Governo devolve a conta









Governo devolve a conta
Líderes partidários disseram ao presidente que não aceitam o aumento do imposto das empresas como compensação para a correção da tabela das pessoas físicas. Fernando Henrique respondeu que eles, então, terão de encontrar outra fórmula

O roteiro foi seguido à risca. Como o Correio informou na última quinta-feira, dirigentes dos quatro grandes partidos aliados — PSDB, PFL, PMDB e PPB — foram ontem de manhã ao Palácio do Alvorada e comunicaram ao presidente Fernando Henrique Cardoso que reprovam o aumento do Imposto de Renda das empresas. Como o Correio informou na última sexta-feira, o presidente lhes respondeu dizendo que não pode fazer nada, porque a Lei de Responsabilidade Fiscal o obriga a compensar parte da arrecadação que o Tesouro Nacional perderá neste ano com a redução do IR das pessoas físicas. Os líderes políticos ficaram de encontrar uma alternativa. Até lá, tudo fica como está.

A reunião foi longa, durou mais de duas horas. Saindo do Alvorada, os dirigentes partidários transpiraram nacos de informação do que se discutiu. Acabaram criando uma confusão. Induzidos pelo presidente do PSDB, José Aníbal, alguns repórteres entenderam que o governo propôs aumentar a alíquota da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) no lugar do IR das empresas. Não propôs. Houve até quem falasse no fim da isenção de IR sobre as cadernetas de poupança. Outro engano.

Concretamente, a única proposta mencionada no encontro envolveu o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). O senador Jorge Bornhausen (SC), presidente do PFL, sem muita convicção, disse que aumentar esse imposto seria boa alternativa. Fernando Henrique ficou calado e torceu o nariz. O deputado Ricardo Barros (PR), que representava o PPB, falou que bom mesmo seria buscar a arrecadação necessária no ‘‘gordo lucro dos bancos’’. Também foi descartado.

O deputado Michel Temer (SP), presidente do PMDB, quis dar outro tom à discussão. Em vez de achar uma alternativa à elevação do IR das empresas, ele pôs em dúvida a interpretação do governo sobre a Lei de Responsabilidade Fiscal. Jurista respeitado no Congresso, Temer defendeu a idéia de que não há necessidade de compensar receita, como quer o Ministério da Fazenda. Argumenta que o dinheiro em que o governo põe olho gordo foi recolhido com o congelamento da tabela do IR. Em sendo receita indevida, não há o que compensar. Não lhe deram ouvidos.

Substituto
Sobre o Imposto de Renda, que afinal de contas era o motivo da reunião, ficou decidido que algum tributo terá que aumentar. Se não for o IR das pessoas jurídicas, os partidos terão que providenciar um substituto. E rápido. Os dirigentes aliados se comprometeram a abrir o semestre parlamentar com o tema resolvido. Isto é, têm até o dia 15 de fevereiro para fazê-lo.

Longe das câmeras de TV e gravadores da imprensa, um dos participantes da reunião admitiu que é crescente a possibilidade de nada mudar. Ou seja, de o Congresso aprovar a medida provisória tal como mandada pelo Palácio do Planalto. E aliviar o contracheque das pessoas físicas avançando sobre o pró-labore de parte do empresariado. ‘‘Se você olhar bem, vai ver que é uma coisa justa’’, falou o dirigente.

Segundo esse parlamentar, que pediu para não ser identificado, ao aumentar a alíquota do IR das pessoas jurídicas que recolhem pelo regime de lucro presumido (faturamento anual de até R$ 24 milhões), a Receita Federal está aumentando a carga tributária para um grupo de privilegiados, de salário alto e imposto baixo. ‘‘Você pega os grandes executivos, os artistas da Globo, alguns jornalistas’’, apontou.

Ele está se referindo ao artifício, muito usado por multinacionais e empresas de comunicação, de contratar seus profissionais como pessoas jurídicas. O funcionário abre uma empresa prestadora de serviços, que é contratada pela companhia em que trabalha. Dessa forma, recolhe IR com alíquota de 15% (contra até 27,5% das pessoas físicas) e seu empregador não paga INSS, FGTS e outros encargos trabalhistas. Fica bom para os dois lados e ruim para o Tesouro Nacional.

Bem humorado, Fernando Henrique pediu aos representantes dos partidos para aproveitar a reunião e definir as prioridades para o primeiro semestre. Os quatro dirigentes hesitaram. Lembraram que faltava o secretário-geral da Presidência, Arthur Virgílio (PSDB-AM), responsável pela coordenação política do Palácio do Planalto. ‘‘Não tem problema’’, forçou o anfitrião.

