PSDB ameniza ataques a Lula para ir ao 2.º turno










PSDB ameniza ataques a Lula para ir ao 2.º turno
Em meio à sua pior crise, comando da campanha revê tom das críticas e altera programa de TV

BRASÍLIA – A campanha do tucano José Serra a presidente vive sua pior crise. Não bastasse o risco de vitória do PT no primeiro turno, Serra vê o rival do PSB, Anthony Garotinho, cada vez mais perto nas pesquisas e tem prazo curto – 12 dias – para tentar reverter o quadro que o apresenta estacionado na faixa dos 19%. Nesse cenário, estrategistas de PSDB e PMDB ainda buscam saídas. Ontem, reavaliaram a tática e decidiram que o programa na TV não deve mais bater pesado no PT, embora algumas alas achem que o bombardeio precisa continuar.

Serra passou o dia em conversas com marqueteiros e assessores próximos, ajustando o tom e regravando passagens do programa que vai ao ar hoje. O recado de que a maioria dos eleitores reprova ataques mais pesados veio sábado. Por decisão judicial, a campanha tirou do ar as cenas contra o PT. O rastreamento telefônico feito pela equipe de marketing identificou que o programa foi muito bem avaliado, o que não vinha ocorrendo.

O cientista político Antonio Lavareda, um dos estrategistas de Serra, já deixara claro que a tática dos ataques, embora inevitável, impunha riscos. O perigo apontado por ele e comprovado pelo Datafolha chama-se Garotinho. Foi ele quem capitalizou a pancadaria.

O retrato da crise na campanha da aliança PSDB-PMDB é exposto pelos aliados. “Eu já estou para ficar doido com essas pesquisas e não sei de mais nada”, admitia ontem o líder do PMDB na Câmara, Geddel Vieira Lima (BA), confuso entre os resultados do Ibope da semana passada, que mostrou o petista Luiz Inácio Lula da Silva em queda de 2 pontos, e o Datafolha, que domingo registrou alta do petista de 4 pontos. “Temos que fazer campanha.

Não vou mais olhar pesquisa.”

Divergências – Enquanto Serra discute em São Paulo o que fazer, seus auxiliares esforçam-se em manter o ânimo, mas estão ficando claras as divergências entre os tucanos. “A idéia é tocar a campanha com todos os agentes políticos e a militância nas ruas, pedindo voto. E quanto mais propostas e conteúdo apresentarmos na TV, melhor”, completa o líder do PSDB na Câmara, Jutahy Júnior (BA).

Embora Lula tenha subido nas pesquisas quando era alvo da pancadaria do PSDB, a estratégia ainda é defendida por setores do tucanato. “Não quero falar mal da estratégia de ataques ao PT porque ela cumpriu seu papel. Se não tivéssemos optado por ela, Lula já teria vencido a eleição”, diz um dos principais interlocutores de Serra. “Foi uma etapa desagradável, mas necessária”, concorda Jutahy, convencido de que foi útil para pôr a comparação entre Lula e Serra na pauta política e na agenda do eleitor.

As comparações de perfis, biografias e propostas vão continuar, agora em outro tom, evitando agressões. E não só na televisão. Os agentes políticos serão cobrados a pegarem firme na campanha em suas bases.

Serra revelou-se abatido com o resultado da pesquisa Datafolha, que registra subida de Lula de 40% para 44% e sua queda, de 21% para 19%. Mas Jutahy mantém o otimismo e aposta na presença de Serra no segundo turno das eleições. “Temos um espaço imenso para crescer.”

Quanto ao desempenho de Garotinho, alguns políticos preferem acreditar que ele é um um risco calculado. “Ele bateu no teto”, aposta o líder tucano, engrossando as previsões de Geddel. “Ele não está crescendo nos grandes centros, mas na periferia das grandes cidades, onde se concentra o eleitor evangélico”, justifica o tucano. Não é exatamente o que pensam os estrategistas da campanha que estudam a melhor forma de atacar o novo inimigo.

