ECONOMISTA PROPÕE REALOCAÇÃO DOS GASTOS SOCIAIS DO GOVERNO



O atual padrão de gastos sociais feitos pelo governo federal representa, na prática, uma transferência de renda dos mais pobres para os mais ricos, disse nesta quinta-feira (dia 30) o economista José Márcio Camargo, em palestra na Comissão Mista para Erradicação da Pobreza. A partir desse diagnóstico, ele propôs que se retire metade do que os 40% mais ricos estariam se apropriando das despesas sociais públicas, que totalizam R$ 130 bilhões anuais, correspondentes a 20% do PIB. O economista entende "gasto social" como o total de recursos orçamentários federais destinados à Previdência, saúde, educação, trabalho e assistência social.
Os dados que fundamentam o diagnóstico de José Márcio Camargo, pesquisador da Universidade Federal do Rio de Janeiro, referem-se à distribuição de acesso aos gastos sociais conforme a renda, segundo os quais 43% dos gastos com educação de 2º grau são apropriados pelos 40% mais ricos. Esses, de acordo com economista, já detentores de mais de 80% da renda nacional, também se apropriam de 91% das despesas públicas com educação superior, de 85% dos gastos com bolsas de estudo, de 82% das despesas com aposentadoria, assim como de 42% dos custos totais com atendimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Pelos cálculos de Camargo, retirar 50% do acesso a recursos públicos hoje garantidos aos 40% mais ricos da sociedade brasileira permitiria a criação de um fundo com 20% do total de R$ 130 bilhões, restando apenas desenhar um programa de transferência de renda, que poderia ser "um programa de bolsa-escola de verdade". O programa por ele defendido teria as seguintes características: a renda deveria ser transferida para as famílias que mantivessem todos os filhos de 6 a 18 anos em escolas públicas; concedida à mãe e não ao pai; sob forma de renda e não em espécie, e alocada conforme outro indicador de pobreza que não o de renda.
Para José Márcio Camargo, comparativamente aos outros países da América Latina, o Brasil, "ao contrário do que se imagina", é o que mais gasta na área social. É também, como afirmou, o que mais tem investimentos em capital físico, maior valor agregado às mercadorias que produz, taxa de desemprego menor que a média latino-americana e sindicatos com razoável poder de barganha. O que mais diferencia o Brasil na América Latina, a seu ver, é o fato de ser o país que menos investe em capital humano, a ponto de apenas Honduras e Guatemala registrar índices educacionais inferiores ao brasileiro.
Em seu comentário sobre a exposição do economista, o deputado Roberto Brant (PFL-MG), relator da comissão, concordou com o diagnóstico e a realocação de recursos proposta por José Márcio Camargo. Registrou, no entanto, sua descrença quanto ao êxito de o Congresso promover essa realocação através das necessárias reformas estruturais - Previdência, instituição de ensino pago nas universidades públicas federais, entre outras.

30/09/1999

Agência Senado


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