Procurador de Genebra confirma contas de Maluf









Procurador de Genebra confirma contas de Maluf
Segundo Bernard Bertossa, ex-prefeito depois transferiu dinheiro da Suíça para outro lugar

Especial para o Estado
GENEBRA - Pela primeira vez desde que as investigações contra Paulo Maluf começaram, o governo suíço reconhece publicamente que o ex-prefeito manteve contas naquele país. "Identificamos operações financeiras suspeitas (envolvendo Maluf)", revela o procurador-geral do Cantão de Genebra, Bernard Bertossa, em entrevista exclusiva ao Estado. "Mas esse dinheiro já foi transferido para outra praça financeira", completa.

Apesar de o procurador se recusar a dizer para onde e de onde veio o dinheiro, informações de um dossiê preparado pelo governo suíço apontam que Maluf teria mantido uma conta no Citibank de Genebra entre 1985 e 1997, quando uma lei local começou a obrigar os bancos a revelar possíveis suspeitas nas contas de seus clientes. Em 1997, o dinheiro teria sido transferido para a Ilha de Jersey, outro paraíso fiscal, localizado no Canal da Mancha.

Segundo Bertossa, apesar de o dinheiro já ter saído da Suíça, não está descartada a possibilidade de se investigar se o ex-prefeito mantém ainda alguma outra conta no país. Nesse caso, a lei local determina que o dinheiro seja bloqueado e, se houver uma confirmação de corrupção por parte do titular, o montante é então devolvido ao país que teria sido vítima dos atos ilegais.

Informações extra-oficiais indicam que Maluf teria uma conta também no Deutsche Bank, em Jersey, o que poderia levantar a suspeita de que o ex-prefeito também foi cliente de outros bancos em Genebra, além do Citibank.

Colaboração - O procurador afirma que as investigações na Suíça não se resumem às contas em nome do suspeito.

"Investigamos todas as contas em que o suspeito apareça pelo menos como beneficiário", explica Bertossa.

Sobre a colaboração da Suíça na investigação sobre Maluf, Bertossa confirmou que as autoridades locais estão prontas para passar as informações sobre o caso ao Brasil. Mas, esclarece que, por enquanto, o poder judiciário suíço ainda tem de avaliar se o pedido brasileiro está completo.

Há cerca de dois meses, o Brasil enviou um requerimento para obter os dados das contas de Maluf, mas a falta de documentos acabou prejudicando o processo. O governo foi obrigado a preparar mais uma vez o pedido, que foi encaminhado há duas semanas para as autoridades suíças.

Bertossa, que há doze anos dirige a Procuradoria-Geral de Genebra, é conhecido por ter investigado os fundos das máfias russas e de ditadores corruptos na África e na América Latina.

Ele garante que ao investigar suspeitos de várias partes do mundo, jamais se baseia nos fatos políticos. "O que importa é se houve crime", explica.

"Nosso interesse é penal, não político", completa o suíço, que deixará o cargo em maio.


Ex-prefeito insiste que não tem dinheiro no exterior
Para ele, objetivo da investigação é atingir sua candidatura à sucessão estadual

As revelações sobre existência de ativos na Suíça causaram irritação no ex-prefeito Paulo Maluf (PPB), mas ele mantém enfaticamente a versão que adotou desde que o Ministério Público Estadual e a Procuradoria da República iniciaram a investigação sobre o caso Jersey. "As contas não existem, jamais existiram", reiterou Maluf, ao ser informado das declarações do procurador-geral do Cantão de Genebra, Bernard Bertossa.

Maluf está convencido de que o objetivo da investigação de promotores e procuradores brasileiros é atingir a "posição privilegiada" em que se encontra nas pesquisas mais recentes de intenção de voto na corrida ao Palácio dos Bandeirantes. Para o ex-prefeito, o primeiro lugar que ocupa há meses incomoda seus adversários políticos, uma referência ao governador Geraldo Alckmin (PSDB).

