Lula acalma o mercado
Lula acalma o mercado
Medidas anunciadas pela equipe do candidato do PT a presidente, que incluem mais aperto nas contas públicas, foram bem recebidas e tiveram forte impacto sobre os negócios de ontem na Bolsa de Valores. O dólar caiu
O anúncio de que o PT estuda um pacote de medidas de emergência para reverter a grave crise econômica que sacode o país, antecipado ontem pelo Correio, aplacou, ainda que momentaneamente, a turbulência no mercado financeiro. A notícia de que o candidato do partido à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva, busca com a sua equipe econômica criar condições que permitam ao governo aumentar, no próximo ano, a meta de superávit primário (receitas menos despesas, sem levar em conta os gastos com juros) de 3,75% para até 5% do Produto Interno Bruto (PIB), foi festejada pelos investidores.
A promessa de mais aperto fiscal, medida considerada fundamental para a manutenção da estabilidade da economia, contribuiu para que a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) fechasse o dia com alta de 6,34%, o melhor resultado desde novembro de 2001. A cotação do dólar (veja quadro com os indicadores do dia), que vinha em disparada, recuou 0,26%, fechando a R$ 3,91, ajudada por vendas de aproximadamente US$ 100 milhões feitas pelo Banco Central. O risco-país, por sua vez, registrou queda de 9,5%, nos 2.066 pontos. Os C-bonds, títulos mais negociados da dívida externa brasileira, tiveram alta de 5,85%.
Além das medidas econômicas e das reformas tributária e previdenciária, o PT anunciou que os nomes da equipe de transição de Lula, caso ele seja eleito, serão conhecidos logo depois do dia 27 de outubro. A maioria desses nomes deverá ocupar cargos até o segundo escalão da equipe econômica no próximo governo. Deverão estar nessa equipe de transição os mais envolvidos na formulação do programa econômico de Lula. Como o secretário de Finanças da Prefeitura de São Paulo e ex-ministro do Planejamento no governo José Sarney, João Sayad, o economista Guido Mantega e Luciano Coutinho, ex-secretário-geral do Ministério da Ciência e Tecnologia também no governo Sarney.
‘‘Se o Lula realmente anunciar sua equipe e o mercado aceitar as indicações, o que é bem provável, a situação se acalmará’’, disse o diretor da Área de Câmbio da Corretora Novação, Mário Battistel. Para o economista Alexandre Fischer, diretor da RC Consultores, as medidas anunciadas pelo PT, caso assuma o governo, levarão o país para o rumo certo. ‘‘O mercado vai aplaudir se isso realmente acontecer. Não existe nenhum país no mundo que tenha conseguido sucesso no ajuste fiscal com um superávit abaixo de 5% do PIB’’, afirmou. O presidente do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças (Ibef), João Carlos de Almeida, disse que Lula, se eleito, terá força para aprovar as medidas ainda no mandato de Fernando Henrique Cardoso, interessado em garantir uma transição tranqüila.
O aceno da possibilidade de revisão da meta de superávit foi a notícia que mais impactou o mercado. Ontem, o coordenador da equipe que prepara o programa de governo de Lula, Antonio Pallocci, e o deputado Ricardo Berzoini (PT-SP) reforçaram o que o Correio antecipara. ‘‘O PT cumprirá o superávit fiscal que for necessário para o equilíbrio das contas públicas’’, disse Pallocci. Berzoini afirmou que a meta de 3,75% do PIB, que consta do acordo negociado em setembro pelo governo com o Fundo Monetário Internacional (FMI), pode ser revista. Desde que se consiga de fato obter um melhor esforço fiscal, com a aprovação das medidas emergenciais que o PT pretende negociar a partir de segunda-feira com o Congresso Nacional na hipótese de vitória de Lula.
As medidas que o PT pretende negociar foram esboçadas no documento entregue pelo partido à Bovespa. O texto, feito em conjunto por técnicos do PT, da bolsa paulista e da Associação Brasileira dos Analistas do Mercado de Capitais (Abamec), sugere caminhos para estimular o investimento no mercado de capitais que, em suma, é também investimento na produção. O documento sustenta que o setor público deve concentrar seus esforços principalmente na área social. Mas precisa planejar e articular políticas públicas e privadas que façam retomar o crescimento. ‘‘Pela primeira vez, o assunto mercado de capitais faz parte da agenda nacional’’, festejou o presidente da Abamec, Humberto Casagrande Neto.
Mesmo eleitores de Serra, como o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Horário Lafer Piva, elogiaram a iniciativa do PT. ‘‘É um documento de consenso entre as entidades e o PT e, na minha opinião, diz tudo. O país precisa de um ciclo virtuoso de crédito, produção, emprego e consumo, que gere mais produção, mais crédito e mais emprego’’, disse Piva.
