Militar discriminará homossexualismo
Militar discriminará homossexualismo
Artigo do Código Penal Militar que aponta a ''pederastia'' como crime e prevê pena de até um ano de prisão será retirado
BRASÍLIA - O Ministério da Justiça quer retirar do Código Penal Militar a caracterização do homossexualismo como crime. A mudança, proposta como projeto de lei ao Congresso, faz parte do novo Programa Nacional de Direitos Humanos, a ser lançado nas próximas semanas. Editado em outubro de 1969, o código militar tem um capítulo dedicado aos ''crimes sexuais''. Lá, junto a estupro, atentado violento ao pudor e corrupção de menores, figura o termo ''pederastia''. É o artigo 235. Prevê pena de seis meses a um ano de detenção para o militar que ''praticar, ou permitir que se pratique com ele, ato libidinoso, homossexual ou não, em lugar sujeito à administração militar''.
O projeto do governo vai retirar a expressão ''pederastia'' da definição do artigo e a palavra ''homossexual'' do texto. O ato sexual, no entanto, continuará proibido dentro do quartel. Seja ele homossexual ou heterossexual.
Na interpretação de entidades de defesa dos direitos humanos, a palavra pederastia, no índice do artigo, fere a livre orientação sexual. O dicionário Aurélio define a palavra como ''contato sexual entre um homem e um rapaz bem jovem'', ou mais genericamente como sinônimo de ''homossexualismo masculino''. A proposta do novo plano, entregue ao presidente Fernando Henrique Cardoso há duas semanas, fica até o próximo dia 10 em consulta pública. Depois será publicada no Diário Oficial da União.
Reação - Para o assessor legislativo do Superior Tribunal Militar (STM), brigadeiro Rosa Filho, haverá reação nos meios militares. Ex-presidente do tribunal e ex-Chefe do Estado-Maior da Aeronáutica, o brigadeiro diz que foi um dos primeiros militares a apoiar mudanças no código. As alterações sugeridas pelo STM em 1997 previam a retirada do termo pederastia do código. Foram enviadas ao governo, mas não se concretizaram.
Rosa Filho acredita que a maior reação deve partir do Exército, por ser a maior das forças militares. ''É uma simples questão de número. O Exército tem três vezes mais militares que a Aeronáutica.'' Para o brigadeiro, o homossexualismo nos círculos militares é muito difícil e ser comprovado. ''Só se você pegar em flagrante''.
Segundo o brigadeiro, os círculos militares sempre tiveram receio de que o homossexualismo influísse nas hierarquias de comando. ''Imagina um sargento escalar um soldado e ter relações sexuais com ele? Vai proteger o soldado depois?'', indaga. ''A gente sabe que a paixão é algo incontrolável. Imagina o relacionamento entre dois militares!''
Minorias - Rosa Filho aponta duas razões para o termo pederastia ainda não ter desaparecido do código. Segundo ele, os militares erraram ao sugerir mudanças em todo o texto do código, há três anos. ''Cometemos o equívoco de propor uma revisão total do código. É necessário propor modificações pontuais.'' O outro erro, diz ele, é nunca terem discutido a questão como uma ''covardia'' contra as minorias. ''O que se colocou sempre foi a questão da servidão, da paixão e da interferência na vida militar.''
Além da mudança no código, o Ministério da Justiça decidiu apoiar a regulamentação da parceria civil entre pessoas do mesmo sexo. Também serão incluídos nos censos demográficos e pesquisas oficiais dados sobre orientação sexual.
História vai por água abaixo
Chuva forte causa estragos em Goiás Velho, patrimônio da humanidade
BRASÍLIA - Menos de um mês depois de ter recebido o título da Patrimônio Histórico da Humanidade, a cidade de Goiás, a 135 quilômetros de Goiânia, teve grande parte do centro histórico destruído pela chuva. Conhecida como Goiás Velho, a cidade teve 40 casas, duas pontes e várias ruas na destruídas pelo grande volume de água que caiu durante seis horas, entre domingo e segunda-feira.
