As estratégias para o segundo turno










As estratégias para o segundo turno
Para enfrentar José Serra (PSDB-SP) no segundo turno da eleição presidencial, o PT pretende se concentrar em buscar apoios não só dos líderes nacionais, mas também regionais. Na madrugada de ontem, os estrategistas do candidato Luiz Inácio Lula da Silva começaram a mapear a situação nos Estados.

Ontem, em entrevista coletiva, ao lado das principais estrelas do PT, Lula reafirmou que as alianças serão negociadas pelo partido e não por ele. E adiantou que ocorrerão com base no programa ou envolvendo uma participação num eventual governo do PT, mas não admitiu que pretenda oferecer cargos.

Lula planeja encontros com Anthony Garotinho (PSB) e Ciro Gomes (PPS) – adversários no primeiro turno – e líderes partidários como os ex-governadores Miguel Arraes, do PSB, e Leonel Brizola, do PDT. Os contatos já foram feitos pelo presidente do PT, deputado José Dirceu (SP). Com Ciro, Lula chegou a conversar na madrugada de ontem, e os dois devem se encontrar hoje.
O partido pretende investir em deputados bem votados no pleito, que não puderam apoiar o PT no primeiro turno por causa da verticalização imposta pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e em prefeitos envolvidos em eleições estaduais.

Lula também deverá percorrer o país para “aumentar a adrenalina dos militantes”, segundo sua própria avaliação. Diante disso, o PT quer propor a redução do número de debates. A intenção é intensificar as visitas aos grandes colégios eleitorais, como Minas Gerais, e aos oito Estados onde o PT disputa o segundo turno.

A avaliação do comando petista é de que os 46% obtidos no primeiro turno estão consolidados e que bastaria obter um terço dos votos dos eleitores de Anthony Garotinho (PSB) e Ciro Gomes (PPS). Daí a pressa do partido em tentar obter um apoio formal de ambos. O PT também não pretende recusar o apoio de políticos como Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA) e Paulo Maluf (PPB-SP), mas não fará acordos formais.

A estratégia de campanha, considerada vitoriosa pelos petistas, só sofrerá pequenos ajustes. O alvo principal será o atual modelo econômico e os problemas do governo.


Fernando Henrique critica especulação
Para o presidente Fernando Henrique Cardoso, a eleição comprovou que o Brasil é um país democrático, “onde o debate de idéias é livre”.

Questionado ontem sobre possíveis instabilidades no mercado financeiro provocadas pelo fato de Luiz Inácio Lula da Silva não ter indicado os nomes que comporão seu possível governo, o presidente disse que o candidato do PT, vitorioso no primeiro turno da eleição presidencial, tem razão em querer indicar seu ministério por completo nessa fase do processo eleitoral.

– Não creio que seja correto colocar pressão em alguém que não é presidente ainda – afirmou FH.
Segundo o presidente, a preocupação deve ser com o país e não com conjecturas sobre uma eleição ainda indefinida.


Lula em vantagem para cientistas
Será muito difícil para José Serra diminuir a vantagem de Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, na disputa no segundo turno pela Presidência. A opinião é dos cientistas políticos Lúcia Hipólito e Fabiano Santos, diretor executivo do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj). Para eles, só um fato de muito impacto na campanha para Serra dobrar seus votos e vencer a eleição, ainda mais tendo praticamente esgotada sua cota de alianças políticas.


Fiesp recomenda moderação
O presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Horácio Lafer Piva, defendeu um segundo turno em que os candidatos detalhem as propostas de governo e evitem exacerbar o confronto, para facilitar a formação de um governo de coalizão, independentemente de quem saia vencedor.

– Lula e Serra devem evitar o confronto. A população não quer isso. E se tiver uma campanha de confronto, fica difícil conversar depois de três semanas – disse Piva.


Tarso va Tarso vai em busca de alianças
Emissários entraram em contato com outros partidos

O primeiro dia do candidato da Frente Popular, Tarso Genro, no duelo do segundo turno foi marcado por entrevistas a rádios e televisões, reuniões para analisar o resultado da primeira fase da disputa e definir a política de alianças. No final da tarde, um grupo do PT foi à sede do PSB para começar a acertar futuros apoios.

Nas entrevistas, Tarso destacou o desempenho como uma vitória, já que o partido havia ampliado de 29% para mais de 35% a preferência entre os eleitores. No segundo turno, os programas de cinco minutos no rádio e tevê – classificados como “latifúndios” pelo candidato –, que teve 2min50s no primeiro turno, vão permitir um debate de programas com o adversário Germano Rigotto.
A confiança na igualdade de condições para enfrentar Rigotto também foi demonstrada pelo candidato à Presidência, Luís Inácio Lula da Silva, em entrevista realizada ontem em São Paulo. Questionado por Zero Hora, Lula disse que, ao contrário das outras vezes, o PT gaúcho enfrentou duas forças políticas, se referindo ao PMDB de Rigotto e ao PPS de Antônio Britto.

– Eram duas forças, inclusive com mais tempo na tevê. Agora, o Tarso terá os mesmos 10 minutos do Rigotto. Já derrotamos ele em Caxias e estou convencido que vamos derrotá-lo novamente – disse Lula, referindo-se à derrota para o prefeito Pepe Vargas, em 1994.

Ontem mesmo, às 17h50min, um grupo de emissários do PT, liderados pelo presidente estadual do partido, David Stival, entrava na sede estadual do PSB para costurar o apoio dos socialistas à Frente Popular (PT-PC do B-PCB-PMN). Foi a primeira peça encaixada na engrenagem de alianças que o PT pretende movimentar no segundo turno.

– Estamos aqui para retomar a Frente Popular, com o PSB junto – adiantou Stival.

O presidente estadual do PSB, Beto Albuquerque, participou do encontro, junto com o candidato ao Piratini, Caleb de Oliveira. O PSB quer anunciar ainda hoje o apoio à Frente Popular.

As demais peças para ampliar a força eleitoral são o PV, o PSTU e o PL.
O lance mais espetacular da política de alianças do PT – ainda que seja uma hipótese – seria o apoio do PTB, de Sérgio Zambiasi. Stival disse que já conversou com o presidente estadual do PTB, Cláudio Manfrói, e com Zambiasi, sobre o voto do senador petebista eleito a Lula. O apoio ao PT gaúcho também teria sido cogitado.


Rigotto articula novos apoios
Entre uma entrevista e outra – só pela manhã, foram sete, depois de apenas quatro horas de sono – o candidato Germano Rigotto (PMDB) começou a costurar ontem os apoios que deverão ampliar a composição da União pelo Rio Grande, formada pelo PMDB com PSDB e PHS.

Com 41,18% dos votos do eleitorado gaúcho no primeiro turno, o peemedebista reservou a manhã de ontem para visitar veículos de comunicação e reunir-se com a coordenação de sua campanha. O descanso a que raramente se reservou o direito durante a corrida pelo Piratini em primeiro turno foi uma exigência durante a tarde, no primeiro dia depois de garantida sua participação na segunda etapa da disputa.

Hospedado no Hotel Intercity, próximo ao comitê de sua coligação, Rigotto ainda acabou concedendo mais entrevistas por telefone, mas só deixou o apartamento para uma breve reunião com sua equipe de comunicação, no início da tarde. Do quarto, ele mesmo começou a capitanear adesões de outros partidos para o segundo turno. À noite, participou de um programa de televisão de uma emissora local.

Apoio formal, por enquanto, só mesmo a declaração escancarada do ex-governador Antônio Britto (PPS), que abriu seu voto ao ex-companheiro do PMDB já no doming o, durante a entrevista coletiva em que reconheceu sua derrota. O coordenador da campanha de Rigotto, Alberto Oliveira, ainda não dá detalhes de que espaço Britto ocupará no palanque do peemedebista. Em Caxias do Sul, entretanto, a equipe do comitê de Britto já se integrou à militância de Rigotto. O presidente estadual do PMDB, Cézar Schirmer, também considera “natural” a aproximação, apesar do racha na legenda no ano passado.

Para Schirmer, “o futuro do Rio Grande do Sul é maior que o PMDB”.

– A união será ampliada com quem tiver identificação com a nossa proposta. Não queremos adesões só por serem contra o outro projeto – reforçou Oliveira, insistindo no que Rigotto repetiu no domingo.


O desempenho nos Estados
O Tribunal Superior Eleitoral divulgou os números para a Presidência até as 19h30min

Em um total de 114.876.976 votos apurado até as 19h30min de ontem pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, obteve 39.302.054 votos, ou o equivalente a 41,61% dos votos válidos. Serra registrou um percentual de 20,79, à frente Garotinho, com 16,01% e de Ciro, com 10,73%.

No Rio Grande do Sul, o candidato do PT alcançou 41,70% e apresentou quase 12 pontos percentuais sobre o seu oponente do segundo turno, José Serra (PSDB), com 29,91% dos votos válidos. O número de eleitores no Estado foi de 7.352.139, e houve 955.451 abstenção, ou 13% dos votantes (em todo o país a abstenção foi de 17,77%).

Lula garantiu seu maior percentual em Santa Catarina. Ele mais do que dobrou os 21,42% dos votos de Serra ao fazer 52,09% dos válidos. Os mineiros também confirmaram a tendência do domingo e garantiram ao candidato do PT um percentual de 47,46, contra 20,27 de Serra.

Em São Paulo, o maior colégio eleitoral do país, Lula conquistou 42,20% do eleitorado e Serra chegou a 26,14%. Anthony Garotinho obteve a maior votação somente no Rio. Obteve 39,57% e superou os 37,70% concedidos a Lula. Um dos pontos curiosos da votação no importante colégio do Rio foi a inexpressiva votação de Serra, o terceiro colocado, com 8,28%. Garotinho também conquistou importante desempenho no Distrito Federal, Maranhão e Espírito Santo, os Estados em que ficou em segundo lugar. Em Brasília, conquistou 17,16% dos votos, no Maranhão obteve 19,69% e no Espírito Santo 24,66% do eleitorado.


Os derrotados da eleição
Carreiras políticas construídas há décadas sofreram um forte abalo nas eleições deste ano. As urnas também refugaram projetos de reconstrução de imagem de políticos afastados temporariamente dos cargos públicos. O eleitor foi implacável com mitos como o ex-governador Leonel Brizola (PDT), sexto colocado na disputa por duas vagas ao Senado pelo Rio, Orestes Quércia (PMDB), outro candidato a senador por São Paulo, e Paulo Maluf (PPB), que brigou pelo governo do seu Estado. Também ficaram pelo caminho alguns gaúchos – os candidatos Antônio Britto (PPS), ao Piratini, Emília Fernandes (PT), ao Senado, e deputados consagrados. Outro que já está em casa – mas não se sabe se para sempre – é o ex-presidente Fernando Collor (PRTB), alijado da disputa pelo governo alagoano no primeito turno.


Britto
Ex-governador chegou a ter 40% nas pesquisas, mas acabou em terceiro lugar

Um dia depois de abertas as urnas do Rio Grande do Sul, cientistas políticos e correligionários ainda buscavam uma explicação para a trajetória surpreendentemente descendente do ex-governador Antônio Britto (PPS), que, de líder nas pesquisas de intenção de voto para o governo do Rio Grande do Sul, despencou para o terceiro lugar na votação final.

Britto chegou a comemorar um pico de 40,6% em agosto, de acordo com o Cepa-UFRGS, mas acabou em terceira colocação na corrida para o Palácio Piratini, com 725.722 votos (12,31%).
Para muitos, a desgraça de Britto começou a ser desenhada em 20 de setembro de 2001, numa reunião de mais de seis horas madrugada adentro em seu apartamento, no bairro Bela Vista, em Porto Alegre.

Naquela conversa, Britto tomou a decisão de trocar os holofotes do PMDB por uma sigla que a maioria dos gaúchos sequer conhecia a origem: o PPS. Desde aquele momento, o ex-governador confiava que um insistente discurso anti-PT somado a uma mudança radical de sua imagem pública seriam suficientes para voltar ao Piratini.

Outra decisão, tomada seis meses antes, em março, também pode ter sido fatal para Britto. Convidado para uma vaga no conselho de administração das operadoras celulares Telemig e Tele Norte, representando o Banco Opportunity, o ex-governador assumiu o cargo. O emprego virou um prato cheio para o PT atacá-lo durante a maior parte da campanha e foi pauta obrigatória nos programas do horário eleitoral gratuito.