O grupo acabou fechando uma pauta preliminar (leia quadro ao lado). O tema mais espinhoso também é tributário. Trata de um projeto do deputado Michel Temer acabando com PIS e Cofins, dois impostos que incidem em cascata nas cadeias de produção e causam urticárias no empresariado. A idéia é criar um único tributo incidente sobre o bem final. A equipe econômica ainda não se pronunciou sobre o assunto, mas o presidente da República já o acolheu.

PLANO DE VÔO
Assuntos que o governo pretende fazer andar no Congresso no primeiro semestre

Previdência
Engavetado há três anos, o projeto de lei número 9/99 define regras com as quais União, estados, municípios e Distrito Federal implantarão regimes de previdência complementar

Reforma política
O governo quer instituir a fidelidade partidária e proibir as coligações proporcionais

Impostos
É o campo em que há mais pendências. A maior delas está na proposta de emenda constitucional número 407/2001. Essa PEC prorroga a vigência da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), que acabaria neste ano, para dezembro de 2003. Outro projeto controverso que o governo quer transformar em lei foi apresentado pelo deputado Michel Temer (PMDB). Acaba com os impostos em cascata (PIS e Cofins), substituindo-os por um único tributo incidente sobre o consumo. Além disso, os parlamentares terão que examinar a medida provisória em que o governo reduziu o Imposto de Renda das pessoas físicas e, para compensar a perda de arrecadação, aumentou o das empresas


PMDB negocia aliança com José Serra
Uma parcela expressiva do PMDB começa a engrossar a pré-campanha do ministro da Saúde, José Serra, à Presidência da República, e a deixar de lado a proposta de lançar candidato próprio à Presidência da República. Depois do governador do Rio Grande do Norte, Garibaldi Alves, demonstrar publicamente seu apoio a Serra num ato em Mossoró (RN), o ministro se reuniu por uma hora e meia com o líder do PMDB na Câmara, Geddel Vieira Lima (BA). ‘‘Não tenho como negar que está ficando cada vez mais difícil manter a candidatura própria dentro do atual quadro’’, disse Geddel, depois da conversa com o ministro.

O que Geddel diz de público algumas estrelas do partido falam em conversas reservadas. A cúpula peemedebista considera que o melhor caminho é mesmo optar por algum dos nomes que já se apresentaram. Nas reuniões do grupo que detém o controle do partido, a avaliação geral é a de que dificilmente os três pré-candidatos peemedebistas teriam alguma chance de chegar ao segundo turno.

Esses políticos do PMDB acreditam que o senador Pedro Simon (PMDB-RS), por exemplo, já lançado pré-candidato à Presidência, pode perfeitamente ser um bom nome para o governo gaúcho ou mesmo vice de José Serra, na hipótese do governador de Pernambuco, Jarbas Vasconcelos, preferir a reeleição. A cúpula do PMDB aposta que o outro pré-candidato, o ministro da Reforma Agrária, Raul Jungmann, acabará ao lado de Serra. E no terceiro, o governador de Minas, Itamar Franco, o PMDB governista não confia. Por isso, a ordem é estreitar as conversas sobre a aliança que Serra propôs ao PMDB.

Embora um número expressivo prefira Serra, há ainda o PMDB sarneyzista, grupo ligado ao senador José Sarney (PMDB-AP), que demonstra entusiasmo pela candidatura da governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PFL), filha do ex-presidente da República. Se o ministro decolar nas pesquisas, a maioria do PMDB, no entanto, deve ficar ao lado do PSDB.

Além das pesquisas
No caso de Geddel, a opção por Serra vai muito além do fator pesquisa. O líder conta com o ministro para se contrapor ao palanque que o ex-senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA) pretende montar para Roseana na Bahia. ‘‘Vou seguir o que meu partido determinar, mas Serra é um nome a ser considerado’’, disse Geddel.
Do Rio Grande do Sul, de onde tenta consolidar a sua pré-campanha dentro do partido, o senador Pedro Simon rejeita esses movimentos que pretendem deixar o PMDB no papel de vice tucano. ‘‘Ou o PMDB tem candidato próprio, ou vai virar um partidozinho de segunda classe. Essa eleição presidencial vai ser definida pelo tamanho do partido. Esses que cogitam alianças deveriam lembrar que 98,7% da nossa última convenção apoiou a candidatura própria’’, lembrou Simon.


Desemprego volta a subir no Brasil
Rio — O desemprego na indústria está subindo à medida em que a produção das empresas é reduzida. Dados divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelam que o emprego industrial voltou a cair no país em novembro, após três meses consecutivos de crescimento. A queda de de 0,9% ante outubro foi puxada pela indústria paulista (-1,6%) e pelos ramos de alimentos e bebidas (-1,3%), refino de petróleo e produção de álcool (-11,9%).

