Lula pede união das esquerdas



 





Lula pede união das esquerdas
A crise na Frente Trabalhista que apóia Ciro Gomes (PPS) e o fraco desempenho de Anthony Garotinho (PSB) nas últimas pesquisas reacenderam as esperanças petistas quanto à possibilidade da união dos partidos de esquerda em torno da candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva.

— Vou alimentar o sonho de uma candidatura única até o último momento. A conjuntura política é favorável à união — disse Lula ontem.

A palavra de ordem no PT é cautela. Os cardeais do partido não querem melindrar os possíveis aliados e incorrer no que consideram um erro político do tucano José Serra, que foi responsabilizado pela saída de Roseana Sarney (PFL) da disputa e agora não consegue atrair o partido para sua candidatura.

— Insisto na tese da união, mas não queremos ganhar desestabilizando os outros — disse o deputado Aloizio Mercadante (SP).

Lula evitou comentar a possível desistência de Ciro e Garotinho:

— A Frente Trabalhista já tem problemas demais. A estratégia do governo é prejudicar a oposição.

O presidente do PT, deputado José Dirceu, está mais otimista com a possibilidade de aliança, embora mantenha a cautela:

— O PT não tomará a iniciativa.

A crise da Frente Trabalhista — PTB e PDT isolaram o PPS nas coligações estaduais — gerou especulações sobre a possível desistência de Ciro. Uma das hipóteses levantadas é de que o pré-candidato do PPS seria vice na chapa de Lula. O petista foi lacônico sobre essa possibilidade: disse apenas “depende”.

Para Lula, oposição está perto do poder

Outro motivo para o otimismo petista é o momento favorável da candidatura de Lula.

— Nunca a oposição teve oportunidade tão próxima de chegar ao poder. A movimentação política gera uma possibilidade de recomposição. Com a verticalização, candidaturas de alguns partidos ficam mais difíceis — disse Mercadante.

Lula alerta para o risco do clima de “já ganhou”.

— Já perdi três eleições e não estou disposto a perder a quarta. Temos que entrar sem orgulho, sem salto alto, para que possamos derrotar este projeto que está aí — disse Lula, na comemoração do Dia do Trabalho da CUT, em Santo André.

Lula esteve em quatro dos dez eventos promovidos pela central. Após participar da missa do Dia do Trabalho em São Bernardo, ele foi a Campo Limpo, São Miguel Paulista, Santo André e Congonhas, sempre acompanhado pelo pré-candidato ao governo de São Paulo, José Genoino, em um helicóptero fretado pela entidade por R$ 4,5 mil.

— Lula tinha uma agenda apertada, não havia outra maneira de ele participar — disse o secretário-geral da CUT, Carlos Alberto Grana.

Em seu discurso em Santo André, Grana foi explícito quanto às preferências da CUT:

— Este ano, nossa principal campanha será eleger Lula presidente.

Ao participar da festa da Força Sindical, adversária da CUT, o deputado Luiz Antonio Medeiros (PL-SP) disse que as pendências do PL com relação à aliança com o PT estão sendo resolvidas e até a próxima semana a coligação poderá ser fechada. Os problemas, segundo ele, eram questões regionais levantadas por oito deputados, mas 80% deles já foram solucionados. Inclusive na Bahia, onde o PL é controlado por partidários do ex-senador Antonio Carlos Magalhães, do PFL. O deputado chegou a dizer que Antonio Carlos, caso o PFL fique mesmo sem candidato a presidente, poderá apoiar Lula:

— A aliança com o PL será uma grande ajuda para atrair muitos setores do centro para a candidatura Lula, independentemente de o vice ser o senador José Alencar.


FH alerta Lula contra ‘sapato alto’ na campanha
BRASÍLIA. O presidente Fernando Henrique Cardoso alertou ontem o candidato do PT Luiz Inácio Lula da Silva para os perigos do salto alto. Irritado com o pedido do petista para que não tomasse medidas que pudessem afetar o próximo governo, o presidente acusou Lula de “estar de salto alto” devido a seu desempenho nas pesquisas eleitorais e disse que o petista devia esperar o resultado das eleições para falar sobre ações de governo.

