'Estelionato eleitoral ou ruína'








'Estelionato eleitoral ou ruína'
Serra diz que Lula não é santo, no depoimento que gravou, sozinho, na madrugada de domingo

BRASÍLIA - O candidato do PSDB à Presidência, José Serra, afirmou ontem que a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas eleições pode representar um grande estelionato eleitoral ou resultar na ruína do país. A afirmação foi feita em pronunciamento veiculado na propaganda eleitoral de ontem à noite.

- Se o Lula fosse eleito, estaríamos diante de duas possibilidades: ou ele cumpriria seus compromissos recentemente assumidos com os empresários e estaríamos, assim, diante do maior estelionato eleitoral, depois da eleição de Collor; ou, se tentasse cumprir suas promessas mágicas com a população, levaria o Brasil à ruína - advertiu o candidato.

Segundo Serra, isso é resultado dos diferentes discursos de Lula, proferidos de acordo com o público.
- Se o Lula não é um demônio, ele também não é um santo. Lula é um candidato como eu, que pode e deve ser questionado - comparou.

O pronunciamento foi cercado de expectativa ao longo da semana, por ter sido anunciado como algo ''muito importante''. O objetivo da conclamação de Serra, segundo o líder do PSDB na Câmara, deputado Jutahy Júnior (BA), foi despertar a racionalidade do eleitor.

- Eu quero dizer que, para mim, as opções do Brasil, felizmente, não são apenas a do estelionato eleitoral ou a da ruína - assegurou Serra, ao concluir o pronunciamento.

Os coordenadores tucanos acreditam que o PT construiu um clima de comoção nacional e deixou a eleição com um caráter plebiscitário. A única chance de Serra, segundo o prefeito de Vitória (ES), Luiz Paulo Vellozo Lucas (PSDB), é trazer a racionalidade para o eleitorado.

- Temos que admitir: mudar o resultado da eleição é improvável. Mas não é impossível - afirma o tucano.
Serra gravou o pronunciamento na madrugada de sábado para domingo, contrariando as expectativas dos aliados, que acompanhariam a gravação, agendada para o início da tarde de ontem.

Jutahy conta que recebeu um telefonema de Serra por volta de meia-noite do sábado. O candidato avisou que gravaria o programa sozinho, durante a madrugada. Argumentou que estaria em campanha no domingo. Serra deixou o estúdio depois das cinco da manhã.

O deputado afirma que o objetivo é quebrar uma espécie de equação matemática equivocada que vem se repetindo: ''O governo Fernando Henrique é ruim, Serra é o candidato do governo, portanto, voto em Lula''.
- Estamos remando contra a maré. Essa lógica é falsa e embasada em uma avaliação puramente emocional - avalia o líder tucano.


Lula prepara espíritos para tempos difíceis na economia
Candidato petista alertou que um cenário adverso aguarda o Brasil

BRASÍLIA - O candidato do PT à Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva, preparou ontem o espírito dos eleitores para o cenário econômico adverso que encontrará caso seja eleito presidente no próximo domingo. Em uma atitude semelhante à que teve o presidente Fernando Henrique Cardoso na campanha de 1998, Lula advertiu que as dificuldades que o país terá pela frente exigirão coragem e espírito de sacrifício de todos e apontou a equipe econômica do governo como responsável pela situação.

- Se houver sacrifícios, serão sacrifícios para todos. Mas se houver benefícios, também serão distribuídos a todos - declarou o candidato do PT, reproduzindo com uma linguagem mais popular o que havia dito no sábado aos empresários e sindicalistas que discutiram com ele a criação de um Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social em seu eventual governo.

Tal como Fernando Henrique, Lula não quer ser acusado de ter cometido um ''estelionato eleitoral'', quando a realidade do governo impuser ações contrárias aos sonhos prometidos durante a campanha eleitoral.

No discurso de ontem, Lula criticou diretamente seu adversário, José Serra (PSDB), no programa eleitoral. Deu um ''puxão de orelha'' no candidato tucano, dizendo que ele integrou o governo por duas vezes nos últimos oito anos e teve oportunidade de fazer tudo o que propôs na campanha.

- Se ele sabe como resolver essa crise, por que não fez isso antes? - indagou.

