar o milho a galinhas, pombos e outros interessados.


Colunistas

RACHEL DE QUEIROZ

Imperatriz, Mangueira, Beija-Flor, etc.
Quem escreve sobre carnaval costuma bater em duas teclas: I - "Carnaval bom era o antigo" e II - "Carnaval hoje é só pra turista. O povão foi expulso da festa."

Será verdade? Se o carnaval piorou, não parece. Os moços ainda se divertem muito, por este Brasil todo. A festa apenas mudou. E quanto à segunda acusação, que evidentemente tem como alvo principal o desfile das escolas de samba no Rio, é bom lembrar um fator importante: se, aqui, confinaram os desfiles ao sambódromo, como uma tourada na arena, e platéia paga, e paga caro, para assistir ao espetáculo - acontece, contudo... O POVÃO É QUE É O ESPETÁCULO.

Toda a massa humana que desfila pela Marquês de Sapucaí é formada pelo pessoal dos subúrbios mais modestos, do morro e suas favelas, da Baixada, que vem sambar, cantar e exibir-se para os ricos e os turistas. E se a classe média e os turistas já se infiltram entre os figurantes das escolas, esses penetras nem sequer tentam impor os seus padrões de gosto à ala hospedeira, docilmente se submetem aos figurinos e à confecção das fantasias, saídas da mão das costureiras da escola, nos seus barracões.

Falei em massas de gente, vamos aos números, conferir. Por exemplo, cada escola do grupo Especial (que são 14) conta, em média, com 4,5 mil a 5 mil figurantes. Temos então mais de 70 mil pessoas fazendo espetáculo de duas únicas noites para a galera aplaudir. Acho que não se registra no mundo conhecido um show em que tão grande segmento de uma população vá para a cena, exibir-se. E num espetáculo complexo, feérico, de enredo ambicioso em que, tanto as melodias como as letras dos sambas são de autoria de componentes da escola. Obedecendo ao gosto deles, que a interferência de um ou outro colaborador mais culto não consegue descaracterizar. O "Bom Gosto" oficial pode achar tudo brega, cafona, vulgar, mas e daí? As grandes vencedoras do prélio são sempre as que mantêm a marca da tradição. Vocês todos devem estar lembrados: anos atrás Joãosinho Trinta, que revolucionou os desfiles com a Beija-Flor, não abandonou as cores, os brilhos e dourados tradicionais, antes os exarcebou, numa quase agressão visual.

Ao longo de todo o ano se prepara o show gigante. E se já se contam em centos de milhares os atores que passarão pelo "palco iluminado", a quanto chegará o número dos demais envolvidos com o carnaval? Talvez atinja bem mais de 1 milhão de pessoas. A operação vem desde o concurso para o samba-enredo, feito na ala dos compositores, vai pelos ensaios na quadra, desenho e costura das fantasias, alegorias, bandeiras, carros alegóricos. Já pensaram na tarefa tremenda que é preparar roupas e cenários para o elenco de 5 mil atores? E não se falou ainda no apronto de um dos elementos mais importantes do desfile - a bateria. Essa, sim, consegue atingir um grau incrível de sofisticação e qualidade, absolutamente sem rival no mundo inteiro. Usando apenas os seus instrumentos clássicos de percussão - tambores, atabaques, surdos, pandeiros, tamborins, agogôs, etc., coroados pela rainha da bateria - Sua Majestade, a Cuíca.

Até mesmo o financiamento exigido para botar a escola na avenida não envolve dinheiro de multinacionais, nem do empresariado patrício. Os recursos vêm, como é por todos sabido, de elementos altamente expressivos da nossa cultura popularesca: os ricos banqueiros de bicho. A não ser que as coisas tenham mudado muito mais do que sei neste carnaval de 2002.


Editorial

O QUE EMPERRA O FÓRUM TRABALHISTA?

Por mais avantajado que tenha sido o desvio de dinheiro público na construção do Fórum Trabalhista de São Paulo - megaescândalo que envolve um rol extenso de réus, encabeçado pelo juiz Nicolau dos Santos Neto -, o prejuízo causado pela roubalheira poderá até ser pequeno, se comparado com as enormes perdas provocadas pela persistência da paralisação daquelas obras e, em conseqüência, pela ausência de solução para o funcionamento da Justiça Trabalhista de primeira instância, desta capital. E, por mais que tenha sido equivocada a concepção centralizadora - e megalomaníaca - do projeto original, indo de encontro à melhor tendência de descentralizar as Varas pelos bairros da cidade, evitando o penoso deslocamento de trabalhadores, deixar a obra inacabada e sem uso seria perpetuar um monumento ao desperdício.