Apesar da destruição patrimonial, não houve registro de mortes e feridos. O prefeito da cidade, Boadir Veloso (PTB), está realizando um mutirão para reconstruir os locais atingidos. O governador de Goiás, Marconi Perillo, visitou a cidade e colocou as secretarias do Estado à disposição para auxiliar nas obras.
Segundo o prefeito, a maioria das casas danificadas era construída de cimento e tijolos. ''As casas de adobe (tijolo misturado com palha) resistiram melhor ao temporal.'' Um dos pontos turísticos mais danificados foi a Cruz de Anhangüera. Com cerca de quatro metros, o marco da fundação da cidade foi arrastado pela correnteza que se formou no Rio Vermelho. Como a base permaneceu no lugar, ontem os voluntários tentavam encontrar a madeira para recompor o monumento.
Casario - A casa da poetisa e doceira Cora Coralina também foi atingida pela enchente do Rio Vermelho. ''A água entrava pela porta da frente e saía pela do fundo'', disse o prefeito. Pela avaliação inicial, a estrutura da casa e o acervo não foram atingidos. Mesma sorte não tiveram outras construções que fazem parte do casario colonial. Muitas ruíram com a força das águas. Os documentos dos acervos da prefeitura, no entanto, ficaram destruídos. Assim como alguns caixas eletrônicos do Banco do Brasil.
A cidade tem 28 mil habitantes e tem o turismo como uma das principais fontes de renda. ''A chuva aumentou o turismo. Vários curiosos vieram para a cidade'', disse o prefeito. Segundo ele, cerca de 30 desabrigados estão acomodadas em casas de parentes e vizinhos.
Frente fria causa estrago em Maceió
MACEIÓ - Uma frente fria proveniente da Região Sudeste provocou fortes chuvas em todo o Estado de Alagoas, causando inundações e desabamentos de casas em Maceió. Além disso, aumentou o volume de água dos rios que abastecem os municípios nas regiões do Agreste e da Zona da Mata.
As equipes do Corpo de Bombeiros começaram a receber pedidos de ajuda pela manhã, duas horas após o inicio de um forte temporal. Foram registrados três desabamentos de residências nos bairros do Mutange e Cambona, na periferia. Vários moradores com casas inundadas solicitaram ajuda.
Na Avenida Fernandes Lima, principal corredor de transporte de Maceió, uma enxurrada provocou grandes congestionamentos no trânsito. Apesar dos transtornos, não houve registro de vítimas.
Réveillon - As chuvas também trouxeram problemas para as festividades da chegada de 2002, afastando os turistas das praias da capital alagoana. Os maiores prejudicados foram os comerciantes, que montaram uma esquema especial para aproveitar o primeiro feriado do ano.
Na região Sertaneja, onde os fortes efeitos da seca atingem as populações de 42 municípios, as chuvas começaram no último sábado. Na madrugada de terça-feira, foi registrada uma média pluviométrica de 70 milímetros, a maior dos últimos seis meses. A meteorologia prevê que hoje deve chover com mais intensidade em todo o Estado.
Em Minas Gerais, as prefeituras dos municípios de Açucena e Dom Joaquim decretaram estado de calamidade pública. Mais de 300 famílias foram deslocadas de suas casas. Outras 12 cidades continuam em situação de emergência.
Fogo atingiu Esplanada na virada do ano
BRASÍLIA - Um princípio de incêndio foi registrado no prédio do Ministério de Minas e Energia logo após o réveillon da Esplanada dos Ministérios, em Brasília. O fogo atingiu um auditório no subsolo do edifício de nove andares, e foi controlado minutos após o fim do show pirotécnico.
''Queimou o madeiramento do ar condicionado'', informou o segurança José Abadia, que estava no prédio ontem pela manhã. O vigia acha possível que faíscas tenham caído pela grade lateral do andar térreo. Ele não permitiu a entrada da imprensa no local. Do lado de fora, ainda era possível sentir um forte cheiro de queimado.
