Parlamentares têm pouco tempo para concluir votações







Parlamentares têm pouco tempo para concluir votações
Prazo oficial é de uma semana, mas deve ser ampliado para resolver projetos polêmicos

BRASÍLIA - Oficialmente, Câmara, Senado e Congresso têm apenas uma semana de trabalho pela frente e muitos projetos polêmicos para votação.

Entre eles, o reajuste do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), o projeto que regulamenta a aposentadoria complementar para o servidor público e a emenda constitucional que permite a participação de capital estrangeiro nas empresas de comunicação, na Câmara, e própria votação do Orçamento-Geral da União para o ano que vem, no Congresso.

Por isso, os presidentes da Câmara, Aécio Neves (PSDB-MG), e do Senado, Ramez Tebet (PMDB-MS), decidiram prorrogar a sessão das duas Casas por pelo menos mais uma semana. E, se for preciso, vão convocar deputados e senadores para trabalhar na semana entre o Natal e o Ano Novo.

O Congresso não pode entrar em recesso enquanto não votar o Orçamento para 2002. E, se não o fizer até o fim do mês, o governo será obrigado a inciar o ano sem poder fazer investimentos: só poderá gastar com folha de pessoal e juros da dívida até a aprovação. O PT tem obstruído as sessões da Comissão Mista de Orçamento, para obrigar o governo a incluir na proposta um aumento maior do que o previsto para o salário mínimo.

Entre os projetos que não são polêmicos está a emenda constitucional que restringe a imunidade parlamentar, abrindo a possibilidade de que congressistas sejam processados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por crime comum sem necessidade de licença prévia da Câmara ou do Senado. A emenda constitucional que permite às prefeituras criar taxa de contribuição para a iluminação pública também está no Senado e deverá ser aprovada sem problemas.

O projeto que limita a imunidade foi aprovado pela Câmara assim que a pauta foi destrancada, com a votação da mudança na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), e encontra-se agora no Senado. O relator da proposta, senador José Fogaça (PPS-RS), promete entregar seu relatório até amanhã. A emenda deve ser votada quarta-feira pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado.

A Câmara deve votar também o projeto que regulamenta a atividade dos lobistas. O líder do PPS, Rubens Bueno (PR), autor de emenda que pode resolver a pendência sobre a constitucionalidade do projeto, disse que o texto é consensual. Para ele, o Congresso não pode conviver com escândalos como o do lobista Alexandre Paes dos Santos, acusado de extorsão no Ministério da Saúde e pagamento de propinas a deputados federais.

O Senado tem na pauta desta semana um projeto de lei complementar bastante polêmico: o que cria as regras para o trabalho temporário nas empresas urbanas e dispõe sobre as relações de trabalho na empresa de prestação de serviços a terceiros. Por ser lei complementar, o projeto só será aprovado se obtiver o voto de 42 senadores, metade da Casa.

Combustíveis - A questão mais urgente no Senado é a emenda constitucional que estabelece as contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico (Cide). Para acelerar sua tramitação, os senadores fizeram sessões deliberativas na segunda-feira passada e na sexta-feira - o normal é que sessões de votação ocorram de terça a quinta-feira. Com isso, foi possível antecipar para amanhã a votação da emenda em plenário.

Para o Palácio do Planalto, esse é o projeto de maior urgência, porque a Cide substitui a Parcela de Preços Específica (PPE), a chamada conta petróleo, que estará extinta a partir do dia 31. Sem contar com um substituto para a PPE, o governo não poderá dar início à livre importação de petróleo, pois poderia ser denunciado à Organização Mundial do Comércio (OMC) por cobrança de taxa ilegal.

A PPE é um arranjo brasileiro. Permite que sejam arrecadados pelo Tesouro Nacional mais de R$ 5 bilhões anuais por intermédio da diferença entre o preço dos combustíveis vendidos aos postos pela Petrobrás e o valor que consta da nota fiscal. (G.G. e J.D.)


Procuradores criticam ação de Alckmin
Conselheiros da PGE atacam recurso no Supremo para manter chefe da instituição

Revoltados com a ação direta de inconstitucionalidade que o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), levou ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra o artigo 100 da Constituição paulista, todos os conselheiros eleitos da Procuradoria-Geral do Estado assinaram carta aberta por meio da qual alertam que a "instituição nunca esteve tão perto da desintegração". O levante - inédito na história da PGE - pode provocar renúncia em bloco dos ocupantes de cargos de confiança na cúpula da procuradoria.