As boas notícias para Lula vieram até mesmo dos Estados Unidos. O subsecretário do Tesouro para Assuntos Internacionais, John Taylor, disse que o governo americano apoiará o próximo governo brasileiro mesmo em caso de vitória do petista. ‘‘Queremos apoiar o novo governo, independente de quem for eleito, e o faremos’’, declarou Taylor, em uma entrevista ao canal de televisão de informações econômica CNBC.
Serra tenta mostrar que não está sozinho na campanha
Candidato do PSDB reúne aliados e faz questão da presença do governador eleito de Minas, Aécio Neves, que aparece com freqüência ao lado de Lula
Disposto a tirar o impacto da fotografia do governador eleito de Minas Gerais, Aécio Neves (PSDB), com o candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, o comando político da campanha de José Serra (PSDB) acertou a ida de Aécio ontem ao Rio de Janeiro para posar ao lado do candidato. O encontro foi combinado pelo presidente do PSDB, José Aníbal, ainda na quarta-feira, depois que Aníbal soube da foto de Lula com Aécio, no aeroporto de Brasília, há dois dias.
Aécio discursou no ato em apoio a Serra promovido por políticos do PFL, do PMDB e do PSDB na capital do Rio. Procurou mostrar que continua firme ao lado de Serra, apesar do bom relacionamento com o petista. Anunciou que irá reunir ‘‘mais de 400 prefeitos’’ em Minas, na segunda-feira, para recepcionar Serra. ‘‘O meu apoio e o de vários companheiros de Minas a Serra não é por uma solidariedade pessoal, tampouco por uma obrigação partidária, mas por responsabilidade com esse país’’, afirmou Aécio, classificando a sua foto com Lula como algo irrelevante. ‘‘Foto eu tiro com qualquer pessoa’’, afirmou.
Serra aproveitou para, novamente, criticar Lula por ter desqualificado o representante do comércio dos EUA, Robert Zoellick, há alguns dias, quando o candidato do PT chamou o secretário de ‘‘sub do sub’’ na hierarquia do governo americano. ‘‘Ele (Zoellick) é, na prática, o ministro do comércio exterior dos EUA. É um homem importante, e Lula pensa que ele é do quinto escalão’’, disse. Em seguida, Serra fez seu comercial, e contou que ‘‘enfrentou’’ Zoellick na OMC (Organização Mundial do Comércio) no caso da quebra das patentes dos medicamentos contra a Aids.
Na nova linha adotada por sua campanha, de críticas diretas às administrações petistas, Serra foi incisivo nos ataques ao partido de Lula. ‘‘Alguém acha que o PT vai dar 60% de reajuste ao funcionalismo?’’, perguntou. ‘‘Por que não deu no Rio? Por que não deu em Recife? Por que não deu em São Paulo?’’, perguntou o tucano. Serra afirmou que, como Lula nunca ocupou nenhum cargo público, se vencer a eleição será o PT que governará.
Mata-mosquitos
Antes de Serra falar mal de Lula, quem ouviu críticas foi ele. A reunião na ABI foi interrompida por um tumulto provocado por dez mata-mosquitos — funcionários temporários da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), que atuavam no combate e controle da dengue, dispensados em 1999. Com cartazes e faixas culpando Serra pela epidemia de dengue, os manifestantes invadiram o auditório da Associação. O grupo acabou expulso por seguranças do senador eleito Sérgio Cabral Filho (PMDB). Houve briga. O manifestante Jonas Ciro de Souza, 49, machucou a perna esquerda.
Serra culpou o PT e seu candidato a presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, pela confusão. ‘‘Ao invés de debater, mandaram uma tropa de choque, inclusive com agressões físicas. É feio o Lula e o PT fazerem uma tropa de choque exatamente no momento em que deve haver uma tropa de debates, uma tropa de idéias’’, disse.
O candidato deixou a ABI sob proteção de policiais do Batalhão de Choque. No térreo, cerca de 30 manifestantes esperavam o candidato. A briga dos mata-mosquitos com Serra é antiga. Eles foram demitidos em 1999, durante a gestão de Serra no Ministério da Saúde. Na ocasião, foram dispensados cerca de seis mil agentes, pois um levantamento do Ministério concluíra que apenas dois mil deles efetivamente trabalhavam. Os mata-mosquitos alegam que a dispensa foi irregular e não levou em conta o crescimento da dengue no país.