Durante 20 minutos, 150 mil pessoas assistiram às cascatas de luzes que desceram dos edifícios da Esplanada na virada do ano. Os organizadores informaram que 30 toneladas de fogos foram usadas na festa, que ocorreu pelo terceiro ano consecutivo. Os gastos totais chegaram a R$ 2 milhões. Com tempo bom, o gramado ficou lotado. Uma das grandes atrações foi a bateria da escola de samba carioca Mangueira, ao lado de vários grupos musicais da capital federal.
Um guia para fazer denúncias
Entrevista/Anadyr de Mendonça Rodrigues
Desde que recebeu carta branca do presidente Fernando Henrique Cardoso para apurar denúncias de irregularidades nos ministérios, em abril de 2001, a corregedora-geral da União, Anadyr de Mendonça Rodrigues, de 65 anos, não teve tempo de olhar para trás. Com status ministerial, a procuradora aposentada teve que montar uma estrutura do nada ao mesmo tempo em que arcava com pressões para mostrar a que veio. No começo de dezembro, Anadyr e equipe foram pegos de surpresa por um pedido do presidente: números da atuação da corregedoria para o relatório anual do governo. Finalmente de posse dos primeiros dados, ela falou ao Jornal do Brasil.
- Quais as preocupações para 2002?
- Temos metas ambiciosas. A principal é fazer com que nenhum processo que dê entrada na Justiça seja anulado por imperfeições burocráticas. Não sei dizer quantos processos são arquivados por detalhes técnicos, mas são muitíssimos. No começo de janeiro, vamos pôr na Internet um guia completo para auxiliar na apuração e na tramitação de denúncias. Vai ter procedimentos, legislação, formulários, todo o necessário para que entidades do governo e cidadãos comuns possam abrir processos sem erros. É melhor prevenir do que remediar.
- E como foi 2001?
- Foi de trabalho insano. Não tivemos tempo para nada. Ao mesmo tempo em que se fazia a instalação da corregedoria, começávamos a analisar processos, sempre com muita pressão por resultados rápidos. Foi um ano enlouquecido. Comecei do zero. Quando um ministro toma posse, em geral tem já toda uma estrutura para recebê-lo. Eu só dispunha de quatro pessoas quando cheguei.
-O que mostram os primeiros números sobre as atividades da corregedoria?
- No começo de dezembro, a Presidência da República nos pediu dados para um balanço do governo em 2001. Pela primeira vez, então, temos alguns números. Descobrimos, por exemplo, que 30% das 2.300 denúncias que recebemos da população não são, na realidade, denúncias, mas sim pedidos de ajuda, opiniões, reclamações. Acabamos criando uma espécie de ouvidoria para receber essas manifestações diversas.
- Por que esse tipo de contato ocorreu?
- Porque fazia falta um canal de comunicação confiável. Há muitos 0800s por aí, mas nunca a pessoa sabe se terá resposta, ou se terá uma resposta melhor do que a padrão. Percebemos também que as denúncias e manifestações começaram a chegar mês a mês em número crescente. Isso significa que há uma linha da confiabilidade crescente. As pessoas estão começando a acreditar no trabalho da corregedoria.
- No caso das denúncias reais, quais e quantas são?
- Temos um banco de dados que acompanha o andamento das denúncias e já conta com 4 mil processos. E deve chegar a 5 mil em breve. Em 90% dos casos, reclama-se de fatos que ocorreram no poder público anteriormente à própria criação da corregedoria. Quero deixar claro que o que aumentou foi o grau de participação consciente do cidadão e não o número de escândalos ou irregularidades. Só que agora essas irregularidades estão aflorando.
Acaba a greve na Imprensa Nacional
BRASÍLIA - O primeiro dia útil do ano marca a volta dos funcionários da Imprensa Nacional ao trabalho. A paralisação começou no dia 21 de novembro e a decisão de pôr fim ao movimento ocorreu após manifestação em frente ao prédio em que mora o Chefe da Casa Civil, ministro Pedro Parente. Segundo o presidente da Associação dos Servidores da Imprensa (Asdin), Antônio Fúcio, apenas dessa maneira foi possível apresentar todas as reivindicações da categoria ao governo.