Até o senador Pedro Simon (PMDB) usou o episódio Opportunity para atacá-lo. No dia 5 de maio deste ano, no primeiro ato de apoio à candidatura de Germano Rigotto (PMDB) ao governo, Simon abriu fogo contra o ex-companheiro de legenda e antigo confidente, sem piedade:
– Quando era governador, Britto privatizou a telefonia e hoje trabalha para o Opportunity. É a primeira vez que acontece isso. O cidadão larga o governo e vai trabalhar numa instituição financeira que dirige a companhia telefônica.

Imediatamente, os ataques de Simon tiveram eco no PT. Para analistas políticos, a troca de partido e o “sim” ao cargo no Banco Opportunity foram erros fatais que teriam levado Britto à derrota de ontem nas urnas.

Na carona de Britto, o deputado estadual Germano Bonow (PFL) trocou uma reeleição certa pela possibilidade de ser vice-governador. Outro companheiro fiel, o deputado estadual Paulo Odone tentou, também sem sucesso, uma cadeira na Câmara dos Deputados.

– Britto se convenceu que apenas o carisma e o antipetismo eram suficientes para ganhar a eleição, mas errou – avalia o cientista político e professor da UFRGS Benedito Tadeu César.
Iniciada a propaganda na TV e no rádio, no dia 20 de agosto, Britto entrou no terceiro ato de sua derrocada. Com ataques fulminantes ao PT, o ex-governador começou a cair nas pesquisas, com o agravante de ter menos espaço nos programas do que Rigotto.


Fogaça
O experiente senador não conseguiu emplacar o terceiro mandato, ficando em quarto lugar na disputa

As eleições de 2002 encerraram o segundo mandato do senador José Fogaça (PPS). Um dia antes de votar, o homem que em 1986 obteve o voto de 1.510.064 gaúchos e em 1994 repetiu o cadeira com 1.627.482 já admitia estar vencido. Por ironia, Fogaça nunca teve uma votação tão grande em números absolutos – 1.812.670. Mas o crescimento não se refletiu nos percentuais. O senador alcançou 28,34% do eleitorado.

A conquista do terceiro mandato era considerada por Fogaça “quase um milagre eleitoral” no sábado. No domingo, ao votar na Escola Estadual Uruguai, em Porto Alegre, o senador citou a estrutura partidária ao falar sobre suas possibilidades eleitorais.

Fogaça deixou o PMDB para ingressar no PPS, ao lado de um grupo de dissidentes liderado por Britto. O senador lembrou que enquanto o PMDB conta com cerca de 120 prefeituras no Estado, o PPS só tem uma:
– E o prefeito foi eleito pelo PMDB. De certo modo, é surpreendente que a gente esteja disputando a eleição.

Eleito para o primeiro mandato em 1986, Fogaça atuou na elaboração da Constituinte de 1988.


Brizola
O ex-governador ficou em sexto lugar na disputa por uma vaga ao Senado

Tradicional palco de romarias de militantes trabalhistas, o confortável apartamento de Leonel de Moura Brizola à beira-mar, em Copacabana, no Rio, amanheceu na segunda-feira sob um silêncio eloqüente.

A ausência do alarido da militância era uma forma de solidariedade ao homem que impediu um golpe de Est ado e lutou contra outro, que governou o Rio Grande do Sul uma vez e o Rio duas vezes, que sorria ao ser apontado como inimigo número um da ditadura militar que manietou o país por 20 anos.

Os trabalhistas guardavam respeito misericordioso pelo seu líder, que sofreu no domingo a maior derrota eleitoral em seus 80 anos de vida. Com 1,2 milhão de votos, Brizola amargou o sexto lugar na disputa a uma vaga no Senado pelo Rio. Perdeu para Sérgio Cabral Filho (PMDB, eleito senador) e Artur da Távola (PSDB) e para os virtualmente desconhecidos Edson Santos (PT), Manoel Ferreira (PPB) e Marcelo Crivella (PL), o segundo eleito como senador pelo Rio. Foi para Ferreira e Crivella, ambos bispos pentecostais, que Brizola guardou as mais ácidas críticas.
- Acho que vou fundar uma religião, fazer uma hortinha no Nordeste e falar em nome de Deus, embora seja pecado. A Igreja Universal tem 600 comitês eleitorais só no Rio, com nomes de templos. Eu só fiz escolas, não igrejas - disse Brizola ao votar domingo no Colégio Municipal Eça de Queiroz, em Copacabana.

O que aconteceu no Rio foi uma transfusão de votos, cabos eleitorais e práticas populistas do trabalhismo para a dupla Garotinho-Rosinha (PSB), ex-brizolistas brigados com o líder. Ela levou o governo do Estado. Ele fez boa campanha para a Presidência da República e promete voltar com força em 2006.

Brizola não foi o únivo pedetista a perder a eleição no Rio. O candidato do seu partido ao governo do Estado, Jorge Roberto Silveira (ex-prefeito por duas vezes de Niterói e filho de um governador), ficou em terceiro lugar.

Fora do Rio, o desempenho do PDT foi igualmente acanhado. Dos 26 Estados da Federação, em apenas três o partido chegou ao segundo turno para governador (com Waldez da Silva, no Amapá, Álvaro Dias, no Paraná, e Jackson Lago, no Maranhão).

Em outros dois, o aliado PPS venceu a eleição (Blairo Maggi, em Mato Grosso) ou vai disputar o segundo turno (Eduardo Braga, no Amazonas). Para o Senado, os pedetistas tiveram eleitos em Sergipe, no Amazonas, no Paraná e em Roraima - contra 10 eleitos do PT, por exemplo. O candidato Ciro Gomes (PPS), apoiado por Brizola na briga pela Presidência, ficou em quarto lurgar. No Rio Grande do Sul, o ungido por Brizola, Antônio Britto (PPS), ficou em terceiro lugar.

Nada disso parece abalar o veterano político. Ciente de que estava derrotado nas urnas, Brizola anunciou ainda no domingo que apoiará Lula no segundo turno e que pode voltar a concorrer:
- O PDT e o Brizola são plantas do deserto. Basta um gota de orvalho e já reverdejamos. Deixa pensarem que somos cachorros mortos. Sou de uma geração que vai durar 110 anos. Nos últimos 10, vou descansar, mas até os cem anos vou estar aí, andando para frente, de bem com a vida.


Ventos e labaredas
No dia 24 de agosto, Leonel Brizola levou Ciro Gomes e Antônio Britto para o batismo do trabalhismo no túmulo de Getúlio Vargas em São Borja. Não se separava de um vidrinho marrom. Ao sair do cemitério, passou o mimo para o candidato a deputado estadual Carlos Chaise e desfez o mistério:
- É terra de São Borja.

Estava faceiro, apesar de ter sido desrespeitado pouco antes por um discípulo atrevido. Um rapaz aproximou-se do túmulo e gritou bem às costas de Brizola:
- Estão enterrando o trabalhismo.

O ex-governador nem se virou para ver o entrevero. Em estado de graça, com Ciro em segundo nas pesquisas e Britto como novo afilhado, andava sempre à frente de todos nas caminhadas em São Borja, Itaqui e Uruguaiana. Abria os discursos, era paparicado por Patrícia Pillar, ganhava beijos estalados de trabalhistas veteranas e gurias.

Com 80 anos, pretendia pilotar uma nova Aliança Nacional, a articulação que tentou levar Getúlio ao poder pelo voto em 1929. Discursava para atacar Fernando Henrique, Garotinho, Lula, com o vigor de quem segurou a campanha da Legalidade aos 38 anos. E poetava:
- Desejo a todos uma linda primavera.

Numa granja em Itaqui, todos tinham pressa para chegar ao comício em Uruguaiana. Ele ficava para trás, só para prosear com os peões:
- E qual é a taxa de natalidade das porcas?

O que se via ali, sem o amparo dos palanques, era um homem de 80 anos, vagoroso, casaco sob o braço. No churrasco à noite, numa fazenda de Uruguaiana, o vento batia forte. Os convidados chegavam e se refugiavam na casa. Brizola passeava em volta do fogo ao relento, examinava as costelas espetadas.

- E se a gente puxar as mesas para cá e sentar aqui mesmo?

Os friorentos riam e seguiam adiante. Mesmo com vento às costas, Brizola preferia ter ficado à fresca, ao redor das labaredas.


Emília
Por 84,45 mil votos, Emília ficou atrás do companheiro de legenda

Para a senadora Emília Fernandes (PT), que perdeu a vaga no Senado para o companheiro de partido Paulo Paim por 84,45 mil votos, a última frase ouvida ontem de Luiz Inácio Lula da Silva, por telefone, foi o reconhecimento de sua importância para a sigla.

– Vou precisar de ti – disse o candidato à Presidência, em convite expresso para que ela compareça aos palanques do segundo turno.

Filiada ao PT desde o ano passado, depois de passar por PTB e PDT, Emília havia conseguido a façanha de derrotar nomes históricos do partido, como o deputado estadual Flávio Koutzii, na disputa pela indicação ao Senado.

Na casa de Carlinhos, filho e assessor, a senadora se preparava ontem para viajar a Brasília e participar das votações no Senado até quinta-feira. Na sexta, volta ao Estado para trabalhar na campanha de Tarso Genro.

A senadora não se considera derrotada, porque participa do “mesmo projeto político” que Paim. Ela admitiu que acompanhar a divulgação dos resultados parciais da votação, nos quais ficou à frente de Paim várias vezes, foi emocionante. Quanto ao futuro político, diz ter planos apenas para o curto prazo: participar da campanha de Tarso e Lula no segundo turno.

– No dia 28, vou começar a pensar na estratégia de vida partidária, na construção de projetos para dois ou quatro anos.

Apesar de encontrar algumas resistências dentro do PT, a senadora conquistou admiradores entre os petistas ao adotar o palanque do partido no segundo turno das eleições de 1996, 1998 e 2000, enquanto ainda estava filiada a siglas adversárias. O respeito de líderes como o presidente estadual da sigla, David Stival, pode garantir uma indicação do partido para um cargo na equipe de Lula ou de Tarso, se eleitos.


Fortunati
Candidato não se elege, mesmo com a quinta maior votação do PDT

Antes de votar, no domingo, o ex-candidato a governador pelo PDT José Fortunati cumpriu um roteiro religioso. Às 8h15min, desembarcou com a mulher, Regina, 44 anos, no Santuário Sagrado Coração de Jesus, onde está localizado o túmulo de Padre Reus, em São Leopoldo:
– Minha mãe levou um tombo aos sete meses de gestação e fez até promessa para que eu nascesse bem. Meu nome completo ficou José Alberto Reus Fortunati.

Não foi desta vez que Padre Reus ajudou o vereador Fortunati a conquistar uma cadeira na Câmara pelo PDT, mesmo conquistando 50,18 mil votos em uma campanha de apenas 45 dias. Largando tarde, depois da malograda candidatura ao governo estadual, Fortunati não conseguiu buscar votos como gostaria:
– Foi uma campanha curta e atípica.

Vereador mais votado em 2000, Fortunati admitiu a “decepção por não ter atingido o objetivo” de se eleger deputado federal pela terceira vez. Mas ficou satisfeito com a safra de eleitores.
– 50 mil votos são 50 mil votos. Foi uma votação muito boa – disse.

Como disputava o governo estadual e renunciou no final de julho, Fortunati não pôde planejar a campanha para deputado. Dos 200 municípios onde poderia colecionar votos, atuou em 10. E os comitês do PDT já haviam definido as candi daturas preferenciais. Ao contrário de outros derrotados, que preferiram não se manifestar ontem, Fortunati mantinha-se cordial. Disse que se emocionou, no dia da votação, com as manifestações de eleitores, inclusive de outros partidos.


Rolim
Deputado perdeu espaço para vereadora do mesmo partido

A disputa pelos votos dos defensores dos direitos humanos com a deputada estadual Maria do Rosário pode ter custado a reeleição ao deputado federal Marcos Rolim (PT). Apesar de ter feito uma votação maior do que a de 1998, Rolim não passou da quarta suplência, com 58.889 votos. Presidente da Comissão de Direitos Humanos (CDH) da Assembléia Legislativa, Maria do Rosário foi a mais votada da bancada federal gaúcha: 143.882 votos.