Não foi a primeira vez que os mata-mosquitos enfrentaram Serra. Em maio, na inauguração de um comitê em Brasília, o tucano foi vaiado por uma centena de mata-mosquitos. Em março, 30 mata-mosquitos cercaram o carro de Serra, na saída do jornal ‘‘O Dia’’, no Rio. Serra também foi vaiado por mata-mosquitos no último dia 4, quando fazia campanha no centro do Rio.
Petista avança e preocupa Lúcio
Fortaleza — Pesquisa Ibope divulgada ontem no Ceará mostra que o petista José Airton Cirilo encostou no candidato apoiado pelo ex-governador e senador eleito Tasso Jereissati (PSDB) ao governo do Ceará, o tucano Lúcio Alcântara.
José Airton tem 47% dos votos válidos contra 53% de Lúcio, de acordo com o Ibope. A margem de erro é de 2,5 pontos percentuais e 9% ainda estão indecisos, segundo a pesquisa. É a menor diferença entre ambos detectada por uma pesquisa desde o início da campanha ao governo do estado (leia artigo na página 15).
Lúcio quase conseguiu vencer no primeiro turno, com 49,79% dos votos válidos. O petista, mesmo sem fazer comícios no interior do estado e com poucos recursos, conseguiu levar a disputa para o segundo turno ao associar a sua imagem à do candidato à Presidência Luiz Inácio Lula da Silva (PT), na propaganda eleitoral, e teve 28,33%.
Para barrar a estratégia do petista, um grupo ligado ao candidato derrotado à Presidência Ciro Gomes (PPS), antigo aliado de Tasso no Estado, criou a chapa ‘‘Lu-Lu’’, para defender as candidaturas de Lúcio e Lula.
O comitê ‘‘Lu-Lu’’, em Fortaleza, foi inaugurado ontem. Para os petistas, adversários de Lúcio ao governo do estado no segundo turno, ‘‘não adianta querer juntar as duas coisas porque não combinam’’. ‘‘Essa é a atitude de alguns enrustidos que não tiveram a coragem de assumir a candidatura do Serra’’, disse Cirilo.
Preferência
O próprio Lúcio, que já declarou apoio a José Serra (PSDB) no segundo turno, compareceu à inauguração do comitê, montado por um grupo liderado por Ciro e com integrantes do PPS, do PDT e do próprio PSDB.
‘‘Vejo isso com a maior naturalidade. A sociedade pode se organizar em movimentos, de acordo com o entendimento e a preferência de cada um’’, afirmou o tucano. Lúcio e Tasso estiveram ao lado de Serra na última terça-feira, no primeiro evento da campanha tucana à Presidência no Ceará. No primeiro turno, a maior parte do PSDB cearense declarou apoio a Ciro, inclusive Lúcio e Tasso.
Apesar disso, a figura de Serra continua apagada no estado. Ele não aparece sequer nos santinhos da campanha de Lúcio. O espaço reservado para a foto e o número do candidato a presidente nos folhetos fica em branco.
A disputa é pela companhia de Lula. Nos outdoors pela cidade, o candidato do PT à Presidência aparece ao lado de Ciro, com a frase ‘‘Para o Brasil mudar, Ciro agora é Lula’’, e ao lado de José Airton. Lúcio aparece sozinho no outdoor de sua campanha.
Os petistas anunciam para a próxima semana a visita de Lula ao Ceará. Enquanto isso, participam de atos públicos em prol da candidatura de José Airton lideranças nacionais do partido, como o prefeito de Recife, João Paulo, que esteve hoje em Fortaleza, o senador eleito Aloizio Mercadante (SP), e a deputada federal reeleita Luiza Erundina (PSB-SP).
Lula vincula o voto
Maracanaú é um município da região metropolitana de Fortaleza com pouco mais de cem mil eleitores. O senador eleito Tasso Jereissati o conhece bem. Ele governou o Ceará nos últimos oito anos e visitou Maracanaú dezenas de vezes. Empenhado agora em eleger seu sucessor, Tasso conferiu no fim da semana passada as mais recentes pesquisas eleitorais aplicadas no estado e descobriu algo que o surpreendeu: Maracanaú avermelhou de vez. Ali, 91% dos eleitores dizem que votarão em Lula para presidente no próximo dia 27.
A cidade do Rio de Janeiro também avermelhou. Números do Ibope levantados no início desta semana mostram que pouco mais de 80% dos eleitores garantem que votarão em Lula. No Rio Grande do Sul, onde o candidato do PMDB que apóia Serra lidera as intenções de voto para o governo, a situação de Serra já foi melhor. Ele começou a cair nas últimas 72 horas. E Lula está subindo. Ao subir, Lula puxa o candidato do PT ao governo, Tarso Genro. É provável que Tarso perca a eleição. Mas se perder será por uma pequena diferença de votos.
