FH reconhece falha e divide culpa









FH reconhece falha e divide culpa
Presidente lembra que Congresso cortou investimentos previstos no Orçamento desde ano para segurança pública

BRASÍLIA - Os gastos do governo na área de segurança pública são insuficientes, reconheceu ontem o presidente Fernando Henrique Cardoso depois de duas horas de encontro com o presidente de honra do PT e candidato do partido ao Planalto, Luiz Inácio Lula da Silva. A declaração confirma reportagem de ontem do Jornal do Brasil mostrando que a administração federal investe menos no setor do que prevê o Orçamento.

Apesar disso, observou o presidente, a culpa não é integralmente do governo. FH reclamou que o Congresso diminuiu os investimentos no Orçamento de 2002 para a compra de equipamentos e qualificação de policiais. Parte do dinheiro foi remanejada para a construção de presídios. O orçamento deste ano destinava R$ 465,8 milhões para programas de segurança pública. O Congresso remanejou R$ 79,5 milhões. Reduziu os investimentos para R$ 386,2 milhões.

''Faremos o possível para restabelecer os níveis adequados na transferência de recursos para compra de equipamentos para a polícia e, sobretudo, para a instrumentos científicos mais eficazes'', afirmou o presidente.
Fernando Henrique não dividiu responsabilidade com o Legislativo apenas na questão orçamentária. Lembrou que existem propostas para alterar a legislação penal que precisam ser votadas. ''Há projetos que estão há anos, há anos, no Congresso''.

Responsabilidade - Em pronunciamento, depois do encontro, o presidente justificou a ação do governo no combate à violência. Eximiu-se de parte da responsabilidade pelo aumento de crimes, ao lembrar que segurança pública, segundo a Constituição, ''está afeta aos governos estaduais''. Ressaltou, contudo, que ''nas circunstâncias brasileiras, a nenhum de nós é dado deixar de atuar para restabelecer um clima de maior confiança para a população''.

Para reforçar a tese, Fernando Henrique lembrou que, em São Paulo, atuam 600 agentes da Polícia Federal, quando as Polícias Civil e Militar têm contingente de 125 mil integrantes. ''Vejam a desproporção'', pediu para, em seguida, repetir que tal fato não exime a União de responsabilidade. ''O governo federal criou, há dois anos, um Fundo Nacional de Segurança Pública para dotar as polícias estaduais, civis e militares, de melhores instrumentos de ação'', citou o presidente. ''No ano passado distribuímos quase R$ 400 milhões.''

Além do presidente, os gastos federais no setor mobilizaram técnicos do Ministério da Justiça, ontem, no esforço para rebater a reportatem do JB.O secretário-executivo do ministério, Bonifácio Andrada, afirmou que os números registrados pela Comissão de Orçamento da Câmara dos Deputadoss não incluíram os gastos com custeio e outras despesas correntes.

Referia-se a desembolsos obrigatórios do dia-a-dia da administração, como aluguel, contas de telefone e compra de material de escritório. Andrada alegou que a conta não soma os recursos do Fundo Penitenciário. É dinheiro destinado anualmente pelo governo para obras e manutenção de presídios no país.

Os valores levantados na reportagem referem-se especificamente aos investimentos realizados pelo governo na área de segurança pública, com recursos do Ministério da Justiça. Não incluem desembolso com despesas correntes. Os repasses do Fundo Penitenciário também não foram levados em conta por estar incluído em outro item do Orçamento da União.

Somados, investimentos e custeio, mais os recursos do fundo totalizam R$ 1,2 bilhão. Representam 96,13% do orçamento global previsto. Mesmo se tivessem sido levados em conta, os investimentos com recursos do fundo penitenciário em 2001 atingiram apenas 61,34% do previsto. Ou seja, dos R$ 267,5 milhões autorizados, foram gastos R$ 164 milhões.