– Se ela não tivesse sido candidata, com certeza eu teria uma votação maior – admite, com relutância, o deputado.

Um dos membros mais atuantes da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, Rolim trabalhou em ações de combate aos maus-tratos nos presídios, de incentivo à adoção e contra práticas de tortura. Mesmo sem mandato, ele pretende continuar a trabalhar nessa área.

Por enquanto, Rolim diz que os planos incluem encerrar o mandato com a mesma dedicação e estudar propostas de trabalho. Apesar de comemorar a votação expressiva, que elegeu oito deputados federais, ele prevê “uma campanha difícil, que vai depender muito do nosso esforço” para o segundo turno no Estado.

No próximo sábado, o deputado se reúne com correligionários para discutir e resolver a “sensação de orfandade” que restou da disputa. Do futuro político, ele faz mistério.

– Ainda tenho de estudar como vou pagar as dívidas de campanha – desconversa.


Collor
Ex-presidente da República fracassa ao tentar voltar à política

Despejado da Presidência da República por corrupção, Fernando Collor de Mello (PRTB), 53 anos, não quis se manifestar ontem sobre a fracassada tentativa de voltar à política como governador de Alagoas. Patrolado pelo governador Ronaldo Lessa (PSB) na reta final do primeiro turno, Collor preferiu o silêncio. Assessores informaram que ele estaria descansando em sua mansão, no bairro de Murilópolis (Maceió), sem agenda.

A derrota de Collor também implodiu o plano de ressuscitar a chamada República de Alagoas. Os principais candidatos à Câmara que apoiavam o ex-presidente não foram eleitos. Ficaram fora Arnon Affonso de Mello (filho de Collor), seu primo Euclides de Mello, Vitório Malta (irmão de Rosane Collor) e o deputado Augusto Farias (irmão de Paulo César Farias, o PC, que foi tesoureiro de campanha em 1989). O candidato ao Senado, Geraldo Bulhões, amargou o quinto lugar.
Nascido no Rio, Collor foi prefeito nomeado de Maceió e eleito governador em 1986. No segundo dia como presidente do país, confiscou as contas bancárias da população e de empresas. Denunciado por sangrar os cofres públicos em conluio com PC Farias, sofreu processo de impeachment e teve de renunciar, em 1992.

Collor não quis falar sobre a derrota. Lessa, que enfrentou uma campanha suja, comentou a performance do ex-presidente:
– Antes de se candidatar novamente, ele deve fazer um exame psiquiátrico. Collor mente compulsivamente.

O filho de Collor, Arnon Affonso, 26 anos, afundou na tentativa de se eleger deputado federal pelo PRTB. Ele não morava em Alagoas, estudou desde o Ensino Fundamental no Exterior e graduou-se em Economia na Universidade de Chicago. A mãe dele, Lilibeth Monteiro de Carvalho (primeira mulher de Collor), chegou a transferir o título de eleitor do Rio para Maceió. Não adiantou.


Quércia
Ex-governador paulista não consegue vaga para o Senado

Candidato a uma das duas vagas de senador por São Paulo, o ex-governador Orestes Quércia (PMDB) teve a pretensão de voltar a um cargo público frustrada por um terceiro lugar na votação. Perdeu para Aloizio Mercadante (PT) e Romeu Tuma (PFL). Com uma diferença de 1,7 milhão de votos para Tuma, Quércia ficou longe de voltar aos seus bons tempos de cacique político do Estado. Nem o aval do senador Pedro Simon, que defendeu Quércia no horário eleitoral gratuito, nem a aparição em palanque ao lado de Lula conseguiram alavancar sua candidatura, também embalada pelo MR-8.

– Se o povo de São Paulo for inteligente como eu acho que é, irá votar em Orestes Quércia e Aloizio Mercadante para o Senado – declarou Lula, no último programa do PMDB no horário eleitoral gratuito antes do primeiro turno das eleições.

Até ser envolvido em denúncias de corrupção, quando ocupou o governo de São Paulo, Quércia havia construído uma sólida carreira política desde 1969, quando assumiu a prefeitura de Campinas, segundo maior colégio eleitoral de São Paulo, aos 31 anos. Em 1974 conseguiu se eleger para o Senado. Aos 49 anos, em março de 1987, assumiu o governo do Estado. Afastado das disputas políticas desde 1998, quando ficou em quinto lugar na votação para governador de São Paulo, Quércia dirige com mão-de-ferro o diretório estadual do partido.

Empresário, o ex-governador mantém vários negócios – imobiliárias, consórcio de automóveis, indústria de alimentos, agropecuária e comunicação.


Maluf
Cacique político amargou a quarta derrota na disputa a governador de São Paulo

Ao perder a quarta disputa para governador de São Paulo, Paulo Maluf (PPB), 71 anos, negou ontem que a derrota, ainda no primeiro turno das eleições, possa decretar o início do fim do malufismo. Aos jornalistas, retrucou:
– Por que vocês não perguntaram se o Lula havia acabado em 1989, em 1994 e em 1998? Antes diziam que o Jânio Quadros estava morto, mas ele veio para São Paulo e ganhou as eleições para prefeito, concorrendo com Fernando Henrique. José Serra também perdeu as eleições para a prefeitura de São Paulo para Luiza Erundina.

Maluf observou que perder e ganhar “faz parte do jogo democrático”. Disse que estava agradecido pelos 4,3 milhões de votos recebidos das urnas.

– Estes votos são um capital suficiente para influir e desestabilizar uma candidatura à Presidência ou ao governo do Estado – afirmou Maluf, antecipando que eventuais apoios, no segundo turno, serão definidos pela direção do partido.

O candidato derrotado chegou a liderar as pesquisas de intenção de voto, tendo um percentual superior à soma de Geraldo Alckmin (PSDB) e José Genoino (PT), os que vão disputar o segundo turno. Mas foi despencando até estacionar no terceiro lugar.

– Esse momento foi do PT, houve uma ventania petista. Não identifiquei falhas na campanha, não me considero em absoluto derrotado, a população de São Paulo me fez vencedor – disse Maluf.


Bornhausen
O presidente do PFL apostou, sem sucesso, no filho e em Ciro

Presidente nacional do PFL há quase 10 anos, o senador Jorge Bornhausen não conseguiu eleger o filho, Paulo, para ocupar uma das duas vagas por Santa Catarina. O herdeiro da herança política dos Bornhausen fez a quarta votação, atrás dos candidatos do PT, do PSDB e do PPB.

Bornhausen também saiu desgastado por ter apoiado ostensivamente Ciro Gomes para a Presidência. Além de ter se empenhado para obter o apoio de 16 diretórios estaduais do PFL, Bornhausen esteve ao lado do ex-senador Antônio Carlos Magalhães (que foi reeleito no pleito depois de renunciar ano passado) no apoio ao candidato do PPS.

O ex-governador catarinense aderiu à campanha de Ciro depois de ver naufragar a candidatura da ex-governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PFL), que renunciou em abril à disputa depois de ter seu nome associado a denúncias de corrupção na Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam).

A habilidade de articulação que o fez convencer o partido a apoiar a candidat ura de Fernando Henrique Cardoso em 1994 não conseguiu fortalecer a candidatura de Ciro, o quarto colocado no Estado, com pouco mais de 7% dos votos. Seu atual mandato vai até 2007.


Como Tarso ficou em segundo
A campanha petista começou com críticas a Britto, enquanto Rigotto crescia nas pesquisas

As tensas prévias que definiram o candidato ao governo do Estado, em março de 2002, marcaram os passos iniciais do PT na disputa pelo Palácio Piratini. O clima fratricida se instaurou entre as correntes que apoiavam o então prefeito de Porto Alegre, Tarso Genro, e o governador Olívio Dutra. Expressões como “roseanar”, “stalinista”, “vacilão” e “preconceituoso” voavam como pedras lançadas de um lado a outro. A indicação de Miguel Rossetto, da Democracia Socialista (DS), para o cargo de vice-governador, apaziguou ânimos.

Os manifestos de apoio lançados em março expuseram as críticas mútuas. O texto pró-Tarso era contundente contra o governo: “Não seria tarefa impossível encontrar seis, sete ou mais motivos para atacar o companheiro Olívio e seu governo. Para isso, bastaria valer-se dos argumentos que boa parte da imprensa e do senso comum reproduzem Rio Grande afora”. Houve um intenso debate interno para calibrar a associação de Tarso com a gestão de Olívio. Segundo um integrante do núcleo central de coordenação da campanha, nunca se cogitou apagar o vínculo: a pauta era o grau da defesa que o candidato teria de fazer do governo.

Nas aparições públicas, Tarso jamais criticou o governo Olívio Dutra. Adotou a política de analisar a administração no atacado, e não no varejo. Exaltava o desempenho da economia – os 11% de elevação do Produto Interno Bruto (PIB), contra os 0,8% do anterior – e o caráter alternativo ao modelo neoliberal. Rossetto, ao contrário, era mais detalhista em debates, comícios e entrevistas.

José Eduardo Utzig, o comandante da campanha, sempre garantiu que Tarso defenderia o governo com naturalidade. As tarefas adicionais para conquistar indecisos e demover o sentimento anti-PT seriam polarizar com Antônio Britto, vincular-se com a candidatura Lula e despertar a paixão dos militantes.

– O PT começou fazendo uma campanha de oposição a Antônio Britto, mas isso acelerou um resultado secundário, o crescimento de Rigotto – explica o cientista político Francisco Ferraz.

Apostando na força irradiadora da militância, dos simpatizantes e dos tradicionais movimentos sociais que o apóiam, o PT conseguiu colocar 90 mil pessoas no Largo da Epatur, em 30 de setembro, no showmício com Luiz Inácio Lula da Silva, mas não rompeu o cerco a ponto de atrair indecisos e ir além do um terço cativo do partido. No comício, Tarso fez um pacto com a multidão.

– Um terço está fechado conosco, mas precisamos visitar o terço da população que ainda não decidiu o voto – propôs.

A considerar o desempenho das urnas, ou a estratégia fracassou ou apenas conteve a rejeição e impediu que a candidatura se inviabilizasse. A mobilização se deu por meio de atos políticos que mais pareciam missas – pelo caráter de exaltação de dogmas e convicções para um público já crente – ou shows, pelas cenas de idolatria aos líderes do partido, disputados para autógrafos, beijos ou apertos de mão, da mesma forma como fãs se atiram sobre seus ídolos pop. O PT discursava para si mesmo.


Como Rigotto virou o placar
A pesquisa Cepa-UFRGS publicada por Zero Hora em 22 de setembro foi a ponta do iceberg na campanha de Germano Rigotto. E quando o imenso bloco da mobilização do PMDB apareceu por inteiro, Rigotto acabou no segundo turno da eleição para o governo do Rio Grande do Sul, superando Tarso Genro (PT).

A pesquisa tornou pública as conseqüências de uma mexida na campanha do PMDB e do PSDB ocorrida 20 dias antes. O levantamento do Cepa foi o primeiro a mostrar Rigotto ganhando de todos os oponentes no segundo turno da eleição, mas ainda colocava o candidato em terceiro lugar na disputa do primeiro turno.

2 de setembro
A história da pesquisa Cepa-UFRGS publicada em 22 de setembro começou no dia 2. Depois do lançamento do programa de governo de Rigotto, no Hotel Everest, um grupo de peemedebistas subiu para a Sala Iene, no 9º andar. Estavam no encontro o então candidato a deputado federal Eliseu Padilha, o presidente do partido, Cezar Schirmer, o coordenador-geral da campanha, Alberto Oliveira, e assessores. Naquele momento, o Ibope mostrava que Rigotto passara dos 4% para 9%.

Padilha sentou ao contrário na cadeira, a barriga junto ao encosto. E foi enfático:
– O partido vai ter de desembarcar na campanha agora. Temos um programa bom.

Schirmer foi duramente cobrado na reunião. Assessores de Rigotto se queixaram que, em muitas cidades, simpatizantes tiravam dos carros os decalques do candidato assim que ele saía, trocando-os pelos de Antônio Britto (PPS).