Desde sexta-feira, quando retornou de uma viagem de descanso à França, onde passou o Natal e as festas de fim-de-ano, Maluf tem concedido entrevistas a emissoras de rádio e jornais por meio das quais faz críticas ao sistema de segurança pública do governo tucano.

O ex-prefeito afirma que os índices de criminalidade e da violência aumentaram na atual administração. Recentemente, ele atribuiu a "uma armação tucana" inquérito aberto pela Polícia Federal sobre suposto crime eleitoral.

Lenga-lenga - As revelações de Bertossa confirmam documento enviado em setembro ao Ministério Público Federal atestando que "papéis bancários" relativos a Maluf haviam sido apreendidos. "Por várias vezes, o dr. Paulo já falou publicamente que não teve e não tem conta no exterior, portanto não teria o que transferir para outra praça", observou o advogado Ricardo Tosto, que coordena a defesa do pepebista. "Tecnicamente, essa informação não muda nada."

"Essa lenga-lenga sobre a existência de contas de Paulo Maluf na Suíça ou em qualquer outro paraíso fiscal do planeta vem desde junho do ano passado e até agora ninguém conseguiu provar nada, simplesmente porque essas provas não existem", reforçou Adilson Laranjeira, porta-voz do ex-prefeito. "Ora é uma autoridade que declara haver indícios, ora é outra que anuncia buscas atrás de resultados; o fato é que essas autoridades sempre ressalvam que é preciso ordem judicial ou uma prova para revelar detalhes que nunca aparecem, exatamente porque não existe nada para aparecer."


Ministro pode deixar cargo antes do previsto
Preocupação de serristas é com possíveis denúncias de uso da máquina do governo

BRASÍLIA - O ministro da Saúde, José Serra, marcou data para sair do governo - 20 de fevereiro, mas deve antecipar o desembarque para preservar sua candidatura presidencial.

Correligionários e colaboradores já admitem a hipótese de ele permanecer no posto apenas até o fim da semana que vem. Os serristas não querem ver seu presidenciável envolvido em denúncias de uso da máquina por conta da impossibilidade de separar o ministro da figura do candidato.

"Serra programou seu retorno ao Senado, coincidindo com a reabertura do Congresso, mas, se em qualquer momento ficar claro que a candidatura e o ministério são incompatíveis ou pairar dúvida sobre sua conduta ética, ele sai antes", resume o líder do PSDB na Câmara, Jutahy Júnior (BA).

Articulador entusiasmado da candidatura, o líder garante que o tucano não trocará uma imagem de ética e correção construída nos três anos de ministério por mais uma semana no cargo.

A agenda do ministro da Saúde reserva apenas uma programação que nem Serra nem seus aliados admitem que ele perca: a viagem do dia 28 a Recife, em companhia do presidente Fernando Henrique Cardoso. Lá, os dois vão comemorar a marca dos 150 mil agentes de saúde que estão atuando de casa em casa Brasil afora, no programa Saúde da Família. E de quebra, ainda assinam um projeto de lei que vai regulamentar a profissão de agente, garantindo-lhes os direitos sociais.

O líder do PSDB no Senado, Geraldo Melo (RN), acompanhou Serra no fim de semana ao Rio Grande do Norte, na primeira viagem depois do anúncio oficial da candidatura. Mesmo tendo discursado em solenidades oficiais da Saúde, na presença do governador Garibaldi Alves (PMDB) e da prefeita de Mossoró, Rosalba Ciarlini (PFL), o senador conta que teve a cautela de só pedir votos para Serra na convenção municipal do PSDB.

"E é bom lembrar que tivemos de retardar o horário da convenção porque o ministro recusou-se a comparecer a uma reunião política durante o expediente de trabalho." Segundo o líder, o próprio Serra confidenciou a ele e a outros dirigentes do PSDB que, caso comece a receber convites insistentes para muitos eventos e reuniões típicos de candidato, seria obrigado a apressar sua saída.