Violência leva Lula ao Planalto
BRASÍLIA - A morte do prefeito Celso Daniel provocou algo impensável em ano eleitoral. O presidente Fernando Henrique Cardoso reuniu-se ontem com seu principal adversário político, o petista Luiz Inácio Lula da Silva, no Planalto, para discutir segurança pública no País. No fim da conversa, duas linhas de propostas diferentes.

Lula e o presidente do partido, José Dirceu, defendem a elaboração de um amplo programa de segurança, comandado pelo governo federal, para combater o crime organizado e seus braços econômicos, políticos, no Judiciário e na estrutura policial. O programa do PT, elaborado pelo Instituto Cidadania, será apresentado depois do Carnaval. ''Vamos discutir as propostas com os governadores'', disse Lula.

Fernando Henrique não se eximiu de apoiar o que chamou de ''uma verdadeira guerra'' contra o crime organizado. Mas defendeu uma ''política de todos'', descentralizada. Segundo ele, cabe ao Planalto trabalhar ''integradamente'', com ''apoio'' aos governadores e prefeituras que devem assumir responsabilidades. ''Se queremos travar uma guerra, se queremos restabelecer a paz, que haja, a todos os níveis, preocupação com essas questões''.

A conversa, da qual participaram os ministros Aloysio Nunes e Alberto Cardoso, durou quase duas horas. O último encontro entre FH e Lula ocorreu em dezembro de 1998, no Alvorada. Na ocasião, Lula foi a contragosto. Acabara de perder as eleições, no primeiro turno, para o tucano. Mas pela insistência do então governador de Brasília, Cristovam Buarque (PT), aceitou visitar o presidente reeleito.

Primeiro colocado nas pesquisas para a sucessão presidencial, Lula não quis dar a impressão de que tirava proveito político da morte de Celso Daniel. O PT de Brasília havia preparado uma carreata para conduzi-lo do aeroporto até o Planalto, mas Lula pediu discrição. Por isso, apenas meia dúzia dos petistas o acompanharam à Praça dos Três Poderes. Além da escolta de policiais militares. ''Não fomos nós quem pedimos isso'', esclareceu Dirceu.

Lula pediu empenho do presidente no esclarecimento da morte de Celso Daniel. E lembrou que o PT já advertira o ministro da Justiça sobre ameaças de uma organização que se identifica como Farb (Forças Armadas Revolucionárias Brasileiras).


Fim do pré- pago agita bolsa de SP
BRASÍLIA - O governo reluta em levar adiante a proposta de proibir a venda de telefones celulares pré-pagos no país. A sugestão partiu do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, como medida de combate ao crime organizado. Há inúmeras resistências à proposta, inclusive dentro do governo. O próprio presidente Fernando Henrique Cardoso mostrou essa hesitação. ''Estamos avaliando. Há prós e contras'', resumiu.

Fernando Henrique se reuniu com o ministro das Comunicações, Pimenta da Veiga, e o presidente da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), Renato Guerreiro. De manhã, no programa semanal de rádio, Fernando Henrique dissera que o celular pré-pago passou a ser um ''instrumento importante do crime''. Pimenta da Veiga, no entanto, pensa diferente. Classificou de ''precipitada'' a medida e disse que impedir as vendas não vai acabar com o crime.

Os especialistas estão do lado do ministro. ''A proposta do governador é até ingênua'', diz Dário Dalpiaz, consultor em telecomunicações e membro nacional do Conselho de Usuários de Telefonia. ''Uma atitude dessas distruiria o mercado.''

Na Bolsa de Valores de São Paulo, ontem, a indecisão sobre o fim dos pré-pagos abalou os investidores e derrubou o preço das ações da Telesp Celular. Os papéis cairam 1,3%. O fim do pré-pago teria impacto violento para as operadoras. No Brasil existem 28,7 milhões de aparelhos celulares. Destes, 19,5 são pré-pagos. Um mês depois de postos à venda, em dezembro de 1998, já representavam 38% de todo o sistema de telefonia móvel. Na região Sudest e, os pré-pagos respondem por algo entre 60% a 80% do sistema. Dos cinco milhões de clientes da Telesp Celular, 66% usam o serviço.