‘‘A evolução do emprego na indústria em 2001 apresentou taxas muito discretas, acompanhando a produção’’, disse o chefe do Departamento de Indústria do IBGE, Sílvio Sales. Ele explicou que a pesquisa, cuja divulgação foi iniciada em dezembro, não dispõe de comparações com igual período do ano anterior, porque ainda não há dados precedentes que possibilitem o cálculo.

Segundo Sales, a falta desse dado comparativo foi parcialmente compensada pela análise da média móvel trimestral (comparação entre os trimestres ao longo do ano), que ajuda a neutralizar as variações sazonais (específicas de um período). Nesse caso, a média revelou que o emprego no trimestre encerrado em novembro foi 0,5% menor do que no trimestre encerrado em junho.

O chefe do Departamento de Indústria do IBGE explicou que a média móvel ‘‘confirma a tendência de queda’’, porque os dados de novembro são tradicionalmente inferiores aos de outubro (crescimento de 0,2%), mês no qual costuma ocorrer um dos picos da produção industrial no ano. Na avaliação de Sales, o nível de atividade da indústria já começou a emitir alguns sinais de recuperação, mas os resultados sobre o emprego vêm sempre depois.

No caso de São Paulo, as principais quedas no nível de emprego ocorreram em segmentos como refino de petróleo e produção de álcool (-15,8%), alimentos e bebidas (-3,4%) e química (-3,7%). O estado registrou queda do pessoal ocupado na indústria por três meses consecutivos e, entre agosto e novembro acumulou perda de 2%. Já Pernambuco (2,1%) e Ceará (1,7%) foram os que apresentaram maior aumento no número de postos de trabalho em novembro.

Um exemplo da forte sazonalidade da pesquisa de novembro é o aumento de 10,5% no valor real da folha de pagamento em relação ao mês anterior, após três quedas consecutivas. Segundo o economista, a expansão ocorreu devido ao pagamento da parcela do décimo-terceiro salário e, também, do pagamento de gratificações e participação nos lucros.


Gasolina custará menos
Valor usado para cálculo do ICMS será reduzido no Distrito Federal e postos pagarão menos impostos. Diferença chegará ao consumidor em março

Nos últimos 21 dias, o preço da gasolina caiu duas vezes no Brasil. O primeiro ajuste aconteceu por causa de quedas nas cotações do dólar e do petróleo, além do fim do subsídio ao óleo diesel. O preço da gasolina comum na maioria dos postos do Distrito Federal era de R$ 1,76 e caiu para R$ 1,57. Depois houve uma queda por causa da redução do valor da gasolina, usado para cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Hoje, a maioria dos postos cobra R$ 1,49. A queda acumulada é de 15,34%.
A partir de 1º de março, o preço deve cair mais dois centavos. O motivo é, novamente, o cálculo do ICMS. Até o dia 20 de fevereiro, o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) deve publicar no Diário Oficial da União novos preços para aplicação do ICMS. Esse valor deve ser aquele cobrado pelo mercado. Hoje, o ICMS de 25% é pago sobre R$ 1,57, mas a maioria dos postos cobra R$ 1,49 pela gasolina.

Atualmente, esse imposto é de R$ 0,39 (25% de 1,57) por litro. Em março deverá equivaler a R$ 0,37 (25% de 1,49). Estima-se, portanto, que o preço final cairá R$ 0,02 (0,39 - 0,37).

Levantamento da Agência Nacional do Petróleo mostra que a redução média do preço da gasolina alcançou 12,94% nas oito principais capitais do país. A maior redução aconteceu em Brasília. A menor queda de preço foi verificada em Porto Alegre, de 9,43%.

Estados reclamam
Mas os estados não estão satisfeitos com a queda da arrecadação do imposto. Representantes das secretarias estaduais da Fazenda se reuniram em Brasília ontem para discutir o que pode ser feito para não reduzirem os orçamentos estaduais. Eles pretendem pedir parte da arrecadação da Contribuição de Intervenção sobre Domínio Econômico (Cide) dos combustíveis. A Cide é arrecadada pelo governo federal. Os secretários ainda irão conversar com seus governadores sobre essa proposta.

O secretário de Fazenda do Ceará e coordenador do Confaz, Ednilton Soarez, disse que não há uma conclusão no momento. ‘‘Ainda não falamos em números. Queremos apenas iniciar um diálogo com a União.’’ Mas o governo federal parece não gostar da idéia. Segundo Soarez, o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Amaury Bier, disse ser contrário à proposta. Na última reunião do Confaz, Bier afirmou que caberia a cada estado administrar suas perdas em decorrência da alteração da base de cálculo do ICMS. O secretário do Ceará afirma que, se não houver uma compensação, os estados terão de reduzir o volume de investimentos previstos em seus orçamentos para este ano.

