Leis e projetos em excesso podem criar privilégios na saúde, advertem especialistas



O crescimento do número de projetos e de leis obrigando o Sistema Único de Saúde (SUS) a instituir políticas para atendimento de determinadas doenças, fornecer medicamentos e disponibilizar procedimentos e tratamentos específicos foi criticado durante audiência publica no Senado nesta quinta-feira (14). O debate visou discutir as deficiências do SUS e apontar soluções estruturais para promover melhorias em todas as etapas do atendimento médico.

O consultor legislativo do Senado Luiz Carlos Romero disse na Subcomissão Permanente de Promoção, Acompanhamento e Defesa da Saúde que esse fenômeno poderá produzir um ordenamento jurídico sanitário "muito fragmentado". Segundo ele, grupos e associações de pacientes mais organizados e com mais recursos conseguem leis específicas que contemplem seus interesses, em detrimento de outros setores, menos organizados.

Romero disse que um especialista no assunto, Geraldo Lucchese, considerou esse fenômeno como caracterizador de uma tendência ao agravamento da desigualdade da atenção à saúde dos brasileiros "ou, em outras palavras, uma afronta ao princípio da equidade".

Especificidades

Outro participante da audiência, o especialista em direito sanitário Marco Aurélio Antas citou pesquisa publicada no site Observatório da Saúde no Legislativo sobre 1.368 proposições apresentadas desde 2007. Segundo ele, parte das propostas trata de direitos específicos (isenções tributárias, auxílio-doença e gratuidade de medicamentos) para doenças ou situações específicas (leishmaniose, diabetes e hipertensão, entre outras).

Marco Aurélio chama o fenômeno de "especificação dos direitos", o que ocorre quando estes "passam a tutelar situações concretas e não apenas o ser humano em abstrato".

Controle social

Paulo Duarte Amarante, editor-chefe da revista Saúde em Debate, do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes), lembrou que foi a entidade que lançou em 1979 a ideia do SUS. Ele observou que, passados 20 anos da implantação do sistema, o controle social sobre seu funcionamento está totalmente engessado. Amarante condenou também a "terceirização do SUS" por meio de convênios do poder público com organizações da sociedade civil.

Valcler Rangel Fernandes, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), disse que as alternativas de gestão não podem substituir a ação do Estado na saúde. Ele fez um balanço positivo do SUS, destacando a queda na mortalidade por doença crônicas não transmissíveis de 2% ao ano, de 1996 a 2007; as ações de controle do tabagismo; a queda de 81% na mortalidade por tétano de 1980 a 2007; a redução de 95% dos óbitos por diarréia em menores de um ano, de 1980 a 2005; e interrupção da transmissão vetorial da doença de Chagas em 2006.

Modelo

Fernandes defendeu um novo modelo para o SUS com base no que chamou de evolução do perfil de morbidade/mortalidade. Segundo ele, há um predomínio crescente das doenças crônicas, mudando o paradigma da cura para o cuidado.

Conforme o representante da Fiocruz, o aumento da população idosa leva à necessidade de configuração de espaços institucionais de longa permanência e cuidados paliativos.

Um dos elementos-chave do novo modelo, acrescentou, deve ser a introdução crescente de mecanismos de avaliação do desempenho do sistema de saúde em seus diferentes pontos.

A audiência na subcomissão, que funciona no âmbito da Comissão de Assuntos Sociais (CAS), foi presidida pelos senadores Humberto Costa (PT-PE) e Eduardo Amorim (PSC-SE).



14/07/2011

Agência Senado


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