Na época do regime militar inaugurado no país em 1964, houve um momento em que o partido oficial estava prestes a perder a eleição para os governos dos estados. O regime adotou então o casuísmo do voto vinculado. Quem votasse no candidato a governador de um determinado partido estava obrigado a votar em candidatos do mesmo partido ao Senado, à Câmara dos Deputados e às Assembléias Legislativas. O casuísmo derrotou a oposição. O partido oficial era mais forte na disputa por cargos proporcionais. E por isso fez a maioria dos governadores.
Nas eleições ora em curso, é a força da candidatura Lula e a fraqueza da candidatura Serra que estão impondo o voto vinculado espontâneo. Foi assim no primeiro turno mesmo em lugares onde o PT perdeu. Em Pernambuco, por exemplo, o governador Jarbas Vasconcelos, do PMDB, foi reeleito com 60% dos votos. Mas até o dia da eleição ninguém previu que o candidato do PT, o deputado estadual Humberto Costa, pudesse alcançar 34% dos votos. Ninguém previu que o PT elegesse uma senadora no Mato Grosso. E fizesse a maior bancada na Câmara dos Deputados.
Candidatos do PT eleitos ou derrotados para os governos estaduais e o Senado colheram uma expressiva fatia dos seus votos nas últimas 72 horas do primeiro turno. Em alguns casos, atraíram até 10% dos votos que tiveram. E nada indica que o fenômeno não possa se repetir no segundo turno. O apoio do PT a Luiz Henrique, candidato do PMDB ao governo de Santa Catarina, deverá ser decisivo para que ele derrote Esperidião Amim. A eleição de Lúcio Alcântara, candidato de Jereissati ao governo do Ceará, está ameaçada pela ascensão do candidato do PT.
Por ora, a eleição em segundo turno para os governos estaduais está indefinida na maioria dos estados. Mas os candidatos do PT ou apoiados por ele tendem a crescer em toda parte. Quanto à eleição presidencial, só um ataque às torres gêmeas do prédio do Congresso pode provocar uma reviravolta no quadro que está aí. E mesmo assim se os aviões lançados contra as torres tiverem em suas caudas a inscrição PT acompanhada de números misteriosos. E se os aviões forem pilotados por terroristas treinados em bases clandestinas mantidas pelo PT na Amazônia.
Eis aí, por sinal, uma boa idéia para animar uma nova aparição da atriz Regina Duarte no programa de Serra: quem pode garantir que o PT não é ligado à Al Qaeda de Osama Bin Laden? Lula e Bin Laden usam barbas. Ambos querem mudar o mundo. Bush quer matar Bin Laden e, se não pegasse tão mal, gostaria de pelo menos dar uns tapas no Lula. O que conspira para derrubar a tese de que Lula e Bin Laden são parentes é o fato de Bin Laden detestar álcool. E de Lula ter-se dado ao luxo recente de tomar um gole do caríssimo vinho Romanée-Conti.
Mas que dá medo imaginar que Lula e Bin Laden têm afinidades, dá.
Carona na campanha de Lula
Em 1998, Joaquim Roriz (PMDB) se elegeu governador com um discurso que reforçava a ligação com o presidente Fernando Henrique Cardoso. ‘‘Eu não tenho dúvida de que Fernando Henrique vai dar todas as condições ao seu aliado, ao seu amigo, ao seu companheiro.’’ Quatro anos depois, o discurso mudou radicalmente. Em baixa nas pesquisas de intenção de voto, o governador, que já declarou seu ódio à cor vermelha e aos petistas, usa agora o nome do favorito na corrida presidencial, Luís Inácio Lula da Silva (PT), para conseguir votos. Ontem à tarde, no horário eleitoral gratuito, ele anunciou a criação de uma aliança, no mínimo, curiosa: a Frente Lula-Roriz, encabeçada pelo Partido Liberal (PL).
Na noite de quarta-feira, o PL local formalizou apoio a Roriz e anunciou que vai ceder sua estrutura de campanha para o governador. Até o dia 27, 1,8 mil cabos eleitorais, 30 carros de som, 76 automóveis e 46 outdoors estarão à disposição para pedir votos para Lula e Roriz. ‘‘Adesivos, panfletos, faixas e todo material gráfico terá o nome dos dois candidatos’’, afirmou o presidente regional do PL, Eduardo Pedrosa. Ontem mesmo, no programa eleitoral de Roriz, a criação da frente foi amplamente divulgada. A aliança surpreendeu juristas e cientistas políticos. Segundo eles, o apoio do PL local a Roriz fere a verticalização das alianças políticas entre partidos, imposta pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Nacionalmente, o PL está coligado com o PT e participa da chapa de Lula com o candidato a vice, José Alencar. No DF, o partido manifestou apoio a Roriz antes mesmo do início da campanha do primeiro turno.
