Após quatro meses de processo, Senado decide destino de Renan nesta quarta



"Eu lutei 120 dias com sofrimento, com dor, com a exposição da minha família para provar a minha verdade, a minha inocência. Não tem sentido, absolutamente nenhum sentido, que agora se faça isso", afirmou o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) ao justificar aos jornalistas, na manhã desta terça-feira (11), por que não cogita a possibilidade de renunciar à Presidência do Senado Federal.

Quase quatro meses após a denúncia da revista Veja que deu início ao processo por quebra de decoro parlamentar que terá seu desfecho nesta quarta-feira (12), no Plenário do Senado Federal, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) reafirma sua inocência e sua disposição em permanecer no cargo com a mesma convicção dos primeiros dias.

Uma postura que pouco ou nada parece ter-se alterado, mesmo após a aprovação, por 11 votos a quatro, no Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, de um relatório que contradiz a argumentação construída em sua defesa. Para os relatores Marisa Serrano (PSDB-MS) e Renato Casagrande (PSB-ES), autores do parecer que, convertido em Projeto de Resolução do Senado, será apreciado por toda a Casa nesta quarta-feira, Renan teria exposto o Senado perante a opinião pública quando se valeu do funcionário de uma empreiteira com acesso a verbas públicas para pagar pensão a uma filha que teve num relacionamento extraconjugal com a jornalista Mônica Veloso.

O relatório concluiu que o presidente do Senado mentiu quando afirmou que teria arcado com a pensão alimentícia com recursos próprios, advindos de sua renda enquanto parlamentar e de operações agropecuárias. De acordo com os documentos apresentados, periciados pela Polícia Federal, o senador não teria capacidade financeira para arcar com suas despesas pessoais.

Para cobrir as lacunas encontradas durante as investigações, ele acrescentou, entre suas fontes de renda, a verba indenizatória de senador. Em seguida, informou ter firmado um empréstimo não declarado à Receita Federal para fazer frente a despesas em seu estado, para as quais não haveria recursos.

Os relatores concluíram que Renan Calheiros "faltou com a verdade" perante o Conselho de Ética e o Senado como um todo, ao apresentar documentos que não comprovam suas afirmações de inocência; ao deixar de apresentar documentos necessários à comprovação das denúncias contra ele; e ao apresentar informações e documentos de maneira "oportunista", com a "crível" intenção de manipular os resultados das investigações.

Conselho de Ética

A comissão de inquérito encarregada de conduzir as investigações no Conselho de Ética no primeiro processo por quebra de decoro parlamentar contra o senador Renan Calheiros foi composta por três senadores - Marisa Serrano, Renato Casagrande e Almeida Lima (PMDB-SE). Este último, por discordar da posição adotada pelos outros dois, não assinou o relatório aprovado. Ao invés disso, optou por apresentar um voto em separado, em que recomendou o arquivamento da representação, já que, a seu ver, não haveria nada no processo que indicasse ter havido quebra de decoro parlamentar por parte do senador Renan.

Antes da constituição da comissão de inquérito, no entanto, uma série de percalços marcaram a instalação do processo no colegiado e a chamada "primeira fase" das investigações. O PSOL, partido autor da representação, protocolou o documento no dia 29 de maio junto à Corregedoria do Senado, quando deveria tê-lo feito junto à Mesa. Em conseqüência, o presidente do Conselho de Ética, Sibá Machado (PT-AC), eleito em 30 de junho, teve que enviar a representação, que havia recebido do corregedor Romeu Tuma (DEM-SP), de volta à Mesa, para respeitar o rito regimental.

A Mesa, no entanto, é presidida pelo presidente do Senado, e, sob críticas e recomendações dos colegas para que se afastasse do cargo, o próprio senador Renan Calheiros se encarregou de enviar a representação de volta ao conselho, determinando a abertura do processo por quebra de decoro contra ele próprio.

O senador Sibá Machado, então, designou o senador Epitácio Cafeteira (PTB-MA) relator da representação, e a ele foram remetidos todos os dados que já haviam sido coletados até aquele momento pelo senador Romeu Tuma, que vinha recolhendo documentos e tomando depoimentos.

No dia 13 de junho, após receber a defesa do senador Renan Calheiros, o Conselho de Ética se reuniu para apreciar o relatório do senador Epitácio Cafeteira, que, após a análise dos autos, recomendou o arquivamento do processo, em virtude "da absoluta ausência ou indício mínimo de provas contra o presidente do Senado".

A oposição, no entanto, protestou e pediu vistas, acusando o relator de "arquivamento sumário do processo", já que sequer haviam sido ouvidas as testemunhas necessárias à formação de um juízo. Os senadores Marconi Perillo (PSDB-GO), Demóstenes Torres (DEM-GO) e Jefferson Péres (PDT-AM) chegaram, inclusive, a apresentar votos em separado solicitando a tomada de depoimentos e a realização de uma perícia nos documentos encaminhados pelo senador Renan.

A perícia se tornou pertinente porque, em 15 de junho, o Jornal Nacional, da Rede Globo, veiculou reportagem segundo a qual parte das notas fiscais apresentadas por Renan como comprovação de venda de gado, suposta fonte dos recursos utilizados no pagamento da pensão à sua filha, seria de empresas inativas, multadas por extravio de notas fiscais ou cujos donos alegam jamais terem feito negócios com o político.