Coquetel – À noite, em São Paulo, Serra participou de um coquetel de apoio às candidaturas à reeleição dos deputados Gilberto Kassab e Rodrigo Garcia (estadual), ambos do PFL, no Clube Pinheiros. Também foram ao evento o governador Geraldo Alckmin (PSDB), que tenta a reeleição, e seu vice na chapa, Cláudio Lembo (PFL). Segundo Lembo, Serra discursou por cerca de 10 minutos e, em certo momento, soprou ao microfone e disse: “Se todos soprarem no mesmo caminho, aí o barco chegará no porto seguro.”


Serra volta a mudar agenda e frustra aliados
Líderes de Uberaba e região acharam 'muito ruim' ausência do tucano em mais um comício

UBERABA - O candidato do PSDB a presidente, senador José Serra, cancelou a viagem que faria ontem a Uberaba e Araxá, sob o impacto da pesquisa do Datafolha que reforçou a ameaça de vitória do PT no primeiro turno da disputa presidencial. Avisados na última hora da mudança de planos, os tucanos e aliados que se mobilizaram para receber o candidato até compreenderam que era preciso "retocar" o programa de televisão que não estava rendendo os votos desejados, mas a frustração foi inevitável.

"Nós entendemos a situação, mas o adiamento é muito ruim", diz o prefeito de Uberaba, Marcos Montes (PFL), que reuniu líderes políticos de uma dezena de pequenas cidades vizinhas e empresários do setor agrícola, da indústria e do comércio para recepcionar Serra no município.

"Vai ser difícil mobilizar todo mundo outra vez daqui a três dias", completa o prefeito, ao salientar que o presidenciável tucano prometeu cumprir a programação que estava prevista para ontem na quinta-feira passada.

O mau tempo e a má performance eleitoral já levaram Serra a cancelar outras visitas, como ocorreu na sexta-feira, em Palmas (TO), e no domingo, em Varginha (MG). Mas o prefeito Montes se queixa com a autoridade de quem abriu a dissidência pró-Serra no PFL mineiro, ainda nos tempos em que até tucanos de Minas haviam migrado para a candidatura de Ciro Gomes (PPS), certos de que o candidato da Frente Trabalhista tinha lugar garantido no segundo turno contra o petista Luiz Inácio Lula da Silva.

Mudança - O PFL mineiro já abandonou Ciro, mas nem por isto fechou com Serra. Ao contrário, Montes reconhece que o momento é de crise na candidatura tucana. "Há um apelo de mudança muito grande", constata, ao mesmo tempo em que garante não temer a eleição presidencial. "O Brasil está preparado para qualquer resultado", diz. E, embora seu PFL se declare anti-PT, ele reage sereno à hipótese de vitória do petista. "Se por acaso o Lula ganhar, vamos alinhar e torcer para que seu governo dê certo."

Logo ele ressalva que não entregou os pontos. A despeito da pesquisa do Datafolha, que alarmou os serristas de Uberaba, ele mantém o otimismo: "Vou com Serra até o final e ainda aposto em uma reflexão do eleitorado, que leve a disputa ao segundo turno."

Carismático e articulado, foi Montes quem costurou o apoio do PFL mineiro à candidatura do presidente da Câmara, Aécio Neves (PSDB), ao governo de Minas, fazendo a ponte entre o tucano e o presidente de seu partido no Estado, deputado Clésio Andrade. O trânsito fácil no tucanato vem da parceria local, em que seu vice é do PSDB. Na condição de ex-vice-presidente da Associação Mineira de Municípios, ele também circula com desenvoltura entre os prefeitos de todo o Estado. (C.S.)


Lula inaugura série Presidenciáveis no Estado
O Grupo Estado promove a partir de hoje uma série de entrevistas com os quatro primeiros colocados nas pesquisas à sucessão do presidente Fernando Henrique Cardoso. O petista Luiz Inácio Lula da Silva abre os encontros a partir das 10 horas e será entrevistado por jornalistas do Estado, da Agência Estado, do Jornal da Tarde e da Rádio Eldorado.

A entrevista vai ser transmitida ao vivo pela emissora (AM 700 khz) e pelo site www.brturbo.com, de banda larga. Flashes do encontro também estarão disponíveis no portal do Estadão (www.estadao.com.br/eleicoes) e no serviço Broadc ast da Agência Estado.

A Eldorado ainda terá repórteres no auditório do edifício-sede do grupo, onde ocorre o evento, para apresentar informações de bastidores da entrevista durante os intervalos comerciais. Os principais trechos da entrevista de Lula serão publicados na edição de amanhã do Estado e do JT.