‘‘É uma ligação esdrúxula. Uma coisa é o partido apoiar Roriz, outra é usar o nome de Lula para pedir votos para ele. Porque o candidato de Lula no DF não é Roriz, e sim Magela’’, opina a cientista política Laura Frade. O coordenador do Núcleo de Mídia e Política da UnB, Mauro Porto, também se surpreendeu com a criação da frente. ‘‘Todos se lembram que há menos de uma semana Roriz exigiu a presença de Serra num comício dizendo que o apoio dele era fundamental. Essa súbita ligação com o candidato petista, num momento em que as pesquisas mostram o favoritismo de Lula e a desvantagem de Roriz, soa como uma tática extremamente oportunista’’, critica.
Problemas jurídicos
Para o procurador regional eleitoral Franklin Rodrigues da Costa, a Frente Lula-Roriz desrespeita a verticalização das alianças. ‘‘Mais do que isso, ela tem o objetivo explícito de confundir o eleitor.’’ Especialistas afirmam que o PL local poderá enfrentar problemas jurídicos pela decisão de apoiar formalmente o governador. ‘‘O PL é livre para apoiar o candidato que quiser em nível local. Mas só informalmente. Ceder estrutura de campanha e associar o nome dele a um candidato que apóia seu adversário, além de desobedecer a determinação do TSE, é uma agressão ética ao PL nacional’’, analisa o especialista em Direito Eleitoral Luiz Carlos Alcoforado.
Segundo ele, o Código Eleitoral não estabelece punição para esse caso, já que foi elaborado bem antes da determinação do TSE. ‘‘O entendimento terá de ocorrer entre os diretórios locais e nacionais do PL e do PT’’, explica. Ontem à tarde, o PT local ajuizou uma representação no Tribunal Regional Eleitoral (TRE) para proibir o PL de associar o nome de Lula a Roriz. ‘‘Não queremos impedir que o PL peça votos para Lula, até porque o partido faz parte da nossa coligação nacional. Mas querer associar o nome dele à imagem desgastada de Roriz é demais’’, diz o advogado do PT, Claudismar Zupiroli.
O PL nacional, porém, não está disposto a comprar briga com o diretório local. Muito ao contrário. Por meio de sua assessoria de imprensa, o presidente nacional do partido, Valdemar Costa Neto, afirmou que o PL sempre foi contra a verticalização e apóia integralmente a criação da Frente Lula-Roriz. ‘‘A verticalização é uma grande violência contra a democracia brasileira’’, disse Valdemar. ‘‘Qualquer iniciativa que garanta mais votos para Lula, e neste caso votos do eleitor de Roriz para ele, é necessária e positiva.’’
Em busca do voto de fiéis
Candidato do PT ao Governo do Distrito Federal promete aos evangélicos que ouvirá os pastores nas tomadas de decisões e que regularizará os terrenos das igrejas. Lei que autoriza a doação é contestada na Justiça
Depois de receber o apoio político do vice-governador Benedito Domingos (PPB), o candidato do PT ao Palácio do Buriti, deputado federal Geraldo Magela, agora apresenta suas armas para seduzir os evangélicos. De olho nos votos dos 200 mil fiéis, o petista prometeu regularizar todas as áreas ocupadas pelas igrejas, durante café da manhã com pastores, ontem no hotel Naoum.
‘‘Quero dizer do meu compromisso com a regularização de todas as áreas que estejam hoje ocupadas pelas igrejas, no meu governo. Esse compromisso não é de hoje, não é de agora. É desde sempre’’, afirmou o candidato, que foi aplaudido de pé. Segundo Magela, todo o processo de regularização dos lotes seguirá a legislação atual. Os dados mais recentes divulgados pela Secretaria de Assuntos Fundiários indicam que cerca de 400 terrenos ocupados por igrejas estão em situação irregular.
‘‘Estão espalhando boatos de que se eu ganhar as eleições, irei derrubar igreja. Não vou derrubar nada. Vou regularizar tudo dentro da lei’’, disse o petista ao Correio, após o evento. Magela não quis adiantar se irá cobrar pelos lotes. Segundo ele, é necessário esperar a decisão final do Tribunal de Justiça do DF sobre a situação da Lei 2.688.