A razão da greve foi a perda de 80% da gratificação por produção suplementar, uma espécie de bônus anexado à folha de pagamento que varia de acordo com a produção mensal. Desde outubro de 2000, esse complemento no salário entrou em um processo de defasagem, de acordo com os funcionários. A direção da Imprensa Nacional argumenta que o ganho era irreal e distribuído de forma linear, o que geraria injustiças.
Amanhã, às 15 horas, representantes dos ministérios do Planejamento e Casa Civil discutem com o comando de greve formas de compensar a redução dos salários. Existem duas possibilidades: criação de uma nova gratificação ou incorporação das perdas ao salário dos funcionários. Na sexta-feira, haverá uma assembléia para acabar definitivamente com a paralisação ou recomeçá-la.
Os funcionários voltam ao trabalho hoje, mas Fúcio avisa que será mantido o ''estado de alerta''. Durante a greve, o Diário Oficial da União e o Diário da Justiça foram distribuídos de forma precária. Apenas 15 dos 736 servidores trabalharam normalmente. Com isso, o DOU foi publicado com 150 páginas, em vez das 500 habituais. Mas o grande prejudicado foi o Judiciário. O Diário de Justiça passou 20 dias sem nenhuma página editada.
Artigos
Brincadeira tem hora
Daniel Azulay
Comecei a brincar quando era criança e não parei mais. Não me perguntem a partir de que idade crianças devem começar a brincar, elas já nascem sabendo. Adultos têm essa preocupação quando esquecem que um dia foram crianças e, de repente, se tornam papai e mamãe, precisando reaprender às pressas como é que se faz para brincar com seus próprios filhos.
Comigo tem sido diferente. Como dizia no início, comecei a brincar quando era criança e não parei mais. Apresentei programas infantis pela televisão, construí mais de 2 mil brinquedos de sucata com material caseiro, ensinei muita gente grande e pequena a brincar. Como Gepeto oficial da TV brasileira, vivo brincando em serviço. Por essa razão a vida também gosta de brincar comigo. Às vezes me transforma em peteca, a gente tem que se acostumar com altos e baixos. De repente você não é mais peteca, vira iôiô. Nem tão alto nem tão baixo, sempre a mesma distância, você vai e volta igual ascensorista de elevador.
Quando começo a me acostumar com a rotina, preciso andar mais rápido. Muda a direção, em vez de subir e descer, arranco na frente em disparada. Você se sente um carrinho de autorama em alta velocidade. É assim - faz parte da vida. Também somos joguetes e brinquedos nas mãos do nosso próprio destino.
O ato de brincar é uma resposta natural à nossa ignorância por não saber de onde viemos e para onde vamos. Todo indivíduo emana um campo de força na medida em que procura sua identidade e um lugar ao sol, custe o que custar. Ao brincar, a criança se apropria da realidade para transformá-la em faz-de-conta, descobrindo um universo de possibilidades capaz de se modificar a cada instante. Ela percebe o mundo como eixo de tudo o que acontece ao redor e sente um fascínio irresistível pelo futuro porque raciocina duas vezes à frente do seu próprio tempo. Os pais que desafiam crianças em videogames conhecem a estranha sensação de se sentirem ''menos inteligentes'' do que seus próprios filhos pequenos, quando são derrotados por eles nos jogos eletrônicos.
O que torna a criança de hoje mais criativa é justamente essa capacidade avançada de armazenar informações com inteligência para transformar conhecimentos em novas idéias. É descobrir que está olhando para aquilo que todo mundo está vendo e pensar uma coisa diferente. Quando vê um brinquedo, o adulto entende que aquilo é ap enas um produto. Para a criança, é um mundo mágico que ela pode reinventar no aprendizado da vida, nos sonhos e conquistas de sua imaginação.
Colunistas
COISAS DA POLÍTICA – DORA KRAMER
Um mandato para ex-presidentes
O assunto tramita há tempos na Câmara como emenda constitucional e, de vez em quando, vai e volta nas cabeças e conversas do poder que, no entanto, agora parece disposto mesmo a investir na aprovação da criação da figura do senador vitalício para os ex-presidentes da República.
