Governo lança pacote contra greves







Governo lança pacote contra greves
Funcionários temporários serão contratados para o lugar de professores universitários e servidores da Previdência

BRASÍLIA - O governo anunciou ontem um pacote antigreve no funcionalismo. O objetivo é forçar o fim das paralisações dos servidores da Previdência e dos professores universitários. A primeira começou há 90 dias, a segunda já se arrasta a 83 dias. Uma medida provisória (MP) será editada para permitir ao ministro da Educação, Paulo Renato, e ao ministro da Previdência, Roberto Brant, a contratação de funcionários temporários para substituir os grevistas. A MP prevê a contratação temporária de substitutos por no mínimo três meses, depois de 10 dias de paralisação.

O governo também publicou ontem no Diário Oficial da União decreto que transfere para o Presidente da República a decisão sobre o pagamento do salário dos servidores. Com isso, qualquer recurso, de agora em diante, tem de ser impetrado no Supremo Tribunal Federal (STF), foro de julgamento do Presidente da República. A Advocacia Geral da União (AGU) espera forçar uma decisão única, e favorável ao governo, no Supremo sobre o pagamento do salário dos grevistas. Hoje, os processos são julgados pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), onde os medidos tomam decisões divergentes sobre o assunto.

O presidente do Andes, sindicato dos professores das universidades federais, Roberto Leher, comparou as medidas ao Pacote de Abril de 1977 do presidente Ernesto Geisel. ïïEsse pacote configura um ato de força do Executivo para silenciar a oposição, a contestação'', acusou. O Pacote de Abril fechou o Congresso Nacional por alguns dias, fez a Reforma do Judiciário à revelia dos parlamentares e criou os senadores biônicos. O advogado-geral da União, Gilmar Mendes, nega que as medidas sejam uma ameaça aos grevistas. ïïQueremos apenas manter funcionando os serviços essenciais'', respondeu.

Leher também acredita que será inviável a contratação temporária de professores nas universidades federais. Ele avalia que os reitores vão resistir à medida, caso ela venha a ser tomada pelo ministro da Educação, Paulo Renato. O artigo 207 da Constituição assegura a autonomia administrativa das universidades federais. O Ministério da Educação diz que ainda não decidiu se vai adotar a medida. A secretária de educação superior do MEC, Maria Helena Guimarães, avisou que vai aguardar a publicação da medida provisória para analisar se é possível aproveitar a nova legislação.

O pacote contém ainda dois projetos de lei que serão enviados ao Congresso Nacional esta semana. O primeiro regulamenta o direito de greve dos servidores públicos, previsto no artigo 37 da Constituição. O projeto considera ilegal a greve que ultrapassar 30 dias e prevê o corte dos salários dos grevistas. ïïNão faz sentido ficar em casa, não trabalhar por tempo indeterminado'', justificou o secretário-executivo do Ministério do Planejamento, Guilherme Dias.
Outro projeto permite a abertura de processo administrativo coletivo contra os servidores que faltarem ao trabalho por mais de trinta dias. O processo é o primeiro passo para a demissão. Hoje, os processos administrativos são individuais.


PF liga Nahas a dossiê Cayman
BRASÍLIA - A Polícia Federal descobriu um fax que relaciona o megaespeculador Naji Nahas a prováveis autores e intermediários do dossiê Cayman, conjunto falso de papéis sobre suposta empresa (CH, J & T) que teria sido montada no paraíso fiscal do Caribe pelo presidente Fernando Henrique Cardoso e por três líderes do PSDB. No fax, o advogado de Nahas, Voltaire Valle Gaspar, remete aos suspeitos de forjar ou intermediar a papelada um modelo de declaração para invalidar documento assinado por eles em 1998. Nele, lançavam acusações contra o ex-presidente Fernando Collor, o irmão Leopoldo Collor, o ex-governador Paulo Maluf, o ex-senador Gilberto Miranda e o próprio especulador.

