Ministro da Justiça lamenta vazamento do caso Siemens e diz que cumpriu a lei
Cardozo isentou o Cade de participação no vazamento de informações sobre o caso
Em audiência pública na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), o ministro da Justiça, Eduardo Cardozo, lamentou o vazamento de informações sobre a investigação da Polícia Federal acerca da possível formação de cartel em licitações de metrô e trens em São Paulo e no Distrito Federal, conhecido como caso Siemens.
Criticado por ter pedido à Polícia Federal que investigasse as denúncias recebidas, o ministro afirmou que, se assim não tivesse feito, estaria cometendo o crime de prevaricação.
A audiência pública foi requerida pelo senador Aloysio Nunes (PSDB-SP), por ter sido citado em notícias da imprensa, junto com outros parlamentares, como supostamente envolvido no caso Siemens. Segundo as notícias, o cartel dos trens repassava valores a empresas de consultoria suspeitas de intermediar o pagamento de propina a parlamentares de vários partidos.
O ministro disse que recebeu denúncias em um documento entregue a ele pessoalmente pelo deputado estadual Simão Pedro (PT-SP) e que enviou tudo para a Polícia Federal. Rebateu as críticas de deputados tucanos, que condenaram o seu comporamento no episódio, ele disse que cumpriu a lei.
- Eu fico às vezes pasmo com uma polêmica que, a meu ver, é absolutamente fora de propósito. Evidente que eu tenho de mandar à Polícia Federal. É isso que diz a lei. E o ministro da Justiça tem que cumprir a lei. Se eu não fizesse, seria acusado de prevaricação – exclamou.
O caso Siemens
Cardozo informou que a empresa Siemens tem sido investigada em vários países pela formação de cartel e pagamento de suborno a autoridades públicas. Segundo o ministro, diante da realidade mundial, a empresa decidiu adotar uma política de reparação desses erros, colaborando com as investigações.
No Brasil, a Siemens procurou o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e propôs a realização de um acordo de leniência, pelo qual a empresa reconhece que praticou irregularidades e passa informações. Em troca, não é responsabilizada pelos ilícitos que denuncia, o que é chamado de 'delação premiada'. O ministro afirmou que, após esse acordo, foram feitas ações de busca e apreensão em várias empresas e que há outros procedimentos em curso no Cade também relacionados à Siemens.
Em seguida, Cardozo explicou que recebeu do deputado Simão Pedro uma denúncia por escrito, relacionada com o assunto. O ministro detalhou a entrega desse documento, que, segundo ele, foi feita pessoalmente em sua casa em São Paulo no dia 12 de maio.
O ministro não deu detalhes do documento, pois faz parte de investigação sigilosa em andamento na Polícia Federal. No entanto, disse que o material não é assinado e que a pessoa que o produziu narra os fatos, explica por que sabe dos fatos, cita o acordo de leniência entre a Siemens e o Cade, diz que tem mais informações a fornecer e que as repassaria às autoridades se obtivesse um cargo numa empresa na qual o governo tem influência.
- Posteriormente, há uma relação, ainda nessa parte, de políticos envolvidos. Alguns dos nomes mencionados me espantam. Inclusive há amigos aqui relacionados, amigos pessoais e pessoas que eu respeito imensamente – disse.
Cardozo disse que o documento traz uma tabela de nomes com as relações que manteriam com diretores e com políticos. Por fim, segundo o ministro, haveria ainda duas cartas, uma em inglês dirigida a “Dr. Jordan” e outra em português, dirigida a “prezados senhores”.
- A segunda carta tem vários pontos comuns com a primeira, mas tem novos dados que se harmonizam com a parte inicial do documento. Enquanto a carta em inglês relaciona 11 anexos, a carta em português relaciona seis anexos – revelou.
Esses anexos seriam documentos, fotos, planilhas, contratos e matérias de jornais. Como o documento não foi assinado, o ministro disse que recebeu uma recomendação de cautela por parte do deputado Simão Pedro e que, por isso, entregou o material nas mãos do diretor-geral da Polícia Federal, Leandro Daiello Coimbra, para que ele verificasse se o material tinha sentido e tomasse as providências cabíveis.
- E realmente a cautela me parece que se impunha necessária. Vazar documentos apócrifos prejudica investigações sigilosas e, além disso, pode prejudicar a honra e a imagem de pessoas que podem ser atingidas indevidamente, antes que uma investigação se realize – afirmou.