— Ninguém deve colocar sapato alto antes da hora. Os que já fizeram isto, como eu, que sentei em cadeira errada, sabem que não se deve repetir. Ele está dizendo o que devo fazer até o fim do meu mandato. Um pouco de humildade é bom — disse ele, em entrevista à Radiobrás, numa referência à sua derrota nas eleições para a Prefeitura de São Paulo.

O presidente chegou ontem a Carajás, no Pará, para uma visita de dois dias. Fernando Henrique disse estar satisfeito com o fato de Lula estar repetindo em sua campanha algumas idéias de seu governo. Ele observou, entretanto, que o petista erra ao abordar alguns temas, como o da energia. Segundo Fernando Henrique, são totalmente improcedentes as afirmações de Lula de que o governo pretende privatizar a Companhia Hidrelétrica do São Francisco (Chesf) e Furnas. O governo já desistiu da venda, lembrou.

— Eu até vejo com certa alegria que as idéias que eu preguei o Lula prega. Ainda agora, na questão de energia, está apelando para o capital estrangeiro — afirmou.

Apesar do ataque a Lula, ele criticou as análises dos bancos estrangeiros desta semana, que recomendaram a desvalorização dos títulos brasileiros devido ao crescimento do candidato petista nas pesquisas eleitorais.


Ciro afirma que os abalos na Frente Trabalhista são ‘manobras naturais’
PORTO ALEGRE E SÃO PAULO. O pré-candidato à Presidência Ciro Gomes classificou ontem, em São Paulo, como “manobra natural”, o possível rompimento da Frente Trabalhista (PDT, PPS e PTB) nos estados.

Ciro, que discursou na festa do 1 de maio da Força Sindical, não quis comentar uma possível retirada de sua candidatura em favor do petista Luiz Inácio Lula da Silva.

— São momentos naturais em que emoções estão tensas. Já tenho 13 eleições nas costas, sei que essas marolas são naturais. É só ter calma que vai dar tudo certo — afirmou o ex-governador do Ceará.

No discurso, críticas ao desemprego e à violência

Para as cerca de 700 mil pessoas que ouviram seu discurso, Ciro afirmou que falaria apenas três palavras. Lembrou que o país tem 16 milhões de desempregados, 13 milhões de aposentados e que a violência assusta.

— Precisamos mudar isso. E não vamos mudar com conversa fiada. Só o povo, esclarecido, unido e organizado, é capaz de mudar isso.

Em entrevista à Rádio Gaúcha, Ciro classificou como de “muita tensão” o momento que seu partido vive. Em outra entrevista à rádio, o presidente nacional do PPS, senador Roberto Freire (PE), chamou o apoio do PDT e do PTB a Ciro de esquizofrênico, culpando o presidente de honra do PDT, Leonel Brizola, pelo fracasso das negociações no Rio Grande do Sul. O pedetista vetou o nome do ex-governador Antônio Britto (PPS) para candidato ao governo pela Frente.

— Eles querem apoiar nacionalmente o candidato do PPS e vetar candidatos do PPS regionalmente — disse Freire.

Mas o líder do PTB na Câmara, Roberto Jefferson (RJ), fez críticas ao comportamento de Freire nas negociações da frente no Rio Grande do Sul.

— Ele é o grande culpado. Primeiro, garantiu a Brizola que Britto não seria candidato. Depois vetou o nome de José Fortunati (PDT) e apresentou o nome de Britto — disse.

O presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, defendeu a Frente:

— É só dar uma enquadrada no Freire. Ele sabe que sem PTB e PDT, o PPS não elege nem a metade dos deputados que quer — disse Paulinho.


Coligação implode no Rio Grande do Sul
BRASÍLIA. A Frente Trabalhista (PDT, PPS e PTB) que apóia a candidatura de Ciro Gomes à Presidência deu mais um passo para sua implosão. Ontem, o diretório gaúcho do PPS pediu ao ex-governador Antônio Britto que lance sua candidatura ao governo do Rio Grande do Sul. Britto respondeu dizendo que se sente liberado dos compromissos com a frente para começar a costurar sua candidatura. Anteontem, o PDT e o PTB anunciaram a decisão de excluir o PPS das alianças regionais.

