Alckmin divide falha na segurança com FHC









Alckmin divide falha na segurança com FHC
O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), 49, candidato à reeleição, admitiu que não cumpriu em quatro anos a meta de redução da criminalidade com a qual havia se comprometido na campanha de 1998, quando era vice na chapa do governador Mário Covas, morto em março do ano passado. O tucano atribuiu parcela da falha ao governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, a quem responsabilizou pela falta de combate ao tráfico de armas e drogas, que são atribuições federais. "[A meta] não foi cumprida. Quero reafirmar que há sim responsabilidades que são da esfera federal. Sabe quantos policiais federais operacionais existem no Estado? Não são 300", disse.

Alckmin participou ontem da série "Candidatos na Folha", no Teatro Folha, em Higienópolis (zona central de São Paulo), com cerca de 200 pessoas. Foi entrevistado por Fernando Canzian, secretário de Redação da Folha, Fernando de Barros e Silva, editor de Brasil, Nilson de Oliveira, editor de Cotidiano e Rogério Gentile, editor do Painel, além de leitores convidados.

O tucano disse "lamentar" a atitude do ex-governador Tasso Jereissati (PSDB-CE), que anteontem formalizou sua saída da campanha presidencial, alegando ser "natural aliado" de Ciro Gomes, candidato do PPS.
Após fazer várias alusões veladas ao adversário Paulo Maluf, do PPB, Alckmin foi explícito ao final do debate: "Temos uma grande diferença. O meu programa é Rota na rua e corrupto na cadeia".
Leia a seguir os principais trechos do debate. Hoje, o entrevistado é Paulo Maluf.

O governador Geraldo Alckmin abriu o debate expondo por que tenciona a obtenção de um novo mandato. "Sou governador há 18 meses, substituindo um grande homem público que foi o governador Mário Covas. Fui co-piloto durante 6 anos de um bom comandante, com aulas práticas de respeito ao dinheiro público, de compromisso popular, de falar a verdade, de austeridade e de eficiência na recuperação da administração pública paulista. Assumi o governo, sou responsável não só pelos acertos, mas inclusive também pelos erros, pelos problemas. Tenho absoluta responsabilidade nisso", iniciou.

"Há muito ainda por fazer, mas a casa está em ordem, arrumada para a gente pisar no acelerador no próximo mandato", declarou.

Alckmin afirmou que, se eleito, fará um "governo empreendedor", que priorizará o desenvolvimento, o emprego e a renda. Nas áreas de segurança, educação e saúde, afirmou que vai tomar como padrão o Poupatempo, projeto no qual o oferecimento de serviços públicos é centralizado e agilizado em um só local.

QUEDA NA AVALIAÇÃO
O secretário de Redação Fernando Canzian, como mediador, fez a primeira pergunta, lembrando a redução de sete pontos percentuais daqueles que avaliam o governador como ótimo/bom, taxa que caiu de 39% para 32%.
"A avaliação não é ruim. Você não leu a pesquisa Datafolha adequadamente. É muito raro um governador de São Paulo ter uma taxa de ruim/péssimo de 15%. Tenho a metade da rejeição de um dos candidatos e a menor dos candidatos, sendo governador do Estado. Sou sozinho para defender o governo, e todos os outros candidatos, até porque querem ser governador, batendo no governo. Ainda tem a mídia, na qual "bad news are good news" [más notícias são boas notícias]", declarou o tucano.

EXAUSTÃO TUCANA
O editor do Painel, Rogério Gentile, perguntou se não há uma exaustão contra os tucanos depois de oito anos de gestão. "Começar o horário eleitoral com 24%, 25% [nas pesquisas" é um nível bom. O governador Mário Covas ficava em terceiro ou quarto lugar [quando começou o horário gratuito". E ganhou a eleição. Às vezes, propostas populistas, demagógicas, sem compromisso com a verdade, têm, num primeiro momento, alguma resposta. Mas para isso existe a campanha eleitoral."

Gentile citou que Covas teve o apoio do PT no segundo turno e perguntou se Alckmin esperava o mesmo. "Não vou avaliar segundo turno, porque acho deselegante com os demais candidatos."

SERRA
O editor de Brasil, Fernando de Barros e Silva, lembrou o apoio que Alckmin recebeu de prefeitos do PTB, PDT e PPS, que têm Ciro Gomes como candidato a presidente, e perguntou se estaria colaborando com a "cristianização" de José Serra, numa referência ao candidato governista Cristiano Machado que, em 1950, acabou abandonado pelos aliados.

"Só tenho um candidato, o senador José Serra. Confio na sua eleição. Acho que tem todas as condições de ir ao segundo turno. É natural que tenhamos alguém de outro partido que nos apóie e não apóie Serra e vice-versa."

TASSO
Barros e Silva citou que, além de Alckmin, o ex-governador Tasso Jereissati, candidato ao Senado no Ceará, e Aécio Neves, que disputa o governo de Minas, criaram uma situação de dubiedade ao abrir palanque a apoiadores de outros candidatos, além de Serra.

"Os apoios são importantes, mas eleição majoritária é olho no olho. Ou você, no horário eleitoral, cria uma empatia com o eleitor -e isso vale para mim, não estou falando para os outros não, estou falando da minha candidatura- ou a responsabilidade é sua. É uma eleição na qual o eleitor não é comandado."
Gentile pediu a opinião de Alckmin sobre o fato de Tasso Jereissati ter abandonado a campanha de Serra. "Lamento. Agora acho que em política a gente não briga, a gente conquista."

META DE VIOLÊNCIA
O editor de Cotidiano, Nilson de Oliveira, afirmou que, em 1998, uma da promessas de Alckmin era reduzir os índices de criminalidade à metade da taxa daquele ano. Disse que as taxas atuais superam às do período citado e perguntou em que havia errado.

"Durante toda a década de 90, houve um aumento dos índices de criminalidade. É um problema mundial. São Paulo é a segunda metrópole do mundo, segunda região metropolitana do mundo, com enormes desigualdades de natureza social. Com péssima urbanização. Você tem todos os fatores aí de criminalidade presentes. O governo está trabalhando. Essa curva que vinha crescendo, parou de crescer e começa a cair. Se você analisar esse primeiro semestre, estamos tendo uma queda de homicídios, aqui na capital, de 10%. No Estado de São Paulo, mais de 8% de queda, comparando-se janeiro a julho deste ano com janeiro a julho do ano passado. Então, houve uma queda significativa no número de homicídios. Queda de roubo e furto de carro", afirmou.