Cronograma - A série "Presidenciáveis no Estado" terá amanhã a presença do candidato tucano, José Serra, ex-ministro da Saúde. Na quinta-feira (dia 26) será a vez do ex-governador do Rio Anthony Garotinho (PSB) e, na sexta-feira (dia 27), as entrevistas serão encerradas com a participação do candidato do PPS, Ciro Gomes, ex-governador do Ceará.

Todos os presidenciáveis já confirmaram presença. As entrevistas devem durar cerca de duas horas, e serão incluídas perguntas de leitores enviadas por e-mail ao portal do Estadão nos últimos dias. No auditório, participarão ainda da entrevista assinantes do Estado e clientes selecionados da Agência Estado. O objetivo da série "Presidenciáveis no Estado" é apresentar novas informações e elementos para auxiliar o eleitor a decidir seu voto.


FHC critica 'ignorância e demagogia' da oposição
Sem mencionar partidos, presidente contesta propostas de novo modelo econômico

O presidente Fernando Henrique Cardoso transformou ontem seu discurso na cerimônia de abertura da 36.ª Convenção Nacional dos Supermercados, no Rio de Janeiro, em uma defesa apaixonada de seus oito anos de governo e numa dura resposta às críticas que os candidatos à Presidência pela oposição têm feito à sua administração. Sem citar explicitamente os presidenciáveis do PT, PPS e PSB nem a disputa presidencial, o presidente exortou-os à defesa da responsabilidade fiscal, classificou de "ignorância" e "demagogia" muitos ataques que recebeu, acusou os críticos de negar a realidade e advertiu contra quem prega mudanças sem se preocupar com a volta da inflação.

"Até há quem fale de um outro modelo", afirmou, em tom irônico, no pronunciamento para os participantes da solenidade promovida pela Associação Brasileira de Supermercados (Abras).

"Mas que modelo seria esse? Um obstáculo ao desenvolvimento? Querem um modelo desfavorável ao investimento?"

O presidente continuou com as perguntas: "Como é que cresce, se o modelo não for favorável ao investimento? Querem aumentar a exclusão? Porque estamos aumentando a inclusão." Segundo ele, houve expansão no consumo e avanço dos indicadores sociais. "Isso significa o quê? Exclusão? Não, isso é inclusão.

Um outro modelo? Qual, que diminua a inclusão?"

A seguir defendeu a continuidade do atual modelo, com gastos públicos controlados e inflação baixa. "Se se imagina um outro modelo no qual a inflação não esteja sob controle, pobre povo! Pobre povo!", afirmou. "Porque quem paga o descontrole da inflação é o mais pobre, é o povo, só que paga sem saber que está pagando. Aí (quando há inflação) é fácil expandir gastos sem nenhum controle, prometer tudo a todo mundo."

"Esqueletos" - Depois, em Brasília, Fernando Henrique também destacou, no lançamento da 4.ª Campanha Nacional de Doação de Órgãos e Tecidos, no Conselho Federal de Medicina, as limitações orçamentárias para fazer frente às carências do País. Lembrou que isso foi ignorado no passado e gerou uma imensa dívida do setor público, os chamados "esqueletos". "É preciso que o País tenha disciplina financeira, que os governos não gastem mais do que têm", advertiu. "Já gastaram tanto no passado que eu não faço outra coisa a não ser pagar dívida que não é minha."

Depois, observou que uma das críticas mais freqüentes à sua gestão é o crescimento da dívida interna. Mas, segundo o presidente, o que seu governo fez foi incorporar débitos estaduais e os chamados "esqueletos", que não apareciam na contabilidade oficial.

Ele ressaltou ainda que a inflação atendia aos interesses dos especuladores e dos próprios governantes. Isso porque, para os governos manterem as contas públicas em dia, segundo ele, bastava atrasar pagamentos e deixar que a inflação fizesse o seu papel de desvalorizar as dívidas.

"Os governos estavam casados com a inflação."