Uma equipe da PF chegou ontem a Miami para ouvir 19 suspeitos de ter forjado o dossiê e obter provas sobre os verdadeiros sócios da CH, J & T. As investigações preliminares apontam como sócios da empresa os brasileiros Honor Rodrigues da Silva, Ney Santos e João Roberto Barusco. A PF desconfia de que a firma tenha sido aberta pelo advogado americano Roberto Allen Júnior, vizinho de Honor em edifício de escritórios de Miami. Eles teriam montado o dossiê para vendê-lo às vésperas das eleições de 1998. Dois citados no dossiê já morreram, o governador Mário Covas e o ministro Sérgio Motta. O quarto era o ministro José Serra (Saúde).

O Jornal do Brasil teve acesso ao fax despachado em 24 de maio de 2000 pelo advogado de Nahas. O modelo enviado menciona que Silva, Santos e Barusco, além de Luiz Cláudio Ferraz Silva, decidiram assinar declaração para tornar inválidas as informações contidas no documento assinado em 1998. A PF procurou Voltaire Gaspar para confirmar a remessa do fax. Mas ficou sabendo que ele morreu em 22 de outubro do ano passado.

Destruição - Na declaração sugerida pelo advogado, os suspeitos atestariam que o documento anterior ''por nós assinado relatava fatos inverídicos'' imputados aos acusados de negociar a papelada fictícia. Assegurariam a destruição de todas as cópias do documento de 1998 e declarariam ser inválidas outras cópias que porventura ainda existissem.
O documento de 1998, chamado de legal opinio, foi elaborado com a ajuda do advogado Roberto Allen Júnior. Foi registrado no dia 20 de dezembro do mesmo ano com o notário público Doren Strauss, em Miami.
Com a ajuda do FBI, a polícia federal americana, os delegado Paulo de Tarso Teixeira e Jorge Pontes vão interrogar os brasileiros suspeitos e o advogado americano. Também ficou de viajar a Miami o procurador da República Marcelo Serra Azul.

Venda - Pelas investigações, Luiz Cláudio Ferraz Silva, 58 anos, é amigo do ex-presidente Fernando Collor. Teve uma empresa de telemarketing no Brasil e possui uma exportadora de medicamentos em Miami. No documento de 1998, ele contou que, a pedido do ex-presidente, foi o intermediário da venda do dossiê Cayman a Leopoldo Collor.
Segundo a PF, o irmão do ex-presidente teria pago US$ 2,2 milhões a dois brasileiros às voltas com a Justiça dos Estados Unidos - Oscar de Barros e José Maria Teixeira Ferraz, sócios na Overland, especializada em abrir firmas em paraísos fiscais. Eles são acusados de lavagem de dinheiro do narcotráfico colombiano. Leopoldo teria revendido a papelada a Paulo Maluf por US$ 10 milhões.
As investigações da PF apontam que o dossiê foi idealizado por Oscar e José Maria. A idéia foi aperfeiçoada por Honor. A assessoria de Collor afirmou que ele vai aguardar o resultado das investigações, que comprovariam sua inocência. Leopoldo Collor nega a compra do dossiê, assim como Maluf, o ex-senador Gilberto Miranda e Naji Nahas. Os acusados que moram em Miami não foram localizados.


ACM ataca Serra e louva Roseana
Ex-presidente do Senado quer governadora como candidata do PFL se tucanos apoiarem ministro da Saúde
BRASÍLIA - Depois de quatro meses sem pisar no Congresso Nacional, o ex-presidente do Senado, Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA), voltou ontem para boicotar o pré-candidato do PSDB à Presidência da República José Serra, ministro da Saúde. Para o ex-senador, se o candidato da base aliada for o ministro, a governadora do Maranhão Roseana Sarney (PFL) deveria sair como presidente, cabeça de chapa. ''Mesmo que seja para perder'', ressaltou.
Para ACM, o ministro não é um candidato viável, ''ainda que apareça na mídia quase todos os dias''. ''Não há Nizan (Guanaes, publicitário) que salve Serra.''