Lula programou uma agenda de viagens pesada nos próximos dias, mas a confirmação dependeria ainda de uma avaliação do pronunciamento feito ontem por Serra. Se fosse necessário gravar respostas, ele poderia cancelar algum compromisso.

Hoje, ele estará no Rio para participar do lançamento de suas propostas para a cultura, firmadas do documento A Inteligência a Serviço do Brasil, que será apresentado no Canecão, em um evento com personalidades do meio artístico e cultural brasileiro.

Na terça-feira, Lula deverá viajar para três Estados onde candidatos petistas disputam o segundo turno. No Distrito Federal, participará de uma carreata com o deputado Geraldo Magela na cidade satélite de Taguatinga. Em Belém, fará comício ao lado da candidata do PT ao governo do Pará, Maria do Carmo. Em seguida, seguirá para Fortaleza, onde faz campanha para José Airton.

Na quarta-feira, Lula visita as duas maiores cidades do Mato Grosso do Sul - Dourados, Campo Grande - e a Florianópolis (SC).


Candidato defende governo gaúcho
SÃO PAULO - No programa da tarde, o PT se preocupou em mostrar aos eleitores o desenvolvimento do Rio Grande do Sul, durante o programa eleitoral gratuito de ontem à tarde na TV. O motivo foi o ataque feito, na noite de sábado, pelo PSDB, que criticou a administração petista no Estado. O presidenciável José Serra não apareceu no programa.

-O Rio Grande do Sul está magoado por causa das acusações feitas no programa de Serra -, disse um apresentador do PT, após Luiz Inácio Lula da Silva dizer que para governar o país é necessário diálogo -o que ele ''sabe fazer como poucos'' - e dar explicações sobre seu plano de governo para as áreas econômica, social, da segurança, educação e saúde.

No programa foram listadas ações do governo gaúcho e qualidades do Estado, como o aumento do salário mínimo para R$ 260, o desemprego em Porto Alegre que, segundo o PT, tem a menor taxa entre as capitais do país, e o fato do governo não aceitar pagar a quantia exigida pela Ford para se instalar no Estado e os investimentos nas polícias.

Foram mostrados depoimentos de moradores elogiando o governo do PT.

No sábado, os apresentadores do horário tucano disseram que o Ri Grande do Sul era um ''Estado modelo'', que foi destruído pela ''incompetência da administração petista''.

O programa mostrou entrevistas com vários gaúchos, que criticaram o PT. Também foram exploradas as ligações do governo local com o MST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra), com depoimento de proprietários que chegaram a ficar como reféns de integrantes do grupo.

Ontem à tarde o programa de Serra não repetiu as imagens anteriores. Limitou-se apenas em mostrar uma conversa entre mãe e filha. A filha contou para a mãe que o avô, gaúcho, pintou a casa de verde e amarelo, cores usadas na campanha de Serra. A mãe respondeu: ''Ele (avô) viu o que o PT fez no Rio Grande do Sul''.
O programa voltou a mostrar declarações de pastores e Serra deu ênfase à valorização da família, assim como havia feito em seu programa de sábado à tarde. Disse que há a necessidade de diálogo entre pais e filhos e que as crianças e jovens precisam aprender sobre a pátria e a solidariedade. ''É preciso dar (aos jovens e crianças) acima de tudo um choque de valores, mostrar às crianças o sentimento de pátria, ética e solidariedade, como ocorre no interior dos Estados'', disse.

A atriz Beatriz Segall voltou a aparecer no programa. E la defendeu a colega Regina Duarte e disse que também tem medo de Lula.

- Eu tenho medo. Também estou com medo de não poder dizer que estou com medo, de ser ameaçada de processo por discordar. Tenho medo de alguém que recorre a ofensas pessoais. Não tenho medo das atrizes mais jovens, a quem sempre dou minha ajuda'', disse Beatriz Segall, referindo-se às declarações dadas por Paloma Duarte no programa de Lula, criticando Regina.


TFP faz críticas a Lula e Serra
Documento diz que momento é de temor

A Sociedade Tradição, Família, Propriedade (TFP), que se fez conhecer principalmente ao longo dos governos militares por suas passeatas, com estandartes de vermelho vinho, pelas ruas das principais cidades do país, agora prefere utilizar a internet para questionar os dois candidatos à Presidência da República. Tanto o petista Luiz Inácio Lula da Silva, quanto o tucano José Serra são considerados ''de esquerda'' na carta publicada nas páginas eletrônicas do endereço www.tfp.org.br.