"Ninguém adotou uma postura mais ética do que o Serra, ao ponto que tivemos que infernizá-lo para que ele assumisse sua candidatura, diz Jutahy.


Garotinho tenta apressar palanques nos Estados
Depois de pavimentar sua sucessão no Rio e anunciar Erundina em SP, ele lança João Leite em Minas

BELO HORIZONTE - O governador do Rio, Anthony Garotinho, candidato do PSB à Presidência, deu ontem mais um passo no plano de montar palanques nos principais Estados do País. Após encontro com empresários, ele lançou a candidatura do deputado estadual e presidente regional do partido, João Leite - nome mais votado para o Legislativo mineiro em 1998 -, à sucessão do governador Itamar Franco (PMDB). Na semana passada, a deputada Luiza Erundina (PSB-SP) anunciou que deve concorrer ao governo paulista.

De acordo com o governador fluminense, seu partido tem interesse em lançar candidatos "fortes" em São Paulo, Minas e Rio, além de disputar o governo de mais dez Estados. "Mas, nestes três Estados, nós precisamos de candidaturas próprias ou de alianças que as sustentem", ressaltou. Ele só não confirma o candidato à sua sucessão, apesar das manifestações favoráveis do partido à primeira-dama, Rosinha Matheus. "Ela teve outras oportunidades de assumir cargos políticos e recusou. Mas o que ela decidir eu darei apoio", comentou.

Para Garotinho, agora se inicia a segunda etapa de sua campanha. A primeira foi até dezembro, quando o encontro nacional do partido homologou sua candidatura. A atual incluirá visitas a todos os Estados.

Ao mesmo tempo em que busca espaço para sua candidatura, Garotinho tenta firmar alianças e já se aproxima do PL, partido cortejado também pelo PT de Luiz Inácio Lula da Silva. No domingo, ele teve um encontro com o senador José Alencar (PL-MG) e saiu animado. "Vamos buscar o entendimento com outras forças políticas, mas, se o PL vier a caminhar comigo, será um prazer ter o José Alencar como vice." O senador, porém, evitou assumir qualquer compromisso e comentou que seguirá o que for decidido pelo partido.

Perguntado se a aproximação incluiria diálogo com o governador de Minas, Garotinho lembrou que não conversava com Itamar desde a decretação da moratória pelo Estado. "Mas já recebemos um retorno de Henrique Hargreaves (secretário de governo e Assuntos Municipais em Minas) de que o governador marcará uma data para que nos encontremos logo."

Programa - Durante a visita a Minas, o governador fluminense se reuniu com líderes empresariais ligados à Federação das Indústrias do Estado (Fiemg) e relatou pontos de seus projetos econômicos e de seu programa de governo para a Presidência.

Ele explicou que, se eleito, pretende reduzir as taxas de juros, instalar um choque de crédito, direcionando instrumentos oficiais com taxas compatíveis e fazer, finalmente, a reforma tributária. "A estabilidade não é incompatível com o crescimento", comentou Garotinho.


Serra defende Estado “ativo e regulador”
Tucano diz a empresários que País pode retomar crescimento com política agressiva de exportações

RIO – O candidato tucano à Presidência, ministro José Serra (Saúde), usou ontem a expressão “ativismo governamental” para definir o papel que acredita que o Estado deve ter na retomada do crescimento. “Não se trata de um Estado produtor e interventor, mas ativo e regulador”, argumentou, em almoço na Associação Comercial do Rio.

Serra insistiu na necessidade de uma política agressiva de exportação e na substituição de importações como caminho para o País retomar o crescimento. “Quando falo em substituições de importações, não é voltar a práticas do passado, reserva de mercado, protecionismo seletivo, subsídios, não se trata disso. Temos uma boa taxa de câmbio, temos uma abertura no exterior significativa, portanto essa substituição tem de se fazer em termos competitivos”

A substituição de importações é “a questão-chave, a ponta do barbante a ser puxada para a economia voltar a taxas históricas sustentáveis”, segundo o candidato do PSDB. “Só com isso vamos ter redução do déficit, juros menores, crescimento da produção e do emprego, fortalecimento das empresas.”