A partir de hoje, o ex-governador começa a conversar com partidos que não deverão ter candidato à Presidência, como PFL e PPB, em busca de apoio ao seu nome. Ele afirmou que deverá lançar sua candidatura oficialmente na próxima semana.

— Resolvemos fazer isso em dois momentos a fim de dar um tempo para que o PDT retome o diálogo. Mas já vamos procurar outros partidos como PPB e PFL, além do PTB — disse o ex-governador.

Britto afirma que PDT é intransigente

Britto afirma que a intransigência é do PDT, que não aceita outra alternativa a não ser o apoio dos três partidos (PDT, PPB e PTB) ao vereador José Fortunati, último colocado nas pesquisas de intenção de voto. O ex-governador lembra que estava disposto a abrir mão de sua candidatura, desde que fosse escolhido outro nome, como o do senador José Fogaça (PPS).

Fogaça disputará o Senado na chapa de Britto

Fogaça, porém, já decidiu que será candidato ao Senado na chapa de Britto e afirmou que a atitude do PDT, com o apoio do PTB nacional, inviabilizou a Frente Trabalhista no Rio Grande do Sul.

— A Frente Trabalhista está inviabilizada no estado. O PPS buscará outros caminhos, porque temos de cuidar de nossa sobrevivência. No caso de Ciro Gomes, a aliança ainda é viável, mas tem gente puxando ele para baixo — disse Fogaça, que acredita que Antônio Britto é o único com chances de vencer o petista Tarso Genro.

Líder do PDT na Câmara, Miro Teixeira (RJ) não perdeu as esperanças na consolidação da aliança. Para ele, o pré-lançamento da candidatura de Britto ontem foi um gesto menor.

— Nós criamos o impasse quando partimos para a tese da reciprocidade democrática. Mas é só com as divergências expostas que vamos conseguir transpor as dificuldades — disse Miro.


Garotinho admite pressão do PSB para desistir
BAURU (SP) e SÃO PAULO. O ex-governador Anthony Garotinho, pré-candidato do PSB à Presidência, admitiu ontem que enfrenta pressões de parte do seu partido para abandonar a disputa. Mas garantiu que não abrirá mão da candidatura nem pensa numa aliança no primeiro turno com Luiz Inácio Lula da Silva, pré-candidato do PT. Ele voltou a criticar sua sucessora, a governadora Benedita da Silva (PT).

— A pressão é muito pequena — disse ele, minimizando a falta de apoio interno.

Para Garotinho, a aliança das oposições só acontecerá no segundo turno. Mas ele não descarta negociações ainda na primeira fase da disputa:

— Se alguém quiser vir no caminho, que venha. Mas nossa candidatura não está condicionada a nenhuma aliança e vai até o fim — afirmou ele, que esteve em Bauru, no interior de São Paulo para inaugurar um escritório-comitê.

Em Bauru, Garotinho voltou a criticar Benedita. E ao chegar a São Paulo, à noite, o pré-candidato do PSB afiou o tom e chamou a governadora de “barata tonta”. Exibindo cópia de uma extrato bancário, ele disse ter deixado em caixa R$ 1,272 bilhão, verba suficiente para quitar a folha salarial por três meses. O PT se queixa de não ter dinheiro em caixa.

— Toda hora, ela (Benedita) lança um factóide. Primeiro, diz que existe um déficit orçamentário. Depois, que é um déficit financeiro. Ela está como uma barata tonta — disse.

Evento gospel reúne 20 mil segundo a Polícia Militar

O ex-governador disse que “lamenta pela população do Rio” que Benedita esteja sendo “mal orientada e fale uma porção de bobagens”.

Em São Paulo, Garotinho participou de um evento promovido pela Rádio Melodia. Recebido aos gritos de “Ah, é Garotinho!”, o ex-governador fez um discurso de apenas três minutos, reclamando do desemprego e da fome.

Segundo a Polícia Militar, o ato reuniu cerca de 20 mil pessoas. Para os organizadores, porém, foram 80 mil. Também foi tocado um jingle citando a candidatura de Garotinho. O dono da rádio, Francisco Silva, puxou a claque:

— Garotinho para presidente! — gritou Silva

— Em nome de Jesus — respondeu a platéia.