Os conselheiros acusam a procuradora-geral, Rosali de Paula Lima, de ignorar "interesses e conquistas" da categoria. "O elo de governabilidade na PGE está em risco absoluto e o que se espera da chefe da instituição é que assuma suas responsabilidades", desafiam os rebelados por meio da carta distribuída nos gabinetes da procuradoria e no Palácio dos Bandeirantes.

O artigo 100, parágrafo único, estabelece que o procurador-geral "será nomeado pelo governador, em comissão, entre os procuradores que integram a carreira". A regra não contempla aposentados - caso de Rosali, que assumiu o cargo em setembro de 2000, escolhida pelo então governador Mário Covas, morto em março.

Em novembro, o juiz Paulo Eduardo de Almeida Sorci, da 9.ª Vara da Fazenda, decretou o afastamento de Rosali ao conceder tutela antecipada em ação civil do Sindicato dos Procuradores do Estado, das Autarquias, Fundações e Universidades. Menos de 24 horas depois, a procuradora foi reconduzida por decisão do presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Márcio Martins Bonilha.

A ação contra Rosali foi decidida em assembléia pelo sindicato depois que ela teria concedido aumento de até 33,3% sobre a verba honorária exclusivamente aos 29 integrantes do alto escalão.

Legitimidade - O impasse sobre a legitimidade de Rosali no posto levantou polêmica acerca da legalidade dos atos praticados por ela.

Nesses 15 meses de comando da PGE, Rosali representou o palácio em ações de grande interesse do governo. Vinculada ao governador, a PGE exerce a advocacia do Estado - promove consultoria jurídica e atua nos processos de interesse da Fazenda, inclusive nos tribunais federais.

Para alguns procuradores, os atos de Rosali "são nulos". O presidente do sindicato, Vitore André Zílio Maximiliano, tem outra interpretação. Ele entende que caberia nulidade desde que configurado prejuízo à parte interessada. Além disso, o sucessor de Rosali poderia convalidar suas medidas.

Na semana passada, disposto a evitar riscos de ordem jurídica para o governo, Alckmin foi ao STF contra o artigo 100, sob argumento de existência de "vício formal " e "simetria com a Constituição Federal" - o chefe da Advocacia-Geral da União não é necessariamente da carreira. Os procuradores temem que se o Supremo revogar o artigo, Alckmin mantenha Rosali ou nomeie um sucessor desvinculado da carreira.

Retrocesso - Na carta aberta, os rebelados destacam:

"Recebemos a notíca de que o senhor governador, orientado por sua procuradora-geral, ingressou com ação no STF; à primeira vista, nos pareceu que se tratava de mero exercício de direito de petição, o que faz parte do jogo democrático, mas ao aprofundar a análise da questão verificamos que o problema é muito mais profundo e grave."

O Conselho da PGE - presidido pelo procurador-geral -, é formado por 14 procuradores e subprocuradores-gerais. Nove são eleitos pela classe e cinco são membros natos. "A situação é muito grave; o estrago está feito", avaliam os eleitos. Para eles, "eventual vitó ria da tese do governo levará à perda da conquista constitucional" de que o procurador-geral tem de ser da carreira. "Sabemos o que significa a perda de garantia constitucional, retrocesso inadmissível."

Inconformados, procuradores observam que, ao recorrer ao STF, Alckmin "admitiu que Rosali está onde não deveria estar". Para eles, "a responsabilidade é dela: enquanto advogada e jurista, sabia que não poderia assumir o cargo".


PSDB paulista tenta ampliar alianças
Campanha pela reeleição de Alckmin deve reunir partidos adversários na esfera nacional

Diante da indefinição do candidato governista à Presidência, o PSDB paulista tenta se dissociar do processo sucessório nacional e quer formalizar o quanto antes uma ampla coligação de apoio à reeleição do governador Geraldo Alckmin (PSDB). Mesmo que para isso se alie a partidos adversários do representante do presidente Fernando Henrique Cardoso na corrida presidencial. O líder do PTB na Assembléia Legislativa, Campos Machado, o deputado Vitor Sapienza (PPS) e o presidente regional do PFL, Cláudio Lembo, foram convidados de honra da convenção estadual do PSDB, no sábado, que lançou Alckmin para uma nova disputa em São Paulo.