Aprovada na Câmara Legislativa em dezembro de 2000, a lei prevê a doação de lotes e terrenos públicos para igrejas e entidades assistenciais. Em contrapartida, os beneficiados teriam de se comprometer a prestar serviços à comunidade. Uma ação de inconstitucionalidade corre no tribunal. No dia 28 de maio deste ano, a Justiça negou o pedido de anulação da lei apresentado pelo Ministério Público, em caráter liminar.
O evento no hotel Naoum reuniu cerca de 500 evangélicos. Estavam lá o vice-governador Benedito Domingos, o deputado distrital eleito Peniel Pacheco (PSB) e o presidente da Convenção Evangélica das Assembléias de Deus do DF (Ceaddif), pastor Sóstenes Apolos. Benedito cobrou apenas respeito aos fiéis. ‘‘O evangélico não precisa de esmola’’, disse.
Magela prometeu também que os pastores terão um papel importante durante o seu governo. E que eles irão participar das tomadas de decisões. ‘‘Quero criar canais específicos que valorizem a participação do povo evangélico no nosso governo, e nas nossas decisões. Eu quero que ajude a governar, mesmo não estando em cargos’’.
Em discurso na noite de quarta-feira, o candidato petista fez outra promessa, dessa vez, na área educacional: anunciou que dará uma bolsa-escola de R$ 200 por mês. Durante discurso em Brazlândia para 1,5 mil pessoas — segundo estimativas da PM — Magela assumiu o compromisso de reativar o programa implantado pelo ex-governador Cristovam Buarque, recém-eleito senador.
‘‘Eu quero pedir a vocês que digam para todas as mães, que já estiveram na bolsa- escola, que elas terão o direito de voltar’’, disse Magela. ‘‘E quem hoje está na Renda Minha (programa criado no atual governo Roriz), será mantido. Elas vão passar a receber um salário mínimo por mês. E nós ainda vamos abrir inscrição para que novas famílias possam se inscrever’’, completou.
Longe da maioria
O próximo presidente da República terá de fazer muita política. Entenda-se por política a arte do entendimento e da negociação. Quem quer que vença a eleição no próximo dia 27, estará longe de obter maioria para aprovar os projetos do seu interesse. Contar com a boa vontade do lado oposto será uma das tarefas mais importantes se o próximo presidente não quiser correr o risco de ver todos os seus planos empacados no Congresso Nacional. Não terá a ampla maioria com que Fernando Henrique Cardoso contava em seus primeiros anos de governo.
O esfacelamento da atual base governista é nítido, quando se verifica quem está com cada candidato a presidente. O do PSDB, José Serra, ainda poderia se orgulhar de ter uma ampla vantagem sobre o candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, se tivesse o apoio de todos os deputados e senadores eleitos pelos partidos que hoje compõem a base de sustentação do governo. Chegaria a poder contar com 320 deputados e 54 senadores. Ocorre, porém, que a cada dia da campanha no segundo turno um novo político anuncia apoio a Lula. E a base que seria de Serra míngua.
Levantamento feito pelo Correio demonstra que, hoje, Serra teria uma pequena vantagem sobre Lula no Congresso. Praticamente, há um empate entre os dois. Isso indica que, qualquer que seja o eleito no dia 27 de outubro, terá de negociar muito para aprovar projetos de seu interesse.
Pelo que declararam nos últimos dias os parlamentares, Serra teria hoje o apoio de 250 deputados e de 38 senadores. Lula contaria com a ajuda imediata de 229 deputados e 37 senadores. ‘‘É claro que, assim que estiver definida a eleição, no dia seguinte ocorrerão mais adesões’’, observa o cientista político Walder de Góes, do Instituto Brasileiro de Estudos Políticos. É na busca dessas novas adesões que os candidatos trabalham desde já nas suas articulações com o Congresso.
Dono da maior bancada na Câmara, com 91 deputados, o PT se articula para suceder o governador eleito de Minas Gerais, Aécio Neves, na presidência da Casa. O deputado José Dirceu (SP), presidente do PT e coordenador da campanha de Lula, é o candidato natural ao cargo. A articulação petista passa por conversas com o PMDB. Na hipótese de uma solução com o grupo peemedebista que já apóia a Lula, a conversa prevê uma troca do apoio do PMDB para Dirceu na Câmara pela ajuda do PT para eleger José Sarney (PMDB-AP) presidente do Senado.
O PMDB empata com o PFL como maior bancada no Senado. Cada qual tem 19 senadores. Na prática, porém, o PMDB terá um parlamentar a mais, caso se confirme a vitória de Lula. O suplente do vice-presidente na chapa petista, o senador José Alencar (PL-MG), é o peemedebista Aelton José de Freitas. Por isso, o PFL também corre atrás de mais um senador.
