Audiência revela convergência sobre necessidade de uniformizar decisões de Juizados Especiais



A necessidade de uniformização na interpretação de leis federais, com a finalidade de gerar princípios para aplicação comum nos Juizados Especiais de todo país, foi reconhecida por todos os expositores que participaram de audiência na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), nesta quinta-feira (16). Os convidados, no entanto, apresentaram diferentes soluções quanto à forma de se chegar a esse objetivo, apontado como uma exigência para evitar que esses juizados continuem dando sentenças divergentes no exame de causas idênticas apresentadas pela população.

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O tema foi debatido para instruir decisão sobre projeto (PLC 16/07) que trata da uniformização, de autoria do Executivo e já aprovado na Câmara dos Deputados. O texto institui no âmbito dos Juizados Especiais uma nova espécie de recurso - o chamado incidente processual. Com base nele, a parte prejudicada, em decisão que contrarie súmula ou jurisprudência (resultado da interpretação de lei que ganha efeito normativo) estabelecida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), poderá provocar esse órgão para resolver a divergência.

Pelo projeto, o STJ poderia ser também acionado quando as turmas recursais de diferentes estados, instância final de apelação das decisões dos Juizados Especiais, estiverem em desacordo com súmula ou jurisprudência. Se a divergência de interpretação da lei envolver matéria constitucional, as partes podem até mesmo levar a questão ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Para o Ministério da Justiça, que preparou o projeto, as alterações na lei que trata dos Juizados Especiais (L. 9.099/85) vão garantir maior velocidade nas decisões desses órgãos - onde podem ser ajuizadas causas no valor de até 40 salários mínimos. Isso ocorreria porque, toda vez em que uma matéria for uniformizada, seria também aplicada medida para vincular todos os julgamentos dos Juizados Especiais em causas idênticas. No debate, no entanto, houve seguidos alertas de que, ao contrário, o recurso ao STJ pode retardar indefinidamente decisões do interesse do cidadão comum, além de sobrecarregar ainda mais os ministros desse tribunal - como informado, cada um já respondendo hoje, em média, por cerca de 10 mil processos.

Pacto Republicano

O ministro Gilson Dipp, do Supremo Tribunal Federal (STF), reconheceu que o STJ não estaria preparado para uma demanda adicional de processos. No entanto, observou que os Tribunais Especiais Federais já praticam a uniformização da jurisprudência e que mesmo deve ser acontecer no plano dos Juizados Especiais. Essa questão é tão importante que, lembrou o ministro, foi incluída no chamado Pacto Republicano, firmado na semana passada, entre os presidentes dos três Poderes, com a finalidade de produzir reformas essenciais na legislação do país.

- Há, portanto, interesse do Judiciário em projeto que discipline esse mecanismo [da uniformização]. Isso será eficaz na prestação jurisdicional - observou.

Para que a proposta funcione, sem criar demanda excessiva sobre o STJ, ele sugeriu que seja criado um sistema de "filtragem" de todas as causas que podem envolver divergências interpretação. Esse trabalho caberia a "turma nacional de uniformização" que, como sugeriu, poderia funcionar como um braço do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

O ministro Hamilton Carvalhido, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), considera necessária a uniformização, mas sugeriu que os próprios Tribunais Estaduais de Justiça decidam sobre as divergências, levando em conta a jurisprudência do STJ. Apontado como o maior responsável pela instituição da lei que criou os Juizados Especiais, o desembargador aposentado José Fernandes Filho, de Minas Gerais, condena a instituição de órgão vinculado ao CNJ ou aos Tribunais de Justiça dos estados para isso. Entre outras razões, mencionou a complexidade de ritos nas demais estruturas do Judiciário, com prejuízo para a velocidade dos processos e para o acesso das pessoas simples.

- Criar um órgão a nível federal vai certamente suspender a caminhada vitoriosa dos Juizados Especiais, o maior projeto de inclusão social já feito no Brasil até então - reclamou.

Como solução, Fernandes Filho defendeu proposta já adotada no Mato Grosso do Sul, onde os chamados "incidentes de uniformização de jurisprudência" são examinados por uma Seção Especial de Uniformização composta pelos membros titulares de cada turma recursal do próprio Juizado Especial, instituída por lei estadual. Provocado pelas partes ou pelas turmas recursais, a Sessão Especial deve emitir súmula em consonância com a súmula ou jurisprudência dominante do Tribunal de Justiça do estado e do STF.

Coube a Rêmolo Letteriello, desembargador do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul, explicar de forma prática como funciona essa Seção Especial. Para isso, ele citou o caso da assinatura básica nos serviços de telefonia, em que havia sentenças divergentes no próprio estado, contra ou favor da cobrança. Segundo ele, depois que o STJ considerou legal a cobrança, a Seção Especial editou uma súmula confirmando essa interpretação. A possibilidade de recurso prevista pelo projeto, junto ao STF, seria danosa, sobretudo, como explicou, porque vão ficar paralisadas todas as ações que estiverem transitando nos Juizados Especiais que tratarem do mesmo tema.

- Se o projeto for aprovado, e tendo em vista a diversidade das espécies de ações possíveis junto ao STF, haverá um grande retrocesso. Não tenho dúvida que, por traz disso, estão as multinacionais, as empresas de telefonia querendo postergar decisões que vão chegar ao STJ - afirmou.

Gorette Brandão / Agência Senado



16/04/2009

Agência Senado


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