'Fora do Eixo e Mídia Ninja representam uma nova forma de pensar o país', dizem debatedores




Participantes rejeitaram rótulo de que defensores da mídia livre são vandalos

Nos últimos dez anos, a juventude pobre da periferia das grandes cidades e do interior do país, organizada em redes e coletivos, criou novos espaços de participação popular e divulgação da cultura. Movimento autossustentado, baseado na economia solidária e no uso comunitário das tecnologias, que cresceu e ganhou força como alternativa à falta de políticas públicas. Ganhou também apoio em audiência pública realizada em conjunto, nesta quarta-feira (4), pelas comissões de Educação, Cultura e Esporte (CE) e de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH).

A opinião unânime dos participantes é que coletivos como o Fora do Eixo e a Mídia Ninja, mais visíveis a partir das manifestações de junho, representam uma nova forma de pensar o país para a transformação da sociedade nos cenários cultural e jornalístico brasileiros.

Manifestações

Para Ivana Bentes, professora adjunta da Pós-graduação em Comunicação da UFRJ, os protestos foram a resposta da sociedade à crise de representação na política e à necessidade de participação nas decisões sobre os rumos do país. Parte da explosão dessa consciência social, segundo a professora, foi "gestada em laboratórios de experiências radicais" como o Fora do Eixo.

- Porque ele aponta a possibilidade de você sair do impasse mais expressivo do Brasil contemporâneo, que é transformar essa precariedade em autonomia - explicou Ivana.

Fora do Eixo

Pablo Capilé,  idealizador do coletivo, explicou o trabalho dos chamados "pontos de cultura" com produtores e artistas brasileiros, fora do circuito Rio-São Paulo. O ativista detalhou como se organizam os festivais e descreveu a estrutura utilizada: estúdios de gravação; selos para a distribuição; divulgação pela internet com veículos de comunicação próprios, como rádio e TV; e até uma moeda complementar (cubo card), usada nas transações dentro do grupo.

O movimento que, além de música, também promove produções audiovisuais e teatro, cresceu tanto a ponto de demandar espaços coletivos permanentes, as casas Fora do Eixo. Com uma universidade em funcionamento, o Fora do Eixo também apresenta suas ideias no projeto de um partido próprio: o partido da cultura.

- A nossa experiência nada mais é do que um serviço de utilidade pública, que veio construindo soluções autônomas para os problemas desses precários [jovens pobres] - afirmou Capilé.

Na opinião de Cláudio Prado, produtor cultural e teórico da Contracultura e Cultura Digital, o Fora do Eixo se expande e se fortalece na perspectiva de mudar o país. O movimento, que persegue uma condição aparentemente utópica, torna-se viável na prática. Uma "revolução", segundo ele. Questões políticas e culturais avançam na possibilidade de "horizontalizar" as relações entre governo e sociedade civil, especialmente quando a tecnologia “já está na mão de todo mundo”.

- Nós temos no exemplo do Fora do Eixo uma semente de como é possível começar a pensar no século 21 em escala - avaliou.

Mídia Ninja

Ivana Bentes entende que a Mídia Ninja só foi possível porque teve base a experiência do Fora do Eixo. A professora da UFRJ defendeu a produção das mídias livres, rádios comunitárias, e a democratização da informação, com uma rede de colaboradores, na divulgação do ativismo político da juventude.

O grupo se apresenta como uma alternativa à imprensa tradicional. As transmissões são em tempo real, pela internet, com o uso de câmeras dos telefones celulares e uma unidade móvel montada em um carrinho de supermercado. Destacou-se na exibição dos protestos de junho. O nome Ninja abriga ao mesmo tempo a ideia de agilidade dos personagens de filmes de  lutas e a sigla para Narrativas Independentes, Jornalismo e Ação.

Criminalização

O representante da Agência de Redes para a Juventude, Marcus Faustini, condenou o processo de criminalização dos movimentos pela imprensa, intelectuais e políticos. Ele considera essa reação uma "tentativa de controle".

- Quem diz que é vandalismo ou revolução, que é caos ou é ordem, é quem está querendo controlar essa potência que apareceu no país. Potência que pode renovar esse campo da radicalização da democracia, que é o que a gente precisa - afirmou.

Políticas

Os debatedores defenderam maior articulação entre os movimentos e o poder público. Faustini sugeriu mais diálogo com o Congresso Nacional para reduzir a desigualdade social e aumentar a participação da sociedade civil na política. Pablo Capilé cobrou mais apoio dos parlamentares para o financiamento das iniciativas do coletivo que podem ser multiplicadas e ajudar na promoção da cultura no Brasil. Mais do que programas, os participantes da audiência pediram políticas públicas eficazes.

Nesse sentido, foram apontados projetos como o do marco civil da internet (PL 2.126/2011) e o que torna lei o Programa Cultura Viva, do Ministério da Cultura (PLC 90/2013).  A proposta permite que os recursos para financiar o programa sejam transferidos diretamente para as organizações responsáveis por suas ações pelo ministério.

Durante a audiência pública, o senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), que solicitou o debate, informou aos participantes que pedirá para ser designado como relator da matéria na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ).

- E tentar, com a participação de vocês, apreciar na CCJ, levar para as comissões de Assuntos Econômicos e de Educação e aprovar no Plenário do Senado - disse Randolfe.



04/12/2013

Agência Senado


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