A articulação em torno de Sarney, no entanto, esbarra num outro problema além do tamanho da bancada no Senado. Os governistas, que apoiaram e integram a chapa de Serra, fizeram a grande maioria dos deputados e senadores do partido. Não vão querer, portanto, ceder o poder no Congresso para o grupo oposto. Essa ala está preparada para dizer aos petistas que, caso Lula seja eleito presidente, qualquer acordo para formar maioria terá que ser feito no sentido de ceder o Poder na Câmara e no Senado. Em conversas reservadas, políticos do PMDB, do PPB, do PSDB e do PFL já falam sobre a formação de blocos partidários para suplantar o tamanho do PT e manter o Poder Legislativo nas mãos dos partidos que apóiam Fernando Henrique Cardoso.
É por isso que Dirceu trabalha com um plano B e há semanas conversa com o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) em busca de uma parceira com os peemedebistas. De acordo com José Dirceu, há ainda vasos comunicantes entre o PT e o PSDB. Não foi por caso que Lula empenhou-se pessoalmente para ajudar a eleição, por exemplo, do deputado Sigmaringa Seixas (PT) no Distrito Federal. Sigmaringa já foi do PSDB. Pode ajudar a quebrar o gelo pós-eleitoral entre os dois partidos numa eventual vitória de Lula. Da parte dos tucanos, o presidente da Câmara, Aécio Neves (PSDB), exercerá esse papel até o fim do ano, quando deixará o cargo para assumir o governo de Minas em janeiro.
Imagem da campanha
O catador de papel ganha o seu sustento recolhendo os panfletos e cartazes lançados pelos cabos eleitorais ontem no Eixão Sul. E, enquanto trabalha, aproveita para fazer a campanha do seu candidato.
Artigos
Poder paralelo
O poder ilegitimamente constituído desenvolve forças que é incapaz de controlar e que podem derrubá-lo em situação de conflito agudo
Edísio Gomes de Matos
Historicamente, poder paralelo é o que concorre com o poder político propriamente dito e, às vezes, chega a superá-lo. Forma-se, quase sempre, por intermédio dos órgãos de repressão. Muitas vezes, nem o governo legalmente constituído consegue enfrentar, com êxito, a autoridade ilegítima. Pormenor digno de registro é o de que, embora não se declare jamais abertamente como uma força, age com uma eficiência que atesta de forma indubitável sua existência real.
O Brasil vive, nesse particular, situação sui generis. Aqui, as rédeas do poderio colateral, que se alastra como uma praga por todo o país, é exercido não pela polícia, mas pelos chefes do crime organizado. Em especial pelos traficantes de drogas, contrabandistas e outros perigosos espécimens dessa fauna indesejável.
O relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito do Narcotráfico, concluído em dezembro de 2000 pelo Congresso Nacional, aponta a ligação de profissionais especializados com o crime organizado. O documento escancara o envolvimento de políticos, juízes, policiais, advogados e empresários com quadrilhas organizadas em muitos estados brasileiros.
O caso mais chocante foi o de ex-deputado federal Hildebrando Pascoal, do Acre. Ele teve o mandato cassado, foi preso por crime contra o sistema financeiro e sonegação fiscal e condenado a mais de dez anos de prisão por tráfico internacional de drogas, com outras 42 pessoas, a maioria policiais civis e militares.
A CPI do Narcotráfico sugeriu o indiciamento de 824 pessoas envolvidas com toda sorte de crime: tráfico de drogas, roubo de cargas, lavagem de dinheiro, sonegação fiscal, corrupção, enriquecimento ilícito, falso testemunho e prevaricação. Dois ex-governadores engordam essa lista, Orleir Cameli, do Acre, e Manoel Gomes de Barros, de Alagoas.
De nada, porém, adiantou tanto esforço e trabalho. Parece até que a situação piorou. E muito. Isso porque o poder ilegitimamente constituído desenvolve forças que é incapaz de controlar e que pode derrubá-lo em situação de conflito agudo. É o fenômeno, constantemente recitado, do aprendiz de feiticeiro.
Em tal momento, não se reconhece o estado de direito. Que é o que acolhe as prerrogativas individuais e submete seus atos em relação aos cidadãos, às decisões judiciárias. Nos regimes ditatoriais é possível anular, em parte, esse poder ilegítimo. Hitler conseguiu, eliminando dezenas de elementos da SS (Schutz-Staffel), tropa de proteção ao Führer, comandada por Himmler. Kruchev também, quando implodiu Béria e a máquina policial soviética que dirigiu.