– Me apontem os nomes que vou expulsá-los do partido – prometeu Schirmer.

O grupo decidiu que Rigotto passaria a dedicar mais tempo às grandes cidades (com mais de 10 mil habitantes). Na noite de 10 de setembro, o PMDB e o PSDB mais uma vez mostraram mobilização. Durante um encontro da Federação das Associações dos Municípios, em Canela, Rigotto se reuniu com prefeitos dos dois partidos. Ficou acertado que cada um passaria a cuidar da campanha em seu município e em outros três. Dezesseis prefeitos se licenciaram do cargo para tocar a campanha.

A mudança foi sentida no comitê na Avenida Sertório. Candidatos a deputado passaram a ir ao comitê pegar material. As 500 máscaras de Rigotto foram distribuídas rapidamente. As duas áreas de estacionamento eram disputadas a tapa. A confusão foi tanta que, por esquecimento, a conta da água não foi paga. O pessoal trabalhou um dia e meio com as torneiras desabastecidas. A mobilização apareceu na pesquisa do dia 22, quando Rigotto alcançou 17,6%, contra 26% de Britto.

24 setembro
Germano Rigotto começou a semana de seu aniversário (completou 53 anos no dia 24 de setembro, terça-feira) pedindo um presente especial para os envolvidos na campanha: empenho e concentração nos últimos 15 dias antes da eleição. E deu exemplo: no dia anterior, segunda-feira, dia 23, deveria ir ao Rio encontrar-se com o presidente Fernando Henrique Cardoso numa homenagem na Convenção Nacional dos Supermercados. Cancelou para não se afastar do eleitorado gaúcho.

Com a pesquisa do Ibope na mão, publicada por Zero Hora no dia 25, chamou seus assessores mais próximos. Disse que estava otimista: tinha 18%, se aproximando dos 26% de Britto. Disse que a situação deveria ser, naquele momento, bem melhor do que mostravam os números, pois sempre considerou o Ibope muito favorável a Britto.

26 de setembro
A presença de Germano Rigotto no segundo turno da eleição começou a se tornar palpável na noite do dia 26. No final do dia, a RBS TV divulgara uma pesquisa. O dado principal: Rigotto (21,4%) aparecia empatado com Britto (22,6%). Pela primeira vez, o segundo turno estava ao alcance do PMDB.

– O pessoal está se dando conta de que, com um único voto, no Rigotto, vai se livrar do Britto e do PT, terminando com essa briga – disse um assessor de outro candidato.

Um assessor de Britto chegou a ser provocado pelo assessor de outro candidato:

– Vocês precisam bater, senão o Rigotto passa.

O brittista apenas sorriu:
– É claro que os votos que estamos perdendo (Britto) estão indo para ele (Rigotto).

27 de setembro
A semana da eleição amanheceu com um boato: Antônio Britto, caindo nas pesquisas, iria renunciar para apoiar Rigotto. Rigotto pediu calma a todos e concentração apenas na campanha.

Difícil, mesmo, foi pedir calma às mulheres durante a campanha. Foram as que mais se aproximaram do peemedebista, partindo para um empolgado corpo -a-corpo. Numa caminhada em Gravataí, dia 27, uma eleitora passou da conta: tascou um beijo na boca de um Rigotto desconcertado.

Os candidatos foram para o debate final na RBS TV, dia 3 de outubro, com o boato da renúncia de Britto mais forte. Uma pesquisa divulgada no final da tarde mostrava Rigotto com 31,5%, contra 19,2% de Britto.

– O Rigotto foi favorecido pelos grandes erros do Britto. Ele bateu na gente o tempo todo e, ao mesmo tempo, tentou criar uma imagem angelical na TV. O eleitor se deu conta que as duas coisas não combinam – analisou um graduado assessor petista.


Segundo turno semeia discórdia
Pela primeira vez na História do Brasil, os partidos e os eleitores brasileiros terão segundo turno de governador e de presidente da República no mesmo dia.

Essa situação cria um dilema para os partidos que estão fora do segundo turno e terão dificuldades para administrar o apoio ao candidato à Presidência com os interesses de suas seções regionais. Resultado: um dia depois da eleição já é possível medir as fissuras no PFL, no PMDB, no PPS e no PPB.

O segundo turno entre Germano Rigotto e Tarso Genro reproduz no Rio Grande do Sul a disputa nacional entre José Serra (PSDB) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Nos dois casos o PMDB e o PSDB estão aliados contra o PT, que começou a buscar apoio em outras siglas, inclusive nas consideradas “de direita”, como o PFL e o PPB. O apoio do PSB de Anthony Garotinho já está assegurado.

A disputa entre Lula e Serra aprofundou o racha no PFL, que se dividiu em três blocos depois do naufrágio da candidatura da ex-governadora Roseana Sarney à Presidência. A própria declarou apoio a Lula ainda no primeiro turno, seguindo os passos do pai, o ex-presidente José Sarney, filiado ao PMDB.

Outro grupo, liderado pelo vice-presidente Marco Maciel, ficou com Serra. Um terceiro, comandado pelo senador Jorge Bornhausen e pelo ex-senador Antonio Carlos Magalhães, aderiu a Ciro Gomes.

Com Ciro fora de combate, esse grupo se biparte. Dono de um patrimônio de 3 milhões de votos, ACM deve ficar com Lula – não por afinidade ideológica, mas por vingança contra o governo com quem rompeu quando teve de renunciar ao mandato no Senado.

É o mesmo sentimento que move os Sarney, inimigos de Serra. Derrotado em seu próprio Estado, Santa Catarina, onde o filho Paulinho perdeu a vaga de senador para a petista Ideli Salvatti e para o tucano Leonel Pavan, Bornhausen só vai se manifestar amanhã, depois da reunião em que o PFL decidirá o seu futuro.

Não há a mais remota possibilidade de o PPS marchar em bloco ao lado de Ciro, que ontem confirmou o apoio a Lula, esboçado no debate da Rede Globo. No Rio Grande do Sul, o PPS é inimigo do PT e vai trabalhar pela candidatura de Rigotto.

Aliado oficialmente a Serra, o PMDB tem dissidências pontuais, como as de Sarney, do governador mineiro Itamar Franco e do ex-governador Orestes Quércia, derrotado na eleição para senador de São Paulo.

O PDT gaúcho, mais uma vez, deve marchar dividido no segundo turno. Inimigo do Palácio do Planalto por definição, o partido se vê obrigado a escolher entre Serra, candidato do governo, e Lula, de um partido que passou de aliado a adversário. A maior parcela do PDT, que apoiou Antônio Britto (PPS) para o governo do Estado no primeiro turno, deve se aliar a Rigotto no segundo – e ficar fora do palanque nos atos conjuntos da campanha presidencial.


Votos de Enéas elegem seis
O recordista nacional de votos desta eleição não é do PSDB de José Serra, nem do PT de Luiz Inácio Lula da Silva. Muito menos do PMDB ou do PFL, mas de um pequeno partido: o Prona.

Os mais de 1,5 milhão de votos conquistados pelo médico Enéas Carneiro deram a ele uma cadeira na Câmara dos Deputados e o título de campeão de votos desta eleição, além de permitir ao Prona formar uma bancada de seis deputados. A megavotação de Enéas garantiu legenda para seis concorrentes praticamente desconhecidos, também filiados ao Prona.

Um deles, Vanderlei Assis, que teve 274 votos e vai ser deputado federal. E só não serão sete os eleitos porque o partido preencheu errado a ficha de inscrição da médica Maria Celeste Suassuna, que não foi registrada no Tribunal Regional Eleitoral (TRE).

Aos 64 anos, natural de Rio Branco, mas registrado em Belém, Enéas foi candidato à Presidência duas vezes e uma vez a prefeito de São Paulo. Em 1999 anulou um documento registrado em cartório no qual afirmava que não concorreria a nenhum cargo que não fosse o de presidente.

– Anulei o documento em 1999, 10 anos depois. As regras eleitorais mudaram três vezes desde que nós começamos, em 1989. Como elas mudam, nós tivemos o direito de anular aquele documento – explica.

Ciente de que o bordão “Meu nome é Enéas” tinha receptividade no eleitorado, escolheu São Paulo, maior colégio eleitoral do país, para se candidatar e eleger os cinco companheiros da executiva do Prona, a maioria ex-alunos. Alguns têm domicílio eleitoral em São Paulo há cerca de um ano.

– Eles representam o pensamento da população brasileira que tem a maior parte dela em São Paulo. O Brasil é um só. E eu tenho orgulho de esse resultado ter sido por São Paulo – diz Enéas.

Pai de três filhas, o médico que vive entre Rio e São Paulo há 20 anos, onde dá aulas de eletrocardiografia, não esconde seu nacionalismo:

– A perspectiva é lutar pela soberania nacional. O projeto é o mesmo que está em qualquer livro nosso há 13 anos: Brasil, Estado nacional soberano, contrário às privatizações, contrário a essa educação do faz-de-conta. Queremos um sistema básico de ensino que os mais velhos tiveram, queremos um sistema de saúde que funcione.


PT terá maior bancada da Câmara
A Câmara dos Deputados ganhou um tom avermelhado nessas eleições.

Segundo projeções do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) e da própria liderança do partido, o PT teve um crescimento surpreendente nestas eleições e, a partir de 2003, passará a ter a maior bancada da Casa.

De acordo os cálculos do Diap, o partido de Luiz Inácio Lula da Silva, hoje a quarta bancada da Câmara com 58 deputados, conquistou, no mínimo, 88 cadeiras. Mas o número pode chegar a 92. As estimativas da liderança do partido baseadas em números oficiais e em consultas Estado por Estado são mais otimistas: variam de 92 a 101 vagas.

Com ou sem composição de bloco com os demais partidos que hoje integram a oposição, o PT poderia, então, concorrer à presidência da Câmara no ano que vem. Uma das apostas no meio político é o presidente do partido, José Dirceu (SP), que está coordenando a campanha de Lula à Presidência da República. Em Minas, a bancada do partido, que hoje é de sete deputados, passou para 11. Em Santa Catarina, eram dois e agora são cinco, no Paraná, de três para seis.

Também no Senado, o PT teve um crescimento significativo. Quase dobrou. Hoje com oito senadores, terá 14 no ano que vem: 10 eleitos no último domingo e quatro com mandato até 2007. Com isso, passará de quarta a terceira bancada da Casa, ocupando o atual lugar do PSDB.


Gaúcho irá ocupar uma das cadeiras do Prona
O professor de filosofia e psicanalista clínico gaúcho Irapuã Teixeira pode dizer que faz parte da intrigante história política do Brasil.

Assim como o companheiro Vanderlei Assis, médico homeopata, ele conquistou duas cobiçadas cadeiras entre as 70 da bancada paulista da Câmara dos Deputados, tendo recebido 0% dos votos.

Vanderlei recebeu 274 votos e Irapuã, 665. Ambos integram a cúpula do Prona. E, como amigos e auxiliares diretos do presidente do partido, Enéas Carneiro, estarão ao lado dele em Brasília em cadeiras que, se dependessem apenas do número de votos obtidos, seriam desti nadas a outros políticos.

Irapuã é vice-presidente do partido. A voz baixa, os cabelos e a barba grisalhos, ele ocupa um cômodo de 2,5x2,5 metros, contíguo à sala onde fica o líder do partido.

– O professor Irapuã e o doutor Vanderlei são homens seriíssimos do Prona. Aqui não há mentecaptos, analfabetos e despreparados – anuncia Enéas.

Gaúcho de Porto Alegre, Irapuã tem um currículo com 12 folhas. Detentor de cursos de pós-graduação e doutorado em Filosofia, Irapuã adianta que, no Congresso, pretende fazer um trabalho dedicado à questão da educação. Mas faz uma ressalva:
– Tudo é prioridade, tudo são preocupações, o Brasil, como está hoje, necessita que olhemos com vigor.

O professor já foi candidato ao governo do Estado, em 1994, quando ocupou o horário eleitoral gratuito na eleição vencida por Antônio Britto (então no PMDB). Foi também candidato a vice-presidente da República em 1998. Nas duas experiências, amargou derrotas. O médico Vanderlei também é um dos fundadores do Prona. Ele não quis se manifestar sobre sua plataforma de trabalho na Câmara.