A perícia, então, foi feita pela Polícia Federal em tempo recorde, e a reunião foi remarcada para o dia 19 de junho. Nesse ínterim, o colegiado tomou os depoimentos do funcionário da Mendes Júnior, Cláudio Gontijo, e do advogado da jornalista Mônica Veloso, Pedro Calmon.

No entanto, o senador Epitácio Cafeteira, irritado diante dos apelos para que fizesse modificações em seu relatório, acabou sofrendo um acidente em casa, e, licenciado, precisou ser substituído. Inicialmente, seu posto foi ocupado pelo senador Wellington Salgado (PMDB-MG), que permaneceu menos de 24 horas no cargo. Diante do impasse que havia se instalado no órgão e sob intensa pressão, no dia 26 de junho, o próprio presidente do conselho, Sibá Machado, apresentou seu pedido de renúncia.

Conclusão do relatório

A "segunda fase" do processo por quebra de decoro parlamentar contra o senador Renan Calheiros começou no dia 27 de junho, quando, eleito presidente do Conselho de Ética, o senador Leomar Quintanilha (PMDB-TO) convidou o senador Renato Casagrande (PSB-ES) a assumir a relatoria do caso, e, com o convite aceito, voltou atrás, alegando que "vícios" do processo precisavam ser "sanados" antes de prosseguir com as investigações.

Quintanilha citou uma nota informativa que havia sido elaborada pela Consultoria Legislativa e um parecer da Advocacia Geral do Senado para fundamentar a devolução do processo à Mesa Diretora. Um dos vícios apontados seria o fato de o presidente Renan Calheiros ter encaminhado a representação do PSOL ao conselho sem ter consultado os demais membros da Mesa. Em reunião sem a participação de Renan, a Mesa devolveu o processo ao colegiado.

Saneados os vícios, o conselho decidiu, então, pela instalação da comissão de inquérito, composta pelos três relatores. A equipe decidiu requisitar à Polícia Federal, mediante a devida solicitação da Mesa, que concluísse a perícia nos documentos apresentados pelo senador Renan em sua defesa, já que a primeira perícia, realizada num período muito curto, não havia sido conclusiva.

Os senadores se dedicaram, então, a fazer um levantamento de todos os documentos que seriam necessários à conclusão do trabalho da Polícia Federal, para que o parecer do órgão servisse de base para o relatório do conselho. O trabalho de leva ntamento dos documentos junto às partes do processo e junto a todos os órgãos, empresas e pessoas físicas citados pela defesa levou cerca de um mês.

O laudo da PF foi entregue ao Conselho de Ética no dia 21 de agosto. Apesar de atestar a autenticidade de todos os documentos apresentados, a perícia concluiu, em muitos casos, que houve "incompatibilidades e inconsistências" entre notas fiscais, saques e depósitos em contas correntes e guias relativas à venda e transporte de gado, entre outros.

Em virtude das dúvidas, o senador Renan Calheiros foi convidado a prestar esclarecimentos ao conselho, e, no dia 23, foi ouvido pelos três relatores e pelo presidente, Leomar Quintanilha. Após seu depoimento, o senador Renato Casagrande, frisou que as contradições persistiam.

A leitura dos votos no Plenário do Conselho, no dia 30 de julho - o dos senadores Marisa Serrano e Renato Casagrande, pela perda do mandato, e o do senador Almeida Lima, pelo arquivamento da representação - , foi acompanhada de intenso debate regimental sobre o procedimento que deveria ser adotado na votação no conselho. Contrariando o próprio presidente do órgão, que, munido de parecer da consultoria legislativa, defendia a votação fechada, a maioria optou pelo voto aberto.

No dia 5 de setembro, o conselho de Ética e Decoro Parlamentar aprovou, por 11 votos a quatro, o relatório de Serrano e Casagrande que recomendou a perda de mandato do senador Renan Calheiros, por quebra de decoro parlamentar. O senador Wellington Salgado chegou a apresentar um voto em separado pela improcedência da representação dos dois relatores, mas seu texto não foi posto em votação. No mesmo dia, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) considerou a matéria procedente sob os aspectos constitucional, legal e jurídico, e ela foi enviada à Mesa.

Outros processos

Há outras três representações por quebra de decoro parlamentar protocoladas contra o senador Renan Calheiros - duas delas já tramitam no conselho. A primeira delas, de autoria do PSOL, pretende investigar a denúncia, publicada pela revista Veja, de que Renan teria utilizado seu prestígio político para beneficiar a cervejaria Schincariol após a mesma ter adquirido uma empresa de seu irmão, deputado Olavo Calheiros (PMDB-AL), por preço acima do de mercado.

A segunda, também baseada em denúncia da Veja, foi protocolada pelo DEM e pelo PSDB, e tem o objetivo de apurar a suspeita de que Renan Calheiros seria sócio oculto de empresas de comunicação em Alagoas.

A última representação, também protocolada pelo PSOL, ainda não foi enviada ao conselho. Ela deverá investigar a denúncia, divulgada pelas revistas Veja e Época, de que Renan seria parceiro do lobista Luiz Garcia Coelho num esquema de arrecadação de propinas em ministérios chefiados pelo PMDB.

11/09/2007

Agência Senado


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