O presidente rebateu depois as críticas de que a economia cresceu pouco nos anos durante o Plano Real. "Que (o crescimento econômico) não foi o que se desejava é verdade, mas não foi por causa do controle da inflação", discursou. " E ainda assim, de 1993 a 2001 o crescimento acumulado da economia foi de 31%. A média (anual) foi 2,7%, 3%. É baixa para o que queremos, mas foi contínua. Nos 12 anos anteriores a 93, houve cinco anos em que houve retração."


Garotinho investe no Sul para superar Serra
Campanha será intensificada nos Estados da região, considerada estratégica pelo PSB

SANTA MARIA – O candidato do PSB à Presidência, Anthony Garotinho, vai intensificar a campanha no Sul com o objetivo de conquistar 15% dos votos de gaúchos, catarinenses e paranaenses. Os dirigentes do PSB acreditam que, se ele chegar ao índice desejado na região, terá os votos necessários para superar José Serra (PSDB) na disputa e ir para o segundo turno. “

Vou procurar visitar mais os três Estados do Sul”, anunciou o candidato ontem à tarde, ao desembarcar no aeroporto de Santa Maria.

Garotinho passou a noite de domingo e boa parte da segunda-feira no Rio Grande do Sul, visitando Pelotas, Rio Grande, Livramento e Santa Maria. Ele comemorou o resultado de pesquisas divulgadas no fim de semana, embora mantenha o quarto lugar. No levantamento do Centro de Estudos e Pesquisas em Administração (Cepa), da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, ele passou de 5,6% para 8%. No do Correio do Povo, está com 9,6%.

A campanha no Estado teve o reforço de sua mulher, Rosinha Garotinho, líder nas pesquisas ao governo do Rio. No domingo, ela acompanhou o marido no comício em Pelotas e a um jantar em Rio Grande. Em Livramento, Garotinho caminhou pelo centro e fez rápido comício no Parque Internacional.

Ele anunciou que seus advogados encaminhariam ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) uma reclamação contra Serra. Segundo Garotinho, o TSE já vetara a inserção do PSDB no horário eleitoral em que ele é acusado de não ter feito nada pela segurança do Rio. “Além de ser um candidato que não sabe perder, é um candidato que não obedece à Justiça”, disse. Apesar disso, o ex-governador garantiu que não entrará num jogo de ataques com o tucano. “Ele não vai me tirar do sério.”

Promessas – Na passagem pela fronteira, Garotinho destacou que, se for eleito, buscará criar convênios para resolver a situação de milhares de pessoas que trabalham ora no Uruguai ora no Brasil e depois não conseguem se aposentar. Também prometeu incentivos à reabertura dos frigoríficos da região que estão desativados deixando milhares de desempregados.

Em Santa Maria, onde discursou para cerca de 300 pessoas às 16 horas, Garotinho criticou o péssimo estado das rodovias federais na região central do Rio Grande do Sul. “O pessoal do Ministério dos Transportes parece tatu de tanto que gosta de buraco”, ironizou.

Embora tenha centrado seus ataques em Serra, ele voltou a criticar as alianças de Ciro Gomes (PPS) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT). “Minha candidatura foi perseguida porque não me vendi e, ao contrário de quem fez concessões, estou limpo para receber o voto de quem ama o Brasil”, afirmou.

Resposta – No aeroporto de Santa Maria, o candidato do PSB comentou a declaração da governadora do Rio, Benedita da Silva (PT), que tenta a reeleição. Ela o acusou de ser “cara-de-pau” por aproveitar-se de programas de governo do PT. “Não tenho resposta a uma candidata que está tão pequeninha nas pesquisas”, desdenhou ele.

O presidenciável insistiu que su a proposta de redução de juros é a que pode criar os empregos que os brasileiros esperam e não os planos de Serra e Lula. “Não se resolve o problema de desemprego botando Chitãozinho e Xororó na televisão.”

À noite, o candidato foi entrevistado pelo jornalista Boris Casoy, na série Presidenciáveis na Record. Garotinho detalhou pontos de seu programa de governo e voltou a dizer que tais medidas seriam postas em prática mediante a redução da taxa de juros. “No primeiro ano de governo será de 10% para 6%”, prometeu.