No discurso para 200 empresários, Serra falou de suas propostas para o País, usou frases como “se o povo me escolher presidente” e fez promessas. Entre elas, as de dar prioridade ao Rio e duplicar o programa de Saúde da Família, que hoje atende 50 milhões de pessoas.

Ele considerou a questão tributária um dos “nós” que precisam ser desamarrados para incentivar a exportação. “O sistema tributário conspira contra a competitividade”, criticou. “Pode-se encerrar o capítulo ‘ouvir a sociedade’. Agora, o governo tem de definir o seu projeto.”

O ministro defendeu a transformação do Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio no de Comércio Exterior, que traçaria a política tarifária e de importação e exportação. Ele elogiou a ação da diplomacia brasileira, dizendo que será fundamental “na batalha contra o protecionismo dos países desenvolvidos”.

Barreiras – Serra também defendeu o fortalecimento do mercado de capitais, citando barreiras “que precisam ser removidas”, como a incidência da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) sobre as bolsas, e mudanças na tributação para investimentos.

Para ele, o Brasil terá de continuar se apoiando na poupança institucional (FGTS e Fundo de Amparo ao Trabalhador), “mas sem posição imobilista em relação ao financiamento privado”. Na sua avaliação, os investimentos resultantes do crescimento econômico vão necessitar de financiamento que, por sua vez, precisam de poupança privada para serem efetivados.

O candidato do PSDB citou cinco pontos que considera precondições, já consolidadas, para que o País retome o crescimento: a estabilidade econômica, o rumo “adequado” das políticas sociais, a “consciência do equilíbrio macroeconômico”, o prestígio do Brasil no exterior e o fortalecimento da democracia e de suas instituições.

Social – “Alguns governantes têm vontade de voltar às políticas populistas do passado. Mas o desenvolvimento tem de se acertar sobre o equilíbrio macroeconômico, ou não vai durar”, declarou. “O Estado brasileiro hoje pode ser menos desenvolvimentista do que no passado. Mas em matéria social, atingiu um desenvolvimento nunca ocorrido em nossa história.”


FHC negocia com aliados solução para a MP do IR
Aníbal diz que Congresso busca saída para retirar do texto aumento de imposto para empresas

BRASÍLIA - O presidente Fernando Henrique Cardoso e os presidentes do PSDB, PFL, PMDB e PPB, que formam a base aliada, reúnem-se hoje a partir das 11 horas no Palácio da Alvorada para negociar mudanças na medida provisória que corrigiu a tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física e aumentou o imposto pago pelas empresas prestadoras de serviços. Reforma política e segurança pública também estão entre os temas da reunião.

Segundo o presidente do PSDB, deputado José Aníbal (SP), o Congresso procura entendimento com o Executivo sobre a MP do IR. "Em nenhum momento vamos pôr o governo contra a parede." Aníbal disse que na reunião será possível negociar formas de substituição do aumento da Contribuição sobre o Lucro Líquido (CSLL) das empresas prestadoras de serviços.

Aníbal e os presidentes do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC), do PMDB, deputado Michel Temer (SP), e do PPB, Pedro Correa (PE) vão dizer que o aumento do imposto para empresas prestadoras de serviço desagradou ao Congresso porque não houve consulta.

O senador Paulo Hartung (PSB-ES), autor do projeto que corrigiu o IR, criticou a atitude do governo, ao infiltrar dois "contrabandos" na MP: o aumento do imposto das empresas prestadoras de serviço e a prorrogação da alíquota de 27,5% além de dezembro de 2002. Para Hartung, o governo pode editar outra MP e evitar o risco de o Congresso mudar o texto.