COMERCIAL DA ANP
A Agência Nacional do Petróleo investiu R$ 1,4 milhão em propaganda para estimular a queda do preço da gasolina. O comercial foi lançado domingo no programa ‘‘Fantástico’’, da TV Globo, um dos mais caros da televisão. No filme de 30 segundos, o gerente de um posto manda o frentista baixar o preço no painel por três vezes por causa da concorrência. No fim, uma voz (texto em off) pede ao consumidor: ‘‘Faça a sua parte. Compare sempre. Procure qualidade e melhor preço’’.


Rede elétrica deficiente
Técnicos ainda não sabem as causas do rompimento do cabo que provocou o apagão em 10 estados e no Distrito Federal. Mas analistas alertam que o problema pode se repetir devido à fragilidade do sistema

Blecautes como o que ocorreu na segunda-feira poderão se repetir com mais freqüência nas regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste, devido à deficiência no sistema de proteção da malha de transmissão de energia. Essa foi a principal causa dos apagões que também deixaram milhares de cidades às escuras em abril de 1997 e março de 1999. ‘‘Nem o rompimento de um cabo nem a queda de um raio poderiam, de maneira nenhuma, provocar um blecaute em dez estados’’, afirma Cláudio Ferreira, especialista em energia e ex-assessor da diretoria da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). O falha no cabo desligou 13 das 18 turbinas da hidrelétrica de Itaipu.

Três reuniões distintas realizadas na sede do Operador Nacional do Sistema (ONS) envolveram, durante todo o dia de ontem, técnicos do órgão, representantes da área operacional das empresas das regiões atingidas pela pane e especialistas ligados ao sistema de proteção da rede. Até o início da noite, o ONS ainda não tinha o relatório das causas que provocaram o rompimento do cabo de transmissão que liga a hidrelétrica de Ilha Solteira à subestação de Araraquara, em São Paulo, apontado como o responsável pelo blecaute.

Sem ter maiores explicações, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) divulgou nota informando que continuava a apurar as responsabilidade e causas do apagão. Dois técnicos da área de fiscalização sobrevoaram a área da linha de transmissão entre a usina de Ilha Solteira e Araraquara, onde houve a queda do cabo. A agência ressaltou que a legislação prevê, em caso de comprovação de infração, punição que vai desde advertência até multa de 2% do faturamento anual da empresa infratora. A Aneel informou ter enviado ofícios à Companhia de Transmissão de Energia Elétrica Paulista (CTEEP), Companhia Energética de São Paulo (Cesp) e Furnas, solicitando esclarecimentos que devem ser prestados no prazo de 24 horas.

Para o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro e um dos responsáveis pela elaboração do programa de racionamento adotado pelo governo, Adriano Pires, o sistema está velho. ‘‘Não recebe investimentos há muitos anos e expõe todo o país a um dano que poderia ser localizado’’, afirmou. Ele comparou a situação da rede à dos dutos da Petrobras que, deteriorados por uma manutenção precária, acabaram provocando uma série de vazamentos nos últimos três anos.

Segundo dados da Eletrobrás, os investimentos em transmissão representaram somente 22% do que foi aplicado no sistema todo, aliando geração e distribuição, entre 1970 e 1999. A estatal anunciou ontem a captação de US$ 110 milhões no exterior. Segundo nota distribuída pela empresa, ‘‘os recursos serão utilizados para investimentos em geração, transmissão e para fins corporativos para fazer frente ao Programa Emergencial do governo federal’’.

O ministro de Minas e Energia, José Jorge, admitiu ontem que parte das medidas de revitalização do setor elétrico pode ser revista em razão do blecaute. O detalhamento das 18 medidas de revitalização estava marcado para a reunião de ontem da Câmara de Gestão da Crise de Energia Elétrica (GCE), mas acabou transferida para quinta-feira. O ministro assegurou que o blecaute não deverá comprometer a idéia do governo de aliviar o racionamento para a indústria e para a iluminação pública, a partir de fevereiro. Segundo ele, o fim do racionamento será decretado tão logo o nível dos reservatórios, que abastecem as hidrelétricas, chegue a 50% de sua capacidade máxima. Segundo ele, as medidas de redução do racionamento para a indústria serão estudadas na reunião da câmara da amanhã.


