1982, o Mundial que nunca terminou para Falcão



Aos 60 anos, completados nesta quarta-feira (10), o ex-jogador Paulo Roberto Falcão ainda tem de responder, vez ou outra, à pergunta: por que a Seleção perdeu a Copa de 1982? Questionamento que o persegue nas mais diversas situações, como quando estava fazendo o credenciamento para trabalhar como comentarista de TV no Mundial de 2002. O motivo foi o futebol envolvente apresentado pela equipe, com estilo de toques de primeira e ultrapassagens que encantou imprensa, torcedores e até adversários, forma de atuar que, para muitos, foi herdada pelo Barcelona e pela seleção espanhola.

“Uma semana antes de começar a Copa na Coreia do Sul e no Japão, a seleção estava fazendo um amistoso e fui fazer o credenciamento. Dei o passaporte, duas senhoras viram meu nome, me olharam e perguntaram: ‘Por que vocês perderam em 1982?’ Nós estamos falando de 20 anos depois, de 1982 para 2002. Aí o Guardiola, quando o Barcelona ganhou do Santos, no Mundial de clubes de 2011, diz: ‘Não sei porque vocês estão tão curiosos e apaixonados pelo Barcelona, o meu pai já falava do Brasil de 1982".

De tanto ser questionado, Falcão tentou dar uma explicação mais autoral ao tema no livro “Brasil 82: o time que perdeu a Copa e conquistou o mundo”, lançado em dezembro de 2012. A publicação reúne depoimentos de todos os atletas que entraram em campo no estádio Sarriá, em Barcelona, em 5 de julho de 1982 (exceção de Sócrates, já falecido na época da edição do livro). Naquela data, a Seleção enfrentou a Itália, precisando de um empate para avançar à semifinal. Após os 90 minutos e três gols do atacante Paolo Rossi, o sonho tinha acabado: 3 x 2 para os italianos.

“Aquela seleção foi tão envolvente, apaixonou tanto as pessoas, que normalmente se busca alguma coisa para justificar o porquê da derrota, mas para aquele time foi difícil achar uma crítica contundente, alguma coisa que resistisse ao tempo”, lembra Falcão, em entrevista ao Portal da Copa. Para ele, o grupo foi vencedor, mesmo sem levantar a taça. “Foi uma seleção marcante. Isso, para a gente que jogou, não deixa de ser uma conquista, o nosso caneco, o reconhecimento”, disse.

Três campeões, uma vaga

Pela primeira vez na história, 24 países participavam de uma Copa. A Seleção estreou contra a União Soviética. A vitória por 2 x 1, de virada, veio no segundo tempo, com gols de Sócrates e Éder. A segunda partida foi diante da Escócia, um consistente 4 x 1, com gols de Zico, Oscar, Éder e Falcão. No terceiro duelo, contra a Nova Zelândia, goleada por 4 x 0. Anotaram Zico, duas vezes, Falcão e Serginho.

Na segunda fase, 12 equipes seguiram na disputa, divididas em quatro grupos. O Brasil caiu ao lado de Argentina e Itália. Eram três campeões mundiais e uma vaga na semifinal. “Ninguém esperava que o Brasil não passasse. Nem o Bruno Conti, que era meu 'irmão'. Assim que a Itália ganhou da Argentina por 2 x 1, liguei para ele e o cumprimentei. E começamos a conversar sobre quando seria a nossa reapresentação na Roma. Ele disse: ‘Dentro da lógica, vou chegar antes’. Ele achava isso, como todo mundo achava”.

O Brasil venceu o clássico com a Argentina, que era a então campeã do mundo, por 3 x 1. A decisão de quem se classificaria para a semifinal ficou entre a “Canarinho” e a “Azzurra”.

Precisando apenas de um empate, por ter melhor saldo de gols, a Seleção começou atrás no placar, com um gol de Paolo Rossi aos cinco minutos. Sócrates igualou sete minutos depois, numa arrancada que começa antes do meio de campo, passa por um drible desconcertante de Zico e um passe perfeito para o Doutor conferir na saída de Zoff. Ainda na primeira etapa, Rossi pôs os italianos na frente.

O Brasil foi buscar a igualdade aos 23 do segundo tempo, num lance síntese do futebol daquela equipe. Júnior traçou uma diagonal da esquerda para a direita do ataque, driblou um adversário e rolou para Falcão, na ponta direita da área adversária. A defesa italiana estava bem postada, mas uma ultrapassagem em velocidade de Cerezo pelas costas de Falcão permitiu ao volante simular o passe e, num jogo de corpo, tirar três italianos da jogada. A bola ficou alinhada ao pé esquerdo de Falcão, na meia-lua. Ele chutou cruzado e venceu Zoff.

“Eu não tinha todo aquele chute no pé esquerdo, não tinha aquela força. O gol foi um desafogo. Pensei: ‘Na pior das hipóteses vamos ficar no 2 x 2’. Foi um gol quase de liberação, de uma luta para chegar à semifinal”, recorda.

No entanto, o camisa 20 da Itália estava inspirado naquela tarde e anotou o terceiro dele e dos italianos aos 29 minutos. “Fomos em cima de novo, tivemos chances. Houve uma cabeçada do Oscar e uma do Sócrates. O Zoff fez milagres”. Ao todo, a campanha brasileira terminou com quatro vitórias e uma derrota, com 15 gols marcados e cinco sofridos.