Garotinho anunciou que lançará um sistema de arrecadação para sua campanha com a venda de bônus de R$ 10.


Serra defende projeto de flexibilização da CLT
O pré-candidato do PSDB à Presidência, senador José Serra, defendeu ontem o projeto de flexibilização da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e propôs o fim da unicidade sindical, que obriga as categorias profissionais a se organizar num único sindicato. Na opinião de Serra, a reforma proposta pelo governo, e que encontra resistência da oposição no Congresso, altera apenas alguns tópicos da CLT e favorece os trabalhadores. Para o pré-candidato tucano, as mudanças na legislação também vão beneficiar parcelas da população que hoje têm dificuldades de obter empregos, como os mais jovens e as mulheres acima de 40 anos.

— Não é a salvação e nem a destruição da lavoura, como a oposição quer fazer crer. Temos que revisar o conjunto da CLT. Hoje, mulher com mais de 40 anos é considerada idosa e não consegue se reempregar. E jovem tem dificuldade de se empregar por causa da rigidez da legislação — disse.

Serra cobra ação concreta contra a unicidade sindical

Serra, que ontem passou a tarde em Caxias, na Baixada Fluminense, disse que as centrais sindicais precisam adotar atitudes mais concretas a favor da pluralidade sindical.

— Hoje, todo mundo fala a favor da pluralidade sindical. Quando é na hora “H”, parece que é o fim da classe operária. E não é — afirmou.

O projeto enviado pelo governo ao Congresso permite que patrões e empregados negociem a redução dos salários, a alteração da carga horária e das férias. Para conseguir que a oposição vote a prorrogação da CPMF, o governo retirou o pedido de urgência do projeto da CLT, que não deverá ser votado este ano.

Para celebrar o Dia do Trabalho, Serra descartou a participação em comícios e optou pelo contato direto com o eleitor, na companhia do prefeito de Caxias, José Camilo Zito dos Santos, seu coordenador de campanha no Estado do Rio. Nas cinco localidades que visitou, onde eram realizados torneios de futebol em praças construídas por Zito, Serra por vezes não foi reconhecido por quem cumprimentava.

— O Zito claro que eu sei quem é, mas ele eu não conheço — disse Vilma Silva Cerqueira, de 51 anos, após posar para uma foto abraçada a Serra, na calçada onde vendia churrasquinhos.

Zito cunha slogan da campanha: “Vamos serrar”

Enquanto apresentava Serra, Zito cunhou um slogan para o senador.

— Gente, neste ano vamos serrar. Não se esqueçam de serrar — dizia o prefeito.

Para um grupo que bebia cerveja na mesa de praça, Serra pediu votos de outra forma:

— Eleição se ganha com uma ventania de votos. Nós vamos soprar um pouquinho — disse.

Nas três horas em que esteve em Caxias, Serra não discursou, apesar de ter à disposição um carro de som que acompanhou a comitiva.

— Preferi vir nesse corpo-a-corpo do que num ato sindical organizado, não porque não tenha importância um ato sindical. Mas aqui ficamos vendo os trabalhadores no seu momento mais descontraído.

Aos jornalistas, Serra defendeu a criação de cursos públicos e gratuitos de pré-vestibular para as camadas populares. Assim, disse, as pessoas carentes poderão disputar uma vaga nas universidades públi cas em igualdade de condições com os que podem pagar cursinhos particulares.


Artigos

Salvar o Mercosul
Aloisio Mercadante

Longe da passividade que tem caracterizado a ação de líderes mundiais, a crise argentina, a um só tempo, indica a necessidade premente de auxílio concreto e representa oportunidade ímpar de inserção global do Brasil.

Além da solidariedade, é preciso afinar a visão pragmático-econômica, pois o default de nosso maior parceiro comercial na América Latina indica o declínio, senão a extinção, do Mercosul. E, por conseguinte, fragilização de nosso poder de negociar acordos maiores como a Alca e a União Européia.