Dário Dalpiaz sugere medidas alternativas, como a intermediação de ligações feitas nos arredores de presídios. A alternativa defendida pela Anatel é o uso de bloqueadores de comunicação nas penitenciárias. Desde o ano passado inúmeros testes foram feitos, mas os resultados mantidos em sigilo. A Anatel alega medidas de segurança. Fernando Henrique marcou data para o início do bloqueio. ''Acredito que até o final de fevereiro ou o início de março estaremos instalando esses aparelhos'', anunciou Fernando Henrique.


A distorção dos números
Garotinho ressuscita programa de segurança pública e usa dados para se promover

Não há outro assunto em política, depois do assassinato do prefeito Celso Daniel, que não a violência. Foi esse o mote da conversa entre o governador Anthony Garotinho e a candidata ao governo de São Paulo, deputada Luiza Erundina (PSB), ontem, em almoço no Palácio Guanabara. Garotinho ressuscitou um calhamaço de 245 páginas, feito em 2000, e o entregou a Erundina como contribuição à campanha da ex-prefeita. Segundo ele, o estudo foi entregue em 2000 ao então ministro da Justiça, José Gregori. O governador apresentou também índices que mostrariam um invejável desempenho na área da segurança pública. Mas um exame detalhado prova que números, às vezes, enganam.

Garotinho comparou índices dos primeiros três anos de Marcello Alencar (95/96/97) com o mesmo tempo de sua gestão (99/2000/2001). O método dá margem a distorções, como no caso dos seqüestros. O governador alardeou queda de 87% nos casos registrados (de 243 para 32). Mas excluiu o último ano do governo tucano, quando o número de seqüestros despencou para 18, contra os 137 registrados em 1995 - uma queda de 86,7%.
Mesmo alertado, Garotinho insistiu em tomar para si os louros pelo desempenho positivo: garantiu que antes havia subnotificação dos casos e atribuiu a redução da criminalidade em sua gestão ao afastamento de policiais. Mas, pelo menos na Delegacia Anti-Seqüestro, a equipe do governo anterior só saiu, promovida, no segundo semestre de 99.

O governador citou, ainda, o que classificou de modernização do registro dos casos de violência. Mas desconsiderou que em alguns índices, como os de homicídios, a mudança torna a comparação impossível. Ela separou diferentes categorias de homicídios. Assim, latrocínios (roubo com morte) ou encontros de cadáveres não são mais contados como homicídios.

As primeiras 43 páginas do plano apresentado pelo governador enumeram programas sociais, como o Cheque-Cidadão, e terminam com três fotos da primeira-dama, Rosângela Matheus, pré-candidata do governo.


Ameaças chegam por dois provedores
Aumenta número de mensagens virtuais endereçadas a petistas e assinadas pela suposta Farb. PF comanda investigação

BRASÍLIA - O número de mensagens com ameaças a integrantes do PT aumentou nos últimos dias, depois da morte do prefeito de Santo André (SP), Celso Daniel. Rastreamento da Polícia Federal identificou 23 novos recados provocadores, enviados pela internet, a parlamentares do partido. A investigação virtual levou os agentes a dois endereços eletrônicos e a dois provedores de onde partem os e-mails.

Além do presidente do partido, deputado José Dirceu (SP), receberam recados ameaçadores o candidato ao governo de São Paulo, José Genoíno, a senadora Heloísa Helena (AL) e a ex-prefeita de Santos e deputada Telma de Souza. Os texto avisa: ''seu fim está próximo. você vai morrer. você não é à prova de bala. você vai morrer. você e todos os traidores do pt''.