Quem entregou o dossiê
Segundo Cardozo, houve uma confusão relacionada a quem teria entregado o material à Polícia Federal, porque, durante o percurso do documento para a avaliação na Polícia Federal, um dos delegados se enganou e pensou que tivesse vindo do Cade.
- O Cade sempre faz um trabalho conjunto com a Polícia Federal. Porque o Cade apura cartel. A Polícia Federal, corrupção – explicou Cardozo.
O ministro esclareceu que não houve nenhuma operação da parte dele para blindar o Cade, embora não houvesse nenhum problema se o Cade tivesse obtido o material.
O questionamento sobre as denúncias terem vindo do Cade foi levantado pela imprensa pelo fato de o presidente do órgão, Vinícius Carvalho, ter trabalhado, em 2004, com o deputado Simão Pedro.
Suposta adulteração
O ministro também rebateu a versão de que dois dos anexos que estavam no material recebido do deputado teriam sido adulterados, e que a tradução teria sido mal feita. Cardozo afirmou que os documentos que estão em inglês e em português são diferentes, embora apresentem trechos iguais.
- Possivelmente foram baseados no mesmo texto, mas dirigidos a pessoas diferentes, ora com mais detalhes ora com menos. Isso é de uma evidência total – disse.
Cardozo acrescentou que pediu à Polícia Federal para examinar tudo, cabendo a ela determinar se houve fraude ou não.
Ele respondeu ainda às críticas do senador Aécio Neves (PSDB-MG), para quem o ministro não poderia mais chefiar a investigação.
- Seja como for, o ministro da Justiça não lidera, não coordena a investigação. Ele pode pedir, mas quem coordena é o delegado de polícia, que, nesse caso, já cuidava desse inquérito desde 2008, não foi escolhido por ninguém – afirmou.
Vazamento seletivo
O senador Aloysio Nunes disse que a polêmica em torno do caso aconteceu por causa do vazamento de documentos e que acabou atingindo a sua imagem.
- Eu me senti atingido por um vazamento de um documento cuja autoria não sei se já foi esclarecida, cujo suposto autor renegou em todo ou em parte o documento e, no entanto, meu nome está lá. Foi para o Jornal Nacional, foi para o Estado de S. Paulo – lamentou Aloysio Nunes.
Lamentando o vazamento, José Eduardo Cardozo falou que essa e outras situações relacionadas com o vazamento estão sendo apuradas e que os culpados, se forem identificados, serão punidos.Cardozo disse que o vazamento prejudica o mecanismo da delação premiada.
O senador José Agripino (DEM-RN) criticou o que achou ter sido uma intenção de vazamento seletivo contra o PSDB e o DEM, pois, apesar de outros partidos estarem envolvidos, apenas os dois foram ressaltados na imprensa.
- Nós estamos querendo que a investigação seja feita com isenção, em que esses vazamentos seletivos tenham a possibilidade de serem rebatidos – reclamou.
Os senadores Alvaro Dias (PSDB-PR), Cícero Lucena (PSDB-PB) e Aloysio Nunes pediram ao ministro que também investigue casos de cartel em outros estados. Alvaro pediu uma investigação sobre o cartel do leilão de Libra, que, segundo ele, deve ser o maior cartel do Brasil.
- Nós desejamos sim, completa, cabal e rigorosa investigação. Mas não só em relação a São Paulo. Não há por que estabelecer pesos diferentes entre o que ocorre igualmente em várias praças – disse o senador paranaense.
Aloysio Nunes citou casos de licitações de trens em Belo Horizonte e em Porto Alegre que indicariam a existência de cartéis. Cardozo lhe pediu para encaminhar ao ministério as informações de que dispõe, de maneira que elas possam ser investigadas.
03/12/2013
Agência Senado
Artigos Relacionados
Ministro da Justiça esclarece atuação no caso Siemens
CCJ ouve ministro da Justiça sobre 'caso Siemens'
CCJ poderá convidar ministro da Justiça para explicar 'caso Siemens'
Caso Siemens gerou desconforto no Cade, diz procurador-geral
Aloysio Nunes repudia menção a seu nome no caso da Siemens
CRE quer ouvir ministro da Justiça sobre caso FBI-Abin