É essa visão político-estratégica que deve nos orientar. Nossa ação deve antever atitude que evite o aniquilamento do comércio bilateral — em queda de 70% — corte de investimentos por parte de companhias presentes lá e aqui, esfacelamento do Mercosul e perda deste poderoso instrumento de negociação. Também é crucial encarar a política de monólogo do governo Bush. Os EUA protegem cada vez mais setores não competitivos, oferecendo pouco ou quase nada na consolidação da Alca. Como competir com um gigante que detém 76% do PIB das Américas se, em segundo lugar, representamos apenas 6%?

Ou nos inserimos no comércio mundial calçados em um Mercosul forte e ampliado, ou aceitamos a anexação comercial. E, assim, abrimos mão de ampliar nossa indústria, ganhar competitividade e buscar novos parceiros mantendo nossa vocação multilateral de comércio.

O Congresso Nacional já aprovou, e o ministro Celso Lafer deu seu aval, a realização de sessão solene de solidariedade à Argentina, com a presença do presidente Duhalde. Outra sugestão que apresentei, com apoio também unânime, cobra maior empenho do FMI e do Banco Mundial na solução da crise argentina.

Como alternativa concreta, sugeri a criação temporária de uma câmara de compensação comercial. Com ela, os importadores argentinos pagariam suas dívidas em pesos, enquanto os exportadores brasileiros receberiam em reais. E vice-versa.

O momento requer atitudes imediatas e práticas do governo brasileiro, agora respaldadas pelo apoio unânime do Legislativo. Nossa ação é indispensável para a estabilidade econômica do Cone Sul e da América Latina.


Colunistas

PANORAMA POLÍTICO - Tereza Cruvinel

FH no palanque
O presidente Fernando Henrique estreou ontem no debate eleitoral acusando o candidato Lula de usar saltos altos ao propor que não tome medidas que engessem o futuro governo. Em conversas com tucanos sobre a situação de Serra e a consolidação de Lula, o presidente já dissera esta semana que não abdicará de seu papel de eleitor especial na campanha eleitoral.

Em uma destas conversas, recomendou mais dureza com os adversários, o que tratou de fazer pessoalmente ontem. Além de Malan, combatendo o PT no plano econômico, devemos ter agora também o presidente como ator no palco eleitoral, embora deva restringir-se à defesa de seu governo e não do candidato. Das articulações políticas em favor de Serra ele já vem participando intensamente. O movimento noturno no Alvorada tem sido intenso, não só nas noites do cineminha, com a passagem de pefelistas e pepebistas que podem apoiar Serra isoladamente e peemedebistas que negociam a aliança com o PSDB, além de outros eventuais colaboradores. Foi do presidente a iniciativa de chamar o publicitário Nizan Guanaes a colaborar com o grupo responsável pelo marketing da campanha, operação que ainda está em curso. Sem dúvida, o presidente será um cabo eleitoral importante, embora hoje apenas 7,5% (pesquisa CNT/Sensus) declarem votar apenas no candidato por ele apoiado. Mas reza o conhecimento político empírico que o Planalto será sempre capaz de transferir 20% de votos para seu candidato.

O ataque de ontem a Lula teve como pretexto suas declarações no Rio criticando medidas que possam representar blindagem contra o futuro governo, seja quem for o presidente eleito. Citou como exemplo, no lançamento de seu programa de energia, a venda de geradoras como a Chesf antes do fim do ano. O conceito de blindagem surgiu com o projeto de autonomia do Banco Central, do qual o governo já desistiu por falta de consenso entre os aliados. Mas o PT classifica na mesma categoria outras medidas, tais como a troca dos presidentes de agências reguladoras, que têm mandatos de cinco anos, de modo a que o futuro presidente não possa nomear nenhum deles. Teria pouca margem para alterar as regras de concessão dos serviços púbicos privatizados. Já foi trocado o da ANP, o da Aneel teve o mandato renovado e hoje toma posse o novo presidente da da Anatel, José Guilherme Shymura.

Uma outra blindagem contra Lula, esta de natureza institucional, deu muito trabalho ao país. Na revisão constitucional de 1993, temendo sua então provável vitória em 1994, PFL, PSDB e PMDB patrocinaram a redução do mandato presidencial de cinco para quatro anos, com direito à reeleição. Lula ficaria só quatro anos e não se reelegeria, calculavam. Na votação, o artigo da reeleição caiu e FH foi depois eleito para um mandato de apenas quatro anos. Acabou pagando caro para aprovar a emenda da própria reeleição.O aumento de IOF era bode e funcionou. A Câmara aprovou a CPMF. Agora, para pressionar o Senado, o governo ameaça com cortes no Orçamento, o que apavora muito mais os candidatos.