O ex-presidente do Senado afirmou que Roseana sozinha fortalece o PFL. O raciocínio é simples: palanque nas eleiçõe s pode significar aumento da bancada do partido. ''Se for Serra o candidato, não devemos nem conversar.''
A tese da candidatura exclusiva do PFL não teve apoio no partido. O presidente, Jorge Bornhausen (PFL-SC), disse que essa é uma posição pessoal do ex-senador. ''Respeito muito a opinião de Antonio Carlos, mas prefiro não comentar''. Segundo Bornhausen, o PFL continua buscando a formação de uma aliança da base e só fechará a questão depois das prévias do PMDB, em 20 de fevereiro.
Além de elogiar o desempenho de Roseana Sarney nas pesquisas, ACM disse que, no momento, o único tucano que pode apoiar é o governador do Ceará, Tasso Jereissati. Mas deixou claro que não cogita o lançamento de uma chapa formada por Tasso e Roseana. ''É Nordeste demais.''
Para solucionar o problema, defende o nome de Serra para vice na chapa. ''É um candidato de São Paulo (maior colégio eleitoral do Brasil), além de agradar o PSDB e o presidente'', disse o ex-senador. Mas, segundo ele, essa decisão deve ser tomada exclusivamente por Roseana.

Para ele, é certo apenas que a governadora não pode ocupar o lugar de vice na chapa. ''Isso eu nem cogito.'' Bornhausen concorda. ''O PFL tem uma pré-candidata a presidente, não a vice'', argumentou.
Quem fez coro com ACM foi a primeira-dama Ruth Cardoso, que disse ser ''ótimo'' que o Brasil apresente mais oportunidades para as mulheres e que tenha uma candidata à presidência. ''É importante para o País'', disse.


Gregori revela pressão para achar terrorista
Ministro diz que cobrança tinha origem interna e externa

BRASÍLIA - O ministro José Gregori, às vésperas de trocar a pasta da Justiça pela embaixada brasileira em Lisboa, disse que sofreu pressão de ''setores internos e externos para que se achasse terrorista no Brasil'' a qualquer custo. Há quase duas semanas, o chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, general Alberto Cardoso, também havia se queixado, no Rio, de ''pressão fortíssima'' relacionada à presumível existência de refúgios de terroristas islâmicos na tríplice fronteira do Brasil com Paraguai e Argentina.

Gregori fez a declaração durante a posse dos representantes do Conselho Nacional de Combate à Discriminação, ligado ao Ministério da Justiça, que vai propor ações públicas de apoio a negros, índios, mulheres e homossexuais. Não revelou, contudo, de onde vinha a pressão. O general Alberto Cardoso também aproveitou uma solenidade para reafirmar ontem que ''não há indício algum'' de terrorismo na tríplice fronteira. O chefe do Gabinete de Segurança lançou, no Centro de Formação do Banco do Brasil, o Plano de Prevenção à Violência para o Distrito Federal e mais 22 municípios do entorno da capital federal.

Atentado - Cardoso disse que, desde que ocupou a função, em abril de 1996, o governo brasileiro realiza trabalhos de inteligência na tríplice fronteira, com o objetivo de identificar pessoas envolvidas em ações terroristas. A vigilância aumentou depois da explosão da embaixada de Israel em Buenos Aires, em 1992. Organizações islâmicas assumiram a autoria do atentado. ''Nessa época já não havia indícios e continuo reafirmando que não há indícios'', disse o general.
Segundo Cardoso, a comunidade islâmica que vive na região entre os três países ''não é suspeita; é ordeira, trabalha e está ajudando a construir o Brasil''. Para o general, a coexistência pacífica entre árabes e judeus no Brasil deveria servir de exemplo aos demais países do mundo.


Promotores em estado de alerta
SÃO PAULO - Treinamento de tiro, curso de defesa pessoal e de direção defensiva e um permanente alerta. É este o estado de espírito dos promotores que integram o Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco), ao qual pertence Roberto Porto. Na segunda-feira, ele escapou de uma quadrilha que tentou apanhá-lo na Zona Sul de São Paulo. No Gaeco desde 1999, Porto, de 33 anos, investigou vários casos de repercussão, entre os quais as ramificações da organização criminosa paulista Primeiro Comando da Capital (PCC). É ela que controla o crime organizado dentro e fora dos presídios paulistas. Mais recentemente, investigou a máfia chinesa - responsável por contrabando de eletrônicos.