PPS e PTB já fecharam acordo para apoiar o ex-ministro Ciro Gomes (PPS) à Presidência, feroz opositor do governo federal. O PFL anda às turras com o PSDB por pleitear a cabeça de chapa da candidatura governista para Roseana Sarney, que dirige o Estado do Maranhão. Nada disso constrange os tucanos paulistas. As três legendas apóiam a bancada de Alckmin na Assembléia e, se confirmada, a coligação pode garantir ao governador um trunfo precioso em 2002: provavelmente o maior tempo disponível no horário eleitoral gratuito no rádio e na televisão.

"Nossa coligação está praticamente definida e a convenção deixou isso claro", afirmou o presidente do PSDB paulista, o deputado Edson Aparecido.

"A questão nacional é importante, mas acreditamos que uma aliança mais ampla em São Paulo vai existir."

Consenso - O presidente do PFL tem discurso semelhante.

"O partido está fazendo tudo para apoiar Roseana, mas aqui há consenso de que devemos caminhar com Alckmin", declarou Lembo. "O caminho não está traçado, mas está nitidamente delineado." Já o PTB participa do governo estadual - ocupa a Secretaria da Habitação - e não dá mostras de que pretenda assumir rumo próprio.

É o PPS quem está mais perto de frustrar os planos tucanos. Apesar de não descartar uma aliança com o PSDB, o presidente regional do partido reeleito ontem, deputado Arnaldo Jardim, disse que a legenda não deverá abrir mão de construir um palanque em São Paulo para Ciro Gomes. "Só vamos decidir a candidatura em maio ou junho", afirmou Jardim. "Mas nossa prioridade é a campanha de Ciro Gomes." O próprio candidato, na semana passada, fez um apelo para que as alianças regionais sejam definidas apenas depois de fechado o quadro nacional. O deputado negou que a presença do colega Vitor Sapienza demonstre o apoio do partido ao PSDB no ano que vem.

Outro desafio do PSDB será compor a chapa com tantos partidos. A legenda tradicionalmente não cede a vaga de vice a outro partido. O PFL não abre mão de uma das vagas para o Senado, destinada à reeleição do senador Romeu Tuma.

Se admitida a hipótese de que o ministro da Educação, Paulo Renato Souza (PSDB), ocupe a segunda vaga, não há margem para negociação com as demais legendas.


Acordo sobre correção do IR pode sair amanhã
Líderes aliados aderem ao índice de 17,5% apoiado pelo governo e PT aceita votá-lo

BRASÍLIA - O presidente da Câmara, Aécio Neves (PSDB-MG), reunirá amanhã os líderes de todos os partidos para acertar a data da votação do projeto de lei que reajusta a tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF). A intenção é fechar um acordo para que ainda na terça-feira seja votada a urgência e na quarta, a proposta. Desse modo, o projeto poderia seguir no mesmo dia para o Senado, onde o presidente, Ramez Tebet (PMDB-MS), já disse que será votado imediatamente.

O governo concorda com uma correção de 17,5%. O PFL e o PMDB, que vinham defendendo um reajuste linear de 20%, com os partidos de oposição, decidiram aderir aos 17,5%. E o líder do PT na Câmara, Walter Pinheiro (BA), disse que sua bancada aceitará a votação do projeto que tem o apoio da base do governo.

"Nós queremos votar a correção do IR", afirmou Pinheiro. "O governo fica fazendo jogo de empurra para tentar levar a votação da proposta para o ano que vem. Então, vamos votar o projeto do jeito que está." O petista explicou que, em seguida à votação, a bancada apresentará emenda elevando a correção para 20%. "Nesse caso, quem tiver mais votos vencerá."

O deputado Benito Gama (PMDB-BA), relator do projeto de correção do IR, argumentou que não dá para ficar esperando a boa vontade da equipe econômica na definição de uma alternativa para o reajuste. "É isso que o governo quer:
não decidir nada este ano." O Palácio do Planalto tem alegado que qualquer reajuste na tabela provocaria queda de arrecadação e é preciso encontrar maneiras de compensar essas perdas.

Benito disse que o PMDB é contra parcelar a restituição do IR, como chegou a ser defendido na semana passada por alguns governistas. Segundo ele, isso caracterizaria confisco, proibido pela Constituição. Outra proposta que o partido rejeita é a de criar as alíquotas de 30% e 35% na tabela.