Terrorismo e preconceito
No segundo turno eleitoral de domingo na França, a eventual vitória do candidato ultra-direitista Le Pen produziria turbulências econômicas significativas. Ele prega até a saída de seu país da União Européia e a volta do franco, que já foi trocado pelo euro.

— Nenhuma destas agências que semeiam terror ante a eventual vitória de Lula no Brasil avaliou o risco francês. Ou será que o FMI e o capital financeiro são discípulos de Gobineau? Pelo visto, acham que só alguns países — periféricos, quentes e morenos — são incapazes para a auto-governabilidade — diz o deputado Paulo Delgado (PT-MG).

Joseph Arthur Gobineau, pensador e diplomata, foi embaixador da França no Brasil Império. Passou à história das idéias como teórico do racismo, sustentando que algumas raças, próprias de lugares quentes, careciam de vocação civilizatória. Seu etnocentrismo ajudou a legitimar cientificamente a escravidão. Com esta abordagem sobre o papel das agências de risco, Delgado começa amanhã sua palestra sobre autoritarismo na Escola Superior de Guerra, na Praia Vermelha.

A corda bamba de Ciro
A crise na aliança PPS-PDT-PTB está longe de acabar. PDT e PTB, além de optarem por uma aliança exclusiva nos estados, aliando-se ao PPS apenas no pleito presidencial, ameaçam punir os diretórios estaduais que se aliarem ao partido de Ciro. O PPS, diz o ex-governador Antônio Britto, será forçado a reagir, politica ou juridicamente.

— Este comportamento é inaceitável numa aliança, funda-se na desconfiança e no preconceito — diz ele.

A proibição atingiria o PTB gaúcho, disposto a apoiar Brito para governador, se tiver o petebista Sérgio Zambiazi como candidato ao Senado.

Britto não se sente porém culpado pela crise da frente. Diz que na quinta-feira passada, em reunião com pedetistas, abriu mão de sua candidatura em favor de José Fogaça (PPS). Brizola estava de acordo mas no domingo desautorizou os entendimentos e, na terça, juntamente com o presidente do PTB, declarou a ruptura parcial.

SEGUIU o padrão do velho PSD a reunião-jantar do PFL na segunda-feira. No subsolo, enquanto os convidados chegaram, Marco Maciel, Jorge Bornhausen e ACM acertaram o quer seria decidido: não hostilizar nem incensar Silvio Santos, jogar com o tempo e deixar para junho a decisão oficial.


Editorial

LIÇÕES

Oaumento de produtividade é o denominador comum das economias que conseguiram vencer o atraso. Em muitos casos, esse processo foi acompanhado por sistemas de câmbio fixo. A Argentina teve de recorrer a essa ferramenta para se livrar de um processo de hiperinflação que quase arruinara sua economia entre o fim da década de 80 e o início dos anos 90. A estabilidade monetária permitiu à Argentina crescer a taxas elevadas durante nove anos. Tal recuperação acabou acomodando o país, e assim reformas fundamentais não tiveram continuidade.

Quando os mercados financeiros internacionais começaram a enfrentar sérias turbulências em 1997, a Argentina continuou presa a um câmbio rígido sem que tivesse construído defesas contra a especulação.

As reformas foram postergadas — especialmente no caso das finanças das províncias — e o país mergulhou em forte recessão, da qual não mais se livrou. O custo social dessa crise tem sido tremendo e a saída não será fácil.

O que vem se passando no país vizinho permite tirarmos algumas lições. Tais como: a relevância da Lei de Responsabilidade Fiscal, que obriga todos os governantes a manterem as finanças públicas em ordem; a necessidade de se fazer o mais rápido possível a reforma tributária e retomar outras (a previdenciária, por exemplo); a economia brasileira fez com acerto a transição para o câmbio flutuante.


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05/02/2002


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