Lula e Serra elevam tom de ataques mútuos








Lula e Serra elevam tom de ataques mútuos
Nos anúncios de TV e nos sites de internet, equipes de Lula e Serra parecem viver segundo turno

Faltam 19 dias para a eleição, mas o tiroteio entre tucanos e petistas, nos anúncios da TV e nas provocações mútuas pela internet, já está em clima de segundo turno, como se a briga fosse só entre eles. Um anúncio mostrado no fim de semana, pelo PSDB - o mais contundente exibido até agora pela equipe de José Serra contra Luiz Inácio Lula da Silva - mostra o petista prometendo, em uma tevê, que em um governo seu "cada real investido deverá corresponder a um emprego gerado". Um apresentador observa, então, que "então, bastaria investir R$ 1 bilhão para gerar um bilhão de empregos".

Fechando a cena, o comentário: "Ou Lula não sabe o que diz ou esconde o que sabe".

Na internet - O troco veio no mesmo tom. O comando petista decidiu ontem recorrer à Justiça contra o anúncio e pedir espaço no horário eleitoral do tucano. "Serra anda muito aflito com essa questão do emprego", reagiu o coordenador do programa de governo petista, Antonio Palocci Filho. Além disso, o site de Lula começou a publicar uma série de críticas ao rival, sob o título 'Herança Tucana".

A partir de frases do próprio presidente Fernando Henrique e de informações do governo, os textos do site petista comparam números dos últimos oito anos com os atuais, para mostrar falhas que resultaram no desemprego atual. O título de um dos textos é "FHC assume que não cumpriu promessa de 1998" e o de outro é "FHC diz quequase dobrou desemprego em oito anos".

O primeiro deles repete frases ditas por Fernando Henrique, na quinta-feira passada, quando foram divulgados dados do IBGE sobre . "De 1993 a 2001, houve um aumento do número de desempregados de 3,4 milhões de pessoas".

Contra-ataque - Portanto,admite o presidente, "no período do Plano Real, efetivamente, houve um aumento de desempregados". O texto ataca um comentário feito por FHC - o de que, apesar de tudo, o número real de empregados aumentou, de 73,3 milhões para 75,4 milhões de trabalhadores. "A afirmação contém uma meia verdade", diz o PT, já que a proporção de desempregados, com o aumento da população, caiu de 57,3% em 1993 para 54,8% em 2001.

Uma outra investida do PT contra Serra afirma ser mentira a informação, veiculada dias atrás pelos tucanos na internet, de que a "Carteira de Trabalho do Primeiro Emprego" anunciada por Lula é uma idéia copiada de um documento do Instituto Sergio Motta. "Esse não é absolutamente o caso, pois desde 1999 o Estado do Rio Grande do Sul tem em andamento programas dessa natureza e a Prefeitura de Ribeirão Preto (S), desde agosto de 2001, apenas para citar dois exemplos", informa o site.


Ciro diz que 'Lula é um salto no escuro'
Em queda nas pesquisas, candidato do PPS tenta se mostrar como alternativa

O candidato do PPS, Ciro Gomes, reforçou ontem as críticas ao concorrente Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, sem descuidar dos ataques a José Serra, do PSDB. Em entrevista à Rádio CBN, Ciro comparou o voto em Lula a uma "aventura" e repetiu que Serra representa a continuidade.

"Votar em Serra é continuar tudo o que está aí e votar em Lula significa uma aventura, um salto no escuro", disse. A estratégia, que consiste em mostrar que Lula é bem intencionado, mas sem experiência administrativa, e Serra representa a manutenção da atual política econômica, foi adotada após duas quedas sucessivas do candidato do PPS nas pesquisas de intenção de voto.

Os estrategistas da Frente Trabalhista entendem que essa é a melhor forma de atrair os eleitores que o candidato perdeu após os ataques feitos pelos tucanos.

Ação - A equipe de comunicação de Ciro também conta com a possibilidade de o candidato tucano ter que administrar uma agenda negativa a partir de momento em que o procurador federal Luiz Francisco de Souza pedir a abertura de uma ação contra o ex-diretor do Banco do Brasil Ricardo Sérgio de Oliveira e Gregório Marin Peciato, que já tiveram relações com Serra.

Os assessores esperavam que isso ocorresse ontem. Mas a apresentação foi adiada.

Embora os assessores de Ciro tenham prometido que não pretendem explorar a denúncia no horário eleitoral gratuito, o candidato antecipou-se e disse, no fim de semana, que, se houver investigação, ficará claro que o tucano não tem "condições morais e éticas" para ser presidente da República.

