Especialistas pedem cautela na regulamentação da internação compulsória




Roberto Tikanori (E), Ana Rita, Humberto Costa e Vitore Maximiano

Em audiência pública para debater a internação compulsória de dependentes químicos, nesta quinta-feira (27), representantes de ministérios e do Conselho Federal de Psicologia (CFP) reafirmaram posição contrária à judicialização da saúde mental e atendimento aos dependentes de drogas.

O debate foi promovido pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), sob a condução do senador Humberto Costa (PT-PE), autor do requerimento de realização da reunião junto com o senador Paulo Paim (PT-RS).  O objetivo foi instruir a análise do Projeto de Lei da Câmara (PLC) 37/2013, que altera o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (Sisnad).  O assunto, segundo a presidente da CDH, Ana Rita (PT-ES), deve ser amplamente debatido. Ela enfatizou que a internação compulsória de usuários de drogas é um dos assuntos mais complexos enfrentados hoje pela humanidade.

Questão de saúde

Humberto Costa ponderou sobre a pertinência do PLC 37/2013 e sobre o Projeto de Lei do Senado (PLS) 111/2010, que prevê a criminalização do usuário, também relatado por ele. O parlamentar questionou se o debate teria relevância nos termos em que está em discussão ou se seria mais proveitoso sendo associado ao projeto de lei sobre a reforma psiquiátrica no Brasil. Com esse enfoque, avaliou, o debate do campo penal seria substituído por uma discussão do ponto de vista da saúde.

Ele também questionou se seria possível, para os legisladores que acompanham os projetos de lei no Senado, discernir ou legislar sobre questões tão técnicas que, segundo o coordenador de Saúde Mental no Ministério da Saúde, Roberto Tykanori, seriam mutáveis com o avanço da ciência. Para Tykanori, antes mesmo da internação compulsória para desintoxicação por ordem judicial, deveria haver profunda reflexão sobre a qualidade da rede que acolhe o dependente químico.

— A expressão internação compulsória tem origem no Código Penal, quando se trata de crimes cometidos por pessoas com distúrbios mentais. A judicialização da internação não deveria ser tratada nestas condições, mas sob a ótica estrutural, da falta de atendimento de rede. Os juízes deveriam questionar a falta de estrutura na rede —  afirmou o coordenador, baseado em entendimento do Conselho Nacional de Saúde.

Internação compulsória

Para o secretário Nacional de Políticas sobre Drogas, Vitore Maximiano, a prática de internação compulsória ainda é pouco usada no país, mas existem ordens judiciais que precisam ser cumpridas não só em termos de atendimento de saúde, mas com apoio de assistência social.

— O ministério é contra a prática de internações compulsórias, mas os serviços de assistência social são indispensáveis para o sucesso dessas políticas — afirmou Vitore.

Dados do MJ demonstram que 80% de dependentes químicos entrevistados nas ruas em 2013 aceitariam tratamento voluntariamente, o que na opinião do secretário demonstraria a falta de sentido nessa modalidade de internação, prevista na lei Lei 10.216 de 2001. O secretário reiterou que as comunidades terapêuticas seriam para acolhimento suplementar à rede pública, com papel central na internação quando necessária, em casos de comorbidades ou risco real de morte para o dependente.

Maximiano disse que 40% dos usuários de crack estão nas ruas e acrescentou que o dependente dessa droga é alguém submetido a uma vulnerabilidade social ainda maior que aquela a que está submetido quem faz uso regular de outros entorpecentes.

Problema  grave

A representante do Conselho Federal de Psicologia (CFP), Marcia Landini Totugui, disse que a internação compulsória deve ser repelida enquanto prática, pois o problema social em volta dos dependentes seria muito mais grave.

— A pergunta que não quer calar é: Por que apoio a instituições de isolamento com recursos quando simultaneamente ao longo dos anos fizemos uma rede de tratamento voltado para a atenção psicossocial que preconiza o atendimento em comunidades baseadas no tratamento em rede, com educação, saúde, assistência social, associação de pais? — indagou.

Segundo a psicóloga, os Centros de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (CAPS/AD) têm realizado internações programadas, com tempo de internação previstos e atendimento integral, envolvendo família e instituições de governo para resolver as questões em volta do problema. Ela informou que relatório produzido pelo Conselho Federal de Psicologia em relação a comunidades terapêuticas em todo o país trouxeram à tona uma série de situações discutíveis.



27/03/2014

Agência Senado


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