Para o relator, caberá ao governo administrar o Orçamento, pois deve haver uma redivisão das despesas com a mudança da tabela. Benito contou que desistiu de incluir na emenda um gatilho que permitisse corrigir o IR todo ano, pois achou que seria mais uma polêmica que o governo poderia usar para adiar ainda mais a aprovação do projeto. "Farei isso no próximo ano", prometeu.

Mínimo - A votação do projeto que corrige o IR é uma das exigências do PT para desobstruir os trabalhos da Comissão Mista de Orçamento. As outras são incluir na proposta orçamentária o aumento do salário mínimo para R$ 220 e o recálculo da dívida dos pequenos e médios agricultores. Pinheiro disse que, se esses três itens não foram incluídos na pauta de votação da Câmara, o PT continuará a obstrução, exigindo votação nominal em todas as sessões, e o governo terá de mobilizar sua base para garantir quórum nas sessões da comissão.
Os parlamentares da comissão encarregados de discutir a inclusão no Orçamento de aumento superior aos R$ 189 propostos pelo governo reúnem-se hoje para discutir as opções. Segundo o deputado Ricardo Barros (PPB-PR), líder do governo na comissão, não há fonte de arrecadação para valor superior a R$ 189. "O governo não sacrificará projetos sociais beneficiados pelo Orçamento para garantir um reajuste maior." O líder do governo na Câmara, Arnaldo Madeira (PSDB-SP), disse que só é possível falar em reajuste maior se o Congresso encontrar fontes de receita. "Sem a fonte não há condição de falar em reajuste do mínimo."

Barros avalia que não há tempo para identificar receitas que garantam o aumento proposto pela oposição. O relator-geral do Orçamento, Sampaio Dória (PSDB-SP), já admite que não deverá incluir qualquer taxa de reajuste, porque não há tempo.

Para o deputado João Coser (PT-ES), após a pressão da oposição é quase certo que o mínimo chegue a R$ 200, pelo menos. Ele acha que há boa possibilidade de acordo em torno de R$ 210. Quanto às fontes de arrecadação, disse que a questão é de vontade política. "O Orçamento é de quase R$ 1 trilhão."


PT do Rio faz prévia para definir candidato
O candidato do PT que disputará as eleições para o governo do Rio no ano que vem deverá ser conhecido hoje. Ontem, filiados do partido foram às urnas para escolher entr e a vice-governadora Benedita da Silva e o deputado federal Milton Temer. O comparecimento foi considerado fraco. Para que a prévia seja válida, é necessário que haja maioria simples (50% dos votos mais um) em 36 municípios fluminenses. Caso contrário, a escolha será apenas indicativa e a decisão será tomada no ano que vem, durante a convenção do partido.


Grande SP prefere Lula e Serra, mostra pesquisa
Pesquisa qualitativa do Instituto Retrato mostra que os eleitores da Grande São Paulo levam em conta dois nomes à sucessão presidencial: o ministro da Saúde, José Serra (PSDB), e Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Os eleitores até conhecem outros candidatos, como Roseana Sarney (PFL), mas não levam fé em seus planos. "Há dois líderes claros: Fernando Henrique Cardoso e Lula.

Serra está associado ao presidente. Os outros são vistos como líderes regionais", diz Maria Teresa Monteiro, diretora do instituto.


Ex-ministro defende regras para lobby
Para Costa Porto, os grupos de pressão têm de ser registrados e prestar contas

BRASÍLIA - Embora largamente exercido, o lobby é uma atividade que ainda assusta. No Brasil costuma ser associado à contravenção, à obtenção de vantagens e ao pagamento de propinas. O advogado, cientista político, professor universitário e ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Walter Costa Porto é um dos raros especialistas em lobby no País. Defende sua regulamentação, porque considera a atividade essencial para a democracia.
Com a regulamentação, argumenta, os representantes dos grupos de pressão terão de ser registrados em algum lugar. No Legislativo, no Executivo, talvez na Corregedoria-Geral da União. Assim, prestarão contas de suas atividades com os livros contábeis e pagarão multas quando gastarem acima de determinado valor. Poderão ser descredenciados e responder a processo quando pegos em irregularidade.

Para Costa Porto, responsável pelo primeiro texto sobre regulamentação do lobby - que no Congresso foi apresentado no fim da década de 80 pelo então senador (hoje, vice-presidente) Marco Maciel -, é necessário partir de alguma coisa. O projeto de Maciel foi copiado da lei dos Estados Unidos. A intenção, diz o professor, era dar início ao debate.