Fernando Henrique Cardoso, que, sempre foi favorável à idéia, mas manteve-se publicamente reticente para evitar o que vai acontecer agora - que defende uma causa própria -, já autorizou seu pessoal no Parlamento a dar conseqüência ao projeto.
Há um, de autoria do agora ministro da Secretaria Geral da Presidência da República, deputado Artur Virgílio Neto, transitando por uma das comissões da Câmara. Mas, hoje, Virgílio já não está mais disposto a fazer a defesa pessoalmente, por duas razões: uma óbvia, é ministro; outra de caráter pessoal: cansou de acumular derrotas no tema.
Isso porque, não obstante em países como a Itália existir a figura do senador vitalício, aqui no Brasil havia - ou talvez ainda haja - grande resistência. Primeiro, porque quem viveu período de ditadura e conviveu com senadores biônicos, sempre acha esquisito a nomeação de um parlamentar à margem do voto.
Segundo, era preciso saber o que fazer com os ex-presidentes militares. Dar a ditadores lugar cativo no Congresso? Totalmente inadequado. Terceiro, havia o entrave Fernando Collor de Mello. O eleitor de Alagoas elegê-lo é uma coisa, mas a institucionalidade lhe conferir um mandato depois de uma cassação por corrupção é outra completamente diferente.
Mas, nessa altura, deu-se um jeito nas duas últimas questões. O primeiro, foi tomado pela própria vida: morreram todos os generais do regime militar. O segundo, viria no próprio projeto que, ou impediria a concessão da honraria a presidentes afastados do poder ou se faria um texto mais sutil, pelo qual, só teriam direito ao cargo aqueles que tivessem cumprido determinado tempo de mandato. Evitar-se-ia, assim, o constrangimento Collor.
Restaria ainda aquela questão de etiqueta para com FH, a fim de não permitir que ele passasse o último ano de mandato sendo acusado de tentar mudar a lei para arrumar um posto. Aí, os tucanos dividem-se. Uma ala aposta que a emenda estará em discussão no primeiro semestre do ano. A outra, mais prudente, acha que o assunto deve ficar para ser discutido e votado no início do mandato do sucessor.
Como o efeito é, por definição, retroativo - beneficia quem foi, não quem é -, Fernando Henrique estaria, assim, na companhia de Itamar Franco e José Sarney. Seriam apenas esses os beneficiários que, no Senado, teriam direito a voz, mas não a voto.
E por que limitar esse tipo de mandato aos ex-presidentes da República, quando, na Itália, os senadores vitalícios são figuras proeminentes? O cientista político e escritor Norberto Bobbio, por exemplo, é senador vitalício sem nunca ter sido presidente.
Mas um tucano do primeiríssimo time, muito próximo a FH, diz que aqui esse método acabaria dando problemas porque, dado o hábito de se fazer acertos regionais para tudo da política, alguma Excelência, de biografia constrangedora, acabaria por ganhar uma cadeira.
Todas essas conversações estão sendo feitas em relativo sigilo, sob o codinome Operação pós-FH. Com as adaptações necessárias e as articulações bem-feitas, a tese, a rigor, nada tem de indefensável, se analisada sem preconceito político.
Afinal, conferir um lugar no Senado a ex-presidente da República não macula o ambiente - ao contrário - e ainda evita certos desconfortos, como a necessidade de mudar o domicílio eleitoral para garantir eleição nos cafundós do país ou mesmo aceitar empregos em embaixadas na condição de subalterno daquele de quem já se foi chefe.
Com a vantagem, para Fernando Henrique, de que parariam as especulações a respeito de tese a que ele tem verdadeiro pavor: uma provável candidatura a senador por Goiás. FH nem pretende mudar seu domicílio eleitoral de São Paulo, muito menos tem a intenção de sair do governo antes do dia 1° de janeiro de 2003.
Baião-de-dois
O constante entusiasmo externado pelo governador Tasso Jereissati pela candidatura de Roseana Sarney - agora a ponto de louvar os fraquíssimos indicadores sociais do Maranhão - está levando à confirmação de duas suspeitas.