O comando da campanha da Frente Trabalhista - formada por representantes do PPS, PTB e PDT - reuniu-se novamente ontem em São Paulo, como tem ocorrido às segundas-feiras.

De acordo com a avaliação oficial da cúpula da campanha , apesar do que mostram as pesquisas divulgadas até agora, Ciro estaria tecnicamente empatado com Serra e com bom potencial de recuperação.

Isso é o que eles dizem aos jornalistas. Não se sabe no entanto, o que discutiram na reunião, a portas fechadas. "Estamos na fase do nada a declarar", limitou-se a dizer o responsável pelo marketing da campanha, Einhart Jacome da Paz.

Ciro, que participou da reunião, também se encontrou ontem com os responsáveis pelo programa de governo. Segundo assessores do candidato, o plano deve ser lançado nos próximos dias.


'Lula abriu mão de suas convições', diz Garotinho
Candidato acha que, para ganhar a eleição, o petista deixou de defender os seus princípios

RIO - O presidenciável do PSB, Anthony Garotinho, disse ontem concordar com declaração de um dos dirigentes nacionais do Movimento dos Sem-Terra (MST), João Pedro Stedile, sobre o petista Luiz Inácio Lula da Silva. Para Stedile, o discurso de Lula não é de esquerda. "O Stedile foi até modesto, porque a gente sabe que ele gostaria de falar mais. Claramente, Lula deixou de ser oposição", disse Garotinho.

Para ele, está claro que Lula não está defendendo os seus princípios. "Ele abriu mão de suas convicções e quer ganhar a eleição a todo custo."

O candidato do PSB voltou a afirmar que, embora as pesquisas eleitorais não indiquem, ele está em segundo lugar na corrida eleitoral. "Em nossa própria averiguação, já passei o candidato da Frente Trabalhista, Ciro Gomes (PPS), e estou tecnicamente empatado com o candidato do governo, José Serra (PSDB).

Só que, não sei por que, as pesquisas não mostram isso."

Com uma agenda que o levará de Rondônia a Santa Catarina esta semana, o ex-governador do Rio passou a tarde de ontem gravando seu programa para a televisão. Criticou Serra, afirmando que ele está descumprindo a decisão do Superior Tribunal Eleitoral ao veicular críticas à gestão dele como governador do Rio. Para Garotinho, Serra faz isso para atingir sua mulher, Rosinha Garotinho, candidata ao governo do Rio. "Serra se acha acima da Justiça e esse procedimento dele compromete o processo eleitoral, pois todos os candidatos seguem as normas e obedecem às decisões judiciais, menos ele."

Garotinho destacou que manterá sua estratégia . "No programa eleitoral só vou apresentar propostas e nos debates vou evidenciar as contradições dos outros candidatos", disse. "Tem o Lula que mudou para tentar ser presidente; o Serra, que promete fazer em 4 anos o que não fez em 8; e o Ciro, que promete criar um Brasil novo, mas se faz acompanhar do que há de mais velho e retrógrado no País."


Candidato ganha direito de resposta em horário de Serra
BRASÍLIA - O candidato do PSDB à Presidência, José Serra, sofreu ontem três derrotas no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O presidenciável do PSB, Anthony Garotinho, conseguiu o direito de responder a alegadas ofensas veiculadas no programa de rádio do tucano. O ministro Caputo Bastos concluiu que Serra acusou Garotinho de maquia r números das finanças públicas e da segurança do Estado do Rio de Janeiro.

Em outra decisão, Caputo negou pedido de Serra para que fosse suspensa propaganda de Ciro Gomes (PPS). O tucano sentiu-se ofendido com o programa no qual ele aparece como se estivesse confirmando que estaria mentindo para a população ao dizer "prometer é muito fácil".

Caputo rejeitou outro pedido de Serra. O tucano questionava programa de Ciro onde um grupo de jovens cantava rap enquanto eram apresentadas imagens do presidente Fernando Henrique Cardoso e de Serra fazendo considerações sobre a geração de empregos. Os advogados do candidato do PSDB argumentaram que os gestos feitos pelos jovens davam a entender que as palavras contidas nas mensagens eram mentiras.

Ontem, Serra pediu ao TSE que lhe conceda direito para responder a declarações de um ministro do Superior Tribunal Militar (STM) veiculadas no programa de Ciro, segundo as quais o tucano teria "entrado pobre e saído rico do cargo de secretário de Fazenda de São Paulo" e de "ser cruel, corrupto e prepotente no exercício do poder".

