Serra em busca dos militares
Serra em busca dos militares
Candidato tucano quer disputar com Lula a simpatia das Forças Armadas
BRASÍLIA - Numa tentativa de frear a aproximação de militares da reserva com Luís Inácio Lula da Silva, do PT, o candidato do PSDB, José Serra vai exibir hoje um perfil nacionalista aos militares. Ele vai estar hoje, às 14h, no Hotel Glória, para uma palestra para os representantes da Fundação de Altos Estudos da Escola Superior de Guerra (ESG).
O tucano deverá firmar um compromisso para dar continuidade aos programas prioritários das três forças armadas. Isso inclui a construção e modernização de embarcações da Marinha, inclusive a construção do submarino nuclear.
Além disso, Serra pretende criar uma empresa nacional para construção de navios e equipamentos navais para exportação - nos moldes da Embraer. Todos os pontos do programa contaram com ajuda de militares da reserva.
O candidato vai prometer se empenhar no reaparelhamento do Exército e da Força Aérea, além de implementar o Programa Calha Norte e o Sistema de Vigilância da Amazônia (Sivan).
- A renovação da frota da FAB, por exemplo, terá que levar em conta a política de ampliação do mercado de trabalho, uma nova política industrial - anunciou o coordenador do programa de governo de Serra, Luís Paulo Velozzo Lucas.
Serra prometerá, ainda, subsídios às indústrias de material bélico para estimular a produção e exportação de armas e material de defesa, como reforço à balança comercial do país. Mesmo assim, manterá sem contingenciamento para 2003 o Orçamento das Forças Armadas, de R$ 4,5 milhões para custeio e investimento conforme a proposta encaminhada pelo ministro Geraldo Quintão.
Caso seja eleito presidente, o tucano prometeu não permitir dispensa de recrutas por falta de recursos, como aconteceu na gestão de Fernando Henrique Cardoso. Serra dirá ainda aos militares da reserva que a estabilidade econômica permitirá o reaparelhamento sem comprometer os programas sociais.
Manter a democracia contra as ameaças da guerra, do terrorismo e do crime será o tripé da Defesa Nacional, diz o assessor do candidato tucano.
- É imprescindível que as Forças Armadas brasileiras melhorem seu equipamento e o treinamento de seus efetivos em todo o território nacional - afirmou.
Serra deverá manifestar restrições à renovação do protocolo com o governo dos EUA para o lançamento de foguetes pela Base de Alcântara no Maranhão. Mas aceitará um acordo, desde que haja revisão dos termos, assegurando o repasse de tecnologia e a contratação de brasileiros.
Serra deverá se manifestar, ainda, favoravelmente à continuidade do serviço militar obrigatório. Vai enfatizar que, apesar de não ter o apoio do ex-presidente José Sarney à sua candidatura, incluiu em seu programa o projeto Calha Norte, iniciado pelo ex-presidente em 1989. Enfatizará também a importância da estratégia de presença na Amazônia, por causa da situação na Colômbia. E prometeu reforçar ainda os vínculos regionais de cooperação militar na América do Sul , sem prejuízo das relações bilaterais.
Aprofundará, também, os atuais programas de cooperação tecnológica de natureza civil e militar, como nas áreas de telecomunicações e de satélites com a China. E vai anunciar ainda a futura instalação, na Região Nordeste, de um sistema de proteção ao vôo semelhante ao Sivam.
Outra novidade será a criação de uma matéria que trate de introduzir informações sobre a carreira militar no ensino médio, no âmbito do programa de orientação para escolha de profissões.
Por fim, para a Região Amazônica, fará a promessa de construção de 20 navios-hospitais da Marinha, com o apoio da Petrobrás, visando a ampliação do atendimento às populações ribeirinhas.
Ciro se distancia de Brizola
Se não bastassem as sucessivas quedas nas pesquisas eleitorais, o candidato da Frente Trabalhista à Presidência da República acaba de perder um aliado de fôlego no Rio de Janeiro. A pouco menos de um mês do primeiro turno das eleições, o ex-governador Leonel de Moura Brizola começa a se afastar da coordenação nacional da campanha de Ciro Gomes.
