Recepção calorosa escondeu preconceito, diz senadora pioneira
O Senado recebeu sua primeira parlamentar em 1979. A pioneira foi Eunice Michiles, que pertencia à Arena do Amazonas. Ela era a suplente de um senador que morreu poucas semanas depois de tomar posse.
— Quando cheguei, nem sequer havia toalete feminino nas proximidades do Plenário. Precisaram providenciá-lo às pressas. Foi uma correria.
Eunice foi senadora até 1987. Depois, elegeu-se deputada federal. Antes dos cargos no Congresso Nacional, havia sido deputada estadual no Amazonas. Hoje, aos 83 anos, ela vive em Brasília.
Leia, a seguir, trechos da entrevista concedida ao Jornal do Senado:
Como os senadores reagiram à chegada da primeira mulher ao Senado?
Fui recebida com palmas, flores, poesia. Disseram que eu chegava para enfeitar o Senado. No começo, foi tudo muito agradável. Só depois me dei conta de que aquilo era uma forma bem sutil de discriminação. Que senador receberia um colega homem com tamanhos agrados? Percebi que eles não estavam me tratando como uma senadora da República, de igual para igual. Na realidade, estavam me vendo com uma mulher. Estavam sendo machistas.
A senhora se empenhou nas causas femininas?
Tive três bandeiras bem explícitas. A primeira foi a defesa do meu estado, o Amazonas. A segunda foi a liberdade religiosa. E a terceira foi o planejamento familiar. Essa foi a minha causa feminina. Naquela época, era uma questão crucial para o Brasil. Eu vivi muito tempo no interior do Amazonas e vi mulheres que tinham 12, 15 filhos, um atrás do outro, mas sem saúde nem recursos financeiros para ter tantas crianças. Elas não sabiam como controlar o número de filhos. No Senado, eu lutei para que as mulheres tivessem apenas os filhos que pudessem e que quisessem ter. Para mim, o poder público tinha a obrigação de pôr à disposição das famílias as instruções e os recursos necessários. Isso, naquele tempo, era muito mal visto, era tabu. Diziam que eu estava rasgando nota de cem, porque era o tipo de bandeira que me tirava votos. Mas eu não dava ouvidos. Era a missão que eu tinha. Hoje em dia, felizmente, planejamento familiar já virou assunto ultrapassado. Quando entrei no Senado, ao contrário de hoje, não havia mulheres ocupando ministérios de Estado. Por isso, eu e um grupo de mulheres fomos ao presidente Figueiredo e “exigimos” uma ação. Outros países já tinham ministras. Poucos dias depois [em 1982], ele nomeou para o Ministério da Educação a professora Esther de Figueiredo Ferraz. Foi a primeira ministra brasileira. Tenho orgulho de ter participado desse trabalho de bastidores.
As senadoras hoje dizem que ficam em desvantagem nas discussões porque os senadores falam mais alto...
Isso é verdade. Mas hoje as mulheres podem falar alto durante os debates. Eu não podia. Na minha época, uma mulher não podia se expor muito. Tinha que ter modos, falar calmamente. Eu não podia alterar a voz para debater de igual para igual com os senadores. Não estávamos em igualdade de condições.
Como a senhora vê as mulheres no poder atualmente?
A barreira está sendo vencida aos poucos. Temos muitas desembargadoras, ministras, prefeitas. A nossa maior glória é termos uma presidente da República. Isso é altamente confortante na luta da mulher pela igualdade.
05/03/2013
Agência Senado
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