No documento, a TFP afirma que ''a imensa massa centrista e conservadora de nosso público - compelida a comparecer às urnas devido à obrigatoriedade do voto - em virtude das circunstâncias que envolveram e condicionaram o atual processo eleitoral, não se viu representada por nenhum candidato''.

Para os integrantes da instituição de tendência radical, o momento é de ''apreensão e temor (diante da) possibilidade de o futuro presidente do Brasil vir a implantar - em especial no que diz respeito à família cristã e à propriedade privada - políticas e diretrizes que atentem gravemente contra os princípios da Ordem natural e da Lei de Deus, explicitados pela doutrina moral e social da Igreja''.

Na carta aberta aos dois candidatos, a TFP pede que eles deixem claro ''se apoiarão ou não a aprovação de leis que legitimem o casamento homossexual''.

O Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) entrou também na alça de mira da TFP. No documento, querem saber se o novo governante do Brasil reprimirá ''ou não as invasões e demais atividades de índole criminosa promovidas pelo MST''. E ainda, ''se pretendem levar adiante o agro-igualitarismo demagógico e socialista, promovendo a Reforma Agrária''.

Para os defensores do radicalismo de direita é importante também saber se o futuro presidente garantirá ou não aos brasileiros ''o direito de adquirir, possuir e portar armas devidamente registradas, para o exercício da legítima defesa''.

A Igreja Católica é citada ao declarar que ''ante o silêncio enigmático do Episcopado, a TFP tenta preencher a lacuna''. O documento é assinado por Luiz Nazareno Teixeira de Assumpção Filho, presidente em exercício do Conselho.


Genoino vai à missa e diz que respeitará religiões
Alckmin afirma que adversário aumenta ataques porque cai nas pesquisas

SÃO PAULO - O candidato do PT ao governo de São Paulo participou da missa realizada de ontem no templo do Terço Bizantino, celebrada pelo padre Marcelo Rossi e pelo bispo Fernando Figueiredo. Na parte inicial da cerimônia, visivelmente constrangido, ele se manteve quase imóvel, enquanto os fiéis dançavam e se abraçavam. Genoino, no entanto, rezou o Pai Nosso, quase inteiro. Mas não aceitou a hóstia, e não levantou as mãos quando padre Marcelo perguntou pelas pessoas que passavam dificuldades por causa das dívidas.

Numa conversa com o padre Marcelo se comprometeu, se for eleito, a respeitar todas as crenças religiosas.
Depois, o candidato participou, com Luiz Inácio Lula da Silva, de uma carreata por alguns bairros da cidade.
No horário eleitoral de ontem, Genoino foi criticado durante o programa eleitoral do governador e candidato à reeleição Geraldo Alckmin (PSDB). Um apresentador tucano disse que bastou Alckmin crescer nas pesquisas de intenção de voto para Genoino passar para o ataque.

O apresentador disse ainda que o petista só critica, mas nunca trouxe um posto de saúde para São Paulo.
Ontem o programa do PT mostrou a situação precária de um hospital estadual, que seria o de Ferraz de Vasconcelos, na Grande São Paulo.

Após a breve crítica do apresentador tucano, Alckmin apareceu na TV e falou do ''sonho da casa própria''. O candidato citou obras na área da habitação e disse que o governo entregou casas para mais de 162 mil famílias de baixa renda.

-Assumi há uma ano e meio, dei continuidade às obras de Mário Covas e agora não dá para parar. Vamos construir novos conjuntos habitacionais em todo o Estado-, disse Alckmin.

A propaganda mostrou cenas de pessoas chorando ao serem sorteadas e receber uma casa.

Já Genoino, seguindo um tema já explorado pelo ex-candidato ao governo Paulo Maluf, repetiu o programa de ontem e criticou o pedágio e a área da segurança no atual governo. Mostrou o depoimento de um representante do Sindicato dos Investigadores de São Paulo, afirmando que as armas da polícia são sucateadas.