- Ele tem que cuidar também de sua eleição, afinal, é candidato ao Senado e não pode ficar sem fazer a sua própria campanha - afirmou o outro candidato a senador do PDT, Carlos Lupi.
Quanto mais o candidato do PPS a presidente se distancia do segundo turno, mais difícil fica manter os aliados em torno de sua pretensão ao Palácio do Planalto.
Presidente Nacional do PT, José Dirceu afirmou, no final de semana, que a expectativa de seu partido é que Ciro chegue ao primeiro turno ''com o nível histórico de 10% dos votos válidos''.
- Esperamos que ele seja um grande eleitor de Lula no segundo turno, pois seus votos serão importantes para consolidar a vitória de Lula, caso a vitória não aconteça na primeira fase das eleições - afirmou Dirceu.
Também no comitê de Lula, o deputado João Paulo Cunha (PT-SP) acredita que Ciro está fora do páreo.
- Ou Lula ganha no primeiro turno, ou disputa contra Serra. Não contamos mais com disputa contra Ciro, mas ainda temos esperança de que podemos ganhar no primeiro turno - avalia.
ACM diz que vota em Lula
BRASÍLIA - Os votos do ex-senador Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA) são muito bem-vindos no PT. O porta-voz de Luiz Inácio Lula da Silva, André Singer, afirmou ontem que o candidato petista não exige atestado ideológico de seus eleitores. Antonio Carlos, por sua vez, ressalta que ainda acredita na presença de Ciro Gomes, da Frente Trabalhista, no segundo turno das eleições. Mas caso isso não aconteça, e o segundo turno for entre Lula e Serra, vai mesmo apoiar o petista.
- Não tenho ressentimentos por Lula nem ele por mim. Nesse caso, voto nele, porque não voto em Serra - disse ACM.
No último sábado à noite, em um comício em Campinas, Lula pediu votos para os candidatos do PT ao Senado, argumentando que precisaria de políticos para enfrentar o ex-senador baiano. Para ACM, a declaração não é um recado de que Lula fechou as portas para negociações de segundo turno. Ele faz suspense sobre possíveis conversas com a cúpula do PT.
- Se estou conversando, não vou contar para os jornalistas. PT saudações - brincou o senador baiano.
Apesar disso, ACM admite que será oposição a Lula em um governo petista no próximo ano. Segundo ele, isso é natural, uma vez que ambos pertencem a diferentes partidos.
- É público que ACM e PT expressam posições divergentes, mas nem por isso exigiremos atestado ideológico para quem quiser votar em nós. À frente de um governo, não estamos preocupados com oposição e situação - afirma o porta-voz petista.
Lula cogita vencer no primeiro turno
Comitê petista aguarda novas pesquisas
ARACAJU e BRASÍLIA - O candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, fez ontem, pela primeira vez, referências indiretas à possibilidade de vencer a eleição no primeiro turno.
- Se depender do meu esforço, vou fazer o possível para ganhar as eleições o mais rápido que eu puder - disse Lula em comício para 20 mil pessoas, no centro de Aracaju.
O comando de campanha de Lula, apesar de não manifestar abertamente a expectativa de uma vitória já no dia 6 de outubro, acredita que as próximas pesquisas poderão registrar uma nova ascensão do petista. Caso Lula atinja 44%, a operação para vencer no primeiro turno ficará mais explícita.
Sem citar nominalmente o procurador Luiz Francisco de Saouza, Lula saiu sua defesa. Luiz Francisco está sendo acusado pelo tucano José Serra de agir de forma eleitoreira, em favor do PT.
- Todos aprendemos que quem não chora não mama. Quem não tem argumento joga a culpa em cima dos outros.
No comício de ontem em Sergipe, Lula recebeu apoio do senador Antonio Carlos Valadares, do PSB, partido de Anthony Garotinho.
De Aracaju, Lula seguiu para Teresina, capital do Piauí, Estado em que o candidato do PT disputa o governo com boas chances de vitória. A direção nacional do PT decidiu monitorar com mais atenção a disputa no Estado. A campanha do PT foi reforçada com a presença do coordenador da campanha de Lula no Nordeste, Geraldo Acioly, e de um advogado do comando nacional. Com o objetivo de respaldar a candidatura de Dias, os dirigentes petistas também organizaram ontem um comício em Teresina.