Artigos

O ministro do não-Planejamento
Lawrence Pih

A nova onda de instabilidade da economia brasileira nada tem que ver com "tensão pré-eleitoral", como apregoam certos arautos do terror, disfarçados de analistas. A vulnerabilidade do modelo vigente no País está em sua própria essência especulativa em detrimento da produção. Os oito anos do governo FHC proporcionaram uma rentabilidade que atingiu 4% por mês em dólar para quem cumpriu o roteiro anunciado do câmbio fixo no primeiro mandato: tomou dinheiro lá fora, transformou em real, obteve lucros notáveis com os juros altos, transformou isso em dólar novamente e mandou, enfim, para o exterior. E para o Brasil sobrou uma dívida interna que cresceu dez vezes, apesar dos "esqueletos"; uma dívida externa que aumentou de US$ 100 bilhões em 1994 para algo em torno de US$ 240 bilhões; piora nos índices de desenvolvimento humano; 20% de desemprego na grande São Paulo; maior blindagem de carros e insegurança nas ruas.

A soberania de um país é inversamente proporcional ao tamanho de sua dívida externa. O modelo inaugurado na gestão FHC foi instrumento permanente de cessão de nossa soberania ao sistema financeiro internacional, que nunca lucrou tanto, em nosso país, em toda a sua história. O governo foi inepto nas negociações bi e multilaterais de comércio exterior e escancarou o mercado sem responsabilidade.

A estabilidade de preços, confundida com "fundamento sólido da economia", é um fenômeno global. À exceção da Argentina de hoje, não existem países similares ao Brasil que tenham inflação alta. Aliás, a estabilidade em nosso país só vale para o setor privado, e por absoluta falta de demanda. A renda média do brasileiro vem caindo há 17 meses seguidos. Já no campo das tarifas públicas, a máxima da estabilidade não tem a mesma importância. Setores privatizados são recompensados com aumentos para equilibrar seus passivos.

Ora, que capitalismo é esse que extingue o risco?

Por isso, o empresariado nacional deve analisar com muita cautela o discurso do candidato do governo. Mais quatro anos de "continuidade sem continuísmo" e iremos todos ladeira abaixo. Não espanta, portanto, que banqueiros e seus representantes locais abram o jogo claramente: ou Serra ou o caos! Mas, afinal, de que caos eles estão falando? Do agravamento da situação de pobreza e miséria de 53 milhões de brasileiros e brasileiras ou de uma eventual redução de seus lucros?

Nesse cenário, José Serra é o menos indicado para ocupar a Presidência da República, tenha ele diploma ou não. Antes de ser ministro da Saúde e permitir a volta de epidemias extintas como a dengue e a malária, ele foi ministro do Planejamento, que, entre outras, tem a função de elaborar estratégias de longo prazo para o País. E o que vimos? A ampliação do fosso social que separa ricos e pobres, a perda ainda maior de nossa soberania e uma taxa inédita de desemprego.

Sendo um tucano de altíssima plumagem e ex-ministro do Planejamento no primeiro mandato do governo FHC, ele certamente é responsável pela situação em que se encontra o País, porque não planejou coisa alguma quando teve oportunidade, por exemplo, para evitar a crise de energia elétrica, que reduziu ainda mais o crescimento do PIB, em 2,5%, em 2001, gerando uma perda de receita de, no mínimo, US$ 12 bilhões. Tampouco conhecemos seus esforços para impedir que a carga tributária, que representava 28% do PIB no início do primeiro mandato, pulasse para o patamar atual de 36%, o que certamente tem contribuído para o crescimento do desemprego. FHC e José Serra preferiram usar a maioria parlamentar para fins menos nobres, como a emenda da reeleição, do que as necessárias e inadiáveis reformas. Isso sem falar da vocação pública do candidato para desagregar os aliados e atropelar os desafetos. Convenhamos que esta característica não combina bem com a função de presidente da República, de quem a população espera disposição para o diálogo e uma grande capacidade de liderança política.

O modelo econômico defendido pelo candidato José Serra aprisiona a todos numa espécie de "Bangu 1 social", onde prevalecem a corrupção e a lei do mais forte. Este é o verdadeiro caos.

Então, fica a pergunta: qual Fernando hoje é mais poderoso?


Colunistas

RACHEL DE QUEIROZ

Uma outra classe emergente
Uma descoberta que o carioca já fez é que tudo o que acontece nesta cidade, conosco, seus habitantes, nos chega sempre por temporadas.