A PF segue três linhas de investigação para descobrir a identidade do mensageiro. O texto está assinado em nome da Frente de Ação Revolucionária Brasileira (Farb). O internauta que enviou os últimos e-mails estaria, segundo apuração da PF, utilizando o provedor do portal Terra (www.terra.com.br) para acessar a Web. Na internet, usou o site de notícias CNOL (www.cnol.com.br), de Maringá (PR), que contém um formulário com os endereços virtuais de deputados e senadores. Tanto o Terra quanto o CNOL estão colaborando com as investigações.

Autoria - Até agora, contudo, não foi possível descobrir o autor das mensagens dos últimos dias e se têm alguma relação com as endereçadas ao Congresso no fim do ano passado. Da mesma maneira, não dá para confirmar a participação do suposto grupo Farb - qualquer internauta pode acessar o CNOL e enviar e-mails aos parlamentares.

A terceira linha de apuração leva os agentes federais aos Estados Unidos. As primeiras informações da Polícia Federal mostram que o domínio farb.com foi registrado na cidade de Englewood, no Colorado, por meio de uma empresa americana, a Verio (www.verio.net). Seria a suposta ligação do autor das mensagens com a tal Frente. Para chegar à Verio, porém, a PF vai pedir ajuda ao FBI, a polícia federal americana.

Especialistas em informática que orientam a ação da PF afirmam que o domínio foi pago com cartão de crédito. Se ficar constatado que tal documento não é falso, o dono do farb.com pode ser preso nos próximos dias.

Ainda esta semana a PF envia um grupo de técnicos a São Paulo para montar um segundo laudo na tentativa de rastrear o responsável pelas mensagens. Embora não existam indícios claros, os agentes federais acreditam que partiram da mesma pessoa.

Real ou fictícia, a ameaça levou líderes do PT a aumentar a segurança. A prefeita de São Paulo, Marta Suplicy, por exemplo, anda acompanhada por seis policiais militares, pagos pelo Estado. O prefeito de Ribeirão Preto, Antônio Palocci, cotado para assumir o lugar de Celso Daniel como coordenador do programa de governo de Luiz Inácio Lula da Silva, se locomove em carro blindado e protegido por colete a prova de bala.


Conta do apagão fica sem multa
Banco Central proíbe cobrança e aconselha consumidores a pedir ressarcimento à agência que incluiu o acréscimo

BRASÍLIA - Os consumidores que tinham conta com vencimento na segunda-feira, dia do apagão e não puderam pagá-la, não podem sofrer multa. A determinação foi dada ontem pelo Banco Central (BC). A instituição aconselha as pessoas que pagaram multa ontem a pedir ressarcimento ao banco que fez a cobrança indevida. Outra boa notícia para o consumidor: quem teve algum eletrodoméstico ouaparelho elétrico danificado durante o blecaute pode pedir ressarcimento para as distribuidoras de energia.

De acordo com a Associação Nacional de Assistência ao Consumidor e Trabalhador (Anacont), o consumidor deve fazer um orçamento para saber quanto pagaria pelo conserto do aparelho danificado. Depois, deve entrar em contato com a Light ou a Cerj, no caso de municípios do Estado do Rio. Cada empresa vai então avaliar se se arca ou não com as despesa estimada do conserto. ''Havendo dano, a fornecedora de serviços é a responsável. Não importa se a concessionária tem culpa, ou não'', diz o presidente da Anacont, José Roberto de Oliveira. O consumidor pode recorrer se a concessionária de energia elétrica negar o ressarcimento.

Segundo a Anacont, nos casos de prejuízo de até 40 salários mínimos – ou o equivalente a R$ 7.200 –, a pessoa prejudicada pelo blecaute pode entrar se dirigir ao Juizado Especial de seu bairro – antigo Juizado de Pequenas Causas. Se a perda é de até R$ 3.600, ou 20 salários mínimos, não há necessidade de contratar um advogado, que só entra em cena se essa quantia passar de R$ 3.600 e ficar em até R$ 7.200. Se o prejuízo for maior que R$ 7.200, o consumidor pode entrar com uma ação de indenização na Justiça comum. ''Uma das ocorrências que as concessionárias não atendem, num pedido de ressarcimento é a perda de dado s no computador, ocasionado pelo blecaute'', esclarece Oliveira. Ele lembra que depois do blecaute de 11 de março de 1999 – que durou cerca de quarenta minutos e afetou as regiões Sudeste e Centro Oeste, principalmente – 10 mil consumidores da Light receberam ressarcimento. Esse total representa 35% dos pedidos de indenização que foram feitos para a Light.