Um Congresso de cara nova
A partir de 2003, o PMDB e o PFL terão as maiores bancadas no Senado. Os dois partidos elegeram 19 senadores cada um. O PMDB perdeu quatro representantes, e o PFL conseguiu mais um. O PSDB perdeu três, passando de 14 para 11 senadores. Mesmo assim, esses três partidos continuarão mantendo a hegemonia na Casa.

Entre os partidos de esquerda, o PT foi o que conseguiu crescimento mais expressivo de sua bancada, passando de oito para 14 senadores. Das 54 vagas em disputa, 14 serão ocupadas por senadores reeleitos.

Na Câmara, as projeções para saber quais os partidos terão maior representação ainda estão indefinidas. Apenas 11 Estados totalizaram suas votações. São Paulo, Rio e Minas Gerais, que juntos somam 169 cadeiras, até o início da noite de ontem não haviam finalizado suas apurações. Nos Estados que já encerraram a apuração (RS, AP, RO, SC, MS, GO, ES, RN, CE, PR e PB), o PT aparece como destaque, tendo saltado de 18 para 33 cadeiras.


Mercadante é recordista de votos na história brasileira
Empolgado e com disposição de candidato que ainda iria para o segundo turno, o deputado Aloizio Mercadante disse ontem que irá agradecer, “pelo resto da vida” aos mais de 10 milhões de paulistas que, no domingo, o escolheram para representar o Estado no Senado a partir de 2003. Essa foi a maior votação de um senador da história do país. Mercandante obteve 64% dos votos válidos.

Aos 48 anos, o petista é um dos homens fortes do candidato a presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e um dos principais interlocutores de seu partido com o mercado financeiro. Em 15 de julho, por exemplo, diante de integrantes do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças (Ibef), apresentou as propostas de Lula para o país.

O petista disse que o apoio que recebeu do atual senador Eduardo Suplicy (PT-SP), de Lula e do candidato ao governo pelo PT, José Genoino, foram fundamentais para seu crescimento nas pesquisas. Confiante na vitória de Lula no segundo turno, Mercadante disse que seu dever será o de dar sustentação a um possível governo petista no Congresso.


Seis mulheres na bancada do PT
Metade das 10 novas cadeiras do PT no Senado foi conquistada por mulheres. Como a senadora Heloísa Helena continua com seu mandato, o PT terá seis mulheres na bancada, que totalizará 14 senadores.

Ideli Salvatti foi a primeira mulher eleita para o Senado em Santa Catarina. Bateu o recorde de votos no Estado para o cargo, com o aval de 1.054.304 eleitores. A petista ultrapassou candidatos fortes como o senador Casildo Maldaner (PMDB) e Paulinho Bornhausen (PFL), filho do senador Jorge Bornhausen.

– Semana passada, comecei a perceber que tinha chances de me eleger – disse Ideli.

Primeira senadora da história de Mato Grosso, Serys, professora universitária aposentada, já está no terceiro mandato de deputada estadual. Ela presidiu duas CPIs polêmicas: do narcotráfico e da compra de votos.

– Fui eleita pela minha história de credibilidade na política. A ascensão do Lula também me ajudou – disse.



Quem volta
De volta ao Congresso Nacional após ter se envolvido num dos mais constrangedores episódios do Senado – a violação do painel eletrônico de votação –, o ex-senador José Roberto Arruda (PFL-DF), deputado federal mais votado do Distrito Federal, garante que está obcecado pelo tema e que seu primeiro projeto será sobre o fim do voto secreto de deputados e senadores:
– Quero transformar o meu erro em uma contribuição efetiva para o aprimoramento da democracia. Vou apresentar um projeto obrigando todos os votos de parlamentares a serem abertos.


Presidente do TRE condena a utilização do voto impresso no pleito
Leal anunciou que a Justiça Eleitoral deve proclamar até amanhã os resultados oficiais da votação no Estado

Falhas nas urnas eletrônicas com voto impresso foram a maior causa para o atraso de mais de 10 horas na totalização da apuração dos votos no Estado. Só em São Leopoldo, o município que registrou o maior número de problemas com as urnas, 32 seções realizaram a votação com cédulas de papel.

Ontem, ao fazer um balanço do pleito de domingo, o presidente do Tribunal Regional Eleitoral (TRE), desembargador Marco Antônio Barbosa Leal, criticou o esquema de votação impressa e revelou que levará ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) as queixas do eleitorado gaúcho sobre o sistema. Leal não chegou a considerar o atraso na divulgação dos resultados algo anormal numa eleição que envolveu, só no Estado, 7.532.139 eleitores. No entanto, a totalização dos votos no tribunal só foi encerrada às 14h19min de ontem. Em São Leopoldo, às 11h45min.

O presidente do TRE lembrou que outros Estados que testaram a urna de voto impresso registraram problemas até mais graves do que os apresentados no Rio Grande do Sul. Para ele, se comparados aos dados das 147 cidades que testaram o voto impresso no país, a eleição gaúcha foi um “oásis”.

– O voto impresso não trouxe nenhum benefício ao pleito, só prejuízo visível. Foi um gasto que não se justifica para a manutenção de um sistema que prejudicou o processo e o eleitor – afirmou.

Além de São Leopoldo, Esteio e Sapucaia do Sul completam o grupo de cidades gaúchas que testou o sistema em caráter experimental. No dia 27, data em que ocorre o segundo turno das eleições, o voto impresso voltará à cena.

Apesar de considerar insatisfatória a experiência com o sistema, Leal ressaltou que a urna eletrônica foi definitivamente aprovada no país nestas eleições.

O TRE estima proclamar os resultados finais do pleito entre hoje e amanhã. O horário eleitoral gratuito só poderá ser iniciado 48 horas depois da divulgação.


Rosinha derrota Benedita no Rio
Candidata do PSB obteve 51,29% dos votos válidos e festejou a conquista com uma caminhada

Rosângela Matheus, o marido, Anthony Garotinho, e um grupo de bispos presbiterianos rezavam em voz alta na mansão do casal, no elegante bairro de Cosme Velho, na zona sul do Rio, quando o telefone tocou, às 7h15min de ontem.

Uma advogada ligada ao PSB anunciava que Rosangela, a Rosinha Garotinho, 39 anos, tinha vencido as eleições com 51,29% dos votos válidos. Todos na sala começaram a pular e a gritar. Rosinha chorou. Depois que as pesquisas de boca-de-urna indicaram um possível segundo turno, até ela custava a crer que já era governadora do Rio.

Mesmo tendo passado a madrugada insone no acompanhamento da apuração, Rosinha e Garotinho espantaram o cansaço e decidiram comemorar a vitória no início do dia. Rumaram, com um séquito de assessores tripulando uma frota de Santana alugados, para a Central do Brasil. É ali que desembarca toda manhã, vinda da Baixada Fluminense, grande parte dos operários, comerciários, desempregados e favelados que consagraram Rosinha. Chegaram na hora do pique dos trens, com a gare tomada pela multidão.

Rosinha saltou do carro empunhando ramalhetes de rosas – sua marca de campanha –, que distribuiu para homens e mulheres. Ela não cansava de lembrar aos eleitores a origem pobre como a deles, já que é filha de ferroviário e de uma professora primária.

Foi uma caminhada marcada por cotoveladas, empurrões, chutes, lágrimas e muitos gritos de aleluia. De quebra, os militantes do PSB desfecharam coros hostis à atual governadora, Benedita da Silva (PT) – ex-aliada e derrotada por Rosinha na corrida para o governo do Rio.

– Vice de novo, vice de novo – ironizavam os socialistas, ao verem bandeiras do PT.

Foi o troco aos petistas, que desfilaram desde o início da campanha com adesivos nos carros nos quais se lia a palavra “Fora, MentiRosinha”.

Os votos de Rosinha foram impulsionados por três iniciativas francamente populistas, originadas quando Garotinho era governador. A principal foi a criação de sete restaurantes populares que servem 18 mil refeições diárias, a R$ 1 cada – o Estado subsidia outros R$ 1,50 da refeição. O casal também criou hotéis populares, com diária a R$ 1, para pessoas sem recursos em trânsito no Rio. Funcionam na Central do Brasil.

O tripé de projetos de forte apelo eleitoral foi complementado pelo cheque-cidadão de R$ 100, fornecido mensalmente a pessoas cuja renda familiar é inferior ao salário mínimo. Ele já beneficia 65 mil famílias. Além desses planos bancados pelo Estado, os Garotinho contaram com ajuda de empresários da Ceasa para os projetos Panela Cheia e Sopa da Cidadania, que distribuem comida a partir da doação de verduras que não são vendidas pelos granjeiros.

A governadora eleita terminou a caminhada por volta das 8h30min e se recolheu à mansão do Cosme Velho para dormir. Ao se saber vitoriosa, fez um discurso conciliatório:
– A população queria a continuação do governo Garotinho. Vou procurar Benedita para fazermos uma transição à altura do Rio.

À noite, Rosinha disse que Garotinho terá o cargo que quiser em seu governo.


Benedita culpa crime organizado pela derrota
Depois de receber os resultados da disputa no Rio, a governadora Benedita da Silva (PT) atribuiu sua derrota para Rosinha Garotinho (PSB) à dificuldade de conciliar as responsabilidades do cargo com a campanha à reeleição. Benedita anunciou que no segundo turno da eleição presidencial será a coordenadora da campanha de Luiz Inácio Lula da Silva no Estado.

Ela reconheceu que a rebelião no presídio de Bangu 1, no início de setembro, e a onda de ameaças que levou ao fechamento do comércio, seis dias antes da eleição, contribuíram para sua derrota:
– Não deu. Não fui para o segundo turno, mas espero ter dado minha contribuição.

Benedita disse lamentar que o eleitorado tenha escolhido dar continuidade a um projeto que, segundo ela, não trouxe desenvolvimento ao Estado.

No início da apuração, na noite de domingo, a equipe de Benedita chegou a acreditar em um segundo turno contra Rosinha. Como o resultado das urnas da Baixada Fluminense demorou a ser computado, a vitória da candidata do PSB só ficou caracterizada no final da madrugada.

A governadora disse que a transição começará no dia 6 de dezembro. Afirmou que o processo será “feito com transparência e com a participação da sociedade”.

Para a petista, a rivalidade no Estado do Rio não vai impedir que o PSB de Rosinha dê apoio a Lula no segundo turno da eleição:
– Quero sentir esse gostinho de ver o Lula ganhando no Rio.


Região Sul vai para o segundo turno
O mapa político do país para os próximos quatro anos começa a ser desenhado. Com os governadores de 12 Estados já definidos em primeiro turno, a eleição do dia 27 de outubro terá disputas em 14 Estados e no Distrito Federal. Na Região Sul, por exemplo, a campanha eleitoral recomeçará em todos os Estados nos próximos dias. Os eleitores do Rio Grande do Sul, de Santa Catarina e do Paraná adiaram a decisão para o final do mês, sendo que nas três disputas o PMDB estará brigando pelo cargo de chefe do Poder Executivo.
Dos maiores partidos do país, o PT foi para o segundo turno em oito Estados, o PMDB em seis e o PSDB em cinco.


Campanha engatilhada em São Paulo
A apuração dos votos do maior Estado brasileiro deverá se encerrar na manhã de hoje, apesar de já estar definido desde o dia da eleição que a disputa irá para o segundo turno entre o atual governador, Geraldo Alckmin (PSDB), e José Genoino (PT). O atraso na apuração foi provocado por problemas de transmissão de dados em cerca de 400 urnas.

São Paulo foi um dos Estados onde as urnas surpreenderam tanto candidatos quanto eleitores com o crescimento do PT nas pesquisas nos últimos dias. Genoino acabou indo para o segundo turno e Paulo Maluf (PPB) de novo foi derrotado na disputa pelo governo.

Um dia depois da eleição os candidatos já entraram em clima de campanha outra vez. Ontem, Genoino participou de entrevista ao lado do candidato do PT à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva, enquanto que o tucano Alckmin cumpriu compromissos de governador e visitou as obras do Hospital das Clínicas.

Oposição ganha em sete Estados
Entre os 26 Estados brasileiros e o Distrito Federal, 12 governadores foram definidos pelos eleitores já no primeiro turno da disputa. Até agora, o PSB é o partido que elegeu o maior número de chefes do Poder Executivo: Ronaldo Lessa (AL), Paulo Hartung (ES) e Rosinha Garotinho (RJ).