A polícia acredita que Porto tenha sido vítima de tentativa de assalto ou seqüestro. Homens em um Ômega preto - do presidente da Bolsa de Valores e roubado no mesmo dia -, apontaram armas para seu carro, um Audi A3 e o interceptaram. Porto deu marcha- ré por cerca de 500 metros até alcançar outra rua, onde foi novamente interceptado. Acuado, sacou a arma e atirou. Notou que estava ferido no joelho direito. Assumiu novamente o volante e fugiu em alta velocidade. O outro carro seguiu em sentido contrário.
Ontem, já refeito do susto, o promotor admitiu que possa ter se ferido acidentalmente, já que o carro não tinha marca de balas.


Gringos congelam o Brasil no tempo
Estereótipo ainda define o brasileiro. Pesquisa mostra que país é mundialmente conhecido pelo futebol e Carnaval

Não adianta querer fugir do estereótipo. Peso pequeno tem um presidente intelectualizado que discursa no idioma local na França e nos Estados Unidos. Para os estrangeiros dos quatro cantos do mundo, o Brasil é o país do futebol, do café, do Carnaval e acima de tudo de Pelé. É esta a imagem refletida pela pesquisa da Sensus, encomendada pela Confederação Nacional dos Transportes. O estudo - com perguntas induzidas - ouviu cerca de 9 mil pessoas em 22 países, inclusive o Brasil.

O que se vê no espelho pode desagradar a quem acreditava ser possível deixar para trás a imagem de país exótico, quase uma marca de nascença brasileira. E não é culpa da herança indígena, nem da exuberância tropical. A visão de nativos caminhando com arcos e flechas em meio a uma verde e densa floresta vem a cabeça de apenas 6% de entrevistados. O item ficou acima dos dois pontos percentuais somente entre alemães, americanos, ingleses, australianos e suecos. No mais, é futebol e Carnaval. Tirando franceses e alemães, preocupados com a pobreza e a miséria das terras tropicais.

O rei - Mesmo assombrados pelo fantasma da não classificação para a Copa do Mundo, os jogadores profissionais ainda são os brasileiros mais conhecidos no mundo. É exemplar que o mais famoso, Pelé, esteja associado à era de ouro do futebol brasileiro. Mas há os que não se desencantam, como os sul-africanos e os sírios, que, por uma estreita margem, consideraram Ronaldinho mais popular. O curioso é que nos Estados Unidos, onde Ayrton Senna é quase um Zé Ninguém, a popularidade de Fernando Henrique esteja em alta. Ele só perde para Pelé.
Ao menos, a imagem de Zé Carioca - personagem pouco afeito ao trabalho e muito esperto, criado por Walt Disney - parece estar desaparecendo. Para a maioria, o povo brasileiro é trabalhador e confiável. Somente israelenses e portugueses tem a visão oposta.

Subdesenvolvidos - Por mais que o termo emergente tenha sido incluído no vocabulário econômico pós-globalização, há quem ainda coloque o Brasil no rol dos subdesenvolvidos. Para os nigerianos, com renda per capita de US$ 310 - a menor entre os 22 países escolhidos para a pesquisa -, somos desenvolvidos. Porém para italianos, japoneses, mexicanos e indonésios somos mesmo é sub. Menos mal que para eles o café ainda seja o principal produto de exportação brasileiro. Foi-se o tempo. Hoje, o ouro negro perdeu o brilho e ocupa apenas o nono lugar. Pelos dados do Ministério do Desenvolvimento, o Brasil é o país da soja.
Apesar da imagem exótica, numa coisa os brasileiros não estão sozinhos. Como quase todos os países pesquisados, por aqui, teme-se que a imigração possa causar o desemprego dos nativos. Somente na Suécia, essa correlação não é feita. E mais. Quando o assunto é política de imigração, o Brasil surge como um país altamente intolerante. É aqui um dos países onde a proibição da imigração mais ganha força. Nesse item, os brasileiros estão em segundo lugar - atrás da Índia e à frete da África do Sul. Por outro lado, quando se tornam imigrantes, os brasileiros costumam ser bem aceitos. A menos que optem por viver na Coréia do Sul ou na Argentina. É o que mostra a pesquisa. Para conferir, pode-se acessar a internet www.cnt.org.br