A Câmara, no entanto, considerou que a iniciativa não poderia ser adotada por projeto de lei e sim por projeto de resolução. O recente escândalo envolvendo um lobista em casos de tentativa de extorsão no Ministério da Saúde obrigou o ministro-chefe da Casa Civil, Pedro Parente, a proibir o exercício do lobby no Executivo, até que a atividade seja regulamentada. Os deputados despertaram para o tema e agora querem regular a atividade. Com o apoio de todos os partidos, a Câmara aprovou na semana passada um requerimento de urgência para a votação do projeto de Maciel. A proposta pode ser votada esta semana.

Estado - Como surgiram os grupos de pressão, conhecidos como lobbies?
Walter Costa Porto - A questão é a da representação. No sistema grego, toda a população se reunia na ágora para debater questões de seu interesse.

Discutiam aquilo tudo e tomavam uma decisão. Era mais fácil, porque a cidade era também o Estado. Falavam de tudo o que tocava de perto o cidadão: a paz, a guerra, suas propriedades, se poderiam ser transformados em servos ou escravos. Mas a sociedade evoluiu. Por isso, o Estado moderno, com sua grandeza geográfica, criou o sistema de representação. Você vota em pessoas que, em seu nome, vão decidir tudo. Os grupos de pressão acabam sendo uma correção desse sistema de representação. Faz com que grupos sociais motivados influenciem ou tentem influenciar as decisões.

Estado - Essa atividade não pode ser exercida pelo partido, que existe para brigar pelo poder?
Costa Porto - A divisão que todos os cientistas políticos fazem é esta: os partidos visam a alcançar o poder; os grupos de pressão, a influenciar o poder. A diferença fundamental é que os partidos são, na maior parte dos países, recenseados. No Brasil temos 30 partidos. Os grupos de pressão são irrecenseáveis. Primeiro, porque poucos são exclusivos. A maioria é formada por grupos sociais que formal ou informalmente fazem pressão. Depois, recuam para seu leito normal. Por isso é que 99,99% dos grupos de pressão são eventuais.

Estado - Qual é o maior grupo de pressão?
Costa Porto - Diria que é a Igreja Católica, porque em cada localidade há um padre com seu púlpito para fazer pressão. Você pode ter a certeza de que logo vão começar a falar contra a clonagem.

Estado - Quais exemplos o senhor poderia dar da atuação do lobby da Igreja?
Costa Porto - Eu vi na Câmara um trabalho enorme dos grupos favoráveis e contrários ao divórcio. Ligavam para as mulheres dos deputados e diziam que por enquanto estavam felizes, mas poderiam ficar infelizes; depois, fui à Igreja e o padre dizia que o fogo do inferno estava reservado para aqueles que lutavam pelo divórcio, porque iriam destruir a família. É assim que funciona: os grupos pressionam dos dois lados.

Estado - O senhor poderia dar um exemplo de um grupo que existe exclusivamente para fazer pressão?
Costa Porto - Cheguei a conhecer um. Até 1950 existiu a Legião Eleitoral Católica (LEC). Meu pai era político, católico e contava que o bispo do Recife chamava os candidatos e expunha os pontos fundamentais da Igreja. Se você não topasse aqueles pontos, os padres iam para as missas para dizer que não era muito recomendável o católico votar em determinado candidato. Faziam a lista dos elegíveis pelos católicos. Era um grupo exclusivo.
Estado - Pode citar algum grupo não-exclusivo?
Costa Porto - A Rede Globo. Quando ela atua na defesa de um candidato, na ajuda à aprovação, por exemplo, desse projeto da mudança na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), ela está procurando influenciar o poder, não alcançar o poder.
Estado - O que o senhor acha do projeto que regulamenta o lobby?
Costa Porto - Ajudei o então senador Marco Maciel a fazer o projeto.
Trata-se de uma cópia da lei norte-americana, porque os Estados Unidos são o único país a regular os grupos de pressão. O projeto procura defender a transparência da atividade. Para encontrar os que podem e não podem ser tolerados. Os diversos grupos teriam de ser registrados, mostrar a contabilidade e pagariam multas se ultrapassassem determinados gastos. É assim que funcionam nos EUA. Na Câmara, já são registradas as pessoas jurídicas que desejam influenciar os projetos.