A preocupação do PT aumentou depois que a Justiça Eleitoral do Estado impugnou a divulgação de pesquisas que indicariam um empate técnico com ligeira vantagem para o candidato do partido. Os dirigentes do partido afirmam que os partidários do governador tentam evitar que os eleitores se informem sobre as sondagens. Ontem uma pesquisa mostrou pequena vantagem para Wellington Dias, candidato do PT, sobre o governador Hugo Napoleão, que tenta a reeleição.
- Aqui não se disputa eleição. A gente trava uma guerra contra pessoas que não sabem o que é democracia - reclamou o secretário de Comunicação do PT no Piauí, Oscar de Barros.
Semana passada, a campanha esquentou com acusações recíprocas. O PT pediu a impugnação da candidatura do governador alegando uso da máquina administrativa e abuso de poder econômico.
Garotinho assegura estar em 2°
Anthony Garotinho, candidato do PSB a presidente, disse ontem que continua duvidando dos institutos de pesquisa, mesmo depois que eles começaram a apontar um crescimento de sua candidatura, nas últimas semanas. Segundo Garotinho, pesquisas realizadas pelo PSB indicam que ele está à frente de Ciro Gomes (PPS) e tecnicamente empatado com José Serra (PSDB) no segundo lugar.
Garotinho afirmou que que não pode divulgar essas pesquisas porque elas não foram registradas na Justiça Eleitoral. Mas não explicou a razão disso.
O candidato do PSB assegurou, ainda, ter a certeza de que vai disputar o segundo turno contra o petista Luiz Inácio Lula da Silva. E que está disposto a aceitar o apoio do presidente nacional do PDT, Leonel Brizola.
Garotinho disse também que foi o primeiro a denunciar que o candidato do PT quer ganhar a eleição a qualquer custo, quando comentou declarações do líder do MST (Movimento dos Trabalhadores Sem Terra), João Pedro Stédile. O líder dos sem-terra tinha dito que o programa de Lula em relação à questão agrária não é de esquerda, mas de centro.
Alckmin ultrapassa Maluf em São Paulo
SÃO PAULO, BELO HORIZONTE e TERESINA - O governador Geraldo Alckmin, que concorre à reeleição em São Paulo, ultrapassou pela primeira vez o ex-prefeito Paulo Maluf, segundo pesquisa do Ibope divulgada ontem. Alckmin aparece com 29% das intenções de voto, contra 28% de Maluf. A diferença está dentro da margem de erro. Em terceiro lugar vem o petista José Genoino, que vem subindo a cada pesquisa, aparece com 19%. Os demais candidatos, somados, têm 6%.
Nas duas simulações de segundo turno, Alckmin vence Maluf por 48% a 39%. Maluf e Genoino empatam em 43% das preferências dos eleitores.
Em Minas, o presidente da Câmara dos Deputados, Aécio Neves (PSDB), ampliou em 14 pontos percentuais sua vantagem em relação ao vice-governador Newton Cardoso (PMDB) na disputa pelo governo, segundo pesquisa do instituto EM Data divulgada ontem pelo jornal Estado de Minas.
Se a eleição fosse hoje, Aécio - que conta com o apoio do governador Itamar Franco - venceria no primeiro turno, com 52% dos votos (7 pontos percentuais a mais do que o levantamento anterior do mesmo instituto). Todos os seus adversários, juntos, somam 30%. Newton caiu 7 pontos percentuais em relação à última pesquisa e está com 15%, tecnicamente empatado com o petista Nilmário Miranda, que subiu 4 pontos e está com 11%.
No Piauí, segundo o Ibope, o candidato petista, Wellington Dias, está liderando a corrida pelo governo do Estado, com 45% das intenções de voto. Logo atrás, em empate técnico, está governador Hugo Napoleão (PFL), que tenta a reeleição, com 43%. Os demais candidatos somam 3%.
