RONALDO CUNHA LIMA PEDE TRANSPOSIÇÃO DO RIO SÃO FRANCISCO
Em um discurso pleno de lirismo, o senador Ronaldo Cunha Lima (PMDB-PB) pediu novamente nesta terça-feira (dia 1º) que as águas do rio São Francisco sejam transpostas para o interior do sertão do Nordeste. Afirmou que fazia seu pronunciamento em solidariedade ao "Grito das Águas", movimento suprapartidário que acontece em Campina Grande (PB). Ronaldo ressaltou as superstições do homem nordestino, no discurso que intitulou "Três seis, três setes, três oitos e três noves".O senador lembrou que o homem do campo, no Nordeste, tem suas crendices. Acredita em botija (tesouro enterrado, segundo o dicionário Aurélio) e em mal-assombro, assim como previne-se na sexta-feira 13 e não toma banho na quarta-feira de trevas.- Maltratado pela natureza, aprendeu a conviver com ela, tirando lições dos seus fenômenos e dos seus mistérios. O trovão é o pai da coalhada. O arco-íris é o limite entre o belo e o triste: a beleza das cores que se misturam e a tristeza do sonho da chuva que não vem mais - afirmou.Da mesma forma, o nordestino acredita nas plantas e crê nas aves. Assim, disse Ronaldo, o canto da acauã prenuncia a seca, a asa branca anuncia a chuva e o carão festeja o inverno.- Em sua crendice chega a ser místico. Supersticioso, se mostra ingênuo. E em sua sabedoria, chega a ser desconfiado. Não acredita que o homem tenha ido à Lua. Se for não volta, e se voltar é porque não foi - afirmou.Ronaldo Cunha Lima citou o escritor Ariano Suassuna, segundo o qual um sociólogo foi a Taperoá, terra natal do autor. Abordou um pescador com o balaio cheio de peixes e perguntou-lhe se sabia onde ficava o Distrito Federal, o nome completo do ministro da Educação e qual era a cotação do dólar naquele dia. Diante de tantas respostas negativas, perguntou se o pescador era, realmente, ignorante.O pescador, então, foi tirando um a um cada tipo de peixe que tinha no balaio, perguntando ao sociólogo qual era o nome daqueles pescados. Diante das negativas, emendou: "Pois é, cada qual com a sua ignorância".Para Ronaldo Cunha Lima, as crendices, superstições e sabedoria do nordestino estão concentradas em sua preocupação com a água. O agricultor da região espera a chuva até o dia de São José (19 de março), senão não planta mais. As referências que eles têm dos indicadores de chuva são os ninhos do fura-barreira e do joão-de-barro, a festa das tanajuras, o vôo das saúvas e o esconderijo dos marimbondos. Além disto, há os adivinhos ou adivinhões, segundo ele verdadeiros profetas, respeitados pelos acertos de suas previsões.O senador citou então artigo publicado pelo poeta Gerardo de Melo Mourão na Folha de S.Paulo, em março deste ano, contando a história de um desses adivinhões infalíveis, o "seu" Né, de Águas Claras. Segundo este profeta, a repetição de três números no calendário é fatal. Dizia que houve uma grande seca em 1666, menor que a de 1777 que, por sua vez, foi ainda menor que a de 1888.- Mas "seu" Né vaticinava que a seca pior, a do fim do mundo, é a que vai chegar com três noves, em 1999. Nesses três noves, segundo a previsão de "seu" Né, o Sol vai virar dragão e secar tudo: a água dos rios, o leite das cabras e o útero das mulheres - disse o senador, acrescentando a advertência final do adivinho: "Se os governos não acabarem com a seca, a seca acabará com os governos na seca dos três noves. E quem viver verá."Ronaldo Cunha Lima disse estar com medo da previsão de "seu" Né. Na Paraíba, 70% dos açudes estão secos. Lembrou que desde 1996 se anuncia uma grande seca para o Nordeste. E que há 100 anos a transposição do São Francisco foi prometida. O senador recordou ter pedido a transposição ao presidente Fernando Henrique Cardoso, com a certeza de que ele atenderá à solicitação. Da mesma forma, pediu à bancada paraibana no Congresso o apoio a uma emenda orçamentária em favor da transposição. Afirmou que continuará pedindo pelos nordestinos "que, em sua crença, já pediram o São Francisco até a São José".- Não importa que, em vez da asa branca, seja um tucano que anuncia o advento desse novo tempo - finalizou.
01/12/1998
Agência Senado
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