NOVOS DADOS
Nilson de Oliveira afirmou que os dados de criminalidade divulgados no site da Secretaria da Segurança Pública, do primeiro semestre, não corroboravam as afirmações do governador.

Alckmin disse que tinha dados mais recentes e que não havia por que discutir o primeiro semestre. Canzian protestou pela demora com que os dados da criminalidade são tornados públicos.

"Na comparação do primeiro semestre de 2002 com o primeiro semestre de 2001, tivemos uma queda de homicídio doloso de 7,7%, no Estado. Na capital, caiu 10,4%. Roubo de veículo caiu 12,2%. Furto de veículo caiu 5,8%", afirmou.

META NÃO CUMPRIDA
Gentile insistiu se Alckmin considerava que a meta de reduzir a criminalidade à metade havia sido cumprida. "Não foi cumprida, por isso tenho cautela com questão de números. Tenho cautela com números. Acho que não foi cumprida. Agora começou a reduzir. Estamos trabalhando para que se chegue nesse número. Para reduzir mais", afirmou.

"A polícia está mais integrada, mais equipada, nós estamos chegando a 126 mil policiais no Estado de São Paulo. Quando o Mário Covas entrou, havia 72,9 mil."

USO ELEITORAL
Canzian afirmou que, em 2000, quando Alckmin era candidato a prefeito da capital, o governo do Estado entregou 4.428 viaturas, contra 371 em 1999. Disse que neste ano já foram entregues 2.104 contra 386 no ano passado e lembrou que Alckmin estava presente em 70% das ce rimônias de entrega de viaturas. Perguntou se o tucano não fazia uso eleitoral de um problema que aflige a população.

"Viatura é um item. Talvez não seja nem o mais importante", escapou, sem abordar diretamente a questão.
Gentile referiu-se à expressão usada pelo governador enxugar gelo quando queixou-se da falta de ação na segurança do governo do presidente Fernando Henrique Cardoso.

"O que eu disse e quero reafirmar é que há sim responsabilidades que são da esfera federal. Tráfico de arma e tráfico de droga são de responsabilidade federal. Sabe quantos policiais federais operacionais existem aqui no Estado? Não tem 300. No nosso sistema há 126 mil policiais. Sabe quantas armas nós apreendemos no ano passado? 40 mil armas. Sabe quanto apreendemos no primeiro semestre? Quase 20 mil armas. De onde é que estão vindo essas armas? Por onde é que estão entrando?", declarou.

RODOANEL
Barros e Silva afirmou que o contrato das obras de construção do Rodoanel (anel viário da região metropolitana) sofreu aditamentos de quase 70%, quando o permitido por lei são 25%, e custou R$ 237 milhões a mais do previsto. Disse que a alegação oficial foi que o aumento se deve a razões técnicas. O editor perguntou se houve incompetência do Estado na elaboração do contrato original da empreitada.

"Não foi licitado um projeto executivo detalhado. Tanto é que hoje nenhuma obra do governo deixamos licitar se não tiver projeto executivo detalhado. Não houve nenhum aumento de preço. O preço era excepcional. Tanto é que o Rodoanel é a obra mais barata do país comparando o chamado quilômetro equivalente. Os preços são os mesmos, não houve nenhum aumento, houve serviço a mais", afirmou.

JARDIM IRENE
Uma leitora perguntou se Alckmin andaria sozinho à noite no Jardim Irene, bairro mais violento de São Paulo. "Estive lá pessoalmente porque o Cafu, nosso campeão, criou uma fundação da qual o Estado é parceiro. Se houver necessidade, eu vou, nenhum problema."

PEDÁGIO
O leitor José Eduardo de Andrade afirmou que o custo do pedágio de São Paulo a Ribeirão Preto é R$ 37 reais. Perguntou se o governador não considerava abusivo o valor dos pedágios.

"É uma opção política. Eu quero fazer a segunda pista da Imigrantes em vez de fazer hospital , fazer escola e saneamento básico? Qual é mais justo? Quem usa paga. Quem usa mais paga mais, quem usa menos paga menos. É justo que a segunda pista da Imigrantes, que fica pronta agora em dezembro, seja paga pela dona Maria que mora no Pontal do Paranapanema, que não tem carro, não vai para a praia? Ela paga por meio do ICMS quando compra uma roupa, um alimento."

Gentile afirmou que outra promessa de campanha de 98 foi atingir em 2002 87 quilômetros de metrô e lembrou que a extensão de hoje se limita a 49,2 km. "Nosso compromisso é esse. Expandir o metrô. Ter 49 km até agora é muito pouco."

REPETÊNCIA ESCOLAR
Um leitor perguntou se Alckmin manterá a chamada progressão continuada, na qual um aluno não é reprovado caso compareça às aulas. "Fico admirado de ver o candidato do PT e o Maluf juntos nisso, porque quem implantou a progressão continuada, em outros moldes, foi o PT. Foi o educador Paulo Freire com a prefeita Luiza Erundina. E foi mantido pelo Maluf, pelo Pitta, pela dona Marta, por todo mundo. Acho que vai ser um retrocesso acabar com a progressão continuada."

Um leitor perguntou se algum filho de Alckmin estuda em escola pública. "Nenhum filho meu estuda ou estudou em escola pública. Até digo com sinceridade: é que em casa a minha mulher manda muito. Porque, se eu mandasse um pouco mais, eu teria colocado na escola pública. Eu estudei em escola pública. Não sou tão velho assim, embora esteja ficando careca. A escola pública teve uma evolução. Hoje só não estuda quem não quer. Há oferta de vagas para estudar. O esforço agora é melhorar a qualidade."

Gentile perguntou qual o argumento da primeira-dama para não colocar os filhos em escola pública. "Há escola particular melhor que a pública, mas também há pior. Não vamos achar que escola particular é essa coisa maravilhosa também."