Quatro governadores foram reeleitos logo na primeira etapa do pleito: Jorge Viana (AC), Ronaldo Lessa (AL), Marconi Perillo (GO) e Jarbas Vasconcelos (PE).

O mapa acima, que indica uma prévia de qual será o tamanho do poder dos partidos políticos no Brasil, adianta que a oposição poderá ter a maioria dos Estados na mão nos próximos quatro anos. Até agora está definido que sete governos estaduais serão de partidos que hoje fazem oposição ao presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), e cinco pertencem à atual base de apoio do Palácio do Planalto.

Reviravolta no Rio
O Rio de Janeiro deu uma demonstração de que as urnas surpreendem. Durante toda a campanha as pesquisas apontavam a candidata do PSB a governadora, Rosinha Garotinho, como possível vencedora no primeiro turno.

No dia da eleição, no entanto, pesquisas de boca-de-urna indicavam que os eleitores jogariam a decisão para o segundo turno. Ontem, com quase todos os votos apurados, foi confirmada a vitória de Rosinha.

Rei da soja no poder
O maior plantador de soja individual do mundo foi eleito já no primeiro turno governador de Mato Grosso.

Blairo Maggi (PPS), conhecido como o Rei da Soja, vem de uma família que colocou o Estado entre os maiores produtores de soja, algodão e arroz do país e conseguiu derrotar alguns dos maiores líderes políticos do Estado. Maggi se elegeu prometendo fazer o que chamou de “ajuste social”, desonerando de ICMS produtos da cesta básica.

A lamentação de Zeca
Favorito nas pesquisas, o governador de Mato Grosso do Sul, Zeca do PT, esperava ser reeleito no primeiro turno.

Porém, abertas as urnas, ele teve 48,33% dos votos válidos, contra 42,41% da deputada federal Marisa Serrano (PSDB).

Falhas na fiscalização e dificuldades dos eleitores na hora de votar foram alguns dos motivos alegados pelo candidato para não vencer a disputa no primeiro turno.

Hegemonia ameaçada
A hegemonia de 16 anos do grupo político de Tasso Jereissati (PSDB), no Ceará, está ameaçada pelo PT. O motivo é o arrastão eleitoral lide rado pelo candidato à Presidência Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Beneficiado por Lula, o candidato do PT ao governo, José Airton, foi para o segundo turno com o tucano Lúcio Alcântara por uma pequena margem de votos. Faltaram só 6.922 votos para Alcântara ser eleito no primeiro turno.


O novo parlamento gaúcho
O PMDB foi o partido que mais cresceu em comparação com a atual composição, passando de cinco para nove deputados

Das 55 vagas da Assembléia Legislativa, 34 (61,8%) serão ocupadas por deputados reeleitos.

O PT permaneceu com a maior bancada, com 13 parlamentares, seguido do PPB, com 10, e do PMDB, com 9. O PSB, que havia perdido seu único representante com a saída de Bernardo de Souza (PPS), conquistou duas cadeiras no Legislativo gaúcho.

A bancada petista cresceu, passando de 11 para 13 deputados. O grupo também contará com o maior número de novos parlamentares, seis. Entre eles, está o ex-prefeito da Capital Raul Pont, eleito deputado estadual no pleito de 1986. Os outros cinco não tiveram nenhuma passagem pela Casa.

No PPB, três estréias, incluindo o ex-governador, ex-vereador da Capital e ex-ministro da Previdência, Jair Soares. A legenda não conseguiu atingir o objetivo de ampliar a representação de 11 para 13 deputados. O deputado Otomar Vivian, ex-presidente da Casa, não obteve sucesso na tentativa de reeleição. A bancada também perdeu Maria do Carmo, que se retirou da política, e Francisco Appio, que concorreu à Câmara dos Deputados.

As eleições de 6 de outubro representaram para o PMDB um crescimento de 80% de sua bancada, que passou de cinco para nove representantes. Em 1998, o partido elegeu 10 deputados, cinco dos quais migraram para o PPS em 2001. Dos eleitos, cinco chegam à Assembléia pela primeira vez, entre eles Luiz Fernando Zachia, vereador em Porto Alegre.

O PDT e o PC do B permanecem com o mesmo número de vagas. Entre os trabalhistas, com sete deputados, a estreante Floriza dos Santos substituirá Ciro Simoni, que não se reelegeu. O PC do B continuará sendo representado por Jussara Cony, enquanto o PSDB passa de dois para três parlamentares.

As bancadas que sofreram a maior redução foram a do PPS (50%) e a do PTB (40%). Em 1998, o PPS não elegeu nenhum deputado no Estado, mas Bernardo de Souza migrou para a legenda em 2000. No ano passado, a legenda ganhou o reforço dos cinco peemedebistas, mas agora, com o fracasso da candidatura de Antônio Britto ao Piratini, ficará com três deputados. O PFL, que estava coligado ao PPS, perdeu uma vaga. O PTB perdeu quatro das 10 vagas conquistadas em 1998. Em 2002, o partido não contou com a presença de Sérgio Zambiasi na disputa. O presidente da Assembléia concorreu ao Senado e o PTB não encontrou um nome para substituí-lo como puxador de votos.


Correlação de forças se mantém
Poucas alterações foram registradas no tamanho das bancadas de cada partido, mas PPS e PL conseguem representação


Em termos numéricos, não houve maiores mudanças na composição da bancada federal gaúcha. Mas a evolução dos perfis dos eleitos pelos partidos é um espelho fiel de como anda a cabeça do eleitorado gaúcho.

No PT, por exemplo, a maioria dos eleitos situa-se nas tendências mais à esquerda do partido. Luciana Genro, Henrique Fontana, Adão Pretto, Tarcísio Zimmermann podem até não admitir publicamente, mas adorariam fazer campanha por Luiz Inácio Lula da Silva sem aliança com o PL.
No PPB, a força é do Interior. Boa parte dos votos do partido de Celso Bernardi veio de uma área específica: a agricultura. João Augusto Nardes trabalhou pela securitização das dívidas agrícolas, entre outros temas, e garantiu uma votação estupenda. Luiz Augusto Heinze, ex-prefeito de São Borja, é agrônomo. Francisco Turra foi ministro da Agricultura. Érico Ribeiro, xavante fanático, é um dos maiores plantadores de arroz do planeta.

Os eleitos pelo PMDB mostram que a tradição partidária é um elemento fundamental no Rio Grande do Sul. O mais votado entre os 31 deputados, é bom lembrar, vem do partido do senador Pedro Simon. Os que não abandonaram a sigla e seguiram o ex-governador Antônio Britto no PPS mantiveram seus votos. Mendes Ribeiro Filho, Cézar Schirmer, José Ivo Sartori e Darcísio Perondi devem hoje suspirar aliviados por terem feito a opção correta. Na época da dissidência, houve quem apostasse em encolhimento da sigla.

Também é interessante verificar como concorrer em campanhas majoritárias agrega eleitores. É uma forma ímpar de exposição e de se tornar conhecido. Alceu Collares melhorou sua votação – quase ficou de fora da Câmara em 1998 – depois de concorrer a prefeito de Porto Alegre, mesmo perdendo para Tarso Genro em 2000. Vale o mesmo para Yeda Crusius. Ela sequer foi ao segundo turno na Capital, mas se manteve na faixa superior aos 100 mil votos para deputada.
Os tucanos acertaram também em apostar no sobrenome Marchezan. Nélson morreu em fevereiro desse ano, mas o filho estreante em eleições está eleito, ainda que precise resolver algumas pendengas burocráticas com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

O PT manteve seus oito deputados, o PPB oscilou uma cadeira, como diriam os institutos de pesquisa, e assim por diante. Apenas o PMDB perdeu duas cadeiras, uma delas para o PPS, já que Nélson Proença acompanhou o ex-governador Antônio Britto no abandono ao partido de origem. Também é hábito do eleitor gaúcho imprimir uma boa dose de renovação. Com direito a 14 deputados com mais de 100 mil votos.


O seleto grupo dos 100 mil votos
Chegar à Câmara dos Deputados com mais de 100 mil votos é privilégio para poucos gaúchos – neste ano, foram 14 candidatos. Apoiados em cargos eletivos anteriores, em redutos eleitorais definidos ou em andanças pelo interior do Estado, os campeões de votos têm receitas diferentes para o sucesso.

N o primeiro lugar na lista, Eliseu Padilha (PMDB) aponta a atuação como ministro dos Transportes no governo Fernando Henrique Cardoso e a militância no municipalismo como as receitas para a vitória. José Otávio Germano (PPB) considera as atuações como vereador, deputado estadual e secretário de Estado, aliadas à visibilidade obtida pelo ano e meio como dirigente do Grêmio como a base para que fizesse 176 mil votos. O deputado eleito, entretanto, diz que as viagens pelo Interior e o trabalho nas comunidades da Região Metropolitana foram decisivos.

– Tive resultado expressivo nas cidades que visitei – afirma Germano, que só não teve votos em 10 municípios.

A deputada estadual Maria do Rosário (PT) cita o vínculo com movimentos sociais e organizações não-governamentais e o trabalho em defesa dos direitos humanos como as bases da votação expressiva – os 76 mil votos que recebeu em 1998 dobraram este ano:
– Tive um reconhecimento significativo no Interior, com 80 mil votos .

Outros candidatos têm bases bem definidas. O pastor da Igreja Universal do Reino de Deus, Paulo Gouvea (PL), chegou a 103 mil com o apoio da Igreja, que trabalhou por candidatos do partido, com direito a comício de rezas no Anfiteatro Pôr-do-Sol. Pompeo de Mattos (PDT), que chega ao segundo mandato, diz que ficou identificado com a luta contra as drogas por seu envolvimento na CPI do Narcotráfico.

Deputado federal mais votado do Rio Grande do Sul, o ex-ministro dos Transportes Eliseu Padilha chega à Câmara Federal aos 56 anos, disposto a dar continuidade ao trabalho iniciado em 1994, quando, eleito pela primeira vez, abriu mão do mandato para assumir a Secretaria Estadual do Trabalho, Cidadania e Assistência Social do governo Antônio Britto. Depois, Padilha entrou para o alto círculo governista e ocupou o espaço deixado pelo então deputado Germano Rigotto, que saíra da liderança do governo para disputar a prefeitura de Caxias do Sul.


Casal Fetter divide votos e amarga derrota nas urnas
Dos 24 candidatos do município que concorreram domingo, só três conseguiram se eleger

Companheiros no lar e nas urnas, Adolfo Fetter Júnior e Leila Fetter (PPB) terminaram a eleição simbolizando a perda de expressão política de Pelotas.

À derrota do casal nas respectivas campanhas à Câmara dos Deputados e à Assembléia, somou-se o fracasso de outros 19 candidatos da cidade nas eleições proporcionais do domingo.

Apenas três políticos da cidade se elegeram – Bernardo de Souza (PPS) e Nelson Härter (PMDB) à Assembléia Legislativa e Érico Ribeiro (PPB) à Câmara. Há quatro anos, foram eleitos três deputados estaduais e dois federais.

Parlamentar há três mandatos, Fetter concorria à reeleição. Fez 75 mil votos, 7 mil a mais do que na eleição anterior, mas o suficiente apenas para credenciá-lo à segunda suplência do PPB. Perdeu a vaga ao dividir votos com o conterrâneo Érico Ribeiro (PPB) na disputa de uma mesma base eleitoral. Com 87 mil votos, a maior votação de um candidato de Pelotas nessa eleição, Érico conquistou a sexta e última cadeira do partido no Congresso.

Leila havia sido alçada à condição de fenômeno eleitoral no pleito de 2000, quando colheu 84 mil votos no segundo turno para a prefeitura e quase venceu a disputa com Fernando Marroni (PT). Credenciada pela surpreendente votação a tentar uma vaga na Assembléia, obteve 34 mil votos e ficou com a segunda suplência.

Outras surpresas foram as derrotas de Cecília Hypolito e Miriam Marroni, ambas do PT. Concorrendo em dobradinha, as duas garantiram uma vaga entre as suplências das bancadas – Miriam é a primeira na fila petista da Assembléia, e Cecília, a segunda na da Câmara.

