Manifestações revelam luta por ‘direito à cidade’, dizem jovens
As manifestações ocorridas em junho por todo o país reuniam uma reivindicação comum: o “direito à cidade”, configurado pelo acesso ao transporte de qualidade e a baixo custo, a serviços públicos eficientes e para toda a população, e ao direito democrático à mobilização popular.
Essa visão sobre as manifestações nas ruas das cidades brasileiras foi apresentada por representantes de entidades e movimentos de juventude, que participaram nesta quinta-feira (11) de audiência pública na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH).
Para Gabriel Santos Elias, representante do Movimento Passe Livre, a mobilização contra o aumento do transporte coletivo era a ponta de um conjunto de frustrações da população, que tem seus direitos desrespeitados.
Ele acredita que os brasileiros se sentem frustrados por não verem concretizadas soluções prometidas de mobilidade urbana, anunciadas desde a confirmação do Brasil como sede da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos.
– Boa parte das obras prometidas não aconteceu. E com aumento da passagem, adianta melhorar obras de infraestrutura, se a população não consegue usar esse serviço? A luta pela mobilidade urbana é uma luta pelo direito à cidade – afirmou.
Apesar da melhoria de renda e do crescimento da economia, disse, os brasileiros não têm a contrapartida pelos impostos pagos e se frustram com serviços públicos ineficientes, em especial de saúde, educação e segurança.
Também Nicolas Powidayko, presidente do Diretório Central Estudantil (DCE) Honestino Guimarães, da Universidade de Brasília (UnB), considera que a insatisfação é o que une as demandas das manifestações.
– O progresso está chegando e a juventude está pedindo o cumprimento das promessas, quer entrar na faculdade, quer local digno de moradia, quer transporte, saúde de qualidade, educação – disse.
Na avaliação de Alessandro Melchior, presidente do Conselho Nacional de Juventude (Conjuve), o estopim das manifestações foi o transporte urbano, pois as horas passadas em ônibus e metrô seriam as mais infelizes do dia para a maioria das pessoas que vivem nas grandes cidades.
A participação de jovens nas mobilizações, na avaliação de Murilo Amatneeks, da Secretaria Nacional da Juventude da Presidência da República, mostra o papel relevante dessa faixa da população no aperfeiçoamento da democracia.
– A democracia conquistada com suor está sendo aperfeiçoada. Essa geração começa a dar seu recado – disse.
Protagonismo
Na condução da audiência pública, o senador Paulo Paim (PT-RS) elogiou a clareza das opiniões expressas pelos jovens durante o debate.
– Está muito enganado quem pensa que a juventude está alienada – afirmou o senador.
No mesmo sentido, a senadora Ana Rita (PT-ES), que preside a CDH, lembrou o protagonismo de entidades e movimentos da sociedade no resgate da democracia e avanço das conquistas sociais.
O senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF) reconheceu que as manifestações surpreenderam a todos e colocaram em xeque os políticos, os partidos, as instituições e a forma como a política é feita.
– O movimento mostrou a capacidade que a mobilização de rua tem de promover transformações. A gente sabe que o Congresso tem atuado através de pressão e a pressão da opinião pública funcionou – frisou, ao se referir às votações da pauta positiva adotada no Senado.
Também o senador Eduardo Suplicy (PT-SP) destacou propostas aprovadas nos últimos dias no Senado, como a que acaba com o voto secreto no Congresso e a que altera as regras para suplentes.
Em resposta a Rollemberg, os participantes do debate disseram apoiar propostas da agenda positiva, mas ressaltaram que são insuficientes frente às demandas da sociedade.
Passe livre
Como resultado dos movimentos nas ruas, a proposta de passe livre no transporte coletivo está se tornando possível, na avaliação de Gabriel Elias. Ele citou estudo que mostra ser viável implementar a tarifa zero em ônibus e metrô sem a necessidade de novos tributos, apenas redefinindo prioridades na aplicação de recursos públicos.
Já Alessandro Melchior ressaltou que os movimentos reivindicam passe livre para toda a juventude, e não apenas para estudantes. Ele criticou a vinculação do financiamento da proposta a recursos de royalties do petróleo, por considerar que criaria concorrência com ações na saúde e educação.
– Também não pode se dar por desoneração às grandes empresas. Reforçamos isso na reunião na semana passada com o presidente do Senado, Renan Calheiros: que o financiamento da tarifa zero seja feito a partir da taxação das grandes fortunas – disse.
Repressão
Os debatedores entendem que a repressão das forças policiais nas primeiras manifestações fortaleceu a mobilização e levou à expansão da pauta de reivindicações para além do transporte, incluindo temas como corrupção, serviços públicos e reforma política.
Para Gabriel Elias, a repressão foi percebida como ameaça ao direito do uso das ruas como espaço dos movimentos sociais.
– A rua é importante para arejar a política e a sociedade.
Também Thanisia Marcella Alves Cruz, ativista do Movimento Negro de Brasília, reforçou a importância do direito à manifestação de rua. Idealizadora da campanha A Cor da Marcha, ela disse que é conhecida a violência policial contra jovens negros e apontou a mobilização social como importante estratégia de combate ao racismo.
11/07/2013
Agência Senado
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