Segundo Falcão, o sentimento no dia seguinte foi de abatimento geral. “A gente não tem noção. É como se tivesse acordado sem ter dormido. Parados. Cansados. Evidentemente derrotados. Mas a gente vai se mexendo, juntando os cacos. Estranhamente, foi a primeira e única vez que vi, nesse período como atleta, como treinador e como jornalista, a imprensa brasileira triste. Chocada. Derrotada como o time. Isso é raro. Por quê? Porque viveram com aquela seleção, se emocionaram. A seleção jogava um futebol bonito, vistoso. Isso fez com que a imprensa sofresse junto. Foi um baque”.

A sensação teve o retrato visual imortalizado na capa do Jornal da Tarde, que estampou o rosto emocionado de um menino de 10 anos, vestindo a camisa da Seleção, apenas com os dizeres: Barcelona, 5 de julho de 1982.


Copas de 78 e 86

A grande frustração da carreira do ex-meio campista da seleção, do Internacional (RS), da Roma (Ita) e do São Paulo foi não ter sido convocado para a Copa de 1978, na Argentina. Na época, Falcão era bicampeão brasileiro com o Colorado e um dos melhores jogadores do país. Mas, segundo ele, desavenças com o técnico Cláudio Coutinho o deixaram fora da lista.

“Eu não tinha ido em 1978 por uma discussão que tive com o treinador, que infelizmente não está mais aqui, então não é agradável nem ético citar, mas achava que tinha condições. Houve envolvimento da ditadura. A comissão de um modo geral era militar”, diz Falcão. “O sentimento foi de frustração. Foi quando comecei a entender o que era o poder. Foi difícil, mas talvez não ter ido fez com que em 82 eu tivesse me saído, individualmente, muito bem”.

Falcão também disputaria a Copa de 1986, no México. A equipe ainda contava com atletas da geração de 1982, como Zico, Sócrates, Oscar e Júnior, além do mesmo treinador, Telê Santana. Em campo, o Brasil também foi eliminado nas quartas de final, desta vez nos pênaltis, diante da França de Michel Platini. Apesar de terminar em quinto, como em 1982, Falcão não alimenta o mesmo carinho pelo futebol apresentado pelo time.

“Zico estava machucado, eu tinha me recuperado, mas estava começando a jogar, o Sócrates vivia problema nas costas. Era um time diferente, quatro anos depois. Tinha um desgaste geral”, relata.

Brasil em 2014

Treinador da Seleção Brasileira entre 1990 e 1991, logo na sua primeira experiência no cargo, Falcão analisou o atual momento da equipe de Felipão, que se prepara para a Copa de 2014. “Eu acho que a Seleção esteve muito bem na Copa das Confederações. Recuperou o prestígio com o povo e isso é importante porque a Copa vai ser no Brasil. Essa confiança que deu ao torcedor talvez tenha sido a melhor coisa. Isso dá ao jogador segurança e é fundamental para você vencer o lado emocional que é jogar em casa, quase que com a obrigação de ganhar. Não tem a obrigação de ganhar, evidentemente que não, porque vamos enfrentar seleções fortes, mas tem um peso forte jogar aqui”.

Para ele, a cobrança sobre a equipe diminuiu depois da exibição na final contra a Espanha. “A cobrança poderia ser muito maior, mas acho que diminuiu quando a seleção jogou bem, ganhou a Copa das Confederações e deixou uma marca forte, principalmente no jogo contra a Espanha. Não dá para ficar lembrando que a Espanha estava cansada, não interessa, mesmo que a Espanha estivesse bem, o Brasil teria ganho, porque fez uma partida excepcional”.

Falcão não faz planos para o futuro, mas tem uma certeza: quer participar da Copa de 2014, seja como comentarista ou técnico. “Tenho várias possibilidades: continuar no trabalho como treinador, voltar para a televisão, tem um leque de coisas que vou decidir quando terminar o ano. Vou tentar trabalhar naquele mês da Copa. Se puder assistir ao treino de alguma seleção, vale a pena”, diz. Recentemente, ele fez intercâmbio com outros treinadores como Cesare Prandelli, da seleção italiana, Vincenzo Montella, da Fiorentina (ITA), e José Mourinho, do Chelsea (ING).
Perfil

Nome: Paulo Roberto Falcão
Nascimento: 16/10/1953
Naturalidade: Abelardo Luz (SC)
Clubes: Internacional (1973 a 1980); Roma (1980 a 1985) e São Paulo (1985 a 1986)
Títulos: Campeonato Brasileiro (1975, 1976 e 1979); Campeonato Gaúcho (1973, 1974, 1975, 1976, 1978), Campeonato Italiano (1983), Copa da Itália (1981 e 1984), Campeonato Paulista (1985)
Seleção Brasileira: 34 jogos. Foram 25 vitórias, seis empates e três derrotas. Oito gols marcados
Como treinador: Seleção Brasileira (1990 a 1991); América do México (1991 a 1993); Internacional (1993 e 2011); Japão (1994); Bahia (2012)
Títulos como treinador: Copa Interamericana (1991); Copa dos Campeões da Concacaf (1992); Campeonato Gaúcho (2011); Campeonato Baiano (2012)

Ficha técnica
Roteiro e texto: Gabriel Fialho
Fotos e vídeo: Danilo Borges
Editor: Gustavo Cunha

Fonte: Portal da Copa



19/10/2013 15:02


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