Duas vezes prefeito e ex-deputado federal, Irajá Rodrigues (PMDB) é mais um político local que se decepcionou. Defensor da transformação da Metade Sul em Estado, fez 16 mil votos, volume insuficiente sequer para uma vaga de suplente.


Artigos

O circo das eleições
Sonia Maria D`Ávila Scheffer

Em momentos de crise do Estado romano, Nero, para distrair o povo que reclamava por pão e trabalho, oferecia-lhe nos 175 feriados – isso mesmo, 175 feriados ao ano! – espetáculos que iam desde o massacre de cristãos até luta de gladiadores. Nesses circos, os miseráveis de Roma que foram substituídos por escravos recebiam pão durante o espetáculo e muita diversão!

E, assim, a massa insatisfeita era controlada por mais um tempo. Mas, sem dúvida, nada é tão contemporâneo neste momento político, em nossas vidas, quanto a estratégia política do pão e circo de Roma!

A magia acaba com o fim das eleições: o circo é desmontado,
está na hora de pagar as contas

Em épocas de eleições, monta-se o circo. O povo desgraçado, que passa dois ou quatro anos trabalhando muito, recebendo pouco em um mundo de alta concentração de renda, pagando uma carga excessiva de impostos, com saúde, educação e transportes altamente precários, que dificultam ainda mais qualquer possibilidade de melhorar sua qualidade de vida, é chamado para o momento mágico: o “circo das eleições”, onde cada político tem as respostas para tudo, a solução para todos os problemas. São salvadores da pátria aos olhos dos miseráveis, que sabem que por conta própria não conseguirão mais nada nesta vida. E a promessa de uma vida melhor é o discurso de todos eles!

Neste mundo mágico do circo das eleições o povo é olhado, visto, abraçado, ouvido, por pessoas que, certamente, passada a mágica, nunca mais verão na vida. Ou, quem sabe, até o próximo circo. O povo verá, de graça, artistas que jamais poderia ver de perto, ou pagar um ingresso. Beberá como jamais poderia fazê-lo por conta própria. Receberá vales para tudo: cesta básica, camiseta, bonés, até dentaduras! Acredite! Megashows, passeatas, carreatas, festas, comícios, presentes. Tudo para o então agora astro principal do circo: a platéia, o povo, o verdadeiro dono do poder, o agora todo-poderoso.

A magia acaba com o fim das eleições: o circo é desmontado, está na hora de pagar as contas: novas tarifas, elevação dos impostos, propinas, superfaturamento, dispara o dólar, sobe o gás, falta energia. É hora de o pobre coitado voltar à realidade: à vida de trabalho e mais trabalho ou sem trabalho, mas sempre com a certeza de muita dificuldade! A vida do povo volta a sua rotina... até o próximo pão e circo romano!

Como disse Abraham Lincoln: “Podemos enganar alguns por todo o tempo, todos por algum tempo, mas não podemos enganar todos por todo o tempo.”

Os romanos que o digam!


Colunistas

ANA AMÉLIA LEMOS

Mulheres no Senado
Os eleitores garantiram a presença de mais de 10% de mulheres no Senado Federal a partir de 2003. Com 81 membros, a Câmara Alta do parlamento iniciará uma nova legislatura com nove mulheres. Dois terços são representantes de Estados das regiões Norte e Nordeste. A maioria eleita pelo Partido dos Trabalhadores.

A senadora Marina Silva (PT-AC) disputou a reeleição e volta para continuar seu trabalho em favor das causas sociais e ambientais. A bancada do PT já contava com a presença da combativa senadora Heloísa Helena (AL), que teve atuação destacada em diversas CPIs.

A ex-deputada federal Lúcia Vânia (PSDB) chega ao Senado para representar Goiás, e Roseana Sarney (PFL), também ex-governadora, reforça o time feminino no Senado, representando o Maranhão. Do Nordeste chega, também, a deputada estadual Patrícia Gomes (PPS), ex-mulher do candidato Ciro Gomes. Uma deputada estadual petista, Serys, de Mato Grosso, desbancou o ex-governador Dante de Oliveira na disputa pelo Senado. De Santa Catarina também chega a deputada estadual do PT Ideli Salvatti. De Rondônia vem a petista Fátima Cleide e do Pará a ex-vice-prefeita de Belém Ana Júlia.

As senadoras Marluce Pinto (PMDB-RR) e Emília Fernandes (PT-RS) não tiveram sucesso na disputa pela reeleição. Emília foi a primeira senadora eleita pelos gaúchos e surpreendeu pela meteórica carreira. Era vereadora e professora em Santana do Livramento e, filiada então ao PTB, recebeu o apoio de Sérgio Zambiasi, líder do partido, derrotando o veterano Cezar Schirmer (PMDB). A senadora gaúcha ganhou espaço na mídia, entre outras coisas pelas brigas com ACM, que teve de renunciar ao mandato de senador para não perder os direitos políticos no rumoroso processo do painel de votação do Senado. O mesmo gesto, nesse episódio, fez o então senador José Roberto Arruda. Os eleitores absolveram os dois ex-senadores. ACM volta ao Senado com a maior votação na Bahia e Arruda chega à Câmara Federal como o deputado federal mais votado do Distrito Federal.

As mulheres na Câmara também aumentarão a representação feminina com figuras do quilate da juíza Denise Frossard (PSDB-RJ) e das combativas deputadas petistas gaúchas que deixam o plenário da Assembléia para se projetarem no cenário nacional.


JOSÉ BARRIONUEVO

Vereadores decidem apoiar Rigotto
A resposta na Câmara de Vereadores está sendo mais rápida. Na sessão de ontem à tarde, os quatro vereadores do PPB assinaram documento entregue ao presidente do partido, Celso Bernardi, propondo formalmente o apoio ao candidato do PMDB a governador. João Dib, Pedro Américo Leal, Beto Moesch e João Carlos Nedel assinam o documento. O mesmo ocorreu na conversa do vereador Antônio Hohlfeldt (PSDB), vice de Rigotto, com a bancada do PDT. A votação obtida por Rigotto em Porto Alegre, encostada no índice de Tarso, duas vezes prefeito, animam os vereadores. O presidente da Câmara, José Fortunati (PDT), também apóia o deputado caxiense.

Bacci rejeita imposição
Respaldado em 85 mil votos, Enio Ba cci reúne sexta-feira em Estrela representantes de 380 municípios para discutir qual a opção que o PDT deve assumir no segundo turno. Com a derrota, entende que Pedro Ruas não tem autoridade para encaminhar as negociações. Indica o nome de Vieira da Cunha, que resistiu à decisão de não ter candidato próprio, para conduzir o processo. Diz que o resultado da eleição mostrou que Vieira tinha razão.
Dos 10 deputados do PDT, apenas dois não externaram posição favorável a um apoio a Germano Rigotto.

Vereadores eleitos
A eleição geral propicionou uma renovação de três cadeiras na Câmara de Porto Alegre, com a eleição de Fernando Záchia (PMDB) – agradecido pelos pardais, Paulo Brum (PSDB) e Estilac Xavier (PT). Os três vereadores visitaram ontem a Assembléia onde passam a atuar a partir de janeiro como deputados estaduais.

A volta às origens
Jair Soares retornou ontem à Assembléia Legislativa, onde iniciou na vida pública no início da década de 60 como chefe de gabinete de dois presidentes da Casa: Gustavo Langsch (1960) e Alfredo Hoffmeister (1965). Dentista e advogado, foi chefe do gabinete do presidente do Irga (1963), presidente do Departamento de Compras (1967), secretário da Administração (1970), da Saúde (1971 a 1979), deputado federal (1979 a 1982), ministro da Previdência (1979 a 1982), governador pelo voto direto (1983 a 1987), vereador mais votado de Porto Alegre (1992 a 1994), deputado federal (1995 a 1999) e a partir de janeiro deputado federal.
Poucos reúnem a experiência do ex-governador na nova Assembléia.

Sou a força – Campeão de votos entre os 31 deputados integrantes da representação gaúcha, Eliseu Padilha retorna à Câmara com prestígio suficiente para comandar a bancada do PMDB. Ontem, o presidente FH pediu para que seu ex-ministro dos Transportes fosse a Brasília para acompanhar de perto a campanha de José Serra. Vai dividir o tempo, pela importância que se reveste a eleição no RS.

Elas prometem sacudir o Congresso
Deputadas atuantes na Assembléia, conduzidas à Câmara em Brasília por grandes votações, Maria do Rosário (143 mil votos), do Movimento Construção Socialista, e Luciana Genro (99 mil), do Movimento Esquerda Socialista, ambas do PT pretendem marcar presença forte na Câmara. Prometem marcar de cima um provável governo Lula.

Maria do Rosário, 36 anos
A professora e deputada estadual teve a maior votação no Estado em 1998.
Faz parte do Movimento de Construção Socialista (MCS) do PT. Entre suas prioridades no Congresso, estão temas como a proteção de direitos de crianças e adolescentes, a educação, a livre orientação sexual e os direitos do trabalhadores, em especial das mulheres.
– Penso que, com o apoio da comunidade, estarei ampliando a nossa possibilidade de trabalho para os temas nacionais. Vou trabalhar para uma abrangência maior das questões que já vinha tratando aqui no Estado.
Hoje PT, teve iniciação política no PC do B.

Luciana Genro, 31 anos
Também professora e deputada estadual, a filha de Tarso Genro pertence a uma das tendências mais radicais do PT, o Movimento Esquerda Socialista (MES). Promete lutar em defesa do salário e contra o desemprego.
– Para isso, vou defender que o governo do Lula não siga submetendo o Brasil aos acordos com o FMI. Na hipótese da presidência ficar com (José) Serra, vamos tentar promover uma grande luta social e mobilização nacional para acabar com o modelo de arrocho que ele vai seguir.
A deputada afirma não se desvincular dos movimentos sociais que defende.
– Vou seguir ressaltando a coerência das minhas posições no Estado, e quero que os governos petistas honrem as bandeiras que fizeram do PT uma referência de mudança para milhões de pessoas.

Mulheres perdem vagas na Assembléia...
A Assembléia Legislativa terá a mais baixa representação feminina dos últimos anos, baixando de seis para duas deputadas.
Maria do Rosário, Luciana Genro e Cecilia Hypolito concorreram à Câmara, com a eleição das duas primeiras com grandes votações. Iara Wortmann trocou o PMDB pelo PPS e não se elegeu. Permanece Jussara Cony, que nas últimas duas décadas assegura a presença do PC do B na Assembléia. A primeira-dama de Novo Hamburgo, Floriza dos Santos, do PDT, é a única noviça num plenário com mais 53 homens.

...e ganham cadeiras na Câmara
As mulheres ganham representação na Câmara. Além de Yeda Crusius, que vai para o terceiro mandato (foi a primeira mulher na Câmara junto com Esther Grossi, que não concorreu este ano à reeleição), entram três novas deputadas: Maria do Rosário, a mais votada, Luciana Genro, ambas do PT, e Kelly Moraes (PTB), de Santa Cruz. Ana Corso, de Caxias, que chegou a assumir como suplente, não retorna.
No Senado, deixa a casa a primeira mulher gaúcha a conquistar um mandato, em 1994. A senadora Emília Fernandes perdeu a cadeira para o colega de partido Paulo Paim.

União trabalhista
Há um movimento entre os trabalhistas, do PDT e do PTB, de formar uma frente em plenário como primeiro passo para a fusão das duas siglas a partir do RS.
Um deputado do PDT, trabalhista de quatro costados, se necessário deixa o PDT se for imposto o apoio a Tarso Genro no segundo turno.
O nome: João Luiz Vargas.

PT mais à esquerda
Dos 13 deputados estaduais do PT que foram eleitos para a próxima legislatura na Assembléia, nove integram correntes mais à esquerda e apenas quatro são moderados. Na bancada federal, apenas três dos oito são de facções moderadas como o Amplo.

Renovação
Assumem 20 novos deputados na Assembléia com 55 cadeiras. Na bancada gaúcha na Câmara, 13 exercem o mandato de deputado federal pela primeira vez.
Importância da Brigada
A questão da segurança pública e a partidarização da Brigada será tema obrigatório nos debates netre Tarso Genro e Germano rigotto, no segundo turno. A eleição está marcada para dentro de 19 dias.