RELAÇÃO COM O PT
Um leitor perguntou como Alckmin avaliava a gestão de Marta Suplicy (PT) em São Paulo e se havia se arrependido de ter apoiado sua eleição. "Tenho por obrigação evitado ficar fazendo avaliação da Prefeitura de São Paulo. Acho que quem tem que avaliar é o povo. Não me arrependo um minuto, mas um minuto [de ter apoiado Marta". Temos divergências com o PT, mas o grande divisor de águas é uma política velha, atrasada, que quebrou a cidade de São Paulo, e o povo não vai deixar quebrar o Estado não . Eu apoiaria a Marta Suplicy dez vezes se fosse necessário."

Canzian encerrou o debate perguntando o que Alckmin acha de o colunista da Folha José Simão chamá-lo de "picolé de chuchu diet". "Sou leitor do Zé Simão. Bom humor é uma coisa boa. Bernard Shaw [escritor irlandês] dizia que o estado de permanente bom humor é prova de inteligência. Gosto muito de sorvete, não gosto tanto de chuchu", afirmou o governador.


Ciro vê a derrota do Brasil com camisa 23
A seleção brasileira de futebol -que perdeu ontem para o Paraguai, por 1 a 0, em amistoso- participou do ato de maior conotação político-eleitoral desde a conquista do pentacampeonato na Copa da Coréia e do Japão: em uma cerimônia organizada na capital do Ceará, o jogador Kaká ofereceu a camisa de número 23 assinada por toda a delegação para o candidato do PPS a presidente da República, Ciro Gomes.

Em rápida entrevista no hotel da seleção, Ciro aproveitou para comentar os ataques que sofreu de José Serra (PSDB) no primeiro dia de propaganda eleitoral na TV. "Quando o candidato [Serra] que tem toda a oligarquia, toda a máquina do governo ao seu lado parte para o ataque dessa forma, só pode estar demonstrando desespero", disse.

O PPS decidiu não responder aos ataques do PSDB no programa de Ciro. A Frente Trabalhista pediu direito de resposta ao TSE.

O ato político da seleção brasileira a favor de Ciro também beneficiou o ex-governador do Ceará Tasso Jereissati (PSDB), que concorre a uma vaga ao Senado. Anteontem, Tasso formalizou seu afastamento da campanha de Serra por meio de uma carta enviada à direção tucana. Sentiu-se livre para aparecer em público, pela primeira vez nesta disputa eleitoral, ao lado de Ciro, a quem classifica de seu "natural aliado".

Ontem, Tasso disse ter conversado com Pimenta da Veiga, coordenador da campanha de Serra, a respeito de sua carta. "Ele me disse que não tem problema nenhum", declarou.

Tasso e Ciro estavam juntos no palanque montado pela CBF (Confederação Brasileira de Futebol) no hotel Marina, onde estavam hospedados os jogadores do Brasil. A cerimônia foi rápida. Começou às 11h58 e terminou às 12h02 -apesar de os dois políticos terem permanecido mais tempo com os jogadores em outro recinto reservado.

A equipe de TV da campanha de Ciro Gomes teve amplo acesso ao evento, inclusive aos contatos reservados que o candidato teve com integrantes da seleção.

Além de Tasso e Ciro, estavam no palanque o presidente da CBF, Ricardo Teixeira, o técnico Luiz Felipe Scolari, o candidato do PSDB ao governo do Ceará, Lúcio Alcântara, e a candidata do PPS ao Senado, Patrícia Gomes -ex-mulher de Ciro. Todos os políticos ganharam camisas autografadas. Quando Patrícia Pillar, atual mulher do candidato do PPS, subiu no palanque montado dentro de um salão do hotel Marina, Patrícia Gomes desceu.

Kaká entregou a camisa da seleção brasileira a Ciro, mas também estavam no evento o capitão da equipe, Cafu, e o ala Roberto Carlos. A camisa de número 23 foi escolhida por uma razão simples: é o número eleitoral de Ciro Gomes e também o usado por Kaká na Copa do Mundo. A idéia foi de Ricardo Teixeira, depois de conversar com assessores da CBF e do candid ato do PPS.

Nenhum outro candidato a presidente foi convidado para a partida amistosa, ontem, em Fortaleza. Segundo Ricardo Teixeira, "se o jogo fosse em São Paulo, o candidato de lá seria convidado".

A decisão de o jogo ser em Fortaleza, segundo a CBF, estava tomada desde antes da Copa. "O último jogo antes de embarcarmos foi aqui. Nada mais natural que o primeiro jogo do retorno fosse no mesmo local", disse Teixeira.

"Quando recebemos a seleção em Fortaleza, em março, havia dúvida sobre o possível sucesso da equipe. Mas nós os recebemos com todo o carinho", afirmou Tasso. Ele também disse ter sido o principal responsável pela decisão da CBF de desembarcar primeiro em Brasília na chegada da seleção ao Brasil.

Sobre o uso político-eleitoral da seleção, Teixeira disse que foi um ato "espontâneo" dos jogadores. Para o dirigente da CBF, o ato de Fortaleza não foi diferente dos que a seleção proporcionou a outros políticos na sua chegada ao Brasil: "Fomos ao Palácio do Planalto; no Rio, a governadora Benedita da Silva (PT) recebeu os jogadores. E o Lula [candidato do PT a presidente] até beijou a taça outro dia. Na semana que vem, vou entregar pessoalmente a taça para o governador Zeca do PT, de Mato Grosso do Sul".

"Se o Felipão, o Cafu e o Roberto Carlos convidam você para dar uma camisa, você não iria? Não estou fazendo campanha. Agora, vou sair daqui correndo para levar a camisa para meu filho que está na escola", disse Tasso, que também ganhou uma camisa.


Estréia da propaganda abre corrida de recursos aos TSE
Ciro quer responder a Serra, que contesta publicidade do PT

Um dia após a estréia da propaganda eleitoral na TV e no rádio, os presidenciáveis recorreram ontem ao "tapetão" para tentar suspender parte da publicidade do adversário ou ocupar espaço destinado ao concorrente. O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) recebeu quatro recursos, dois deles pedidos de direito de resposta.

Ciro Gomes (PPS) e José Serra (PSDB) transferiram para o campo judicial a disputa que travam por votos, trocando acusações de desrespeito à legislação eleitoral. A propaganda de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi alvo de ataques da Petrobras e de Serra.

