Avanços obtidos desde Copenhague ajudam negociação na COP 16, afirma Thelma Krug



Uma das especialistas brasileiras mais ativas nas negociações internacionais de mudanças climáticas, Thelma Krug, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), acredita que houve avanços entre as convenções de Copenhague (2009) e Cancún (2010). Porém, a cientista afirma que ainda há muito trabalho pela frente quanto à discussão sobre a definição de metas de redução de gases do efeito estufa para o segundo período de compromisso do Protocolo de Quioto, a partir de 2012. 

Portal Brasil - Quais suas expectativas sobre os resultados da COP 16? 

Thelma Krug – As expectativas são bem menores do que as que existiram em Copenhague, mas acredito que isso vai ajudar. Não creio que se consiga finalizar a arquitetura do futuro regime internacional do clima em Cancún. Entretanto, de Copenhague até aqui, alguns avanços foram feitos – os quais poderão auxiliar o processo de negociação na COP 16. Há que se reconhecer que ainda existe uma gama de pontos muito importantes que precisam ser acordados. 

PB – E em relação a um segundo período para o Protocolo de Quioto? 

TK – O Protocolo de Quioto, a meu ver, continuará a existir, mas também não creio que as metas de redução de emissões para os países desenvolvidos, para o segundo período de cumprimento, serão finalizadas. O argumento é o de que existem ainda regras não totalmente claras sobre como esses países vão poder utilizar uso da terra, mudança do uso da terra e florestas na demonstração de cumprimento de suas metas quantitativas. Normalmente, o setor florestal é um sumidouro e não fonte de emissões de gases de efeito estufa, e a arquitetura hoje existente permite que o país tenha mais direito a emitir, caso suas florestas (ou, mais precisamente, suas atividades de manejo florestal, manejo agrícola e de pastagem e reflorestamentos) resultem em uma remoção líquida de CO2 da atmosfera. 

Outro ponto em aberto refere-se à forma como os mecanismos de flexibilização, a exemplo do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), que permite transações de reduções certificadas de emissões entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, poderão ser usados (o que pode gerar certificados, se há limitação de utilizar-se reduções certificadas no lugar de ações domésticas de redução de emissões etc). 

Mas enquanto as regras para os países desenvolvidos que não estão no Protocolo de Quioto não ficarem minimamente acordadas, o Protocolo de Quioto também não terá avanços. As discussões na Convenção – que incluem a forma de engajamento dos países desenvolvidos não Partes de Quioto e também dos países em desenvolvimento, particularmente no que refere-se as suas ações de mitigação nacionalmente adequadas (NAMAS) –, correm em paralelo com as discussões no Protocolo de Quioto. Tenho certeza de que, em algum ponto no tempo, os dois serão fechados simultaneamente. 

PB – A senhora acredita que o Brasil esteja adiantado em relação a um futuro sistema de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação (REDD)? 

TK – O Brasil é considerado o país mais preparado para REDD, por conta de ter um Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia, ter um sistema de monitoramento extremamente confiável para o desmatamento (incluindo, mais recentemente, degradação florestal), estar demonstrando ter a capacidade de reduzir as suas emissões por desmatamento na Amazônia, de já estar engajado em atividades de capacitação no monitoramento de florestas e estar transferindo suas tecnologias para processamento de dados, administração de grandes bancos de dados, etc.

Sob a liderança do ministério do Meio Ambiente e com o engajamento de vários outros ministérios, particularmente os de Ciência e Tecnologia e de Relações Exteriores, discutimos com vários segmentos da sociedade civil uma proposta para uma estratégia nacional para REDD em que seriam definidas as atividades, a elegibilidade, a forma de financiamento, a organização institucional, o repartimento de benefícios, entre outros. Ou seja, o Brasil está bem mais avançado do que a maior parte dos países em desenvolvimento. Mas ainda há muito o que fazer para que o mecanismo possa ser implementado, como o monitoramento das alterações de cobertura florestal em todos os biomas brasileiros e a implantação de um inventário florestal nacional. 

PB – Mas pode haver avanços importantes no México? 

TK – Pode ser que em Cancún se decida implementar, sob o acordo multilateral, as atividades das fases 1 e 2 de REDD. Ou seja, desenvolvimento de planos nacionais de ação, identificação de medidas para redução do desmatamento e da degradação florestal, e implementação de projetos demonstrativos. Para isso, seria necessário que os países desenvolvidos assumissem a responsabilidade de financiar plenamente essas fases, e que não envolva mercados de carbono (de forma compensatória ou não). 

PB – Que anúncios mais importantes são esperados do Brasil na Conferência? 

TK – O Brasil deverá apresentar a sua Segunda Comunicação Nacional e o segundo inventário nacional de gases de efeito estufa para o período 1994 – 2005. O estudo introduziu alguns refinamentos metodológicos significativos, particularmente no setor de uso da terra e florestas, Realmente, o Brasil demonstrará uma liderança na elaboração do inventário deste setor, considerado um dos mais complexos dentre os setores reportados (Energia, Agricultura, Processos Industriais, Solventes, tratamento de resíduos). 

PB – Qual tem sido o avanço da ciência e da tecnologia do clima no Brasil? 

TK – O Brasil possui um supercomputador instalado no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) que permite refinamentos na área de modelagem regional, o que trará importantes avanços no conhecimento científico. Mais especificamente, projeções sobre impactos das mudanças do clima sob diferentes cenários de estabilização dos gases de efeito estufa na atmosfera e seus efeitos sob a temperatura e precipitação média. A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) também tem avançado nos seus estudos, particularmente buscando compreender o impacto da mudança do clima nas culturas mais relevantes para o País e possíveis ações de adaptação, como produção de sementes mais resistentes à falta de água, etc. Paralelamente, o País continua investindo em ciência e desenvolvimento tecnológico para energias renováveis, particularmente biomassa. A Petrobras também tem feito investimentos significativos em captura e armazenamento de carbono, que é uma das possibilidades para prevenir que as emissões de gases de efeito estufa cheguem à atmosfera. 

>> Acompanhe a participação do Brasil na COP 16 

Fonte:
Portal Brasil Internacional



03/12/2010 20:31


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