Os xiitas do PT no divã de Freud
Antônio Houaiss, cujo pensamento há três anos flutua na eternidade, sustentava que o grande ponto de inflexão da gigantesca obra do gênio de Viena não era o Édipo, mas o Tanatos, outra figura que Freud foi buscar na mitologia e tragédia grega para definir comportamentos humanos. Tanatos, o oposto de Eros, impulso destrutivo e autodestrutivo, simbolizado numa espécie de falcão que pousa nas sombras da existência. Comum a pessoas de motivação complexa, aparece especialmente quando a vida flui no caminho de um êxito. Caso como esse que a Revista Veja que chegou às bancas focaliza ao destacar, provavelmente, uma coincidência, a posição dos xiitas do PT à véspera da vitória de Lula, candidato do próprio partido que luta pelo poder há treze anos e três derrotas. O vôo para o Planalto agora é de cruzeiro? Pronto, os xiitas recorrem ao Tanatos para atrapalhar o quase presidente e a sim mesmos. Freud explica.

As esquerdas reformistas (não revolucionárias) estão vencendo antecipadamente a eleição, como acentuou ainda mais a pesquisa do DataFolha, domingo. Porém em aliança com setores do empresariado, representados na chapa pelo vice de Lula, José Alencar. Elas, as esquerdas, não poderiam encontrar outro caminho melhor do que o da conciliação, uma vez que, quando se fala em política, fala-se em viabilidade. O que não é viável, como o radicalismo, não é essencialmente político. Pode ser filosofia, como em 68 De Gaulle disse a Sartre; pode ser uma fantasia intelectual; pode ser um delírio; pode ser, enfim, a projeção de Tanatos.

Para Houaiss, muito mais importante do que o Édipo, já que Tanatos resulta de uma contradição entre o princípio do prazer, outro título de Freud, e a idéia do sofrimento. Édipo cumpre um destino trágico e seu relacionamento com a própria mãe, Jocasta, nada tem de apelo ao prazer. Além disso, como na ótima tradução do francês Henry Bauchau pela professora Ecila Azeredo Grunewald, o fato é que Édipo e Jocasta tiveram quatro filhos. O encontro entre ambos portanto não foi episódico. Édipo, no fundo, não é mais aquele. Ampliando-se na tela de hoje a imagem que dele faz o próprio Freud, não seria a simples atração de um homem mais jovem pela mulher mais velha. Mas sim a tentativa de alguém reencontrar na vida adulta o afeto que ficou na infância. Visto sob este ângulo realista, Édipo não tem sexo: tanto pode ser masculino, quanto feminino.

Mas e os xiitas? Sua ingenuidade aparente conduz ao tanatismo, pois agridem o doce pássaro da vitória, e estranhas razões, voltam-se até para atrapalhá-la, insatisfeitos com o êxito perto de concretizar treze anos depois de Fernando Collor. Na sucessão de 89, pela margem de apenas um ponto, Lula afastou Brizola da final no segundo turno. E se por um gol no futebol se vence, por um gol também se perde. Agora, inclusive, são 32 pontos à fre nte no quadro irreversível, a uma distância de apenas seis dias e um debate na Globo das urnas, a poucos metros da faixa final. Ajudadas as oposições pela elevação de trezes pontos, pelo Banco Central, da taxa de juros, Tanatos pousou lá também, pois pela primeira vez, não se sabe porque, o devedor eleva seus compromissos espontaneamente em favor dos credores. Reverdece o sonho de há treze anos? Isso incomoda a minoria xiita: revolta-se e reclina-se no divã de Freud. A vida tem dessas coisas.


Palhaços colaboram com o trânsito de Recife
Campanha ajuda a reduzir número de acidentes

Em Pernambuco, violência no trânsito é coisa de palhaço. Para desarmar os ânimos dos motoristas e ao mesmo tempo ensinar as regras do Código Nacional de Trânsito, o Detran de Pernambuco investiu no bom humor. Há dois anos, foi lançado o projeto educativo Vida no Trânsito que conta com 58 atores e animadores de festas, fantasiados de palhaços, que vão todos os dias aos principais corredores de tráfego do Recife, e até de cidades pólo do interior, como Caruaru e Petrolina, mostrar como se deve dirigir.