Artigos

Um novo patamar para a ciência brasileira
Ronaldo Mota Sardenberg

A pesquisa científica brasileira ganhou novo e concreto impulso qualitativo, com forte impacto em áreas estratégicas do conhecimento e do avanço tecnológico. A partir deste mês de janeiro, 17 redes de pesquisa, organizadas dentro do Programa Institutos do Milênio, iniciam atividades em áreas tão diversas quanto saúde, educação, meio ambiente, agricultura, novos materiais, genética e nanotecnologia.

Os Institutos do Milênio são inovadores na forma e no conteúdo. Alinhados à política de ciência e tecnologia para esta década, têm foco definido:

capacitar os centros e laboratórios de pesquisa para que participem dos avanços na vanguarda mundial do conhecimento. Ao mesmo tempo, mobilizam os institutos a competência já adquirida no País para a superação de desafios históricos. Esses são os casos da redes dedicadas a buscar a melhor adaptação humana ao semi-árido nordestino e das que integrarão esforços de pesquisas quanto à exploração sustentada, seja da Amazônia, seja do mar e das regiões costeiras.

Selecionados entre mais de 200 propostas de alta qualidade, 17 projetos passaram pelo crivo de um Comitê Científico Internacional, com maioria brasileira, formado por líderes nos campos da pesquisa e do desenvolvimento tecnológico. Como atestou o próprio comitê, são projetos de excelência, comparáveis ao que existe de mais avançado em âmbito mundial. Somam-se os institutos ao esforço nacional de pesquisa e desenvolvimento conduzido pelo Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), que este ano alcançará o total de R$ 2,3 bilhões. Aliam-se a consistência científica e um novo modelo de financiamento, organização e gestão dos recursos. Empréstimos do Banco Mundial no valor de R$ 90 milhões, até 2003, garantem estabilidade e segurança, bem como permitem a ação planejada das atividades de pesquisa.

Criam-se também modelos confiáveis quanto à transparência na aplicação de recursos e à previsibilidade de resultados.

A organização dos grupos de pesquisa em redes virtuais rompe os obstáculos característicos das estruturas tradicionais. Supera distâncias no conhecimento e limitações geográficas e enseja a efetiva integração de dezenas de grandes centros e pequenos laboratórios de todas as regiões do País e de centenas de pesquisadores experimentados e jovens cientistas.

Facilita ainda o compartilhamento de informações com institutos internacionais de pesquisa.

A diversidade, o arrojo e os objetivos ambiciosos destas redes de pesquisa refletem a maturidade do sistema nacional de ciência e tecnologia, que, sem descuidar das ciências básicas, se torna cada vez mais capacitado e comprometido com a criação de instrumentos para o aumento da competitividade econômica e a resolução de problemas nacionais de cunho social.

Nos próximos três anos, grupos estarão em busca, por exemplo, da formação de recursos humanos e do desenvolvimento de novas tecnologias para o combate de doenças como tuberculose, mal de Chagas, alergias; ou estarão pesquisando alternativas para o tratamento de câncer, aids e de transplantados.

No caso do mal de Chagas, como recentemente noticiou o Estado, estarão associados 90 doutores da Fiocruz da Bahia, da Univeridade de São Paulo, da Universidade Federal do Rio de Janeiro e de outras entidades, para desenvolverem uma nova área de medicina regenerativa, com o uso de terapias de células-tronco, para tentar regenerar músculos cardíacos destruídos pelo parasita de Chagas.

Outros laboratórios e pesquisadores de várias regiões trabalharão no mapeamento genético de frutas cítricas, com a identificação dos genes resistentes a doenças, o que contribuirá para a definição de estratégias mais eficientes de controle de pragas, fundamental para aumentar a qualidade do produto agrícola e a competitividade do País no mercado internacional.

Ao mesmo tempo, redes inéditas vão-se concentrar no desenvolvimento de novos materiais e de alternativas inovadoras para a indústria. Uma delas vai trabalhar exclusivamente com pequenas empresas do setor de autopeças, enquanto outra estará direcionada para o conhecimento de ponta, como a nanotecnologia, que deverá ter impacto na saúde e revolucionar a forma de fabricação de uma infinidade de produtos, como computadores, automóveis e aviões.