Artigos

Nosso compasso
João Carlos Ramos

A dança contemporânea do Rio vive um momento de comemoração, com a edição dos 10 anos do Panorama RioArte de Dança, projeto do qual participei em 1993 e 1994 e que considero de grande importância porque celebra o sonho e a tenacidade de seus idealizadores e por atuar como um verdadeiro trampolim para o aperfeiçoamento de novos coreógrafos. Nos últimos anos, estamos vendo surgir uma arte marcada pela reflexão sobre aspectos sociais e pelo estreito envolvimento com manifestações culturais raramente expressas na dança contemporânea brasileira. São trabalhos que não apenas buscam inspiração nos registros culturais de comunidades menos favorecidas mas trabalham com a sua matéria-prima, bailarinos oriundos dessa mesma realidade social, a maioria sem qualquer formação acadêmica.

São projetos corajosos que se afastam da motivação ''papo cabeça'' típica da dança contemporânea internacional, que tanto nos influencia, e nos aproximam de uma realidade que para muitos só é suportável através do viés da arte. A repercussão desses trabalhos e o investimento financeiro que os tornou possível têm origem muito mais em sua função ''politicamente correta'' do que na sua contribuição artística. Penso, no entanto, que esse é um caminho rico e extremamente generoso nas suas possibilidades de contribuição para uma dança genuinamente brasileira, que nos garantiria uma legitimidade no cenário internacional não por refletir o folclórico, a dança típica, o documental, mas porque traduz um sentimento verdadeiramente nosso.
Por outro lado, trabalhar a partir de uma temática nova poderá gerar o que o mercado interno costuma chamar de formação de platéia, atraindo para a dança um público novo, mais identificado com questões da nossa história e nossa vida cotidiana do que com os padrões estéticos importados do Primeiro Mundo. É importante lembrar que um trabalho nessa linha demanda um apoio consciente tanto por parte do poder público, através dos programas culturais e de incentivos fiscais, como por parte das empresas privadas. Mas se trata de um investimento de longo prazo em uma arte em formação, o que poderá exigir um compromisso maior que não vise a resultados imediatos.

O desafio é enorme. Não estaríamos mais nos pautando por uma arte bumerangue, que bebe nas águas e reflete os parâmetros da dança internacional. Voltaríamos os olhos de nossos coreógrafos para os movimentos corporais de nossa cultura, de nossa gente. Acredito nesse caminho apesar de toda a dificuldade. A trajetória da nossa companhia, a Cia Aérea de Dança, radicalizou nesse sentido.
Muitos acham que o que fazemos é arte popular - talvez por causa da nossa insistente pesquisa do samba enquanto linguagem de dança -, mas arte popular é um fenômeno espontâneo e coletivo. O que perseguimos apaixonadamente é a representação dessa expressão popular dentro do universo da dança contemporânea. Dançamos, sim, o nosso passo, nosso compasso, nossos gestos, nosso desamparo.


Colunistas

COISAS DA POLÍTICA – DORA KRAMER

O presidente em seu labirinto
O presidente Fernando Henrique Cardoso, ao que consta, voltou do exterior apressadíssimo para organizar a balbúrdia que se instalou nos partidos governistas no que tange à sucessão presidencial. Balbúrdia essa, desnecessária, desprovida de conteúdo sério e, com todo respeito, provocada pelo mesmo que agora pretende organizá-la.
De duas uma: ou o plano estratégico de FH é algo digno de prêmio Nobel ou, se conduzir a sucessão como fez até agora - pelo método mais confuso de apoiar todo o mundo e ninguém -, mais uma vez, é bom lembrar: poderá acabar falando sozinho. Mas a tentativa que fará, registram os noticiários, é encontrar a saída do labirinto onde se meteu na base da conversação com um a um dos personagens.