Levantamento da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), mostra que o apagão de 1999 resultou na indenização de R$ 1,4 milhão em todo o país. Foram 14.426 consumidores que se sentiram prejudicados e que solicitaram ressarcimento. Deste total, 61% dos pedidos foram atendidos – média de R$ 160 de ressarcimento por cada pedido.


Artigos

Sem milagre
Luís Guilherme Vieira e Amilcar Siqueira

Há muito os juristas dedicados ao Direito Penal vêm chamando a atenção dos governantes para que o embate eficaz, não o panfletário e popularesco, contra a criminalidade violenta não se resolverá a pequeno prazo. Há de haver vontade e coragem para enfrentar o problema como um todo. Ninguém mais se ilude com a ''inflação legislativa penal'', como adverte o professor Nilo Batista.

O professor Antonio Carlos Barandier, em artigo publicado no JB há mais de 10 anos, quando a lei dos crimes hediondos completava o primeiro aniversário, comentava a crença dos leigos na eficácia da atrocidade com que se ameaçam os delitos. Essa crença é alimentada por grandiosas campanhas publicitárias, repetidas a cada ocorrência de um fato mais grave, como o seqüestro e morte do prefeito de Santo André, Celso Daniel. As mais altas autoridades da República vieram a público emprestar a inteligência da Polícia Federal.

Estão cumprindo parte de seu dever ou estariam expiando culpas de crônica omissão anterior? O que terá de fazer o cidadão da base piramidal da sociedade para enfrentar seu cotidiano de roubos, seqüestros-relâmpagos e outros delitos, sem as inteligências mobilizadas só nos crimes extraordinários?

Será que nossos dirigentes ainda não perceberam a absoluta inutilidade das soluções propostas e adotadas? Ora é botar as Forças Armadas na rua, ora é considerar hediondos quase todos os crimes, para vedar qualquer tipo de abrandamento na execução da pena, ora é o açodamento de bradar pela prisão perpétua, como recentemente decantado por pré-candidato do PT ao governo paulista, fazendo-nos lembrar folclórico parlamentar fluminense que durante anos, enganando a população, se elegeu com a plataforma da pena de morte. Acaso a criminalidade diminuiu nesses últimos tempos em que a lei endureceu?

A sociedade, ora representada por leitor do JB (21.1.01), está a denunciar ''a falência do Estado como fiador da cidadania. Não temos estadistas e os direitos civis são coisas do passado.''

Sem diminuirmos o abismo que isola a maioria da população, alijada da economia, do consumo, da dignidade; sem oferecermos trabalho, escola, saúde e moradia; sem incluirmos os excluídos, todo e qualquer retrocesso em matéria de pena retributiva aos criminosos, se adotado fosse, num acesso de insânia, em nada contribuiria, como nunca contribuiu, para minorar as agruras do povo.

A medida de combate à criminalidade há de ser a médio e longo prazos. Esse prazo há de ser iniciado já (os governantes perdem muito tempo quando o assunto não lhes toca diretamente). Deve-se iniciar, repita-se, dando-se, aos excluídos, trabalho, escola, saúde e moradia, que lhes permita, com dignidade, ter opção de vida. Sem passar por esse caminho não haverá solução. É aguardar, mãos atadas e amordaçado, o próximo crime de repercussão nacional. Milagres, nessa seara, não existem.