Negócio mal explicado
Novo dono da Transbrasil alega em ação judicial de execução de dívida que seu patrimônio é formado por apenas um avião Bandeirante. Mesmo assim, ele promete investir R$ 270 milhões na companhia nos próximos seis meses

Com O Popular e Agência Estado
O empresário Dilson Prado da Fonseca comprou a Transbrasil pelo valor simbólico de R$ 1 e promete injetar R$ 270 milhões nos próximos seis meses na companhia. Mas sua empresa de táxi de aéreo, Fly Brazil, teve o único avião — uma aeronave Bandeirante de 22 assentos, fabricada pela Embraer — penhorado há mais de um ano. Nos autos do processo de execução de dívida que tramita na 2ª Vara Cível de Brasília, Fonseca apela, por meio de seu advogado, para que a Justiça não penhore o Bandeirante por se tratar do ‘‘único meio de sobrevivência’’ dele e da mulher, Cláudia Prado dos Santos. O avião está na iminência de ser leiloado. Para determinar o leilão, o juiz da 2ª Vara Cível, Alfeu Gonzaga Machado, espera apenas informações sobre uma ação trabalhista movida contra Fonseca na 3ª Vara do Trabalho do Piauí. Essa ação também resultou na penhora do mesmo avião.

O processo de execução em Brasília foi movido pela organização não-governamental Centro de Trabalho Indigenista (CTI) em setembro de 1999. A instituição comprou um avião bimotor da Fly Brazil em março daquele ano, por US$ 120 mil, para realizar um projeto social em aldeias indígenas. No ato da compra, a ONG recebeu de Fonseca uma nota promissória no valor de R$ 23,9 mil como garantia de pagamento de taxas aeroportuárias em atraso. Como o compromisso não foi honrado, o CTI entrou com processo de execução judicial da dívida.

Saldo bancário baixo
As petições do advogado Giovani Pasini Neto, que defende Fonseca, e as decisões judiciais relatadas no processo revelam a penúria da Fly Brazil e de seus sócios, Dilson Fonseca e Cláudia Prado dos Santos. A primeira decisão do juiz Alfeu Machado para garantir o ressarcimento à CTI foi a penhora, em novembro de 2000, do dinheiro existente na conta bancária da empresa. Mas a Fly só dispunha de R$ 688,32 no banco. Como o valor era insuficiente para honrar a nota promissória, dias depois o juiz determinou a penhora do avião Bandeirante.

‘‘Fonseca tentou substituir a penhora do avião pela penhora de um lote de esmeraldas, mas sabemos que muitas vezes o laudo de avaliação aponta valores muito mais altos que o valor real das pedras’’, afirma a advogada da CTI, Maria Inês Nogueira da Gama. O advogado Giovani Pasini Neto foi procurado pelo Correio para dar a versão da Fly sobre o processo, mas até às 22h não havia retornado aos telefonemas da reportagem. O empresário Dilson Fonseca não foi localizado. Ele promete dar uma entrevista coletiva hoje em São Paulo para explicar o negócio e os planos para a Transbrasil.

Além da ação de execução em Brasília, o Centro de Trabalho Indigenista moveu uma ação de reparação de danos, que tramita desde abril do ano passado na 10ªVara Cível de Goiânia. Os advogados alegam que Fonseca vendeu o bimotor garantindo perfeitas condições do aparelho para 1.100 horas de vôo. Depois de consumado o negócio, a ONG teve de comprar motores novos para utilizar o avião. Na petição inicial, a ONG pede R$ 67 mil para ressarcimento do gasto com peças novas, mais o valor equivalente no câmbio a 100 mil libras esterlinas pelos dois motores novos e ainda indenização por danos morais, a critério do juiz.

Além da ação do CTI, Fonseca é réu em quatro processos em tramitação no Tribunal de Justiça de Goiás. Em novembro de 1998, a GM Leasing SA Arrendamento Mercantil pediu rescisão de um contrato por falta de pagamento. A empresa Accelerated Genetics do Brasil encaminhou, em abril de 2000, uma ação de execução de dívida. Outro processo, aberto em outubro, diz respeito a reintegração de posse.

O diretor do Centro de Trabalho Indigenista, Gilberto Azanha, disse ontem estar perplexo com o fato de Fonseca ter assumido a Transbrasil. ‘‘Acho muito estranho. A Fly Brazil está em situação de total inadimplência’’, afirmou Azanha. Ele não poupou críticas ao empresário: ‘‘Eu o conheci pessoalmente. Ele é do tipo que se sujeita a todo tipo de negócio escuso’’. Azanha acredita que o dono da Fly Brazil pode estar à frente de algum grupo estrangeiro interessado no mercado brasileiro de aviação.