Para o próprio bem da candidatura governista, queiram os deuses que o presidente esteja pronto para expor claramente suas posições, como convém a quem se pretende comandante do processo.
Evidente que, por mais forte que seja o presidencialismo brasileiro, não é a vontade do chefe da nação que resolve os problemas e dirime todos os conflitos. Mas, pelo menos, aqueles que ele criou ao ignorar que factóides adquirem dinâmica de fatos, vai precisar resolver da maneira que mais o desagrada: sem adiamentos nem ambigüidades.
Nessa história toda de incentivos de candidaturas a torto e a direito, a única pessoa que se mostrou com a cabeça firmemente presa ao pescoço foi o ministro da Fazenda, Pedro Malan, cuja resistência à proximidade da mosca azul revelou acurado senso do ridículo.

Outros já não tiveram a mesma prudência e saíram por aí reafirmando candidaturas desde sempre inexistentes, mas que, mesmo na condição de ectoplasmas, agora estão presentes o suficiente para embaralhar mais o quadro. Dizem que o presidente da Câmara, Aécio Neves, não está nesse grupo e anda também cônscio de suas limitações. Mas, ao mesmo tempo, rodopia pela Europa com uma equipe de TV e acompanhado de assessores que se mantêm em linha direta com jornalistas no Brasil, para que não passem em branco as referências que Aécio ouve lá fora sobre sua suposta candidatura.
Nessa altura, aliás, é perigosíssimo duvidar do que quer que seja, na medida em que tudo vai se tornando possível. A esse processo dá-se o nome de perda de controle da situação.

Vejamos o caso do governador Tasso Jereissati, que outro dia mesmo estava jurando fidelidade eterna ao jogo tucano sucessório, do qual evoluiu - se que é se pode chamar de evolução - para o tratamento irônico ao adversário José Serra, uma ''Carmen Miranda'' de tão exibicionista, na opinião dele, e agora já propõe alternativa aos dois.
É mais ou menos como se, no PT, o senador Eduardo Suplicy, resoluto a disputar as prévias e Luiz Inácio da Silva negando-se a elas, resolvesse que Lula estivesse endurecendo o jogo a ponto de justificar um zerar de placares. Ora, quem quer concorrer é Suplicy, Lula nunca disse que topava a disputa para cuja existência é necessário que haja concorrentes.

Tasso lançou-se candidato, quer que Serra se lance também, Serra não quer fazê-lo agora e o governador então determina que existe impasse a justificar a escolha de ''uma terceira via''. E, nessa alternativa, inclui a pefelista Roseana Sarney - concomitantemente à explicitação do apoio de Antonio Carlos Magalhães à governadora, que até então não estava a freqüentar-lhe o coração -, o que soa no mínimo esquisito para quem se declarava tucano até morrer.
Ao que se saiba, ainda não foram alterados os planos do PSDB de ocupar a cabeça da chapa que disputará a presidência.
Seja lá qual for o lance que Tasso Jereissati esteja fazendo, trata-se de um direito dele escolher o caminho político que lhe seja mais conveniente. Agora, convenhamos que, quando uma liderança da estatura do governador do Ceará, com a influência que tem, faz movimentos algo desconectados da pax partidária que havia sido combinada, é porque algo anda errado no processo.
E até aonde a vista alcança, a falha está na direção, cuja ausência de clareza permite que os atores dessa peça individualmente corram ao centro do palco, a fim de garantir o papel de protagonista. Afinal de contas, trata-se de um elenco à deriva, em que nin guém sabe exatamente qual é a tarefa de cada um, o que favorece o ambiente do salve-se quem puder. E, quem não puder, que trate de levar o adversário junto ao fundo do mar.

Expurgado
O ex-deputado José Eudes, expulso do PT por ter votado em Tancredo Neves no Colégio Eleitoral de 1985, não achou a menor graça na referência que Lula fez ao episódio, dizendo que o radicalismo exacerbado em certa época, foi importante para a evolução do partido.
Eudes, agora tucano, até hoje não se conforma: ''Ao que eu saiba, o método do expurgo só foi importante para a construção do stalinismo.''