Estado - Em que Poder a atuação do lobby acab sendo mais forte?
Costa Porto - No Legislativo. Lá, você leva anos discutindo um projeto. Um grupo pressiona de um lado, o segundo de outro, de forma que o projeto termina equilibrado, atendendo aos dois lados. Não há sobre o Executivo? Só há. E não há sobre o Judiciário? Pouco, mas há. Quando a CUT faz uma mobilização na frente do Legislativo, do Executivo ou do Judiciário, está fazendo pressão. Hoje, é um dos maiores grupos de lobby do País. Quando os evangélicos se unem, tornam-se fortíssimos. Hoje já ultrapassaram os 50 deputados.


Artigos

A face anti-social do corporativismo
MARIO CESAR FLORES

Nos confrontos capital-trabalho, a greve é útil ao empregado para "acertar" com o empresário melhores condições salariais e de apoio social.
Quando ela ocorre, empregados e empregadores podem ganhar, perder ou ganhar e perder, em compromisso negociado ou imposto pela Justiça.

Nos confrontos Estado-corporativismo público, os servidores podem não ganhar ou ganhar menos do que pretendiam, mas nunca perdem. Quem perde sempre é o povo, vítima da complacência da lei e do Poder Público e da intolerância e insensibilidade quanto ao possível, do corporativismo público, para cujas lideranças negociaç ão é quase sinônimo de capitulação. Essa é a realidade, pelo menos a das categorias capazes de pressionar o Poder Público usando o povo e a vida nacional como reféns: saúde, previdência, segurança, educação, outras?
O problema é complexo: a Constituição dá ao servidor civil (apenas ao civil, razão por que paralisação de policiais militares não é greve, é motim) o direito de greve, condicionando-o aos termos e limites da lei nela preconizada. Lei 13 anos depois não formulada, mas necessária para disciplinar o direito (?) anti-social de minorias fazerem mal à maioria, transparente, por exemplo, nas greves da previdência pública e das unidades de saúde que servem ao povo humilde.

Ou na greve de professores universitários, que compromete a vida de centenas de milhares de jovens e da própria idéia da universidade pública, em razão do prejuízo causado aos alunos e ao ensino público. Nesta, com um detalhe:
entre as pretensões corporativas, ou assim apresentadas pelas lideranças apoiadas por minorias que vociferam chavões com o punho fechado, algumas efetivamente razoáveis, ainda que nem sempre exeqüíveis, e outras praticamente inviáveis sem prejuízo para outros encargos do Estado, desponta o repúdio à retribuição por mérito, preterida pela "politicamente correta" igualdade na mediocridade, corporativamente "democrática" porque, compreensivelmente, a maioria não se destaca pelo mérito, no serviço público ou fora dele, aqui e no mundo.

O descaso pelo equilíbrio ponderado é refletido em afirmações de lideranças sindicais, sempre bem veiculadas pela mídia, entre elas algumas sobre as recentes medidas de cerceamento da permissividade, do tipo "a Universidade não vai aceitar" ou "o governo está reeditando mecanismos da ditadura com o objetivo de conter a pressão legítima da socidade". Essa - curiosa, porque subentende que a pressão corporativa é pressão da sociedade, e não contra os interesses dela - subentende que prejudicar tanta gente (no caso do INSS, gente da parcela mais mal aquinhoada da sociedade brasileira) seria uma virtude democrática vedada pelo autoritarismo, mas permitida pelo Estado democrático de Direito!

Nesse qüiproquó, o STF já se manifestou contrário às ou complacente com as greves sem a lei reguladora-protetora do povo, mas, independentemente disso e a despeito de seu conteúdo anti-social, as greves continuam. Por vezes ao amparo de sentenças que deveriam limitar-se ao julgamento do caso específico, em função da lei pertinente, mas que, vez ou outra, são complementadas por críticas às políticas públicas. No fundo, um "arranhão" tanto no conceito da divisão de Poderes, pois o julgamento das políticas da alçada do poder eleito cabe ao povo nas eleições, como na afirmação constitucional de que os Poderes são independentes e harmônicos, um tanto comprometida pela independência desarmônica.

Ou o Brasil reformula seu corporativismo público, hoje o setor que mais resiste à modernização inerente à época - o que exige a revisão de temas como estabilidade, contratação pela CLT e terceirização (excluídas carreiras de Estado), valorização por mérito, direito de greve e previdência pública (seu complicado equacionamento no tempo) -, ou o Brasil continua muito sujeito aos humores corporativos, entre eles os efeitos da saudade do estatismo, que assegurava mais espaço institucional ao serviço público, prevalecente dos 1930 aos 1970/80, com seus períodos e regimes mais ou menos autoritários.

