PAULO HARTUNG: COMBATE À RECESSÃO IMPLICA RECUSA DE DOGMAS LIBERALIZANTES



A mesma ousadia empregada na criação da URV, em 1994, e na flutuação do câmbio, em janeiro de 1999, deve ser aplicada no combate à recessão e na definição de uma política de crescimento nacional. Para tanto, sugeriu nesta quinta-feira (8) o senador Paulo Hartung (PSDB-ES), "há que se libertar de alguns dos dogmas liberalizantes. Tão danosos quanto os sepultados dogmas estatizantes".Sem reivindicar "políticas monetária e fiscal irresponsáveis, expansionistas a qualquer custo", o senador defendeu políticas compensatórias ao desemprego gerado pela recessão, com investimentos em saneamento básico, urbanização e transporte coletivo. Como explicou, estes são bens e serviços não-comercializáveis - "portanto, não há abertura comercial que possa suprir estas necessidades" -, vitais para a competitividade sistêmica do país e que, principalmente, "revestem-se de elevado efeito multiplicador de emprego e demanda doméstica". O financiamento dessas políticas antidesemprego poderia vir do FGTS, cuja disponibilidade de recursos para obras de urbanização e saneamento foi erroneamente suspensa, na opinião do senador, dado que investir com recursos do FGTS não tem impacto no déficit fiscal, a não ser do ponto de vista "meramente contábil".Para Hartung, não se trata de voltar ao sistema autárquico de excessiva proteção tarifária e não-tarifária ao mercado doméstico nem de buscar culpados por erros cometidos no passado recente. Trata-se, no entanto, de "reconhecer a fragilidade do modelo de crescimento com poupança externa, que torna a economia permanentemente vulnerável a qualquer mudança de conjuntura internacional" e de, a exemplo do que fazem os países desenvolvidos, "praticar mecanismos efetivos de defesa do mercado interno contra práticas desleais de comércio".- O maior perigo que corremos no momento é achar que uma eventual melhoria do ambiente macroeconômico nos próximos meses sirva de justificativa para não se buscar mudanças no modelo econômico adotado - alertou o senador.Esse modelo, baseado na sobrevalorização cambial, suscitou divergências desde a sua implantação em 1994 e, na opinião de Hartung, é também responsável pelos principais fatores da atual instabilidade econômico-financeira: o déficit em transações correntes, da ordem de 4,5% do PIB - enquanto, entre 1984 e 1993, a economia brasileira registrou superávits comerciais capazes de contrabalançar as transações correntes com o exterior - e o aumento da dívida líquida consolidada do setor público, de 28% do PIB em 1994 para 38,6% em julho de 1998. O colapso das contas externas resultante do modelo tornou inevitável o recurso ao FMI, afirmou o senador, mas o acordo firmado com o fundo limita-se às reformas no campo fiscal e à promessa de superávit comercial de US$ 11 bilhões e de déficit em transações correntes de 3% do PIB, sem qualquer menção a uma estratégia de crescimento.- Ou talvez, justamente por dizer muito pouco, é que diga tudo. Ou seja, a omissão de temas como política comercial, política industrial, política agrícola, de crédito, de emprego ou qualquer outro tema dito setorial talvez seja a confissão da crença na inutilidade destas políticas ou da incapacidade do país estipular tais instrumentos - considerou.Em aparte, o senador José Alencar (PMDB-MG) registrou que há uns cinco anos o Brasil ocupava a terceira posição no mundo como gerador de superávits comerciais, vindo atrás apenas do Japão e da Alemanha. Como o serviço da dívida externa então era menor e "não tínhamos tanta desnacionalização", pois esta, posteriormente, provocou aumento nos pagamentos de dividendos, as transações correntes externas também eram favoráveis, explicou. Sérgio Machado (PSDB-CE), por sua vez, concordou que é crucial definir uma agenda de desenvolvimento, já que "todo o sacrifício e o ajuste fiscal têm uma razão de ser, que é a de prepararmo-nos para crescer".

08/04/1999

Agência Senado


Artigos Relacionados


Aprovada criação de subcomissão para tratar de propostas de combate à recessão e ao desemprego

NICOLAU RECUSA-SE A RESPONDER A PERGUNTAS DO RELATOR PAULO SOUTO

MUDANÇA IMPLICA EM ESCALA PARA OS GASTOS

USP: Esforço intenso não implica em melhor qualidade de vida

PAULO HARTUNG DISCORDA DA CPI DO JUDICIÁRIO

PAULO HARTUNG DIZ QUE VIOLÊNCIA NÃO É RESPONSABILIDADE SÓ DOS ESTADOS