Localizadas em prédios inseguros e inadequados, com instalações precárias, péssimas condições de trabalho, de arquivamento de processos e de circulação de público, as 79 Varas do Trabalho da capital - prevendo-se a instalação de mais 11, quando vierem a ser concentradas no novo Fórum - abrigam cerca de 2 mil funcionários e recebem um movimento diário de 15 mil pessoas, em velhos edifícios espalhados pelo Centro - Pça. Alfredo Issa, Avenidas Ipiranga, Rio Branco, Cásper Líbero e Rua Aurora. Só de aluguel representaram o custo de R$ 20 milhões, de 1998 a 2001, e continuam consumindo R$ 6 milhões por ano.

O movimento da Justiça do Trabalho de São Paulo, correspondente a 25% da de todo o Brasil, é de nada menos que 400 mil ações ajuizadas. Em termos de recolhimento de valores correspondentes às rubricas de Custas Processuais, INSS e Imposto de Renda, esse movimento carreou para os cofres da União R$ 180 milhões no ano 2000 e R$ 210 milhões no ano 2001.

Por esses dados já dá para entender o absurdo que é a demora na retomada e conclusão das obras do Fórum Trabalhista de São Paulo. Estas, a partir de pormenorizado levantam ento, realizado pela Divisão de Engenharia do Banco do Brasil, importam no custo estimado de R$ 44 milhões. Apesar do verdadeiro consenso, entre autoridades governamentais, quanto à urgência na conclusão daquelas obras, e em que pese todo o esforço despendido pelo juiz presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 2.ª Região, Francisco Antonio de Oliveira, no sentido de conseguir as verbas necessárias e dar início ao processo de licitação, parece haver uma estranha força exercida em sentido contrário, como se se pretendesse soterrar, definitivamente, um "elefante branco" que se tornou simbólico da corrupção no País. É claro que haveria um total descabimento nessa espécie de superstição - além de uma falta de visão do que seja o real interesse público. Até porque todas as iniciativas adotadas para a retomada das obras, com as necessárias revisões e readaptações feitas no projeto original, seguem curso dentro de critérios da mais absoluta transparência - e as razões disso dispensam comentário, por notórias que são.

Na verdade, o que está emperrando gravemente a retomada das obras do Fórum Trabalhista de São Paulo é a insensibilidade do Poder Legislativo, em relação à questão. O Ministério do Planejamento já consignara a verba orçamentária de R$ 15 milhões - insuficiente para cobrir o custo total do projeto, mas que daria para a abertura de licitação e início das obras, para posterior complementação. No entanto, a Comissão Mista de Orçamento teve a atitude inexplicável de, simplesmente, excluir do Orçamento aquela verba.

Será que os senhores parlamentares a julgaram desnecessária? Ou, dada a proximidade do período eleitoral, tiveram receio de associar o próprio nome, mesmo da forma mais indireta e remota que se pudesse imaginar, à força "simbólica" daquela construção?

Existe a perspectiva de o Tribunal Superior do Trabalho fazer um repasse parcial de seu Orçamento, transferindo cerca de R$ 17 milhões para as obras do Fórum Trabalhista de São Paulo. E a presidência do TRT da 2.ª Região continua tentando, junto ao Ministério do Planejamento, a complementação dos recursos necessários. Em artigo publicado nesse jornal (em 28/12/2001), o ministro-presidente do TST, Almir Pazzianotto, demonstrou sensibilidade para o problema, defendendo a retomada das obras - apesar de não ter concordado com sua concepção original - em razão do que elas já custaram aos contribuintes e das necessidades urgentes da Justiça do Trabalho.

Entretanto, o projeto de remanejamento de verbas do TST para o TRT também depende de aprovação da mesma Comissão Mista de Orçamento. Ela é que precisará sensibilizar-se - vale dizer, superar inexplicáveis resistências - quanto à questão.


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02/14/2002


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