Alvaro Dias: sigilo no caso dos cartões fere a democracia e a República



O senador Alvaro Dias (PSDB-PR) fez, nesta segunda-feira (5), discurso remontando todo o caso dos cartões corporativos . Apoiado em um amplo arsenal jurídico e em retrospectiva das notícias sobre o caso, o parlamentar exigiu "irrestrita" apuração das denúncias de mau uso dos cartões como uma medida de respeito à democracia e ao regime republicano.

O discurso ocorreu a dois dias da audiência pública em que será ouvida a chefe da Casa Civil, ministra Dilma Rousseff, na Comissão de Serviços de Infra-Estrutura (CI). Alvaro Dias começou dizendo que homenagearia o deputado Ricardo Izar (PTB-SP), morto na sexta-feira (2), da forma mais justa possível a quem presidiu o Conselho de Ética da Câmara dos Deputados: faria um pronunciamento sobre a crise ética em que se envolveu o governo por causa dos cartões e gastos com as contas de tipo B.

Segundo o senador, além de se recusar a abrir as informações sobre seus gastos corporativos, o atual governo montou, na Casa Civil, dossiê com o objetivo de lançar suspeitas sobre essas despesas durante o governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Em seguida, cobrou de Alvaro Dias a revelação da pessoa que entregou a ele cópia desse levantamento.

De acordo com o senador, cumprindo seu dever parlamentar e o seu compromisso com a Nação, a oposição articulou a instalação de uma comissão parlamentar mista de inquérito (CPMI) para apurar as denúncias. No entanto, como saída para frustrar, antecipadamente, uma investigação regular que poderia chegar às despesas pessoais do presidente da República e de seus familiares, o governo articulou uma "operação de guerra".

Alvaro Dias lamentou os esforços do atual governo para impedir as investigações da CPI Mista, principalmente com a alegação, baseada em dispositivo da Constituição, de que a exposição de dados e informações colocaria em risco a segurança do Estado.

- Despesas de caráter pessoal, como a compra de roupas, bebidas e alimentos, não têm nada a ver com segurança do Estado - contestou.

Alvaro Dias lembrou que o papel do Congresso Nacional não é só legislar, mas também fiscalizar os atos do Poder Executivo.

- A mentira foi institucionalizada para sonegar as informações que a Casa Civil tinha o dever de prestar como uma das exigências elementares do Estado de Direito Democrático - argumentou, citando o artigo 33 da Constituição, no qual se consagra o direito de todo cidadão de "receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral".

O senador pelo Paraná acusou ainda o governo de tentar controlar o pensamento dos brasileiros por meio da distorção de palavras e expressões, transformando, por exemplo, "dossiê" em "banco de dados". Anteriormente, na época do mensalão, trocara "caixa dois" por "recursos não-contabilizados". Para Alvaro Dias, essa atitude equivaleria à criação da "novilíngua" pelo regime ditatorial retratado no livro 1984, de George Orwell.

Segundo avaliou, a tentativa de fazê-lo dizer o nome de quem lhe entregou a cópia do dossiê fere suas garantias constitucionais como parlamentar. Lembrando que a senadora Ideli Salvatti (PT-SC) o acusou de omissão, Alvaro Dias disse que ela "ignora, ou finge ignorar", o artigo 53 da Constituição: "Os deputados e senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos" e "não serão obrigados a testemunhar sobre informações recebidas ou prestadas em razão do exercício do mandato, nem sobre as pessoas que lhes confiaram ou deles receberam informações."

- Quando da elaboração da carta constitucional, o [atual] senador Eduardo Suplicy (PT-SP) disse considerar esse dispositivo como fundamental - relembrou, mencionando ainda, sobre esse direito, parecer favorável do Supremo Tribunal Federal (STF), proferido pelo ministro Celso de Mello.

Para o senador do PSDB, os gastos pessoais do presidente da República, que o governo procurou rotular de despesas inerentes à segurança do Estado, devem ser públicos. Para reforçar seu argumento, o parlamentar baseou-se outra vez em parecer de Celso de Mello: "A gestão republicana do poder e a publicidade dos atos governamentais são uma exigência imposta pela ordem democrática e pelo princípio da moralidade administrativa".

Alvaro Dias também avaliou que o costume do sigilo é um resquício do regime militar (1964-1984) e fez parte da doutrina da segurança nacional. Nessa perspectiva, aconselhou a leitura de artigo do jurista Geraldo Ataliba acerca do artigo 37 da Constituição, que trata dos princípios fundamentais para a Administração Pública, entre os quais o da publicidade de atos administrativos.

- Não há prerrogativas majestáticas. O chefe do Executivo não manda no povo. É, pelo contrário, seu mandatário, para obedecer às leis. Seu poder não vem da Divindade, nem de outra fonte que não o mandato popular -, sustentou.

Também foram lembradas por Alvaro Dias as palavras de Thomas Jefferson (1743-1826), o terceiro presidente dos Estados Unidos: "Se uma nação espera ser ignorante e livre num estado de civilização, espera o que jamais existiu e existirá. Onde a imprensa é livre e todo homem sabe ler, tudo estará em segurança".

Por fim, o senador qualificou de "permissivo" o ministro da Justiça, Tarso Genro, por ter considerado a elaboração de dossiês uma prática normal e corriqueira em qualquer governo.

- Com o objetivo de justificar os métodos surrealistas de investigação da Polícia Federal, ou seja, a apuração de quem vazou a notícia da existência do dossiê sem se preocupar com quem o organizou, chegou ao extremo da permissividade ao afirmar que montar dossiês contra adversários políticos não só é necessário, como também é correto - salientou.

Senador traça "Cronologia da crise"

05/05/2008

Agência Senado


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