Dívida de R$ 1 bilhão
Outros empresários do setor também estranham a transação oficializada na última sexta-feira. Para eles, outros interesses podem estar por trás da negociação que envolveu a transferência do controle acionário da Transbrasil, pelo valor simbólico de R$ 1, em troca da administração de débitos superiores a R$ 1 bilhão. ‘‘De onde vem esse dinheiro? Não está bem explicado’’, indagou um analista. Rumores no mercado dão conta de que o ex-p residente Antonio Celso Cipriani continuará a controlar a Transbrasil nos bastidores.

Fonseca tem 34 anos. Nasceu em Brasília e mudou-se para Goiânia aos 6 anos de idade com os pais, naturais de Guarapari (ES). É casado há 19 anos com Cláudia Prado de Moraes e tem três filhos: Bruno, 18, que estuda Medicina na Bolívia, Monisi, 16, e Raissa, 12. A família mora na Avenida Juriti, no Setor Santa Genoveva, em Goiânia.

O empresário sempre esteve envolvido com aviação. Seu primeiro emprego foi de controlador de vôo, no Aeroporto Santa Genoveva. Depois de casado, mudou-se para Itaituba, no Pará, onde montou uma empresa especializada em lavar aviões. Já foi vendedor de aeronaves e presidiu a Fly Brasil, empresa de táxi aéreo e de transporte de cargas. O sogro de Dilson, Bonfim Carmo de Moraes, é dono do Restaurante Samauma, em frente ao aeroporto Santa Genoveva. Bonfim sabia das negociações do genro com o ex-presidente da Transbrasil, Antônio Celso Cipriani. ‘‘Era segredo, não podíamos falar nada antes que o negócio fosse fechado’’, afirmou. Segundo ele, Fonseca é um exímio vendedor e recebeu a proposta de parceria com a Transbrasil logo depois dos atentados terroristas aos Estados Unidos, em 11 de setembro. A companhia parou de voar em 3 de dezembro e a promessa de Fonseca e retomar os vôos no início de fevereiro. Ele prometeu ontem ressarcir todos as pessoas que compraram passagens da Transbrasil e não conseguiram viajar.

Empresa nova A Varig criou uma subsidiária para atuar na manutenção de aeronaves, revisão de componentes aeronáuticos e turbinas, além da conversão de aviões. A expectativa é de que a nova empresa, batizada de Vem — Varig Engenharia e Manutenção, fature US$ 250 milhões neste ano. Antes de tornar-se subsidiária, a Vem era uma unidade de negócios da Varig. A meta da nova empresa é alcançar 3% do mercado no mundo, cujo faturamento é estimado em US$ 35 bilhões este ano.


Unidos para cobrar
Empresários de Brasília tentam sintonizar discurso para pedir ao governo nova data de pagamento dos impostos. Querem, também, mudança na destinação de recursos do Fundo do Centro-Oeste

Um ano de muita discussão e cobrança. É assim que os empresários dos setores de serviço, comércio e indústria do Distrito Federal vão enfrentar 2002. Querem deixar no passado o tempo em que lutavam isoladamente pelos interesses de cada setor. Agora, unidos, vão procurar o governo e a Câmara Legislativa para oferecer propostas, defender seus interesses e brigar se for preciso. Mas eles também sabem que negociar em ano eleitoral é mais fácil.

Amanhã acontecerá o primeiro encontro do Fórum Empresarial do Distrito Federal, na sede da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL). Na agenda, reuniões mensais com presidentes das entidades representativas de cada setor produtivo: Federação das Indústrias de Brasília, Associação Comercial do Distrito Federal, Federação do Comércio, Sindicato Rural e CDL.

Segundo o presidente da Fecomércio, Adelmir Santana, o Fórum tem como objetivo principal unificar a linguagem dos empresários. ‘‘Precisamos nos unir em um ponto de vista que atenda ao anseio de todos’’, explica. ‘‘Muitas vezes, a Câmara Legislativa age aprovando leis sem discutir com as partes interessadas e ouvir as suas necessidades.’’

Uma dessas ações foi a polêmica aprovação da lei que proíbe a abertura do comércio aos domingos, sancionada em setembro do ano passado. Aprovada em junho com a justificativa de que Brasília precisava economizar energia, foi vetada pelo governador Joaquim Roriz. Na ocasião, Roriz apresentou outro projeto, que flexibilizava a abertura do comércio. Mas não teve jeito. A Câmara derrubou o veto e a lei foi mantida, mas ainda não entrou em vigor, porque ainda não foi regulamentada por Roriz.