Eles ficam nas calçadas, nas faixas de pedestres e nos sinais de trânsito com placas indicando a velocidade máxima para o local, apitos e usam a mímica para apontar quem está certo ou errado na direção ou nas ruas. Além dos palhaços, existem dois personagens que encarnam a briga entre o bem e o mal no trânsito: o caveirinha e o superfaixa. O primeiro é o super-herói do mal, que orienta o motorista a parar no lugar errado e faz sinal de positivo para as barbeiragens, enquanto o outro chega e aponta que o certo é parar o carro na faixa de pedestres - estes são alertados e viram alvo de gozação quando atravessam no meio da rua.

- Dirigir mal é uma prática adquirida. Nossa proposta é mudar os costumes e vícios, desprogramando as pessoas para elas não irem pela contramão. Isso de uma forma lúdica, porque, segundo pesquisas, o público não gosta de mensagens negativas, que mostram a violência do trânsito -, diz o diretor-geral do Detran de Pernambuco, Laedson Bezerra.

O resultado da campanha não é brincadeira. Desde que foi implantada, o Detran contabiliza uma redução de 25% nos acidentes e de até 30% nas mortes por atropelamento. Sem prazo para terminar, a campanha consome em média R$ 80 mil por mês em recursos do Detran e do Programa de Redução de Acidentes nas Estradas (PARE), do Ministério dos Transportes. Devido ao seu caráter educativo e social, a campanha obteve autorização da Justiça Eleitoral para continuar mesmo no período de campanha política.

As ações de mídia são focadas no calendário, com os palhaços mudando de figurino no carnaval, nas festas juninas e no Natal, ou em temas específicos como a faixa de pedestres e a redução da velocidado.


Artigos

Cenários lulistas
Gaudêncio Torquato

José Serra foi pego pela lei de Murphy, aquela que diz: ''Se uma coisa pode dar errado, dará. E dará errado da pior maneira, no pior momento e de modo que cause o maior dano possível.'' Não bastassem os 25 milhões de votos que o distanciam de Lula, Serra acaba de ver o seu guarda-chuva, Fernando Henrique, deixá-lo debaixo do maior toró deste segundo turno: o aumento dos juros de 18% para 21%, que, de um lado, onerará os setores produtivos e, de outro, dará aos bancos cerca de R$ 480 milhões mensais, de acordo com cálculos de especialistas.

Na esteira da famosa lei da maldade, que prevê acontecimentos infelizes sempre ocorrendo em série, o protetor Fernando Henrique, em discurso irritado na CNI, afirmou que ''nada vai acontecer, ganhe quem ganhar''. Ora, o alvo da frase é seu candidato, Serra, cuja campanha está montada na propagação do medo, diante da previsível vitória de Lula.

Para muitos, a ênfase do presidente equivale à toalha jogada no chão. A conclusão tem sentido. Afinal de contas, para ultrapassar Lula, Serra teria de colher, por dia, mais de 2 milhões de votos, o que, convenhamos, é tarefa que está a exigir não apenas desempenho extraordinário do candidato mas uma disparada de gafes e erros do adversário. Portanto, os sinais estão todos apontando para uma vitória do petista, restando à análise política a tarefa de interpretar os cenários do governo comandado pelo ex-torneiro mecânico do ABC paulista.
Pelo menos três cenários podem ser vislumbrados. O primeiro, de cor ''tucano-pálida'', seria uma extensão da administração de FHC. As grandes diretrizes da atual gestão econômica seriam preservadas, a partir dos compromissos e metas assumidas com o FMI. Significa dizer que, pelo menos em um primeiro ciclo, a política cambial e o programa de metas inflacionárias seriam continuados, sob o comando de gestores econômicos endossados pelo mercado. A cara mais próxima ao PT e à Lula seria dada com avanços pontuais, principalmente no campo de reformas que já se consideram maduras, como as reformas tributária e previdenciária e uma ação forte direcionada à alavancagem de setores produtivos, com ênfase às exportações.
O segundo cenário tem a cor ''vermelho forte'', cujos eixos apontam para a moratória da dívida externa e revisão do programa de privatizações. Instado pelos credores externos, que não renovariam os créditos, o governo seria obrigado a fazer o default. O país se veria isolado e uma crise de credibilidade ameaçaria as bases da estabilidade econômica, com sérias conseqüências sobre o tecido institucional. Lula procuraria se amparar numa rede de pactos setoriais, com as grandes questões nacionais conduzidas para a esfera das entidades intermediárias. Correríamos, ainda, o risco do assembleísmo, que transformaria o país num monumental e infindável congresso.