No final da tarde de ontem, os advogados de Ciro apresentaram um pedido de direito de resposta contra o programa de Serra veiculado anteontem à noite na TV, em que o tucano exibiu declarações críticas do próprio presidenciável do PPS sobre políticos aos quais ele agora está aliado.
Os advogados questionaram particularmente a veiculação de uma resposta de Ciro a um ouvinte durante entrevista na Bahia sobre o apoio que recebe do ex-senador Antonio Carlos Magalhães, sem a apresentação da pergunta.

O ouvinte havia perguntado se o candidato queria ser presidente da Suíça, porque ele dissera que não daria cargos aos aliados se fosse eleito. A resposta foi: "Lá é parlamentarista. É só um aviso aí para esses petistas furibundos. Tem que fazer as perguntas com um pouco mais de cuidado para largar de ser burro".

Os advogados argumentam que a equipe de Serra fez "montagem de áudio que distorceu a realidade, com o nítido propósito de injuriar" Ciro. Teria havido ofensa à reputação, à dignidade e ao decoro do candidato.
Eles pediram um minuto do tempo de Serra como direito de resposta, a proibição de uso de voz e imagem que o denigram e a perda do tempo do programa e o dobro das inserções (comerciais ao longo da programação) que continham o ataque.

O programa de Serra deve voltar ao assunto hoje, mostrando o ouvinte que fez a pergunta a Ciro na rádio baiana.

Serra, por sua vez, moveu representação contra Ciro porque ele teria aparecido na propaganda do candidato ao governo de São Paulo Antonio Cabrera (PTB).

Os advogados sustentaram que ele fez propaganda dissimulada de sua candidatura ao Planalto em horário destinado à publicidade da disputa ao governo. Pedem que Ciro, como punição, perca tempo de seu horário eleitoral.

Na mesma linha, Serra acusou Lula de utilizar indevidamente as propagandas dos candidatos ao governo de Pernambuco e ao Senado apoiados pelo PT. Nesse caso, também foi pedida a perda no Estado de inserções de Lula para compensar a aparição supostamente ilegal.

A Petrobras pediu direito de resposta contra Lula porque o petista criticara anteontem o fato de a empresa ter decidido construir uma plataforma em Cingapura.

O programa de Serra foi criticado por aliados de Ciro e levou o presidente do PPS, Roberto Freire, a divulgar uma nota, no qual afirmou que o programa de Serra se resumiu "a um ato de agressão à figura pública" de Ciro.

Para Freire, o programa rompeu o compromisso com uma campanha de alto nível e abandonou as proposições, representando a "sucumbência da política ao desespero, este manipulado pelo marketing". "Quem transforma os graves problemas nacionais em mercadoria de consumo fácil demonstra não estar preparado para governar o Brasil."

O presidente nacional do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC), disse que, ao atacar Ciro, o candidato tucano beneficia Lula. "O horário eleitoral estreou de forma normal, à exceção do programa de José Serra, que -nanico de votos- virou laranja de Lula", disse ele, por meio de sua assessoria.

"Direito de espernear ele terá sempre. Não é baixar o nível, é dizer quem é esse transformista que diz mentiras toda hora", disse o presidente do PSDB, José Aníbal.


Candidatos vão até os limites da legalidade
O surgimento de quatro recursos sobre a estréia do programa eleitoral, anteontem, demonstra que os candidatos estão no limite da legalidade para tentar tirar o melhor proveito político possível do tempo.
A Lei Eleitoral estabelece uma série de proibições, mas a aplicação das punições nela previstas depende da forma como os tribunais interpretam cada uma delas e, muitas vezes, da análise subjetiva que eles fazem de questões como a ofensa à honra de adversários ou de outras pessoas citadas.

Conforme a lei, a publicidade de um candidato não pode, por exemplo, "degradar ou ridicularizar" adversários nem ofender a sua honra. Montagens e truques de áudio ou vídeo também são vedados. Outras proibições legais são remunerar uma pessoa pela aparição na propaganda e permitir a participação de alguém filiado a partido adversário.

O depoimento do presidente Fernando Henrique Cardoso para José Serra não foi questionado porque essa participação é considerada válida.

A Justiça Eleitoral recebe as fitas e as transmite às emissoras, mas não pode fazer censura prévia. Os tribunais têm, entretanto, o poder de proibir os candidatos de repetir uma determinada ofensa ao adversário. Na hipótese de reincidência da ofensa, o TSE inovou neste ano e passou a prever, na resolução sobre propaganda, uma punição mais dura: a suspensão do programa.

Outra novidade é a obrigatoriedade de apresentação do nome ou da imagem do vice na propaganda dos candidatos a presidente da República e a governador e do suplente no caso dos concorrentes ao Senado.
Essa exigência foi desprezada pelo candidato do PSB, Anthony Garotinho, nos dois blocos de programa presidencial. Luiz Inácio Lula da Silva (PT) omitiu a referência a seu vice, José Alencar (PL), à tarde, mas expôs imagens dele no bloco das 20h30.


O eleito
Belo Horizonte, final de 1954, Palácio das Mangabeiras, anoitecer de sábado.
Sozinho, o governador Juscelino Kubitschek de Oliveira está à vontade, de pijama, lendo deitado. Toca o telefone. É o garçom. Informa que um frade barbudo está esperando na sala de entrada.

JK estranha. Não há nada na agenda. Falha do Cerimonial? Veste-se, desce a escada encaracolada, cumprimenta alegremente o desconhecido. Cordial, age como se estivesse esperando por ele.

O frade vai direto ao ponto. Pede que o governado r nunca abandone seus propósitos humanitários e que se prepare para ser o próximo presidente da República. Ato contínuo, levanta-se, dá a bênção e sai rapidamente.
Juscelino corre para o telefone. Está maravilhado e preocupado. Quer saber como o frade entrou contra todas as regras e sem aviso algum. O palácio é encravado na vertente da Serra do Curral, isolado, cercado, policiado.

O único acesso é pela Portaria, naquele dia chefiada pelo disciplinado e zeloso cabo Lucas, da Polícia Militar. Checam tudo. Conclusão: ninguém entrou, ninguém saiu. Bastante místico, Juscelino, eleito presidente em 3 de outubro de 1955, contava esse episódio com convicção absoluta.

Brasília, outubro de 1984, escritório da campanha presidencial de Tancredo Neves.
Chegam três deputados de esquerda. Estão nervosos com a desenvoltura e objetividade do adversário Paulo Maluf. Analisam o perigo, exageram, insistem.