Mas é impossível extirpar completamente o braço paralelo, porque é da natureza intrínseca dos governos cuja autoridade é contestada a existência dessa jurisdição, que faz frente a tudo e a todos. E isso porque o exemplo de impunidade absoluta para os crimes contra os indi víduos vem da cúpula do regime, cria uma camada de pessoas que vivem dessa exculpação, o crime passa a ser burocratizado, a tortura mistura-se com a corrupção, os torturadores passam a ficar com os bens dos torturados, o desprezo passa a ser a norma.
Nas favelas, como nos centros urbanos próximos a elas e sujeitos à influência do poder paralelo, não há lei, não há direito, não há defesa, não há a menor segurança. Dominam os dirigentes do crime. E agem sem piedade, sem misericórdia, sem pena, como se estivessem a se vingar do homem comum, da sociedade indefesa e apavorada.
Contra esse estado de coisas o poder político nada pode fazer, mesmo que assim queira, porque destruir essa máquina de forma total é aniquilar as bases em que se assenta. O máximo que um chefe do Executivo pode tentar é intervir neste ou naquele caso isolado, salvando um ou outro inocente, mas, mesmo assim, não vai ao ponto de identificar nem responsabilizar os funcionários culpados. A coisa toda não passa de uma satisfação para fins de opinião pública. Vasta rede de interesses entrelaçados ligando homens, instituições, órgãos, segredos, razões de Estado, posições, segurança individual, medo, corrupção, crimes, desmandos, injustiças, privilégios, cerca o poder instituído de forma tal que, para desmontar parte dessa máquina, é preciso um autêntico golpe de Estado.
Editorial
NOVAS FRONTEIRAS DO TERROR
Mais uma vez o sudeste da Ásia foi sacudido por um violento e sangrento atentado terrorista. E mais uma vez o cidadão comum, inocente, é atingido. As duas bombas de ontem nas Filipinas são novo alerta de que o terrorismo está explodindo em outras fronteiras, muito além do Iraque.
Não há mais como vincular o regime de Saddam Hussein a toda essa onda, que começou na costa do Iêmen, há 15 dias, com a explosão de um petroleiro francês (sem vítimas). Logo depois, o alvo foi a Indonésia, maior país muçulmano do mundo. O ataque ao paraíso turístico de Bali no sábado passado matou 180 pessoas, a maioria estrangeiros de nações ocidentais. Agora é nas Filipinas.
Se formos olhar apenas pelo ângulo clássico, o terrorismo também assombra os Estados Unidos há 16 dias na figura do franco-atirador de Washington. O misterioso pistoleiro já fez nove vítimas, e a polícia mais bem aparelhada do mundo continua atônita, sem pistas. A arma do criminoso é um rifle comum, daqueles que qualquer caçador pode adquirir no comércio.
Então por que o presidente norte-americano, George W. Bush, bate irritantemente na tecla da invasão ao Iraque? Em todos os atentados não se provou o envolvimento de Bagdá. Não foram empregadas as tais armas de destruição em massa que dizem que Saddam desenvolve. E, pelo menos até agora, não há nenhum cidadão iraquiano envolvido em qualquer um desses atos.
É necessário que, neste momento em que se analisam na Organização das Nações Unidas (ONU) as medidas a serem tomadas contra o Iraque, a comunidade internacional evite uma guerra insana. Há muita pressão dos Estados Unidos, mas países como a China e a França, que têm assento e direito a veto no Conselho de Segurança, estão demonstrando bom senso ao se oporem ao uso da força.
Devem manter a linha sensata. O mundo ainda nem curou as cicatrizes dos atentados de 11 de setembro e continua acordando sobressaltado com atos cada vez mais ousados e violentos por parte de grupos extremistas.
O antídoto para o extremismo é a negociação, a diplomacia. A paz é silenciosa, não ruidosa, como reza o estilo George W. Bush de administrar crises. Não se pode impor um regime democrático à força. É um paradoxo. Isso ficou claro na mensagem dos iraquianos, quarta-feira, nas urnas. Com votação maciça, Saddam Hussein foi reeleito para mais sete anos de governo.
Pior do que a posição beligerante de Bush é a omissão das nações árabes. Como podem países com tradição milenar ver a cultura e a religião muçulmana serem aviltadas dessa forma, a cada bomba explodida e reivindicada por arautos dos seguidores de Maomé? A indignação humana ainda é arma poderosa contra a ignorância. E deve ser usada.
Topo da página
10/18/2002
Artigos Relacionados
Efeito Lula assusta bancos e derruba mercado
Mercado favorável
Mercado prevê PIB de 7,55% em 2010
CRA debate mercado de cereais
Novo terremoto no mercado
'Não atuamos ao sabor do mercado', diz FHC