Colunistas

COISAS DE POLÍTICA – Dora Kramer

Acabou-se o que nunca foi doce
Está praticamente decidido, faltando apenas ser anunciado: o PMDB vai cancelar as prévias marcadas para 17 de março, abandonar a idéia de candidatura própria e aceitar a proposta de José Serra para compor a chapa à Presidência da República, indicando o vice. O predileto é o governador de Pernambuco, Jarbas Vasconcelos, que, no entanto, estava resistindo, a despeito de ser um aliado de primeiríssima hora de Serra.

Surge, ainda tênue, outro nome: o do prefeito de Joinvile (SC), Luiz Henrique, que já foi ministro de Estado, presidente do PMDB e, até onde a vista alcança, não tem aqueles problemas de biografia que andam acabando com a carreira política de muita gente. Mas essa conversa de nomes para a vaga oferecida por Serra é uma etapa a ser cumprida mais adiante.

No momento, o comando do PMDB está às voltas com um problema mais complicado: administrar a retirada das pré-candidaturas de Itamar Franco, Pedro Simon e Raul Jungmann. A Itamar busca-se oferecer uma saída confortável, dado que disposição mesmo de concorrer à presidência é o que menos tem o governador de Minas a essa altura.

Simon, se não entender o recado em bases mais sutis - por exemplo, percebendo a movimentação do comando pemedebista que se iniciaria ontem -, será então explicitamente convidado a renunciar ao mandato de senador (ele tem mais quatro anos) e correr o risco da derrota. A situação atual, avaliam dirigentes do partido, é cômoda, pois, do ponto de vista da própria carreira, não teria compromisso com a vitória.

Com o ministro Raul Jungmann, o PMDB não terá dificuldade interna, dado que ele já entendeu perfeitamente o caráter de farsa que tinha não apenas a prévia, mas a tese da candidatura própria. Esta servia apenas para o partido se cacifar junto ao PSDB, necessidade que desapareceu no momento em que José Serra ofereceu a vice em conversa bastante objetiva com Michel Temer, presidente do PMDB.

Pode haver, entretanto, alguma turbulência externa, uma vez que Jungmann estava mesmo disposto a disputar. No mínimo, para viabilizar seu futuro político e, ainda que seja para concorrer a uma vaga de deputado federal, fazê-lo na condição de político integrante da cena política nacional e não apenas de Pernambuco, seu Estado.

Jungmann, então, está considerando dois caminhos: o do conflito, aberto, pelo qual sairia denunciando a farsa da candidatura própria e o do vôo solo, prosseguindo como anticandidato. E, no limite, não se pode descartar a possibilidade de Raul Jungmann deixar o PMDB. O ministro ficou particularmente irritado com as reações de Itamar e Simon às cartas que enviou a ambos, convidando-os para um debate entre os postulantes.

O governador de Minas respondeu que não debatia com ''auxiliares'' e Simon disse que só iria se Itamar aceitasse também. Ao mineiro, Jungmann enviou um recado lembrando que ele também já foi ''auxiliar'' de Fernando Henrique Cardoso, na condição de embaixador do Brasil junto à OEA e em Portugal.

O golpe
A manobra usada para dar sustentação legal à decisão de não fazer mais a prévia, foi engendrada pela direção do partido há algum tempo, quando propôs e os partidários de Itamar Franco aceitaram, adiar a data inicialmente marcada pela convenção do partido, que era 20 de janeiro. Como, por aquela decisão, nova data poderia ser marcada ad referendum da convenção, a executiva entendeu que, domingo, dia 20, expirou a validade da resolução, o que deixaria o comando livre para fazer o que quiser.

E o que os pemedebistas mais querem agora é apressar as negociações com Serra, para fechar o acordo e, na repetição da aliança firmada em 1994 e renovada em 1998, trocarem de posição com o PFL. Nas duas ocasiões anteriores, os pefelistas tiveram precedência porque, em 1994, o PMDB teve candidato próprio (Orestes Quércia) e, na eleição seguinte, o partido se dividiu, mas não fez aliança formal com FH. Não lhe deu, por exemplo, o precioso tempo de televisão.