Caputo Bastos negou ainda pedido do candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, para que fosse suspensa parte do programa de Serra veiculado sábado, no qual teria distorcido propostas do petista para a geração de empregos.

"Vi a fita e não vislumbrei, em juízo liminar, justificativa para suspensão do programa de que cogita a representação."


Saldo comercial está acima de US$ 8 bi em 12 meses
Resultado de setembro, em 2 semanas, é de US$ 930 milhões; acumulado do ano já é de US$ 6,3 bi

BRASÍLIA - A balança comercial já acumula um superávit de US$ 930 milhões apenas nas duas primeiras semanas de setembro. Entre os dias 9 e 15, o superávit foi de US$ 530 milhões, segundo dados divulgados ontem pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC). Com isso, o saldo acumulado no ano atingiu US$ 6,312 bilhões. Considerando a série de 12 meses até setembro, o saldo atingiu US$ 8,175 bilhões, o melhor resultado dos últimos sete anos.

O saldo superior a US$ 8 bilhões em 12 meses mereceu destaque entre os dados divulgados pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC). O número já era esperado pelos técnicos, mas o governo avalia ser importante destacar o bom resultado da balança comercial, porque acredita que isso puxará a recuperação da credibilidade dos analistas a respeito da economia brasileira. Um bom superávit comercial melhora o perfil da conta de transações correntes do Brasil e indica condições mais sólidas de honrar compromissos externos.

O secretário-adjunto de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Roberto Iglesias, acredita que o saldo superior a US$ 8 bilhões em 12 meses será mantido ao longo de setembro e em parte de outubro. "Depois, pode ser que caia um pouco", comentou. Ele acha que os saldos comerciais não serão tão exuberantes nos últimos meses do ano, devido ao aumento sazonal das importações e queda nas exportações. Ainda assim, acredita que a balança chegará ao final do ano com um superávit próximo a US$ 8 bilhões.

Isso, é claro, se não houver mais surpresas na balança. Se for confirmada a suspeita de que os dados da balança comercial estão subestimados com relação às exportações de soja efetivamente ocorridas, o saldo tende a ser ainda maior. Iglesias informou que os cálculos ainda estão sendo refeitos, mas explicou que as estimativas são feitas com base nos dados do MDIC. Portanto, as projeções foram feitas, possivelmente, com números abaixo do real. De fato, as exportações de soja apresentaram um salto na segunda semana de setembro. A média diária das vendas do produto subiu de US$ 37,765 milhões na primeira semana para US$ 74,310 milhões na segunda.

Foram principalmente os produtos básicos que puxaram o crescimento das exportações no período, que chegaram a U$ 1,574 bilhão na semana e U$ 2,835 bilhões no mês. Enquanto as vendas de básicos cresceram 41,9% entre a primeira e a segunda semanas do mês, as exportações de manufaturados se ampliaram em 17% e a de semimanufaturados, 14,4%.

Segundo o boletim, a média diária das exportações acumulada até a segunda semana (US$ 283,5 milhões) cresceu 13,3% em relação à média de setembro de 2001 (US$ 250,3 milhões). Esse é um dado positivo já que as exportações vinham registrando no ano, pela média diária, queda em todos os meses frente ao mesmo mês do ano passado.

O movimento de queda foi interrompido em agosto, quando as exportações cresceram 5%, pela média diária, em relação a agosto de 2001. E até a segunda semana de setembro a tendência de crescimento das exportações se mantém, mostrando uma reação das vendas externas do País que, junto com as queda das importações, está assegurando o aumento do superávit no ano.

Na avaliação de Iglesias, o aumento das vendas ao exterior num momento em que a conjuntura internacional é adversa não é apenas reflexo do câmbio favorável. Mostra uma mudança estrutural nas exportações brasileiras. Para ele, o Brasil está colhendo frutos da diversificação de produtos e mercados.


Artigos

Petrobrás, empresa estatal ou de mercado?
João Pinheiro Nogueira Batista

A campanha eleitoral em curso tem colocado a Petrobrás na vitrine, o que só confirma a sua importância para a economia brasileira e regional.

Infelizmente, a dinâmica do processo eleitoral muitas vezes impede que os candidatos e seus assessores prestem ao público informações relevantes sobre a empresa na extensão e profundidade necessárias. A Petrobrás tem procurado esclarecer a opinião pública por meio de anúncios, artigos e declarações.

Este é mais um artigo que pretende fornecer aos interessados elementos importantes para julgar as declarações e críticas que vêm sendo feitas à empresa.

