Copa 2014: dúvidas com relação a legado persistem
O auditor do TCU Rafael Jardim apontou problema crônico no dimensionamento das obras
Quando o Brasil foi escolhido como sede da Copa do Mundo de 2014, em 2007, muito se falou no legado que o mundial de futebol deixaria no país, como estádios modernos e obras de mobilidade urbana que ajudariam a melhorar a vida de milhões brasileiros. Faltando menos de 100 dias para o jogo de abertura entre Brasil e Croácia, no dia 12 de junho, persistem as dúvidas sobre os resultados efetivos desses investimentos, como ficou demonstrado durante debate interativo promovido nesta terça-feira (11) pela Comissão de Educação, Cultura e Esporte (CE).
Cidadãos que enviaram perguntas e comentários, senadores e debatedores manifestaram preocupação com as obras previstas na "Matriz de Responsabilidades", documento lançado em 2010 pelo governo com a lista de obras de mobilidade urbana que deveriam estar prontas até o início da Copa do Mundo. Das 56 previstas inicialmente, apenas cinco ficaram prontas. Outras 35 estão sendo tocadas, mas a maioria não deve ficar pronta para o Mundial, tendo sido inclusive retiradas do documento.
Ao tirarem as obras da matriz, estados e municípios se eximiram de ter que finalizá-las até junho, quando começa o Mundial. Entre as obras mantidas, a construção e a reforma de estádios são as que se encontram em estágios mais avançados. Contudo, o custo e a qualidade de alguns estádios construídos para a Copa também têm recebido críticas.
Esse é caso, por exemplo, da Arena da Amazônia, em Manaus (AM), que recebeu no domingo (9) seu primeiro evento-teste. Apesar do público de apenas 20 mil pessoas – o estádio tem capacidade para 42 mil espectadores – para a partida entre Remo e Nacional, houve reclamações sobre acessibilidade, transporte e estacionamento.
O estádio Mané Garrincha, em Brasília, tem sofrido críticas pelo custo, que ultrapassou R$ 1,4 bilhão, e pela estrutura – devido a goteiras e dificuldades no acesso à internet. Segundo o jornalista e diretor do Portal da Copa 2014, Rodrigo Magalhães Prada, se comparados o curso por assento nos estádios, o Brasil tem gastado bem mais que África do Sul e Alemanha, que sediaram as edições anteriores do evento. O primeiro deve gastar R$ 7.983,60 por cadeira, contra R$ 3.600,00 do país europeu e 3.270,00 do africano.
— Nenhum estádio brasileiro tem pronta a estrutura de tecnologia da informação. Será a Copa do mundo das mídias sociais, mas os 600 mil turistas que estarão aqui terão dificuldades nessa área – apontou.
Aeroportos
As reformas e obras de ampliação em aeroportos também registram atraso e levantam preocupação. Apenas 85% das obras do aeroporto de Confins, na região metropolitana de Belo Horizonte (MG), devem ser entregues até a Copa. Em Fortaleza, apenas a parte inferior do terminal deverá ficar pronta até abril. Outros aeroportos devem ter obras provisórias, os chamados “puxadinhos”.
Na avaliação do Tribunal de Contas da União (TCU), a falta de planejamento nos projetos é um dos motivos dos atrasos.
— Eventualmente o empreendimento atrasa porque o prazo foi mal dimensionado. Em 99% dos casos aqueles prazos foram justificados mediante experiência do projetista. Isso é recorrente, Copa ou não Copa – apontou o assessor do ministro relator das obras da Copa do Mundo, Rafael Jardim Cavalcante.
O presidente do Sindicato Nacional das Empresas de Arquitetura e Engenharia Consultiva (Sinaenco), José Roberto Bernasconi, concordou. Segundo ele, projetos mal formulados são responsáveis pela falsa expectativa criada em torno da conclusão de todas as obras até o evento. Mas, para Bernasconi, o legado da Copa para os brasileiros é inegável.
— Os estádios são modernos, efetivamente, o Brasil aprendeu a fazer. Há obras de infraestrutura? Teremos, sim, algumas delas não ficarão para a Copa, mas terão sido motivadas pela Copa, então dá para dizer que é um legado que vem da Copa. Pena que não fique tudo pronto até a Copa – ponderou.
Também para o professor e pesquisador da Universidade de São Paulo (USP) Lamartine Pereira da Costa, independentemente de todas as obras estarem concluídas até junho, o mundial tem funcionado como um processo catalisador de melhorias em infraestrutura.
— A Copa é um momento, um ponto de um processo muito mais sofisticado. É um processo catalisador de qualquer cidade que ele foi implantando. Há três décadas não se fazia obra de mobilidade urbana no Rio de Janeiro. Hoje é um canteiro de obras – disse.
Mas Cyro Miranda teme que elas sejam abandonadas após o fim do evento esportivo.
— Só tem legado quando ele é entregue. Temos preocupações grandes. Depois que passar a Copa, quanto tempo levaremos para entregar esse legado? - indagou.
Interatividade
Ao lerem manifestações de internautas enviadas por meios dos canais interativos do Alô Senado e do e-Cidadania, os senadores Alvaro Dias (PSDB-PR) e Ana Amélia (PP-RS) disseram que é notável a insatisfação da opinião pública em relação aos gastos com a Copa e os atrasos nas obras de mobilidade urbana e em portos e aeroportos.
— Não vamos adotar uma postura de avestruz, a de enfiar a cabeça na areia, para não enxergar o que se passa ao redor. Essa é a realidade no Brasil. Basta encomendar uma pesquisa. Nós vamos verificar que a maioria esmagadora da população brasileira entende que o povo brasileiro está sendo pilhado na realização dessa Copa do Mundo – disse Alvaro Dias.
Apresentação de Adalberto Santos de Vasconcelos
Apresentação de Lamartine Pereira da Costa
Apresentação de Rodrigo Magalhães Prada
11/03/2014
Agência Senado
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