Cientistas brasileiros com reconhecimento internacional, em parceria com os melhores centros do mundo, estarão buscando o fortalecimento da matemática, tanto no ensino quando na sua aplicação no setor produtivo. Na área de meio ambiente, Institutos do Milênio darão forte impulso à competência nacional em campos como clima, recursos hídricos e desenvolvimento sustentável.

Outra iniciativa que se conjuga a esse esforço de pesquisa é o Programa de Apoio aos Núcleos de Excelência (Pronex), cujo objetivo é contribuir para consolidar o processo de desenvolvimento científico e tecnológico, por meio de apoio adicional e continuado a grupos de alta competência, que tenham liderança e papel aglutinador na sua área de atuação. Os Núcleos de Excelência são selecionados por meio de editais centrados na qualidade e na relevância científica ou tecnológica da proposta. Também apresenta importante função de sustentação de núcleos emergentes, com efeito positivo para regiões pouco atendidas pelas linhas tradicionais de fomento. Ao todo, já foram selecionados e contratados 206 projetos em três editais, no valor de R$ 190 milhões, envolvendo, além dos núcleos coordenadores, mais de 500 instituições associadas. Do total de recursos contratados, foram investidos em 2001cerca de R$ 140 milhões.

Enfim, não seria possível mencionar aqui todas as iniciativas e todos os campos da pesquisa avançada a serem beneficiados. Promissoras frentes de trabalho de alta qualidade levarão à melhor compreensão dos fenômenos da vida e da natureza, permitindo desenvolver meios para agregar conteúdo tecnológico ao produto nacional e a superação de problemas sociais e ambientais.

São, portanto, imensos os desafios da ciência e tecnologia (C&T). Novas iniciativas, a par da consolidação e expansão dos programas vigentes, capacitam o Brasil a dar-lhes respostas vigorosas e rápidas. As metas dos Institutos do Milênio expressam demandas da comunidade científica, assim como diretrizes adotadas pelo MCT, em consonância com estratégias definidas pelo presidente Fernando Henrique Cardoso. Na mesma perspectiva, enquadram-se a criação dos Fundos Setoriais de Ciência e Tecnologia, o anteprojeto de Lei da Inovação, o programa de ações regionais em C&T e os novos esforços de cooperação internacional.

Todas essas ações estreitam as parcerias entre governo, pesquisadores e empresas, e também atraem o envolvimento crescente dos Estados da Federação.

Consolida-se uma política nacional de longo prazo voltada para a integração dos esforços nacionais de ciência e tecnologia, bem como para a desconcentração geográfica da geração de conhecimento, em benefício das regiões menos avançadas e com apropriação de suas vantagens por toda a população brasileira.


Colunistas

RACHEL DE QUEIROZ

Esse estranho animal
Ah, o animal urbano humano é mesmo essencialmente gregário, como os carneiros e as andorinhas. Só esse instinto ancestral, que se traz enrustido nos ossos e na carne (ou nos nervos e na pele?), é que explicará nossa absurda paixão por morar amontoados em edifícios de m ais de 20 andares, ou formigando pelas ruas numa massa fechada de carros que se entrechocam, se amassam, se batem com fúria, matando e ferindo não apenas quem está dentro deles, mas o infeliz pedestre que não pertence à aristocracia rodante, e se arrisca pelo asfalto, território privativo das feras de rodas.

Você já estudou, do alto de um edifício, um engarrafamento, lá embaixo? Não dá para entender porque eles se obstinam naquela fúria impaciente, em se concentrar todos na mesma pista, como se no mundo só existisse aquele caminho, como se fugissem de um perigo invisível que por trás os açoitasse; a cada rua transversal entrem mais carros - em vez de saírem, fugirem, por aquele caminho aberto!