Sempre que algum dos candidatos se refere à Petrobrás, o faz classificando-a simplesmente como uma empresa estatal, induzindo assim o eleitor a entender que se trata apenas de um órgão ou departamento do governo, responsável pela execução de políticas públicas. Será isso correto? Vejamos a questão de outro ponto de vista.

Ao decidir pelo fim do monopólio legal, o Congresso Nacional resolveu que a União manteria o controle da Petrobrás, para evitar sua desnacionalização e como meio de preservar o direito de interferência em situações de extrema gravidade, como, por exemplo, na hipótese de uma séria crise de abastecimento.

A partir desse novo quadro legal se estabeleceu, entre outros requisitos, que a companhia deveria estruturar-se para competir não só no mercado nacional, mas também no internacional, com independência financeira.

Deveria, portanto, garantir sua financiabilidade. Em outras palavras, em nenhuma hipótese recorreria ao Tesouro Nacional para obter recursos fiscais, escassos por natureza.

Para tornar viável a execução de seu ambicioso programa de investimento doméstico e financiar sua expansão internacional a companhia precisaria mobilizar o equivalente a US$ 31,7 bilhões entre 2001 e 2005. Isso exigia que a empresa desenhasse e executasse uma estratégia que transformasse o mercado de capitais na fonte primária para a obtenção dos recursos. Este, aliás, é o padrão adotado pela indústria em nível mundial.

Para que essa estratégia fosse bem-sucedida se tornava indispensável assegurar acesso continuado ao mercado de emissões primárias de ações. A companhia precisava, antes de tudo, diversificar a base de acionistas. Isso foi alcançado com duas ofertas públicas secundárias de ações, que reduziram a participação da União a 33% do capital econômico total da empresa. Com essas operações, o número de acionistas aumentou para cerca de 450 mil.

Destes, cerca de 337 mil foram trabalhadores que utilizaram recursos do FGTS para comprar ações da companhia. Investidores estrangeiros passaram a deter um terço das ações da empresa.

Com essa reestruturação, cerca de dois terços do capital total estão em poder do público em geral e são negociados nas Bolsas de Valores de São Paulo, Nova York e Madri.

A Petrobrás vem imprimindo um grande esforço para aprimorar seus padrões de governança corporativa e melhorar o relacionamento com os acionistas.

Esperamos em breve fazer jus ao selo de Nível II da Bovespa e já recebemos, entre outros prêmios, o que a classifica como a empresa brasileira que melhor se relaciona com investidores, concedido pela Investor Relations Magazine em 14 de maio deste ano.

No mercado de renda fixa, a Petrobrás vem construindo curva consistente de rendimentos para títulos. Já promoveu quatro emissões públicas, no total de US$ 2,3 bilhões, nos últimos dois anos no mercado internacional. Mais recentemente, iniciou processo idêntico no mercado doméstico, com emissão pioneira de R$ 750 milhões por dez anos. Em setembro de 2001 a Petrobrás obteve classificação três níveis acima do risco soberano, em moeda estrangeira, quebrando paradigma histórico de que o melhor crédito é, necessariamente, o Tesouro Nacional de um país.

Essas conquistas só foram possíveis porque resultam de um pacto muito claro entre o acionista controlador e os minoritários: a empresa deverá estar focada em rentabilidade, com responsabilidade social e ambiental. Para competir em igualdade de condições ela precisa ter a liberdade de atuação de uma corporação multinacional.

Nossos competidores, com regras precisas de disciplina de capital, obtêm dos seus acionistas autonomia para execução de políticas de investimento, comercial, financeira e de recursos humanos. A Petrobrás já avançou muito, mas ainda está longe do padrão de gerenciamento de seus principais concorrentes.

Voltemos à questão inicial: a Petrobrás é uma empresa estatal ou de mercado?

Espero que a esta altura tenha conseguido, ao menos, demonstrar que a resposta não é tão simples como parece. Ela é uma empresa cujo acionista controlador é a União Federal. Mas tem sócios. O controlador deve absoluto respeito às regras do mercado de capitais e ao pacto com os seus sócios.

Sócios, frisemos, que juntos detêm os outros dois terços terços do capital total.

Deixo, para auxiliar a reflexão, as seguintes questões:

O acionista da Petrobrás deve subsidiar, via política de preços da companhia, os consumidores de combustíveis?

O acionista da Petrobrás deve ser responsável, via política de compras da companhia, pelos incentivos à indústria nacional?

Se as respostas forem afirmativas, perguntaria ao leitor se ele se disporia a ser acionista da Petrobrás.