Coisa boa e coisa ruim, tudo é por sazão. Por ondas. Somos o povo mais novidadeiro do mundo; e bandido, que é carioca, já que vive aqui, tinha também que ser novidadeiro.

A violência e o crime, por exemplo. Vão mudando de forma e de intensidade.

Mas sempre num crescendo. A onda dos arrastões, se lembram? Chegou a ser um terror, pouco tempo atrás. Parou. Mas pode voltar, no próximo verão, com novo aparato e maior agressividade.

E ainda se pode lembrar o baseado (de maconha), considerado glamouroso nas areias de Ipanema, que ainda será fumado mas já não é moda. Já o crack não chega a ser moda, é perigoso demais, vai logo matando; além disso, funciona especialmente entre meninos de rua, que não fazem moda, já que são eles próprios a mais nefasta das modas. Outrora eram chamados de pivetes. Aliás, não: pivete era o pequeno criminoso, ladrãozinho de rua, (trombadinha) em São Paulo. Enquanto o menino de rua tem mil faces: com 3 anos já é assim denominado, pode ser inocente como um anjo, apenas escolheu a rua como domicílio. É um generalista, como se diz em medicina: faz de tudo. Se pequenino se agrega a uma mulher que em geral não é a mãe dele: ajuda a pedir esmola, leva cascudos da megera (vi uma vez um grupo deles espancando, com pau e tamanco, uma dessas mulheres estirada na grama daquela encruzilhada à margem da Lagoa, perto do clube Caiçaras). Quem passava achava graça, ninguém se metia, os garotos eram muitos, estavam enfurecidos e aquilo era assunto deles. Depois saiu no jornal que a polícia afinal apareceu, prendeu os meninos e meninas mais velhos - os mais entretidos na pancadaria - que não conseguiram escapar; prendeu também a vítima, provavelmente merecia cadeia, claro.

As batalhas campais das galeras dos bailes funk parece que estão passando.

E os assaltos a apartamentos da zona sul, a crer nos jornais, diminuíram.

Parece que a bandidagem, como todas as classes emergentes, está se organizando. Em primeiro lugar vem a droga, com todas as suas variadas especialidades. Que começam com o transporte da droga bruta da fronteira para cá, opera o refino (abastecida pelo ramal que cuida da aquisição dos produtos e necessidades da destilaria); em seguida vem o transporte para os centros distribuidores, a divisão do que fica aqui e o que vai para o estrangeiro. Só o recrutamento das "mulas" para transportarem a mortífera carga daqui para fora do País, é um setor altamente especializado, diz o jornal. (Tudo que nós, do público, sabemos a respeito, aprende-se nos jornais, que dão todo o serviço.) Para garantir tão complexas e arriscadas operações, tinha que se formar um exército - o que foi feito. (Com periódicas mudanças e baixas no alto comando, que no momento é dirigido por Fern andinho Beira-Mar, mesmo de dentro da sua cela, através do celular.) Hoje, o nosso rico mercado de armas, que vão das mais sofisticadas às mais primárias, é operado pelas quadrilhas de traficantes. A diferença de armamento entre eles e os nossos policiais é dolorosa; por isso os duelos entre polícia e bandidos são tão desiguais.

O segundo lugar da escala cabe aos seqüestros. Tantos, tão variados e tão abrangentes, que mesmo a modesta classe média só sai de casa com um friozinho de medo no coração, ou melhor, já quase ninguém sai mais de casa depois que escurece. Para combater a nova onda, não se pode negar que as autoridades fazem o que podem. A invenção do "disque denúncia" vai dando algum resultado; e com os êxitos policiais, pode ser que esfrie o entusiasmo dos seqüestradores. E saiam eles para nova diversificação.

Por enquanto, a moda maior é a ordem dada pelos bandidos de fechar o comércio, fechar ruas, fechar entrada e saída de morros em represália pela morte de um dos seus elementos pela facção rival. Ou por qualquer outro motivo. E todo mundo obedece sem pestanejar, pois a palavra de ordem deles já é um refrão: "Tá tudo dominado! Tá tudo dominado!"


Editorial

O MERCADO RESPONDE A LULA

Os fatos mais uma vez desmentem o candidato petista à Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva.