Todo cuidado é pouco, cada voto um tesouro a preservar ou conquistar. É preciso usar todos os trunfos.
Sugerem que o discurso tancrediano se incline um pouco para a esquerda, a fim de facilitar a adesão de petistas.

Mas o candidato está mais confiante do que nunca, feliz, rindo à-toa. Tranqüilo, agradece e pede calma. Garante que não é necessário mudar nada. É só manter o rumo e aguardar a vitória no Colégio Eleitoral.
Os três se entreolham desconfiados, sem entender nada. Tancredo tira um papel do bolso:
"Acabo de receber a pesquisa que realmente conta, o mapa do tesouro. Das cinqüenta famílias que mandam no Brasil, trinta e cinco estão conosco."

Em tempo. Tancredo obteve 480 votos; Maluf, 180.


Cúpula do PSDB aponta "traição" de Tasso
Pimenta da Veiga diz que ex-governador será julgado no futuro por sua atitude e "julgamento não será favorável"

A carta do ex-governador Tasso Jereissati em que anuncia sua saída da campanha de José Serra surpreendeu a cúpula do PSDB apesar de todos os sinais emitidos antes pelo tucano do Ceará e foi considerada uma "traição", porque ele se havia comprometido a apoiar a candidatura oficial formalmente até o final da eleição.
Tasso foi o orador que lançou o nome de Serra na convenção nacional do PSDB. O ex-ministro das Comunicações, Pimenta da Veiga, foi para a chefia da campanha de Serra para atender Tasso.

O presidente do PSDB, José Aníbal, declarou-se "desapontado" com a decisão de Tasso. Na terça, ele falara com o ex-governador, e o tucano não dera a menor indicação do que pretendia fazer.

"Eu sempre tive a expectativa de que Tasso reafirmasse, como fez em momentos anteriores, que a candidatura dele à Presidência da República era a candidatura do PSDB. Infelizmente isso não aconteceu", afirmou Aníbal.

Collor
Em carta endereçada a Tasso, Aníbal foi duro, fazendo alusão ao ex-presidente Fernando Collor. No final, escreveu: "(...) Espero que possamos, novamente, dialogar no sentido de manter o Brasil no rumo seguro com a ação corajosa do PSDB, desde que garantimos a governabilidade do Brasil num momento de crise, após a aprovação do impedimento do ex-presidente Collor, fato que -espero- não volte a se reproduzir na história do Brasil.".

Serra e Pimenta também foram surpreendidos. O coordenador da campanha de Serra divulgou uma nota em que dizia que Tasso seria "julgado no futuro pela atitude, e o julgamento não será favorável". Pimenta leu a carta do ex-governador ontem de manhã.

A decisão de Tasso chegou na fase em que a candidatura de José Serra enfrenta seu momento mais crítico e perde pontos nas pesquisas. Na carta, Tasso alega a amizade pessoal com Ciro Gomes (PPS) para apoiá-lo.
Os tucanos se perguntavam ontem: a amizade não era a mesma quatro anos atrás, na reeleição de Fernando Henrique Cardoso? FHC perdeu para Ciro no Ceará, muito embora Tasso tenha passado a campanha toda dizendo que apoiava o presidente.

Por não acreditar que Tasso tivesse essa iniciativa, Serra não foi ao Ceará apoiar a candidatura do senador Sérgio Machado (PMDB) ao governo. Machado é desafeto de Tasso no Estado. O peemedebista e Serra conversaram ontem. Ainda não têm uma estratégia definida a seguir, mas Serra sente-se liberado para apoiá-lo.

O líder do PSDB na Câmara, deputado Jutahy Júnior (BA), tentou minimizar os efeitos na campanha de Serra.
"A decisão de Tasso não tira nada da campanha, porque ele não acrescentava nada. Todo mundo sabe que ele não entrou na campanha", disse.

Em campanha pelo centro de São Paulo, a mulher do presidenciável, Monica Serra, afirmou que não estava surpresa.

"Isso mostra a coerência das pessoas que mantêm suas posições, que é o que nós valorizamos", afirmou a psicóloga.

Para o coordenador-executivo da campanha, Milton Seligman, a carta de Tasso mostra que o sistema político no Brasil ainda é frágil, pois decisões referendadas pela maioria não são cumpridas.

"Fiquei chocado. Isso mostra que ainda temos de dar passos importantes para fortalecer a nossa democracia", afirmou.

Serra passou a manhã e parte da tarde em seu apartamento em Brasília, onde se reuniu com Jutahy e assessores. No final da tarde, embarcou para São Paulo para gravar os programas de TV. Ele não comentou a carta de Tasso.

Ao deixar o apartamento do candidato, o líder do PSDB na Câmara disse que a carta de Tasso não comprometeu o otimismo da campanha com repercussões positivas da estréia do programa eleitoral gratuito no dia anterior. Eles consideraram positivos inclusive os ataques a Ciro, pois teriam mostrado o candidato "como ele é". Para o deputado federal, Serra vai "reverter" sua situação a partir do programa eleitoral.

Covas
Em resposta às críticas que recebeu de José Aníbal e Pimenta da Veiga, após desligar-se oficialmente da campanha de José Serra à Presidência e de encontrar-se publicamente com Ciro Gomes (PPS), Tasso Jereissati (PSDB) comparou sua atitude a gestos de Mário Covas.

"Para mim, a cara do PSDB é o Covas. A coerência passa pela transparência e pela clareza das posições e acho que foi o que fiz", afirmou o ex-governador. "Covas teve atitudes como essa." Segundo o ex-governador, o grande julgamento é o voto.

Para Tasso, sua atitude foi para "não atrapalhar", e não para "atrapalhar" Serra.


Freire critica adesão de "ACMs da vida" a Ciro, em alusão a economista
O presidente do PPS, senador Roberto Freire (PE), atacou de forma incisiva, ontem em Recife, a inclusão do economista José Alexandre Scheinkman na campanha do presidenciável do partido, Ciro Gomes, e as adesões "cômodas" à ela. Anteontem, o senador já havia feito críticas ao convite feito ao economista.