Essa realidade deveria preocupar os setores políticos que apóiam à outrance o corporativismo público por convicção estatista, oposicionismo ou interesse eleitoral. Afinal, se e/ou quando se tornarem responsáveis protagônicos pela condução dos negócios públicos, provavelmente se depararão com ocasiões em que terão de optar entre, de um lado, o povo e a lei a serviço do povo e, do outro, o corporativismo público.


Colunistas

RAQUEL DE QUEIROZ

Voto não leva assinatura
Olha, essa história de eleições para tantos cargos anda nos invocando muito, mormente a nós, mais velhos. O difícil naipe de candidatos, os nomes impostos de baixo para cima, o aparente desinteresse popular pelos partidos e seus líderes, tudo nos parecia muito desanimador. Mas, de repente, nós, e muita gente, como nós, fomos nos apercebendo que o povo está se interessando pela eleição. Se interessando pelo voto - pelo ato de votar. Descobriram que votar é uma prerrogativa conquistada, descobriram - lá nos seus próprios termos o que nós, mais pomposamente, chamamos de "exercer o nosso direito de cidadania".

Tenho conversado com muita gente. Jovens, meia-idade, pobres, ricos, profissionais, biscateiros, funcionários, professoras, camelôs, manicures, babás, cozinheiras e o vasto espectro das chamadas prendas domésticas. E essas conversas nos dão a entender que os do povo estão descobrindo que o voto não é apenas uma obrigação periódica que, bem administrada, lhes poderia dar algumas mínimas e duvidosas vantagens materiais; uma espécie de fenômeno sazonal que eles deviam aproveitar na hora, sem jamais pensar nos seus efeitos a longo alcance. Agora, descobrem que o voto é um direito, que naquele momento importante, dentro da cabine indevassável, estão eliminadas todas as barreiras sociais e cada um deles é o igual de todos os outros brasileiros.

Descobriram ainda que cada cidadão - seja milionário ou bóia-fria - só dispõe de um único voto. Costumam perguntar como é que se contam os votos na apuração e se mostram surpresos descobrindo que o coronel ou o deputado só podem dar um voto, tal qual eles. E a gente brinca: "Como o coronel só tem um filho e você tem oito, você até que pode influir na eleição mais do que ele..." O velhote com quem falávamos meditou sobre e o assunto e riu: "Bem, eu lá em casa tenho o meu voto, o da mulher e os dos cinco meninos que já vota... E lá no coronel talvez só tenha mesmo o voto dele, escoteiro, porque mulher de rico não vota pela cabeça do marido, se governa pela cabeça delas..."

Vê-se, assim, que aquilo que nós mais desejávamos para o povo brasileiro, de certo modo, ele já está adquirindo: a consciência da sua cidadania. Eles estão dispostos a votar e não têm mais aquele antigo medo de votar contra a vontade dos mandões. Descobriram que voto não tem assinatura. Vão, pois, votar com uma nova segurança, uma nova consciência.

Podem votar nas pessoas erradas, o que, aliás, é possível e até provável. Por isso pagaremos todos; mas da próxima vez talvez não se deixem levar por entusiasmos fáceis. E se ainda votarem errado, paciência. Nós, que nos consideramos bem informados e racionalizamos nossas escolhas, em quantas frias nos metemos, quanto candidato péssimo apoiamos! Democracia se aprende devagar.

O importante é que o povo todo, pobres e os ricos, poderosos e os fracos, acreditam na sua identidade de cidadão. E exerçam a sua cidadania para o melhor, ou até mesmo para o pior. O resto fica com Deus, que, no remate dos males, é o responsável pelos acertos e pela loucura dos homens. Afinal, não foi Ele, Deus Nosso Senhor, que nos concedendo o Livre-Arbítrio inventou a Democracia? Dotados do Livre-Arbítrio, o mais fundamental de todos os direitos morais, o ser humano, pelo simples fato de nascer, já é um cidadão do Mundo.

A escolha independente entre o pecado e a virtude, a consciência do Bem e do Mal, tornam o Livre-Arbítrio o fundamento de todas as liberdades. Por decreto divino.


