Para debatedores na CDH, modelo econômico gera conflitos no campo
Marcando os 17 anos do massacre de Eldorado do Carajás - conflito com policiais militares, no Pará, que resultou na morte de 21 trabalhadores sem terra em 1996 -, a audiência da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) desta quarta-feira (17) foi marcada por críticas à impunidade e à morosidade da Justiça, considerando que esses fatores estimulam a continuidade da violência.
Antônio Escrivão Filho, coordenador executivo da organização de direitos humanos Terra de Direitos, atribuiu a violência no campo ao descumprimento da função social da terra e classificou a impunidade como "padrão institucional" do Estado brasileiro diante das violações de direitos dos "povos da terra":
- Quando mandantes percebem que o Estado não tem vontade política para investigar esses crimes, sentem-se estimulados para cometer mais crimes - afirmou.
Para ele, o Poder Judiciário ainda resiste a dialogar com os movimentos sociais, quando precisaria dar tratamento especial às ações coletivas fundiárias e se afastar da cultura do despejo forçado. Ele afirma que os movimentos sociais estão atentos para esclarecer aos operadores da Justiça a realidade do campo.
Alessandra Lunas, vice-presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), criticou o "modelo de desenvolvimento concentrador" que gera conflitos agrários - conforme ressaltou, a África e a América Latina apresentam os maiores índices de violência no campo - e que se põe como desafio para os movimentos sociais e o governo brasileiro. Ela defendeu a agricultura familiar como instrumento de soberania alimentar, afirmando que é preciso disseminar a consciência de que a concentração de terras "vai doer no bolso" do povo, e pediu a federalização do julgamento de conflitos agrários.
Elisângela dos Santos Araújo, coordenadora-geral da Federação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar (Fetraf), considera fundamental para o Brasil avançar na reforma agrária. Ela tratou das várias formas de violência no campo, situação que atinge mais fortemente os negros e as mulheres, alertando que essa violência não é vista devidamente pela sociedade:
-- Para nós, tudo isso tem um sentido: o modelo de produção que temos no país, que destrói a natureza e apresenta uma grande concentração fundiária - disse, denunciando a "estrangeirização" das terras brasileiras.
Ela define que a persistência dos conflitos no campo desafia as políticas dos governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff para o fortalecimento dos assentamentos e pela agricultura familiar.
Por sua vez, Alexandre Conceição, diretor da coordenação nacional do MST, lamentou que, 17 anos depois de Eldorado do Carajás, o Judiciário ainda seja "classista" e "criminalizador dos movimentos sociais e da política". Ele criticou a lentidão do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) nas desapropriações de terras, e cobrou a discussão de um modelo alternativo ao agronegócio:
- Reforma agrária não é um programa compensatório, mas um programa para produzir alimento barato e saudável.
Antônio Canuto, secretário da coordenação nacional da Comissão Pastoral da Terra (CPT), divulgou dados do relatório anual da entidade, salientando o aumento de 24% dos assassinatos de trabalhadores rurais entre 2011 e 2012. Canuto denunciou as pressões sobre as terras de índios e quilombolas, "grupos humanos que não se enquadram no capitalismo", e a continuidade do modelo de desenvolvimento predatório. Ele condenou os parlamentares da bancada ruralista, que, em seu ponto de vista, têm impedido o avanço da luta dos trabalhadores.
Representante do Incra na Comissão Nacional de Combate à Violência no Campo, Cláudio Rodrigues Braga sublinhou que a lentidão do Poder Judiciário em conflitos agrários aumenta onde a distribuição de renda é pior, e disse que o Estado tem que ter muita habilidade para atuar de "forma harmônica" nesses casos.
17/04/2013
Agência Senado
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