A primeira, de que sua retirada da disputa dentro do PSDB pela vaga a presidente da República, foi apenas uma armadilha para José Serra terminar sendo expulso do jogo pelas circunstâncias.
A segunda desconfiança, já é quase uma certeza incontestável: Tasso Jereissati firmou mesmo parceria com Antonio Carlos Magalhães. ACM, que nunca morreu de amores pela candidatura de Roseana, veria aí uma possibilidade de vingança contra FH e Serra. Coincidentemente, um projeto que não soa nada mal aos ouvidos de Tasso Jereissati.
Editorial
Missão Diplomática
A gestão do engenheiro David Zylberstajn à frente da Agência Nacional do Petróleo foi irretocável. Entre seus muitos méritos, cabe ressaltar a coragem com que enfrentou as reações da Petrobras às medidas que se destinavam a alargar o espectro empresarial do mercado de energia. Acostumada ao cachimbo do monopólio, a estatal entortou a boca e bateu de frente com a ANP em várias oportunidades, sempre que considerou seus interesses atingidos. Zylberstajn, porém, não arredou pé do objetivo de abrir o setor à concorrência, inclusive de grupos estrangeiros. E saiu-se com êxito na missão que lhe foi atribuída: o número de operadoras na exploração de petróleo saltou de uma para 43. Também foi notável a mudança qualitativa nos transportes e na revenda de combustíveis, áreas que passaram a trabalhar em regime de mercado.
Sai David Zylberstajn, por motivos pessoais (pretende dedicar-se à iniciativa privada) e entra em seu lugar o embaixador Sebastião do Rego Barros. A troca pode parecer insólita: o que se pode esperar de um diplomata com a tarefa de substituir um engenheiro à frente da Agência Nacional do Petróleo? Mas apenas para quem não conhece o perfil do novo diretor-geral da ANP. Diplomata experiente e de faro finíssimo, Rego Barros tem profunda intimidade com os temas econômicos. Em seu último posto, na embaixada do Brasil em Buenos Aires, teve atuação preciosa para o Itamarati, ao antecipar com exatidão todas as etapas da crise do país vizinho. Muito antes da revolta popular, bastaram as retiradas dos correntistas que consumiam vorazmente as reservas bancárias, para que desse seu veredicto: a credibilidade virou pó e o governo De la Rúa estava com os dias contados. Acertou na mosca.
Para quem não sabe, Rego Barros também serviu na embaixada do Brasil em Moscou, o que valeu para acumular conhecimentos sobre a questão energética. Por coincidência do destino, a passagem por Moscou lhe será extremamente útil à frente da ANP, já que os russos - produtores e exportadores de gás e petróleo - voltaram a ser peça-chave no tabuleiro internacional da energia. Reaproximaram-se dos EUA e estão dando as cartas, com ameaças de alterar o ritmo de produção. Rego Barros conhece muito bem o jogo dos russos e saberá explorar esse conhecimento em favor dos interesses brasileiros. Da mesma maneira, saberá extrair frutos da convivência com os argentinos e das negociações complexas do Mercosul.
No front interno, o novo diretor-geral da ANP terá a responsabilidade de consolidar o regime de mercado, sem descuidar do equilíbrio da oferta e da política de preços. Também enfrentará o desafio de corrigir mazelas do setor, como a distribuição de gasolina adultera da. O esforço de fiscalização, pelo menos no primeiro momento, exigirá grande parte de seu tempo. Rego Barros deve ficar atento para não perder o rumo com relação à Petrobras. A empresa estatal é voraz (agora com a visão comercial apurada) e não deixará de exercer pressão sobre a ANP. É do jogo, porém, e, a exemplo do que fez Zylberstajn, Rego Barros terá de usar muita diplomacia para conter o apetite da Petrobras. O que não será difícil para um embaixador de primeiríssimo quilate. Até porque quem manda na agenda do petróleo e do gás no Brasil é a ANP.
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01/02/2002
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