Editorial

Proteção legal à segurança nacional
O Estado Democrático de Direito, que se estrutura, se mantém e se desenvolve a partir de parâmetros bem definidos em seu ordenamento jurídico - o qual, por sua vez, decorre do prévio pacto político celebrado pelos membros de sua sociedade, em geral consub stanciado em normas constitucionais -, precisa de regras, igualmente bem definidas, de proteção à sua própria segurança. Isso equivale dizer que a Democracia necessita de um mecanismo jurídico-normativo para defender sua própria existência, ante a possibilidade - historicamente freqüente, em muitas partes do mundo - de pretenderem destruí-la. A rigor, seria possível dizer que apenas as Democracias necessitam de regras legais em sua defesa - já que as ditaduras delas não precisam -, não fosse um certo eufemismo institucional, pelo qual os regimes de força apreciam revestir-se de aparente "legalidade", impondo "Constituições", decretando leis ou editando atos normativos, independentemente de quaisquer respaldos que lhe ofereça o corpo social.

Apesar de a primeira lei brasileira de segurança nacional ser de 1935, foi o Decreto-Lei 314, de 13 de março de 1967, que criou a famigerada Lei de Segurança Nacional (LSN) - alterada para adquirir maior rigor em 1969 - que acabou se transformando num pesado, temeroso (e repudiado) símbolo do regime militar instalado no País em 1964. E a LSN não perdeu sua conotação autoritária nem depois de ter sido substancialmente abrandada, ao tempo do governo do general João Figueiredo, em 1983, e de ter sido derrogada em alguns de seus dispositivos, pela Constituição de 1988.
Há cerca de um ano, a comissão de juristas encarregada pelo Ministério da Justiça de redigir o anteprojeto do novo Código Penal propôs a introdução, no novo Código, de um título, com cinco capítulos, destinados a substituir - e ao mesmo tempo abrandar - os dispositivos da LSN, o que serviria para eliminar do ordenamento jurídico uma lei tão associada ao regime militar. No primeiro capítulo, "Dos crimes contra a soberania nacional", estavam previstos, por exemplo, delitos como a espionagem e a traição; no segundo, "Dos crimes contra as instituições democráticas", entre outras coisas se previam os atentados contra os chefes dos Poderes de Estado; no terceiro, "Dos crimes contra o funcionamento das instituições democráticas e serviços essenciais", além de sabotagens a serviços essenciais previam-se os crimes de coação contra autoridades legítimas; no quarto capítulo, "Dos crimes contra as relações internacionais", cominavam-se sanções contra atentados praticados contra autoridades estrangeiras; e, no quinto capítulo, "Dos crimes contra a cidadania", fazia-se uma inovação, ao "proteger também o cidadão contra abuso do poder de Estado ou de outros cidadãos". É aí que se proibia a formação de associações discriminatórias, racistas, etc.
Além da circunstância de o Estado Democrático de Direito necessitar de sua proteção legal, nessa questão há que se considerar mais dois aspectos:

primeiro, o fato de não importar muito se essas normas estiverem integradas a um diploma legal mais abrangente - e com a importância normativa do Código Penal - ou constituírem uma lei apartada; segundo, a conveniência de se alterar, na hipótese de se adotar legislação independente, a nomenclatura expressa pela sigla LSN, visto a já histórica animosidade que ela desperta.

Mas o que no âmbito do governo se dizia há um ano serve perfeitamente para hoje - e talvez até mais, levando-se em conta as recentes e trágicas peripécias do terrorismo islâmico: não se pode revogar, pura e simplesmente, a Lei de Segurança Nacional vigente, como estão pretendendo integrantes da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, da Câmara dos Deputados, sem que em seu lugar se deixem dispositivos legais de proteção ao Estado de Direito Democrático. E não são apenas os acontecimentos internacionais, como o assombroso atentado contra a Democracia norte-americana em 11 de setembro, ou os desafios do crime organizado a um Estado democraticamente constituído, como na Colômbia, que nos levam a temer um vazio legal nesse campo. Os motins em que se transformaram diversos movimentos paredistas, as ameaças e coações perpetradas por manifestantes grevistas armados, pertencentes a forças de Polícias Militares dos Estados - especialmente na Bahia -, sem dúvida significaram uma clara ameaça à segurança nacional, em relação ao que o soberano Estado Democrático de Direito brasileiro não pode permanecer, legalmente, inerme.



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12/10/2001


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