Mas não, e você vê com espanto que eles desdenham as possibilidades de fuga, fazem questão de ficar no sufoco sem sentido, numa velocidade de cem metros por hora. Outra comparação que nos lembram são aqueles enxames de abelhas africanas que atacam uma árvore, uma cerca, até um telhado, em vôo cego, e ficam tentando se mover para diante ou para os lados, num zumbido que já parece um rugido; e do local onde se concentram caem muitas mortas, mas parece que isso lhes é indiferente, são tantas que nem podem olhar para as vítimas. Igualzinho aos engarrafamentos.

Numa cidade grande qualquer, pequeno embaraço é uma tragédia. Se falta água, se há uma pane na eletricidade, se os ônibus se declaram em greve, tudo pára e entra em crise. Com as torneiras secas, mesmo só por algumas horas, os restaurantes não podem servir comida, nas residências o pânico se instala, desde as crianças gritando que não podem ir para a escola sem escovar os dentes! E os hospitais que não têm como acudir os doentes - sem água?

Pois embora a gente não seja peixe, a água é, depois do ar, o elemento mais indispensável à nossa sobrevivência. E faltando luz? Já experimentou subir, sem elevador, ao seu apartamento no quinto, décimo, vigésimo andar? E os que se arriscam, se arriscam mesmo a um enfarte, a uma crise respiratória, a todos os males que ameaçam o citadino sedentário, que só sabe "andar" sentado no carro, no ônibus, na moto.

Agora, em todas as cidades, anda o povo exigindo que lhe abram os metrôs, subterrâneos, onde poderão continuar se engarrafando, descarrilando, debaixo da terra, como se não lhes bastasse o que fazem lá em cima...

E como cai a qualidade de vida na cidade grande. Desde o ar que se respira, poluído, envenenado, à água que vem (ou não vem!) pelos canos, o pequeno espaço dentro dos apartamentos, o leite engarrafado, a carne congelada.

O pior de tudo é que esse frenesi "civilizatório" já está até perturbando a condição de vida nas cidades de pequeno porte. As ruas se enchem de carros e a maior glória dos prefeitos é instalar sinal luminoso nos cruzamentos. Já não se pode comprar leite mungido nas vacarias; os supermercados já invadiram tudo, passaram até a se chamar de "shopping" e só vendem leite de caixa.

Creio que a psicologia do homem urbano pode se traduzir com especial fidelidade numa frase de Pedro Nava, num baile carnavalesco no salão de cima do velho "High Life" (ah, saudosas décadas passadas!), vestido num macacão cáqui, Nava suava e sufocava empurrado e empurrando num cordão; a gente lhe propôs sair dali, ir para o jardim, lá embaixo: "Aqui está muito quente, muito apertado!" E o Nava o suor em bicas, enxugando a cara na manga, parou um instante para recusar: "Mas eu gosto é do quente e do apertado!" E seguiu no cordão.


Editorial

PARA QUE NÃO SEJA APENAS MAIS UMA TRAGÉDIA


O seqüestro e o assassínio do prefeito Celso Daniel provocaram a justa indignação da população e dos políticos, despertando nos últimos a lembrança de que existem parados no Congresso projetos que poderiam, se estivessem aprovados há mais tempo, ter contribuído para interromper a onda de violência que aterroriza as cidades brasileiras e São Paulo, em particular. O crime hediondo que vitimou Celso Daniel está tendo grande repercussão por ter sido ele três vezes prefeito de Santo André, coordenador da campanha de Luiz Inácio Lula da Silva e um dos políticos mais populares e queridos do interior paulista. Muitas outras pessoas tiveram o mesmo destino trágico de Celso Daniel sem que houvesse a comoção popular que marca esse caso. Assaltos, seqüestros, homicídios tornaram-se parte do cotidiano dos paulistas e foi preciso que alguém com o perfil do prefeito de Santo André fosse vítima de um crime bárbaro - que, assim como o que vitimou o prefeito de Campinas, Antonio da Costa Santos, em setembro, não parece ter tido conotação político-ideológica - para que abalasse a letargia em que as autoridades estaduais pareciam estar diante da ousadia crescente dos criminosos.