Em palestra a estudantes secundaristas, Freire disse que o crescimento de Ciro nas pesquisas "trouxe esses ACMs da vida [referência ao ex-senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA), que apóia Ciro]. Para ele, "outros gabirus [ratos de esgoto] ainda virão". ACM tem dito que não vai responder a críticas do senador.
Para Freire, o PPS precisa estar atento a eventuais "mudanças de gênero na condução política e implantação do projeto de governo". Ele se referia especificamente à inclusão de Scheinkman na equipe.

"Há adesões que são cômodas", disse à Agência Folha. "Em candidaturas que marcham para a vitória sempre tem isso."

O senador disse não saber por que o economista, ligado às teses liberais, foi chamado para auxiliar na elaboração do programa de governo. "Pergunte isso ao Ciro." Freire afirmou que não questionou o candidato sobre o assunto.

E disse que considera Scheinkman "contraditório" com a política defendida pelo PPS. "Quero um Estado com capacidade de regular mercado, e ele, um Estado que não tenha nenhuma capacidade de nada", declarou. "Isso é o que diferencia a direita da esquerda, do ponto de vista econômico."

Para Freir e, render-se ao pensamento liberal levaria o PPS "a um processo de direitização como existe hoje no PT". "O PT rendeu-se e quer acalmar banqueiro."


Alckmin cola em Covas; Genoino, em Lula
Tucano esquece Serra no primeiro dia de horário gratuito na TV, enquanto petista usa Marta como cabo eleitoral

Muito Covas e nenhum Serra. A estréia da propaganda televisiva do governador Geraldo Alckmin foi pródiga em menções a seu antecessor e não fez referência ao candidato do PSDB ao Planalto.

Foi total o descolamento entre as campanhas tucanas paulista e federal. Não houve texto ou imagem que lembrasse José Serra, terceiro colocado na disputa pela Presidência. Nos dois horários do rádio, apenas uma citação protocolar da chapa completa, incluindo os candidatos ao Senado.

Já o governador morto em março de 2001 foi mencionado repetidas vezes na TV. Primeiro pelo locutor, que apresentou Alckmin como "amigo leal e solidário" de Mário Covas. Depois pelo candidato. Entre sua personalidade e a de Covas, disse, existiam "mais semelhanças que diferenças".

No rádio, além das referências, foi veiculado um áudio em que Covas elogia a "integridade" do afilhado político. Palavras como essa -e frases como "corrupção é a destruição da alma"- pontuaram a propaganda.
Elas indicam que Alckmin, espelhando-se no que fez Covas em 1998, vai explorar a "questão do caráter" na tentativa de reverter a desvantagem em relação a Paulo Maluf (PPB), que lidera a disputa com 40% das intenções de voto. O governador, que nos programas virou apenas "Geraldo", aparece em segundo lugar, com 24%.

Maluf abriu sua temporada de TV com um programa sobre educação. Com menos da metade do tempo do principal adversário, voltou as baterias contra o sistema de progressão continuada vigente no ensino público paulista.

Esse modelo, no qual a reprovação do aluno pode ocorrer apenas ao final de ciclos de quatro anos, é marca da administração tucana em São Paulo e um dos três pontos mais martelados por Maluf em sua campanha, ao lado da violência e dos preços dos pedágios nas rodovias estaduais.

O texto apresentado pelo pepebista apelou às mães e condenou o "crime" de ter na quinta série "crianças que não sabem ler nem escrever". No programa da tarde, a fala do candidato foi complementada por jingle de teor semelhante cantado por uma menina.

À diferença de Alckmin, José Genoino (PT) fez questão de apresentar-se colado ao candidato presidencial de seu partido, primeiro colocado nas pesquisas.

Lula foi citado e apareceu ao lado de Genoino, que obteve 10% das intenções de voto no Datafolha mais recente. Além disso, o programa vespertino seguiu, em forma e conteúdo, o modelo do que foi exibido por Lula anteontem no mesmo horário. Ambos trataram de geração de emprego.

Além da imagem do presidenciável, foi ao ar depoimento da prefeita de São Paulo, Marta Suplicy, cada vez mais presente em eventos das campanhas petistas.

"Escada"
Dois candidatos pequenos serviram de "escada" para os presidenciáveis de seus partidos, que assim ganharam exposição além da que lhes é destinada às terças, quintas e sábados. Ciro Gomes (PPS) surgiu no horário de Antonio Cabrera. Anthony Garotinho (PSB), no de Luis Carlos Pitolli.

Houve menos diferença entre os programas vespertino e noturno do que na estréia dos presidenciáveis. À noite, Maluf ampliou o leque de críticas à gestão Alckmin. O tucano apresentou mais obras. E Genoino saiu do estúdio para enumerar prioridades em frente ao Palácio dos Bandeirantes.

Se na estréia da TV cada um dos grandes atirou para um lado (e vários pequenos atiraram contra Alckmin), no rádio o denominador comum foi a questão da segurança, central na sucessão paulista e diariamente abordada na programação regular desse veículo.

Com ênfase variada, todos os candidatos trataram do assunto. A nota folclórica ficou por conta de Ciro Moura (PTC), que sugeriu "bola de ferro no pé e enxada na mão" como tratamento a ser dado aos detentos do Estado.
Na televisão, o horário gratuito da tarde alcançou 27,6 pontos no Ibope no conjunto das emissoras que o apresentaram (cada ponto equivale a 47 mil domicílios na Grande São Paulo).

O número é praticamente igual ao registrado anteontem. Há uma semana, quando ainda não havia propaganda gratuita, a audiência total no horário foi de 41,4 pontos. A diferença significa que cerca de 40% dos aparelhos que costumam estar ligados no início da tarde não permaneceram sintonizados na propaganda eleitoral.


Ex-senadores pedem votos
Dois ex-senadores que renunciaram ao mandato -Jader Barbalho (PMDB-PA) e Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA)- voltaram a pedir votos em programas eleitorais. O mesmo ocorreu com o ex-presidente Fernando Collor de Mello (PRTB) que, depois de oito anos de inelegibilidade e duas eleições presidenciais, voltou a um programa eleitoral, em Alagoas, onde é candidato ao governo do Estado..


