Relator afirma que vai propor alterações a projeto de Sarney que fixa cotas para negros



O senador Sebastião Rocha (PDT-AP), relator do projeto de lei do senador José Sarney (PMDB-AP) que reserva vagas no serviço público e nas universidades para a população negra, afirmou que vai propor alterações à proposta original. Rocha, que havia apresentado relatório sugerindo a aprovação do projeto sem alterações, identificou diversos pontos em que a proposta pode ser alterada durante audiência realizada nesta quarta-feira (3) na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ).

Apesar de não considerar políticas compensatórias ou de ação afirmativa soluções estruturais, o relator disse acreditar que elas são capazes de corrigir desigualdades e dar oportunidades a grupos que estejam em desvantagem na sociedade. "As desigualdades são evidentes e merecem soluções de discriminação positiva para serem amenizadas", disse.

O senador Jefferson Péres (PDT-AM) afirmou que não são necessárias estatísticas para identificar a exclusão social dos negros, pois a desigualdade social, na sua opinião, "está na cara".

- Há 150 anos, toda a população negra estava na base da pirâmide social. Não houve qualquer política pública para reparar a desigualdade - disse Jefferson, que defendeu a adoção de medidas para acelerar o processo de inclusão dos negros, apesar de fazer restrições ao projeto em discussão.

O senador disse ter receios sobre a aplicabilidade, pois, no Brasil, diferentemente do que ocorreu em outros países, como os EUA, houve miscigenação em grande escala, o que torna difícil a definição de um critério que distinga um negro de um mestiço. Ele também defendeu que a proposta inclua uma variável que leve em consideração a renda da pessoa que pode ser incluída entre os que podem ocupar as vagas reservadas.

O presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Roberto Borges Martins, afirmou que a questão operacional pode ser solucionada, pois a decisão conceitual antecede a definição de como a ação afirmativa seria aplicada. Ironicamente, ele disse que a polícia sabe distinguir muito bem os negros do restante da população.

Jefferson sugeriu ainda que o estabelecimento de cotas não se limite aos negros. Ele citou que no Amazonas os índios serviram como escravos e também sofrem com a exclusão social. "Esses caboclos ficariam de fora do sistema de cotas. Isso é justo?", questionou.

Para resolver essa questão, o senador Eduardo Suplicy (PT-SP) apresentou emenda ao projeto de Sarney, incluindo os descendentes de indígenas entre os beneficiados do sistema de cotas. Roberto Martins e a secretária-executiva da Comunidade de Países de Língua Portuguesa, Dulce Pereira, concordaram com a necessidade de os índios serem atendidos, mas acreditam que, por terem especificidades e uma população muito menor que a dos negros, um outro projeto de lei deveria ser proposto para incluir os indígenas. O senador Ricardo Santos (PSDB-ES), que é presidente da Comissão de Educação (CE), acompanhou a opinião dos palestrantes.

Único senador negro, Geraldo Cândido (PT-RJ) recordou que o projeto de lei acompanha outros já aprovados, como a proposta do senador Antero de Barros (PSDB-MT) que reserva 50% das vagas das universidades públicas para estudantes de escolas públicas. Projeto semelhante, disse o senador, foi sancionado recentemente pelo governador fluminense, Anthony Garotinho, aplicável às universidades estaduais do Rio de Janeiro. Cândido defendeu ainda a criação de um fundo para a reparação dos danos causados aos negros no passado.



03/10/2001

Agência Senado


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