Ele insiste em negar que o tumulto cambial no Brasil tenha relação com sua candidatura. Na sexta-feira, disse numa entrevista que o presidente da República, o ministro da Fazenda e o presidente do Banco Central teriam de explicar por que o dólar vinha subindo. Naquele dia, a moeda americana caiu, depois de quase uma semana de alta. Qual a explicação? Segundo uma pesquisa do Ibope, divulgada à tarde, o candidato do PT havia perdido pontos. Ontem, o dólar voltou a disparar e fechou com 4,99% de alta, valendo R$ 3,575, o valor mais alto desde a edição do Plano Real. Oscilações são normais, mas não um salto tão grande. A explicação era evidente para todos e repetida, sem restrição, no mercado financeiro: a pesquisa Datafolha, publicada no domingo, mostrou o candidato petista com 44% das intenções de voto, muito próximo, portanto, de uma vitória no primeiro turno. Alguém estranha, ainda, que o dólar suba ou desça, no Brasil, segundo as pesquisas mostrem avanço ou recuo da oposição?

É claro, e ninguém nega, que outros fatores também afetam o mercado cambial.

Ontem, bolsas caíram em todo o mundo. Persistem as preocupações com a economia americana e com o risco de guerra entre Estados Unidos e Iraque. O preço do petróleo subiu. A procura de dólares continuará intensa, no Brasil, para a liquidação de contas, neste fim de ano. Mas a maioria desses fatores era conhecida na semana passada. Mesmo com a piora do humor no mercado internacional, faltaria algo para fazer o dólar subir cerca de 5% diante do real. O fator adicional, diga o que disser a cúpula do PT, só pode ser a pesquisa eleitoral conhecida no domingo.

Ontem mesmo já se discutia, no mercado, qual será a reação à nova pesquisa Ibope, esperada para hoje. Se confirmar a tendência apontada na sexta-feira, com Lula em queda e grande possibilidade de segundo turno, o setor financeiro terá um problema: como avaliar a oposição entre os números do Ibope e os do Datafolha? Se, ao contrário, os novos dados indicarem a ascensão de Lula, o dólar poderá subir novamente. Não são palavras de candidatos ou dirigentes da coligação governista, mas de operadores e analistas do mercado financeiro.

Quem chama a atenção para os temores criados pela candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva não é o governo. Ao contrário: as autoridades têm repetido, tanto no Brasil quanto no exterior, que o mercado brasileiro tem sido afetado por fatores econômicos externos e que ninguém deve temer o resultado das eleições. O presidente da República e seus auxiliares admitem, naturalmente, que o quadro eleitoral esteja causando algum receio entre os investidores e financiadores, mas procuram mostrar que nada justifica as preocupações. Foi uma resposta desse tipo que o presidente nacional do PT, deputado José Dirceu, obteve do presidente Fernando Henrique Cardoso, numa conversa por telefone, no sábado passado. Há exagero no mercado, afirmou o presidente, repetindo uma frase do chefe do Banco Central, Armínio Fraga.

Que mais os dirigentes petistas poderiam esperar das autoridades? Que assustassem os banqueiros e investidores? Não poderiam fazê-lo e, além disso, é verdade que a reação do setor financeiro vem sendo exagerada. Mas essa reação não provém do nada. O mercado foi assustado, sim, pelas tolices que disseram e fizeram, há mais tempo, líderes da oposição. Dirigentes petistas, hoje, reconhecem que foi uma tolice o partido haver apoiado, em 2001, a idéia de um plebiscito sobre a dívida externa. Prudentemente, afastaram-se, neste ano, do plebiscito sobre a Área de Livre Comércio das Américas (Alca). Reconheceram, implicitamente, que a defesa dos interesses brasileiros, nessa e noutras negociações internacionais, dependerá de ações políticas e técnicas muito mais sofisticadas. Além de tudo, os petistas mais de uma vez se comprometeram a preservar a estabilidade monetária e a cumprir os compromissos financeiros. Se as preocupações permanecem, só se pode culpar o próprio PT. Seus dirigentes parecem haver esquecido, com demasiada freqüência, a pretensão de chegar ao governo da República. Pena é que todo o Brasil pague por esse erro, suportando os efeitos da instabilidade cambial.


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09/24/2002


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