A pressa guarda relação com a certeza de qu e a candidatura de Roseana Sarney não vai prosperar e que o PFL, então, vai querer entrar na aliança. E, desta vez, o PMDB pretende chegar primeiro.

Sem dubiedade
Os pemedebistas não têm nada contra o PFL integrar a aliança, desde que o faça na condição de sócio minoritário. E, para isso, as conversas com Serra, de agora em diante, incluirão uma exigência fundamental: que não haja, como nas duas campanhas de FH, dubiedade de apoios aos candidatos regionais.

O PMDB quer que o candidato deixe claro de que lado está, sem prejuízo, no entanto, de depois vir a aceitar o apoio de quem quer que seja. Na opinião dos dirigentes, quanto mais urgente for formalizado o acerto, mais condições terá o partido de negociar com Serra essa posição privilegiada. Onde houver palanques do PMDB, o PSDB deve dar preferência explícita a eles, seja para se aliar ou apoiar.


Editorial

O QUINTO DEDO

A crise da violência paulista ultrapassou o limite suportável da criminalidade. Desta vez, a população deseja que as autoridades encaminhem as providências já existentes em teoria e as transformem numa prática férrea contra o crime organizado no país, contra os seqüestros e a impunidade, e pela reforma radical do sistema policial.

Antes que se alastre o jogo de empurra entre autoridades - cada uma delas se defendendo pela não concretização do Plano Nacional de Segurança que foi criado em 2000 e praticamente não saiu do papel - é preciso acompanhar com cuidado os próximos passos. Existem muitas sugestões, no ar, de combate ao crime. Na Câmara foram apresentadas 118 propostas, das quais nenhuma foi votada e algumas beiram o ridículo. Logo depois da derrubada das torres gêmeas em Nova York, a 11 de setembro, o presidente da Câmara, Aécio Neves, reuniu todos os projetos e pediu aos líderes que passassem uma peneira neles, retendo apenas os principais, e pusessem mãos à obra na elaboração de um grande projeto que equacione os principais problemas da insegurança nas cidades.

Algumas das providências têm de passar por mudanças constitucionais, como a unificação das polícias, primeiro passo para a integração das inteligências das secretarias de Segurança estaduais. Outras têm a ver com o reaparelhamento das polícias convencionais e a reabilitação das polícias técnicas para que se dê início no Brasil à era das investigações, a começar pela tomada de impressões digitais no local do crime, passando pela elaboração de arquivos nacionais de fácil consulta, chegando à subordinação das polícias ao Ministério Público.

O caso da execução dos prefeitos de Santo André e Campinas, por sua repercussão no plano político e na sensibilidade da população, mostra que a ação anticrime não pode mais ser adiada. A questão da segurança vem de longe. Basta lembrar que um dos cinco dedos da primeira campanha de Fernando Henrique, há sete anos, era exatamente a segurança. A investida contra a criminalidade é uma verdadeira guerra. O papel do governo federal não é apenas distribuir verbas - coisa que vem sendo feita com exagerada parcimônia - mas contribuir para a reabilitação da polícia. A maneira mais eficiente de combater a crise da segurança, como disse um especialista, é investir na reforma da polícia e no sistema prisional para que aumente a eficiência das investigações e reduza a impunidade. No caso paulista, a migração dos ladrões de bancos para os seqüestros não foi sequer acompanhada por troca de informações entre as delegacias especializadas - aspecto lamentável da desunião entre as diversas polícias.

O seqüestro é hoje um crime tão difundido que seu número só não cresceu em Santa Catarina e no Rio. Se a tendência não for quebrada agora o Brasil corre o risco de se transformar na Colômbia dos anos 90, na qual se formou um Estado dentro do Estado. Começar é sempre fácil. Difícil é voltar para a normalidade.


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01/23/2002


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