PT e PSB utilizam Lula e Garotinho
O PT e o PSB aproveitaram o tempo dos candidatos ao governo no horário eleitoral gratuito para fazer campanha explícita por seus candidatos à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Anthony Garotinho (PSB). José Serra (PSDB) apareceu apenas em ato de campanha ao lado da candidata Solange Amaral (PFL). Ciro Gomes (PPS) não participou do programa de Jorge Roberto Silveira, candidato da Frente Trabalhista.


Eleição consolida democracia
Nunca antes a Europa, e mais concretamente a Espanha, um dos maiores investidores estrangeiros no Brasil, tinha acompanhado uma eleição presidencial brasileira com tamanho interesse. E não é apenas pelo impacto econômico que uma mudança política poderá acarretar para as empresas que investem neste país. Existe algo mais: a opinião européia, de modo geral, hoje vê o Brasil como uma reserva da Ibero-América, na medida em que o Brasil é hoje um dos países vistos como exemplares, devido à mistura pacífica de raças e religiões que o compõem. É um Brasil, sem dúvida alguma, com vocação de liderança.

Na condição de observador estrangeiro, noto novidades importantes nestas eleições. A mais evidente delas é o comportamento maduro dos grandes meios de comunicação, que, até o momento, não ficam devendo em nada à mídia européia em termos de imparcialidade e objetividade.

Outra surpresa é a maturidade política da população. Se antes se criticava o fato de as eleições no Brasil serem decididas sobretudo pela televisão, hoje isso já não acontece.

Tenho ouvido pessoas sem instrução, trabalhadores do campo e da construção civil, motoristas de táxi e ambulantes fazer análises da situação do país, suas preferências, suas dúvidas diante das urnas, que não ficam nada a dever às de muitos analistas. O Brasil amadureceu de alto a baixo.

Existe, também, uma terceira anomalia. Está acabando a chamada ""era Cardoso". Foram oito anos cujas conquistas para o país podem ser discutidas, mas não negadas.

Nas convulsões econômicas mundiais, todas as crises a asiática, a russa e a argentina- acabaram parando neste país, cuja moeda já resistiu a três vendavais. Visto no exterior como um dos grandes estadistas da América, Cardoso chega ao fim de sua gestão com cerca de 30% de aprovação. Por que o candidato escolhido para defender sua gestão não consegue sair do fim da fila?

Desejo de mudança
As sondagens dizem que 80% dos brasileiros querem uma mudança. Mas mudança é um conceito ambíguo. Na Espanha, tivemos uma primeira "mudança enganosa" que nos tirou do túnel do franquismo, levando-nos, com Felipe González, para um socialismo moderado que foi capaz de transformar a velha e atrasada Espanha ditatorial num dos países mais modernos e prósperos da Europa.

Mas chegou um momento em que os espanhóis, que já tinham s e acomodado na democracia, quiserem mudar de cara. A direita aproveitou para apresentar-se como alternativa moderna, com o jovem Aznar. Elegeram-no como o candidato novo, quando, na realidade, era o herdeiro do velho partido franquista, apesar de ostentar nova roupagem. Neste momento, ainda não se enxerga com clareza que tipo de mudança desejam os eleitores brasileiros.

Os europeus, em nível mais popular, não escondem uma certa simpatia pelo indomável lutador Lula, que arrisca a sorte pela quarta vez, embora a preferência dos empresários seja por Serra.

Mas o que os tranquiliza, apesar de tudo, é que o Brasil já tem sua democracia consolidada; que ficaram para trás, muito distantes, os velhos sabres militares, e que nenhum dos candidatos está propondo alternativas revolucionárias capazes de alterar o rumo democrático do país. E isso não é pouco.


Artigos

Os mercados e a ira
Clóvis Rossi

MONTEVIDÉU - É sempre perigoso deixar-se levar por impressões, mas vou correr o risco: o presidente Fernando Henrique Cardoso deu a impressão, nas inúmeras vezes em que falou aos jornalistas ou a outros públicos em Montevidéu, que está profundamente irritado e magoado com os tais mercados.

Ontem, por exemplo, fez um copioso discurso para empresários uruguaios destinado a tentar provar que a crise no Brasil não existe. É apenas uma questão de percepção dos mercados financeiros, que, obviamente, ele acha equivocada.

Chegou a usar uma expressão sociológica ("dissonância cognitiva") para referir-se à crise. Seria, na sua interpretação, "uma defasagem entre o que ocorre e o que se informa ou se percebe que está ocorrendo".
Foi só na fase de perguntas, posterior ao discurso, que o presidente foi lembrado de que, percepção ou realidade objetiva, o fato é que a turbulência está fazendo com que os empresários fiquem sem crédito, o que, por sua vez, afeta a atividade econômica, o que é muito real.

A irritação com os mercados (ou agentes financeiros ou o nome que se queira dar) é tamanha que FHC contrapôs a política (o que significa ação do Estado) ao mercado. "Sem a política, os mercados também se tornam irracionais", disse.

É verdade que o presidente jamais aceitou que se tivesse rendido aos mercados, ao contrário do que dizem a oposição e muitos críticos independentes. Mas, se de percepção se trata, o que se percebeu nos quase oito anos de governo FHC é que, por inércia ou por convicção, sua gestão deixou-se levar pelos mercados.
Até uma medida que teria sido providencial e que deveria ter sido adotada antes (a desvalorização do real) foi imposta pelos mercados, como o próprio presidente diz vez ou outra.

Talvez por sentir que essa rendição não tenha produzido o reconhecimento esperado por parte dos mercados FHC esteja exibindo essa irritação. Agora, é tarde.


Colunistas

PAINEL

Dissidência tucana
Após romper publicamente com a candidatura José Serra, o tucano Tasso Jereissati (CE) tenta articular uma debanda no PSDB pró-Ciro. O ex-governador prometeu à Frente Trabalhista trazer ao menos 30 deputados até o fim do mês.

Tropa de choque
Além da bancada do PSDB do Ceará, Tasso investe em deputados do NE, de MG e até de SP. Pretende atrair também para a campanha de Ciro os governadores tucanos Albano Franco (SE) e Almir Gabriel (PA) e o ex, Eduardo Azeredo (MG).

Medo de contágio
Arthur Virgílio (PSDB-AM), líder do governo no Congresso e apelidado de "pit bull de FHC", esqueceu de Serra em sua campanha ao Senado. O nome do presidenciável não aparece na maior parte do material de propaganda do candidato tucano.