O terceiro cenário tem a cor ''rósea''. Como o nome indica, é uma espécie de meio termo entre o primeiro e o segundo cenários. O governo preservaria os compromissos básicos com o FMI, procurando manter as políticas de ajuste. Para compensar e plasmar uma feição própria, tentaria reduzir os juros a patamares que não pudessem comprometer a estratégia da estabilidade. Um forte programa de exportação estaria na mira central da administração, com o apoio e os recursos do BNDES, cuja atenção se voltaria para linhas de financiamento de empreendimentos de pequeno e médio porte. Ou seja, uma visão nacionalista e protecionista mais forte tomaria lugar no governo petista. O gargalo seria a conquista da meta de crescimento em torno de 4% a 4,5% ano.

Esse cenário está mais próximo do campo das probabilidades do que os dois primeiros.

A verdade é que Lula não quer ter a cara de Fernando Henrique. Mas sabe que não poderá ter também a fisionomia radical do velho PT de guerras e lutas. Por isso mesmo, é fácil prever que suas maiores dificuldades, depois de certo prazo de carência, serão colocadas pelos próprios correligionários, a partir dos 26 deputados eleitos da linha radical do PT e do MST, que certamente não deixarão por muito tempo as cabeças enfiadas no chão.

Em qualquer cenário, Lula vai precisar da maioria simples de 257 parlamentares e, para mudar a Constituição, de dois terços, ou seja, 308 deputados. Os pequenos partidos e o PL poderão até se coligar ao PT, formando um bloco de cerca de 200 deputados.

Mesmo assim, o governo carecerá do apoio dos grandes partidos para tentar aprovar projetos. A maior proximidade, hoje, é com o PMDB, em função do apoio que Lula está recebendo de lideranças peemedebistas em alguns Estados.

Na cozinha do futuro governo, a omelete será certamente preparada. Sob o desafio maior: como fazê-la sem quebrar os ovos?


Editorial

CONQUISTA SOCIAL

O início das operações da Telecom Italia Mobile no Rio de Janeiro vem confirmar o êxito absoluto do programa de priva tização no setor de telecomunicações. Os consumidores saem ganhando mais uma vez. Além do acesso à tecnologia GSM, são premiados com ofertas de preços e condições de assinaturas especiais - não só por parte da TIM mas de todas as demais operadoras de telefonia celular. Caem por terra também as previsões pessimistas sobre o comportamento do capital estrangeiro nestes tempos de mudança. A TIM está disposta a investir US$ 600 milhões nos próximos três anos. Seu objetivo é conquistar 300 mil clientes ainda no atual exercício e 1,5 milhão até o fim de 2003.

Acima de todas incertezas (políticas e econômicas), fala mais alto o enorme potencial de consumo do mercado brasileiro. Quando aposta no Brasil, a empresa italiana sabe que tem aqui oportunidade de crescimento e lucro muito maior do que em seu próprio país. Aí está o caso da Fiat Automóveis, que atravessa crise aguda na Itália mas vai de vento em popa no Brasil. No limite, conta com os resultados da filial de Betim para reequilibrar as finanças.

Na telefonia, mercados de Estados como Rio e São Paulo superam o de vários países europeus. Justificam-se o enorme interesse e a competição cada vez mais acirrada entre grandes grupos estrangeiros. A disputa, por sinal, não se resume às operadoras; estende-se aos fornecedores de equipamentos. Multiplicam-se os aparelhos de ponta a preços condizentes com o poder aquisitivo dos brasileiros. Resultado: o telefone celular deixou de ser artigo de luxo. Está integrado ao dia-a-dia das famílias e é ferramenta de trabalho dos prestadores de serviço.

O cronograma de investimentos da TIM é novo exemplo de que a privatização, quando bem idealizada e realizada, é generosa nos frutos. Depende, também, da ação eficaz da agência reguladora. Mas eficiência não faltou à Anatel. Que o novo governo, portanto, não ceda à tentação de mexer em time que está ganhando. A privatização da telefonia é conquista irreversível da sociedade.


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10/21/2002


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