Proença avalia críticas
Presidente e coordenador da campanha do PPS, o deputado federal Nelson Proença, único eleito do partido para a Câmara, remete carta para discordar de críticas publicadas na coluna.
“Assumo integralmente as críticas e os resultados que obtivemos no episódio eleitoral que foi parcialmente encerrado ontem e pretendo chamar a mim, como é do meu dever, a responsabilidade pelos insucessos que colhemos.”
Proença só não aceita “insinuações de falta de lealdade para com meus companheiros”. Assegura que todos que estiveram próximos a ele “sabem que não são verdadeiras”.
“Pode ter me faltado competência, mas em nenhum momento faltou-me dedicação e lealdade.”

Fogaça destaca sobertura
O colunista recebeu ontem um telefonema do senador José Fogaça, que deixa o Senado em janeiro, para agradecer a cobertura que recebeu da imprensa em 16 anos na Casa. Sem mágoas pela derrota, fez questão de registrar a correção das análises feitas pela Página 10.
Também ontem, Gustavo Fogaça, filho do senador, remeteu longo e-mail ao colunista em que analisa a campanha e dá seu testemunho sobre a atuação do pai. Faz um elogio:
“Quero dizer que sempre fui seu admirador e posso falar por meu pai, sua esposa e toda nossa família. A Página 10 sempre foi a primeira a ser lida lá em casa. Teu jornalismo sempre foi agudo e contundente, sendo às vezes até visionário (no caso do Rigotto, nestas eleições)”.

Mirante
• Ex-prefeito Alceu Moreira (PMDB) arrebentou a boca do balão, ganhando as apostas sobre quem seria o mais votado. Com 40,8 mil, é o quarto mais votado da bancada do PMDB, vencendo com folga o confronto com Ciro Simoni (26,3 mil), do PDT, que ficou na segunda suplência.
• Terceiro suplente da bancada do PDT na Assembléia, o doutor Humberto Goulart fez 24,1 mil votos, na terceira suplência. Chegou perto. A família Goulart não deu sorte mesmo. João Vicente Goulart, filho de Jango, concorreu pelo PGT, do Rio de Janeiro.
• Conterrâneo e correligionário de Antônio Britto, Blairo Maggi se elegeu governador no primeiro turno em Mato Grosso, pelo PPS. Nasceu em Torres.
• Sucesso mesmo teve o prefeito Sérgio Moraes, do PTB, que elegeu a mulher, Kelly Moraes, para a Câmara dos Deputados, e assegurou a reeleição de Osmar Severo, este com 40 mil votos.
• Sem correspondência na parceria com o federal do PPB, Telmo Kirst encerra sua carreira política após sete mandatos. Partiu direto de vereador para deputado federal. Ficou na primeira suplência de estadual, por uma diferença de 1.216 votos.
• Petista reclama do colunista, que não viu motivo para o PT festejar o resultado da votação no Largo da Epatur. A festa teria sido feita para comemorar a derrota de Antônio Britto. Seria mais interessante que derrotassem o ex-governador no segundo turno.
• A campanha do PT foi a mais cara no Estado. Só um dos muitos anúncios em jornal de Luciana Genro custou R$ 30 mil.
• As campanhas de Estilac Xavier e de Paulo Pimenta também foram poderosas. Não ficaram a dever nada a Nelson Proença e Eliseu Padilha.
• Pelotas e Caxias do Sul perderam representatividade na Assembléia Legislativa. Caxias elegeu José Ivo Sartori para a Câmara e apenas dois para a Assembléia: Kalil Sehbe (PDT) e Ruy Pauleti (PSDB). Maria Helena Sartori (PMDB) não teve votos suficientes para substituir o marido na Assembléia e o Padre Roque Grazziotin, boicotado pela máquina da prefeitura, não se reelegeu.
• Germano Rigotto fez estragos nas hostes petistas. Devolveu Ana Corso, deputada federal, para as lides caseiras. É casada com seu primo irmão, prefeito Pepe Vargas (PT), para quem perdeu a prefeitura em 1996.
• Com 25 candidatos, Pelotas dividiu os votos e assegurou mandato apenas para três filhos da terra: Érico Ribeiro, eleito federal, Bernardo de Souza, que cumprirá seu quarto mandato como deputado estadual, e Nelson Härter, que estréia na Assembléia depois de ter exercido mandato federal.
• Cecilia Hypolito (estadual) e Fetter Júnior (federal) encerram seus mandatos em janeiro. Miriam Marroni (PT) e Leila Fetter (PPB), consideradas eleitas, amargam a condição de suplentes.
• Vieira da Cunha (PDT), relator da CPI da Segurança, Elmar Schneider (PMDB), vice-presidente, e Valdir Andres (PPB), presidente, foram reconduzidos com grandes votações. Um indicativo de que a população aprovou o trabalho.
• Beto Albuquerque surpreendeu uma grande maioria que não acreditava que pudesse assegurar o quociente eleitoral que lhe garantisse uma cadeira na Câmara.
• O PSB fez 195 mil, o que lhe garante mais um mandato e a possibilidade, numa dessas, de ser aproveitado por Lula para a equipe. O PSB surpreende com a eleição de dois deputados estaduais.
• Com a eleição de 25 deputados federais, três governadores e três senadores, o PSB deve vencer a cláusula da barreira.
• A Igreja Universal tentou eleger dois deputados estaduais por partidos diferentes. Não conseguiu colocar um representante do PL – partido de Paulo Gouveia, eleito federal –, mas teve sucesso com Sérgio Peres, primeiro colocado na bancada, ao lado de Heitor Schuch.
• O pastor José Dalton Cardoso Duarte fez 38,8 mil e não assegurou uma cadeira para o PL na Assembléia.
• Com apenas 35 mil votos, Ibsen Pinheiro fez a metade do primeiro suplente da bancada federal do PMDB. Errou em expor seu nome.
• A Assembléia terá uma representação mais qualificada na próxima legislatura.
• A Assembléia perde Padre Roque, um secular, e ganha um frade franciscano, frei Sérgio Görgen. E quatro pastores. Edmar Vargas e Manoel Maria, do PTB, partem para o quarto mandato.
• Quarto suplente do PT, Marcos Rolim é uma das perdas mais lamentadas na Câmara dos Deputados pelo trabalho desenvolvido em defesa dos direitos humanos. Hoje desfruta conceito internacional.
• Com 54 mil votos, foi o terceiro mais votado em 1998. Agora, com 58 mil, vai para a quarta suplência. Foi desbancado pelo seu ex-chefe de gabinete, Paulo Pimenta, que fez campanha forte.
• Para anotar: o deputado Marcon (PT) garante que não pretende deixar o PT, mesmo com a guinada ao centro de Lula que assumiu um discurso social-democrata. Representante do MST na Assembléia, diz que “o PT é referência para a esquerda da América Latina e mundial”.


ROSANE DE OLIVEIRA

Regras absurdas
Quando se passa os olhos pela lista de políticos que as urnas aposentaram – ou que ficarão na geladeira pelos próximos quatro anos – é impossível não compará-la à relação dos que saem consagrados. A renovação é saudável e a vontade do eleitor deve ser respeitada mesmo quando comete uma aberração, mas é impossível aceitar certos absurdos que fazem parte das regras do jogo. É o caso do fenômeno Enéas, que está levando para a Câmara dos Deputados cinco ilustres desconhecidos na carona de seus mais de 1 milhão e 500 mil votos.

Uma Câmara que perderá deputados com a qualidade de um Marcos Rolim (58.889 votos) ou de um Osmar Terra (70.236) terá na bancada de São Paulo cinco deputados com meia dúzia de votos e nenhuma expressão política, beneficiados porque se filiaram ao Prona de Enéas. Que 1 milhão e meio de eleitores paulistas tenham votado em Enéas, o folclórico candidato que disputou três vezes a Presidência e agora resolveu ser deputado, tudo bem. O problema é a lei não exigir um mínimo de votos para os que se elegem graças ao desempenho desses campeões de votos.
Essa distorção vinha ocorrendo no Rio Grande do Sul nas últimas três eleições, por conta da extraordinária votação do deputado Sérgio Zambiasi, que carregava nas costas nomes pouco expressivos do PTB. Agora que Zambiasi concorreu ao Senado, os gaúchos ficaram sabendo qual é o verdadeiro tamanho do PTB, o partido que mais perdeu cadeiras na eleição para a Assembléia Legislativa.
Por razões idênticas impõe-se uma mudança na lei que trata da substituição dos senadores. Não é razoável que um senador se afaste do Parlamento para ocupar um cargo no Executivo – ou mesmo em caso de morte – e seja substituído por um obscuro suplente, cujo nome nem seus eleitores sabem. Imagine-se o tamanho da frustração dos mais de 2 milhões de eleitores de Paulo Paim ou dos mais de 10 milhões de Aloizio Mercadante se Luiz Inácio Lula da Silva for eleito presidente e convidá-los para integrar seu ministério. Ou dos 4 milhões de fluminenses que votaram em Sérgio Cabral Filho, se Serra ganhar a eleição e incluí-lo em seu ministério.
Suplente deveria ser o candidato ao Senado que ficou logo abaixo do eleito na classificação geral. Pela ordem, Emília Fernandes e José Fogaça, no Rio Grande do Sul. Mas isso é tema para a reforma política, a mais difícil de todas as que o país precisa fazer.


Editorial

O RECADO DOS ELEITORES

Ao optarem por uma votação em segundo turno para a Presidência da República e para um número expressivo de Estados, os eleitores deixaram claro que desejam transformações, mas pretendem vê-las implantadas com o máximo de cautela. Os resultados das urnas demonstram que os brasileiros referendaram pelo voto nomes consagrados da política, mas abriram espaço também para novas forças políticas em governos estaduais, Assembléias Legislativas e no Congresso. O recado transmitido nas urnas demonstra ao mesmo tempo que o país conta hoje com um número recorde de candidatos aptos a pleitear uma oportunidade no Executivo e no Legislativo em condições de igualdade. Ao mesmo tempo, revela que os eleitores estão mais exigentes, a ponto de uma parcela expressiva cobrar mais tempo para refletir sobre o seu voto.

A constatação de que a população brasileira optou novamente pela possibilidade de mudança com precaução deve fornecer ensinamentos à sociedade, aos candidatos e aos partido s. A mais expressiva das lições, mais uma vez sugerida pelos resultados eleitorais, é de que nas democracias o poder é transitório, cabendo ao eleitor o controle da qualidade de quem exerceu cargos executivos e legislativos. À medida que amadurece, a democracia se mostra crescentemente capaz de fazer opções, de continuar ou rejeitar projetos e de aceitar alternativas. O resultado da eleição de domingo indica que ninguém recebeu carta branca, nem mesmo nos Estados em que a decisão se deu no primeiro turno.

As urnas mostraram a vontade de mudança, mas também que muitos brasileiros preferem esperar até a última hora para decidir

Se de um lado permite mais tempo e melhores condições para que os eleitores possam avaliar melhor as propostas dos candidatos que seguem na disputa, a extensão das eleições – particularmente a presidencial –, abre uma brecha para mais intranqüilidade na área econômica. O comportamento de alguns dos principais indicadores da vulnerabilidade financeira registrado ontem, com a volta das pressões sobre o câmbio e o risco Brasil e a queda das ações negociadas em bolsa, confirma a ameaça de que esse quadro venha a se incorporar ao cotidiano por menos de três semanas. Por isso, até que os eleitores confirmem a sua opção entre Luiz Inácio Lula da Silva ou José Serra para o Planalto, é importante que o país se encarregue de dissipar ao máximo as razões que possam ampliar o nervosismo dos investidores. O governo pode colaborar nessa tarefa facilitando as condições para a transição. Os candidatos, aproveitando o período até 27 de outubro para detalhar ao máximo seus projetos, procurando transmitir tranqüilidade aos eleitores, ao setor produtivo e ao mercado financeiro.

As urnas, portanto, mostraram a vontade de mudança, mas também que muitos brasileiros preferem esperar até a última hora para decidir. Agora, é preciso assegurar que esse gesto de maturidade política garanta o máximo de ganhos para a democracia e o mínimo de custo econômico para o país.


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10/08/2002


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