O presidente da Fecomércio reconhece que cada setor tem suas próprias reivindicações. Para os comerciantes do Distrito Federal, a principal é a redução da carga tributária. Segundo o diretor Técnico da Câmara de Dirigentes Lojistas, Edson Monteiro, os lojistas têm de recolher o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) no 20º dia do mês. O problema é que nesta data, o pagamento das compras feitas a prazo ainda não entrou no caixa das lojas. ‘‘Pagamos o imposto antes de receber e ainda ficamos no prejuízo se o cheque que recebemos para o pagamento a prazo é sem fundos’’, reclama.

Outro pedido dos empresários envolve a destinação da verba do Fundo Constitucional do Centro-Oeste — linha de crédito do Banco do Brasil para empresas da região. ‘‘Queremos que o comércio tenha direito a mais recursos do fundo, porque a maioria do dinheiro vai para a indústria. No ano passado, ficamos com apenas 10% de todo o crédito’’, emenda o diretor da CDL.

Os atacadistas da cidade também têm reivindicações. Na próxima semana, dia 29, o Sindicato do Comércio Atacadista do Distrito Federal vai se encontrar com o governador Roriz e com o secretário de Fazenda, Valdivino Oliveira. No encontro, a entidade discutirá com o governador a criação de um pólo de distribuição no Distrito Federal que possa abrigar também as empresas do mesmo setor que vêm de outros estados.

Mais briga
Enquanto os líderes de entidades se unem de um lado, os empresários das quadras 700 da Asa Sul se unem de outro. Na quinta-feira da semana passada, tomou posse na sede da Fecomércio, no Setor Comercial Sul, a primeira diretoria da Associação Comercial da W3 Sul, Quadras 700. A entidade nasce no mesmo momento em que a Administração de Brasília decreta o fim das empresas que funcionam nas residências das quadras ao longo da avenida. Desde março do ano passado, a Administração, alegando que essas instalações ferem o tombamento de Brasília, não concede mais alvarás de funcionamento.

A briga da entidade vai ser dura, mas, segundo o presidente da Associação, o oftalmologista José da Silva Rodrigues de Oliveira, 45 anos, os argumentos são fortes: ‘‘Geramos empregos e renda numa cidade com quase 200 mil desempregados e temos a certeza de que se essas casas não forem destinadas às empresas de prestação de serviços, não serão alugadas para moradia, porque ninguém aguentaria viver com o barulho do trânsito.’’

Ao longo da avenida, 120 empresas atuam oferecendo serviços variados: salões de beleza, escritórios de advocacia, pousadas, cursos preparatórios para concursos públicos, teatro e até clínicas médicas. Na estimativa da Associação, as empresas empregam cerca de 3.200 pessoas. ‘‘Outra vantagem é que não concorremos com os empresários das quadras 500, porque oferecemos serviços e não produtos’’, defende o presidente. O próximo passo da diretoria é procurar o governo do Distrito Federal para discutir a revitalização da W3 Sul, juntamente com o Iphan e o Ministério Público.


Artigos

As balas da subversão
As balas que abateram Celso Daniel, seqüestrado quando regressava à casa, servem à subversão, quaisquer que tenham sido os sicários que as dispararam

Por Mauro Santayana

A morte do prefeito de Santo André é a mais séria advertência, depois de tantas outras, às elites brasileiras. Se o crime é político, como tudo faz crer, o episódio é assustador. Se não é político, o medo não pode ser menor. As balas que abateram Celso Daniel, seqüestrado quando regressava à casa, desarmado e tranqüilo, servem à subversão, quaisquer que tenham sido os sicários que as dispararam. E isso basta para qualificar o crime como político.

A primeira constatação é a de que o Estado não vem cumprindo a sua primeira razão de ser, que é a de manter a ordem democrática, o que significa assegurar os direitos essenciais a todas as pessoas, entre elas o direito de ir e vir em plena liberdade. Mas o E stado é um todo e deve exercer o seu dever de coação indistintamente contra os que violam suas leis. Quando o poder repressivo do Estado é seletivo, e a polícia executa, a tiro limpo, pequenos assaltantes, enquanto o Banco Central protege banqueiros inescrupulosos, e as agências governamentais fazem corpo mole diante do assalto cotidiano das concessionárias de serviços públicos, desatam-se os laços de obediência e de respeito à lei.