É normal?
Não é desprovido de sentido o combate que o PMDB governista faz à candidatura Itamar Franco, uma vez que o governador já anunciou que, escolhido candidato, apóia Lula.
Seria o mesmo que o petista sair vitorioso da prévia de seu partido direto para a candidatura do PSDB.


Editorial

Queda da Bastilha

A tomada de Cabul pela Aliança do Norte ainda está longe de assinalar o fim da guerra do Afeganistão, mas, do ponto de vista simbólico, está para os talibãs assim com a tomada da Bastilha estava para Luís XVI. Toda a oratória talibã, todas as ameaças em vídeo de Bin Laden, todo o pretenso desafio muçulmano à civilização ocidental - começaram a ruir quando a capital afegã caiu. Certa opinião pública internacional que extravasou antiamericanismo quando os terroristas derrubaram as torres gêmeas de Nova York e, sobretudo, um mês depois, quando os EUA iniciaram a guerra contra o Afeganistão, seguramente ficou decepcionada com a rapidez dos ganhos bélicos antitalibã. O Afeganistão, que já derrotou a Inglaterra no século 19 e a URSS no século 20, era para eles inexpugnável.

As pessoas que pretendiam dar uma das mãos a Deus e outra ao diabo quando condenavam o terrorismo mas não aceitavam a investida antiterrorista (alegavam que não havia provas concretas da participação de Bin Laden no atentado às torres gêmeas), não perceberam as profundas mudanças ocorridas no mundo pós 11 de setembro.
Sem descartar a dor pelas 6 mil vítimas do World Trade Center, na coluna das aquisições positivas merece destaque a atenuação da violência fora do centro vital do conflito. Começou com o IRA irlandês que, um mês depois, já abalado pela revelação de seus contatos com a guerrilha colombiana, depôs as armas e se engajou num diálogo com a maioria protestante da Irlanda do Norte. Ainda na Europa, o governo espanhol espera comportamento semelhante por parte da ETA, apesar de algumas dificuldades suplementares representadas sobretudo pela ala mais jovem que se recusa a conversar.

Tanto Cuba como Coréia do Norte não hesitaram em condenar o terrorismo islâmico, logo depois de Yasser Arafat que se apressou a abominar o tremendo ato perpetrado nos EUA, temeroso de se ver identificado como aliado de Bin Laden. O próprio conflito israelense-palestino sofreu inflexão diante da guerra do Afeganistão. Tanto quanto Israel, ameaçado pela Al Qaida, a Autoridade Palestina não pode contar com a clemência dos integristas: o maïtre à penser de Bin Laden, o palestino-jordaniano Abdalah Azzam, condena, desde 1992, qualquer processo de paz, e conclama os ''bons muçulmanos'' a liquidar os colaboracionistas, à frente dos quais coloca Arafat... Uma das hipóteses estudadas pelos EUA seria a proclamação imediata do Estado palestino, deixando para depois a resolução do contencioso.

No outro prato da balança, no entanto, polarizou-se o mundo muçulmano entre partidários e adversários do integrismo. A longo prazo estes conflitos se asseveram inevitáveis. Países um pouco fragilizados, como Marrocos e Líbia, bem frágeis como Egito ou regionalmente sensíveis como Arábia Saudita, Iêmen e Paquistão ressentem desde agora as conseqüências da polarização.
Há elementos positivos no caso da reaproximação russo-americana. Tal reconciliação implica forte evolução das relações interétnicas nos Bálcãs, no Cáucaso e até no mar Cáspio. Concretamente, russos e turcos deveriam se aproximar para estabelecer discreta mas eficaz barreira à inevitável ascensão do poder do Irã. Isto significa também negociação sólida de Moscou com os chechenos moderados que não querem se talibanizar. O isolamento crescente de Saddam Hussein no Iraque prepara uma grande revolta xiita no Sul.
Depois da queda de Cabul, com toda sua carga simbólica, a guerra contra o terrorismo em geral ainda está em curso. A ONU continua a debater o tipo de governo provisório que deseja para o Afeganistão, dirigido por afegãos mas apoiado por força multinacional. Todo cuidado é pouco para evitar as atrocidades pós-guerra.


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11/14/2001


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