Editorial

LULA BATE CONTINÊNCIA

Uma das constantes da presente campanha é a disposição dos presidenciáveis, em maior ou menor grau, de agradar às platéias a que se dirigem, dizendo tudo ou quase tudo que elas querem ouvir. Na sofreguidão pelo voto, que elimina no nascedouro qualquer preocupação com a coerência, a maioria dos candidatos ajusta o seu discurso ao público da hora, convenientemente esquecidos dos pronunciamentos anteriores, ditados pelo mesmo cálculo de acender uma vela a Deus e outra ao Diabo, que apontavam em outras direções, não raro opostas. Por menos que o eleitorado, em geral, se dê conta disso, o fato é que esse comportamento virtualmente retira da campanha o que ela poderia oferecer de mais substantivo - informações confiáveis sobre os planos de cada pretendente, a partir das quais os eleitores que se guiam antes pela razão do que pelas fantasias da propaganda fariam escolhas fundamentadas e maduras.

Nesse jogo farsesco, ninguém tem levado tão estritamente ao pé da letra o cínico princípio de que os fins justificam os meios como o petista Luiz Inácio Lula da Silva. A rigor, não há nenhuma novidade nessa constatação.

Não foi sem motivo que, meses atrás, ele ganhou o apelido de "Dula Mendonça", um trocadilho com o nome do marqueteiro que se dedica a polir a imagem do seu cliente. Mais recentemente, em um mesmo dia, para citar um exemplo que decerto entrará para a história desta campanha, Lula foi acalmar os ruralistas da Confederação Nacional da Agricultura e, em seguida, os militantes do MST, fazendo, a uns e outros, afirmações contraditórias sobre a questão da reforma agrária. Mas, na última sexta-feira, o candidato empenhou-se como nunca antes, talvez, em ser o espelho que reflete sem distorção alguma as posições, expectativas e idiossincrasias de seus interlocutores.

Numa palestra na Fundação de Altos Estudos e Estratégia, vinculada à Escola Superior de Guerra (ESG), Lula bateu continência às convicções dos que o ouviam. Criticou o governo pelos cortes nos orçamentos das Forças Armadas para 2003, prometendo revê-los. Falou da necessidade de reaparelhamento das Três Armas. Sustentou que um país precisa ser uma potência militar para ser respeitado. Defendeu um "Estado forte" e o serviço militar obrigatório.

Condenou a adesão do Brasil ao Tratado de Não-Proliferação Nuclear (TNP).

Tornou a elogiar, sob aplausos, a capacidade de planejamento do regime de 1964. Apoiou o projeto de construção de um submarino nuclear, da Marinha, e o do Veículo Lançador de Satélites, da Aeronáutica. Qualificou de "leonino" o acordo com os Estados Unidos para o uso da base espacial de Alcântara, no Maranhão. Acusou o Itamaraty de não estar à altura da guerra comercial no mundo, deixando de exercer o direito de retaliação.

Os seus ouvintes não se deram conta, ao que parece, desse crasso erro factual. Mais de uma vez, o Brasil reivindicou, na Organização Mundial do Comércio (OMC), o direito de reagir a práticas prejudiciais ao interesse nacional. Não há dúvida, porém, de que a profissão de fé nacionalista e o irrestrito entusiasmo com que Lula destacou o papel dos militares produziram os efeitos pretendidos. Oficiais entrevistados pelo Estado julgaram "impecáveis" as declarações do candidato. O presidente do Clube Militar, general Luiz Gonzaga Lessa, ex-comandante da Amazônia, concluiu que Lula conhece bem os problemas do Brasil. Mas o general Leonidas Pires Gonçalves, ministro do Exército no governo Figueiredo, que dirige a entidade onde Lula discursou, foi quem melhor identificou o propósito de Lula. "Disse exatamente o que eu esperava ouvir", resumiu.

É provável que o desempenho do candidato, perfeitamente calibrado para a ocasião, tenha sido facilitado pela histórica afinidade ideológica entre a esquerda e setores militares brasileiros - o que ambas as partes relutam em admitir. Como esta página já comentou, se João Goulart não tivesse sido deposto, com toda a probabilidade ele faria um governo extremamente parecido com o do general Ernesto Geisel, em matéria de estatização da economia e de antagonismo aos Estados Unidos, que levou ao rompimento do acordo militar com esse país, em 1976. O "pragmatismo responsável" da política externa geiselista, um alinhamento automático com o nacionalismo terceiro-mundista, não trouxe um único benefício ao Brasil.

Pelo contrário, pelo menos nos casos do acordo nuclear com a Alemanha e da parceria especial com o Iraque, o Brasil teve grandes prejuízos.


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09/17/2002


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