Inimigo íntimo
A imagem de Ciro chamando um eleitor de "burro" em um programa de rádio foi gravada apenas pela TV de ACM, na BA. Enfurecido, o ex-senador procura quem vazou a fita para o comitê de Serra, que a colocou no ar no programa eleitoral.

Faixa carimbada
Desta vez, Ciro não comentou o jogo da seleção para uma rádio, como fizera na última partida do Brasil em Fortaleza, em março. Alegou que a lei eleitoral o impede. Mas saiu do CE com fama de pé-frio assim mesmo.

Arma ao inimigo
No jingle de Ciro, tocado no programa de TV do presidenciável, está a expressão collorida, para deleite dos seus adversários: "Minha gente".

Memória seletiva
Antônio Cabrera (PTB), candidato de Ciro ao governo de São Paulo, disse no programa eleitoral na TV que foi ministro aos 29 anos. Só esqueceu de dizer que foi nomeado por Fernando Collor de Mello.

Fantasma
Tasso Jereissati assistiu ao primeiro dia de horário eleitoral, anteontem, com Ricardo Teixeira. Mas o tucano não sabia regular a TV de 34 polegadas de seu escritório. A solução foi apelar para o velho Bom-Bril sobre uma antena improvisada. Viu a imagem do amigo Ciro turvada.

Puxão de orelha
Solange Jurema, secretária nacional dos Direitos da Mulher, enviou ontem uma carta a Lula comunicando que sua secretaria já existe há seis meses. Em evento anteontem com lideranças femininas em São Paulo, o petista prometeu criar um órgão federal de direitos da mulher.

Ataque especulativo
Pedro Malan tem atualmente uma outra preocupação além da crise econômica: conter uma invasão de escorpiões na sede do Ministério da Fazenda.

Palanque pesado
O juiz Sideni Pimentel mandou prender por desacato a autoridade um funcionário contratado pela campanha de Zeca do PT para armar o palanque do showmício de Lula ontem à noite em Campo Grande (MS). O palco havia sido montado em frente à entrada do fórum.

Engarrafamento
O showmício de Lula, com Zezé di Camargo e Luciano, rendeu atrito de Zeca do PT com o prefeito de Campo Grande, André Puccinelli (PMDB). O governador queria interditar por três dias a avenida onde seria realizado o evento, mas o prefeito só aceitou por um dia e meio.

Visitas à Folha
Hélio Bicudo (PT), vice-prefeito de São Paulo, visitou ontem a Folha, onde foi recebido em almoço. Estava acompanhado do assessor Marcelo Nobre.

O senador Jorge Bornhausen, presidente nacional do PFL, visitou ontem a Folha.

O embaixador José Aparecido de Oliveira, presidente da Fundação Oscar Niemeyer e secretário de Assuntos Internacionais de Minas Gerais, visitou ontem a Folha.

TIROTEIO

Do deputado Luciano Zica (PT-SP), sobre o grupo de Ciro:
- A única diferença entre o palanque de Ciro e o de Collor em 89 é que o Roberto Jefferson está 70 quilos mais magro.

CONTRAPONTO

Campanha em perigo
Há cerca de um mês, em um comício em Corumbá (MS), Rita Camata (PMDB), vice de Serra, chamou a cidade de "Cuiabá", recebendo em troca uma sonora vaia dos sul-matogrossenses, que odeiam ser confundidos com os vizinhos.
Na noite de anteontem, Rita acompanhou Serra a um comício em Alexânia (GO).
E cometeu uma nova gafe.
Assim que subiu ao palanque, a candidata a vice-presidente começou a elogiar um a um os políticos presentes.
Por último, saudou o anfitrião:
- E aqui ao meu lado o grande governador de Goiás, Marconi Perigo!
Alertada pelo burburinho na platéia, a deputada peemedebista percebeu o fora e tentou consertar:
- Eu sei que o nome do governador é Marconi Perillo. Mas quis dizer que ele é um perigo para os corruptos...


Editorial

SERRA NO ATAQUE

Não há surpresa na tática adotada no primeiro dia da campanha televisiva do tucano José Serra: atacar Ciro Gomes. O candidato governista e o da Frente Trabalhista disputam não apenas uma vaga no turno final das eleições mas também, em boa medida, a mesma fatia do eleitorado e do apoio político e financeiro. Quatorze pontos atrás de Ciro, de acordo com o Datafolha, Serra parece disposto a c orrer os riscos de uma campanha mais agressiva.

O cálculo dos assessores de marketing do candidato do governo tem lógica. O tempo de Serra na TV é muito grande, o que permite dividi-lo entre a chamada campanha positiva (que fala do candidato e de suas principais promessas) e a negativa (que ataca o adversário). Além disso, há um padrão histórico de audiência desses programas que estabelece, grosso modo, os dez primeiros e os dez últimos dias como os de maior visibilidade. E a chance de Serra ir para o segundo turno depende de o governista diminuir rapidamente a sua desvantagem em relação a Ciro Gomes nas pesquisas de intenção de voto.

Mas a opção da campanha de Ciro Gomes de manter-se como que alheia ao tiroteio do adversário também faz sentido. O que indica a mais recente safra de sondagens eleitorais é que o ex-governador do Ceará, se já não sobe, estacionou num patamar que, se for mantido até o fim, muito provavelmente lhe assegurará uma vaga na disputa final. Ao mesmo tempo, o pleiteante da Frente Trabalhista, ao que consta com a ajuda decisiva de Tasso Jereissati, vai temperando o seu discurso agressivo com sinalizações para o "establishment" uma delas tendo sido a adesão do economista brasileiro radicado no exterior José Alexandre Scheinkman.

A questão é saber até que ponto o eleitorado aceita o ataque ao adversário como moeda política. A tentativa de convencer o público dos defeitos do adversário pode ser entendida como tática desesperada de quem está atrás nas pesquisas e, assim, voltar-se contra o candidato que ataca.


Topo da página



08/22/2002


Artigos Relacionados


FH reconhece falha e divide culpa

Heráclito vê falha de segurança na invasão de Tucuruí

Casagrande acha que 'apagão' pode ter sido falha no sistema de segurança

Eficácia de selo de segurança em medicamentos divide senadores

Adequação do modelo agrícola brasileiro à segurança alimentar divide debatedores

Alckmin destaca anúncios em segurança e educação