Os níveis extravagantes a que chegou o crime em São Paulo - resultado direto da cumulativa incompetência de sucessivos governos - autorizam dizer que as cada vez mais ousadas façanhas do banditismo até superam, em matéria de vítimas e de efeitos profundos sobre o cotidiano de milhões de pessoas, o ataque terrorista sofrido pelos americanos em setembro. Daí não ser exagerado que o presidente Fernando Henrique Cardoso e o governador Geraldo Alckmin falem, agora, em guerra contra o crime. Mais do que declarar a guerra, no entanto, é preciso travá-la com eficiência e pertinácia - até agora não demonstradas pela polícia - para que os bandidos de toda espécie saibam que os tempos da impunidade acabaram e o crime, finalmente, não compensa.

É preciso definir e pôr em prática o quanto antes as medidas capazes de prevenir e reprimir, com a máxima dureza autorizada em lei, a escalada do banditismo. Cita o governador paulista a torto e a direito o número de seqüestradores presos ou mortos. Mas o fato é que no ano passado houve 307 seqüestros no Estado, perto de cinco vezes mais do que em 2000.

Há um limite para a sociedade suportar o cativeiro que lhe impuseram os malfeitores, as grades que a cercam em casa e no trabalho, a necessidade de elaborar estratégias de sobrevivência cada vez mais complicadas e psicologicamente onerosas. Há um limite também para a desmoralização do Estado, para o seu fracasso em cumprir o que é literalmente o seu dever elementar - garantir a vida das pessoas. Esse limite foi ultrapassado muito antes da tragédia desse domingo. Mas, para não ser apenas uma tragédia a mais, o assassínio de Celso Daniel precisa representar um divisor de águas.

Infelizmente, não há razão para apostar nesse resultado.

A flacidez, a falta de doutrina, de articulação, de comando, de profissionalismo e de energia no combate ao crime no Estado; o envolvimento de policiais civis e militares com os bandidos; a naturalidade com que a Secretaria da Segurança registra as dezenas de homicídios que ocorrem todo fim de semana na Grande São Paulo; a notícia inacreditável de que, três dias depois do resgate aéreo de dois presos em Guarulhos, a polícia ainda não tinha o retrato falado dos seqüestradores do helicóptero utilizado na operação - tudo isso evidencia um descalabro que não mais pode ser tolerado pela população.

Quem viu o governador de São Paulo no domingo falando na televisão sobre as medidas que irá adotar imediatamente para conter a criminalidade ficou com a impressão de que ele estava admitindo, tacitamente, o descalabro a que chegou a segurança pública em São Paulo. A pena de prisão perpétua para os seqüestradores, o bloqueio dos bens das vítimas de seqüestros e de seus familiares e o controle da venda de telefones celulares pré-pagos são medidas que dependem de aprovação do Congresso ou de regulamentação federal.

Mas a oferta de recompensa para quem der informações que levem à captura de seqüestradores consta de lei aprovada no ano passado e até agora não regulamentada pelo governador. A contrataçã o de 6 mil estagiários para ocupar funções burocráticas que estão sendo desempenhadas por policiais militares - que serão liberados para policiar as ruas - não é idéia nova e sua implementação depende apenas de um ato administrativo do governador.

Explica-se a perplexidade de Alckmin diante da brutalidade de que foi vítima Celso Daniel. O que não se explica é a demora em adotar medidas tão comezinhas para aumentar a eficiência do combate ao crime organizado.


Topo da página



01/22/2002


Artigos Relacionados


Jersey confirma contas ilegais de Paulo Maluf

Devassa nas contas de Maluf

Nicea Camargo confirma denúncias contra Pitta e Maluf

Confirmadas contas de Maluf em Jersey

(Flash 13h10) - Covas elogia Casa da Solidariedade e confirma presença em debate com Paulo Maluf

PROCURADOR CONFIRMA QUE FOI AMEAÇADO DE MORTE