Toda lei é um pacto, e não há leis que devam ser cumpridas e leis que não devam ser cumpridas. Quando o Estado ‘‘flexibiliza’’ algumas leis, coloca em dúvida a rigidez de outras. A busca da isonomia — conceito criado pelos fundadores do pensamento político grego — é um processo que envolve todas as dimensões das pessoas, do conhecimento à economia, da saúde à alegria. Só podem ser iguais as pessoas que têm as mesmas condições básicas para o usufruto da vida. É claro que essa igualdade absoluta é impossível, mas o Estado existe para agir como se ela fosse possível, e agir no projeto de sua consecução porque, diante da promessa democrática do Estado, nenhuma pessoa pode ter mais direitos do que todas as outras. Por isso mesmo, o conceito de justiça — diké, em grego — tem uma de suas etimologias, atribuída a Aristóteles, que se enraíza na idéia da divisão equânime entre duas pessoas: se uma subtrai da outra alguma coisa, cabe ao juiz fazer com que a coisa subtraída seja devolvida à pessoa prejudicada, ou à comunidade lesada. Quando um direito meu é retirado, cabe ao Estado devolvê-lo; mas o Estado não pode admitir que um cidadão tenha mais direitos do que os outros.

Quando o Estado se desarma de seu poder de coação, em nome da ‘‘desregulamentação’’ e da liberdade de mercado, tudo passa a ser possível. Os traficantes traficam, os assaltantes assaltam, as concessionárias de serviços públicos furtam nas contas e furtam na prestação de serviços adicionais, os banqueiros usam o Banco Central para fixar os juros de sua conveniência, os estrangeiros nos ditam a conduta que lhes interessa, os seqüestradores seqüestram e os psicopatas matam. Matam nas escolas, matam nas ruas, matam nos escritórios, matam no interior das casas. Se Deus não existe, disse o filósofo, tudo é permitido. Na versão profana do enunciado, se o Estado não existe, tudo é permitido. E, se existe menos do que deveria ser, a permissividade ao crime tem o tamanho de sua ausência. A força do Estado democrático só é legítima e necessária se estiver a serviço da Justiça.

O governo está anunciando medidas mais duras contra os crimes cometidos pelos delinqüentes comuns. O combate ao crime seria mais efetivo, no entanto, se a repressão fosse ainda mais dura contra os que roubaram e roubam do povo inteiro; contra os achacadores que se instalam na administração pública e fazem da concussão e da corrupção uma das indústrias mais rendosas do país; contra os juízes venais que vendem sentenças e contra os parlamentares que vendem seus votos.

A nação deve saber que há poderosos interessados em tumultuar o processo sucessório e cercear a ação do próximo governo, em uma quadra histórica na qual a estabilidade política nos permitirá a retomada do desenvolvimento, a afirmação da soberania e a liderança continental.


Editorial

ESPADA DE DÂMOCLES

O Brasil pensou ter acordado do pesadelo dos apagões. As fortes chuvas e a conseqüente recuperação do nível dos reservatórios animaram os responsáveis pelo setor. No fim do ano passado, o governo falou na suspensão gradativa do racionamento com flexibilização das metas de consumo. Clima de euforia tomou conta do país. Daí a surpresa com o apagão de segunda-feira.

O blecaute expôs a fragilidade da rede de energia elétrica. A simples queda de um cabo de linha de transmissão paralisou 13 das 18 turbinas de Itaipu, que responde por 30% da energia consumida no Sudeste. Onze estados — do Sul, Sudeste, Centro-Oeste e o Distrito Federal — foram atingidos. Em São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, o apagão durou quatro horas. Os estragos provocados vão do fechamento do comércio mais cedo aos transtornos no trânsito, congestionamento de linhas telefônicas e interrupção da atividade industrial.

Explicações técnicas não faltaram. Mário Santos, presidente do Operador Nacional de Energia Elétrica (ONS), disse que falharam os mecanismos de proteção. O ministro de Minas e Energia, José Jorge, prometeu avaliar o nível de segurança do sistema para evitar o desligamento em cascata.

Longe de tranqülizar a população, as palavras das autoridades trouxeram o pesadelo de volta. Um fato é indiscutível. A pane só tomou tamanha proporção por causa da degradação do Sistema Interligado Nacional. Há, é verdade, problemas no processo de proteção, como frisou Mário Santos. Mas não é só. A rede está sobrecarregada. Trabalha no limite.

O governo vendeu a idéia de que os problemas do racionamento eram decorrentes apenas da escassez de chuvas. A realidade provou o contrário. Faltam inversões nos setores de geração e transmissão, além de aperfeiçoamentos na gestão do ONS. Na área da Agência Nacional de Energia Elétrica, o anúncio de licitações não resolve o descompasso entre o cronograma da oferta de energia nova e a demanda real da economia.

A espada de Dâmocles ameaça o Brasil. Apagões podem ocorrer novamente em virtude da combinação da retomada do crescimento econômico com a escassez de infra-estrutura de energia elétrica. Impõe-se evitar a recorrência de episódios semelhantes, cujo impacto sobre a economia é dramático. Está na hora de olhar firme e holisticamente o problema. E não retardar os investimentos necessários à expansão do sistema.


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01/23/2002


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