TRE do Acre sob suspeita
Relatório da corregedoria aponta indícios de influência do crime organizado
RIO BRANCO - A presidente do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do Acre, desembargadora Miracele Souza Lopes Borges, costuma chamar o empresário Narciso Mendes pelo apelido carinhoso de Naná. Em agosto do ano passado, o Jornal do Brasil revelou depoimentos de integrantes do Esquadrão da Morte, presos no Acre. Eles disseram que Narciso os visitou no presídio e pediu que ninguém falasse com o Ministério Público. Em troca, seriam libertados, caso Flaviano Melo assumisse o governo do Acre.
O empresário é, ainda, articulador da campanha do ex-prefeito Flaviano Melo (PMDB), que disputa o governo do Estado. O apelido carinhoso pelo qual a juíza chama o empresário é uma das informações que integram o relatório do Procedimento Administrativo instaurado pela Corregedoria Regional Eleitoral do Acre, sobre indícios de influência do crime organizado nas decisões do TRE.
O relatório afirma que as decisões de Miracele beneficiam pessoas ligadas ao crime há muito tempo. Nas eleições de 2000, diz o relatório, Miracele era corregedora regional eleitoral. Na época, o juiz- auxiliar de propaganda, Adair Longuini, decidiu fechar a TV Rio Branco, de propriedade de Narciso Mendes, por infrações contra a legislação. O advogado Ruy Duarte impetrou reclamação e Miracele suspendeu a decisão e, posteriormente, instaurou processo disciplinar contra o juiz. Segundo o relatório, a juíza Maria Cezarinete corrigiu ''tamanha aberração''. A magistrada, no entanto, não foi reconduzida ao cargo que ocupava no TRE.
Outra fato atribuído à desembargadora Miracele, no fim do ano passado, foi a colocação de toda a estrutura do Cartório Móvel à disposição do PFL. O partido realizaria serviços de alistamento eleitoral no município de Capixaba. Essa ''aberração'', diz no relatório o corregedor Regional Eleitoral, juiz Pedro Francisco da Silva, não se efetivou por iniciativa da juíza Mirla Regina, que via nisso apoio a políticos.
O juiz substituto do TRE acreano Wellington de Carvalho Coelho prestou depoimento dia 27 de agosto à corregedoria e contou ter sido convocado pela presidente Miracele. Ela primeiro reclamou da existência de muita propaganda próximo de sua residência. Depois, Wellington recebeu a visita de outro membro do TRE, o juiz Francisco Djalma da Silva, que perguntou o motivo de haver ''tantas representações'' contra a aliança partidária que Narciso apóia e ''tão poucas'' representações contra a Frente Popular Acreana, do governador Jorge Viana (PT).
A lista de documentos levantados contra Miracele inclui uma notícia-crime contra a desembargadora, impetrada no último dia 6 pelo Ministério Público Estadual. Segundo a petição, Miracele vem retardando indevidamente lavratura de acórdão de um caso julgado em maio do ano passado, para impedir que o Ministério Público recorra. Ao não publicar o acórdão, informam no documento os promotores, Miracele está permitindo que o irmão de Hildebrando, Pedro Pascoal - preso por homicídio contra adolescente, com requintes de crueldade - ''goze de regalias'' e fique no alojamento dos oficiais da ativa da PM, local considerado sem segurança. O MP quer a transferência de Pedro para o Quartel da PM.
A desembargadora Miracele também é acusada pela corregedoria de efetuar pagamento à TV de Narciso sem respeitar a Lei de Licitações. No relatório, o corregedor Pedro Francisco escreveu: ''Os elementos colhidos são firmes ao indicar a manipulação de decisões judiciais em benefício de grupo político ligado ao crime organizado''.
Plebiscito da Alca terá resultado hoje
Previsão é de 10 milhões de votos
BRASÍLIA - Representantes de entidades que participam da Campanha Jubileu Sul/Brasil divulgam hoje, às 11 horas, na Câmara dos Deputados, o resultado final do plebiscito da Alca. A expectativa do candidato do PSTU à Presidência, José Maria de Almeida, é a de que 10 milhões de pessoas tenham participado da votação, superando os 5,4 milhões de votos dados no plebiscito sobre a dívida externa, realizado em 2000.
- Mais do que os números finais, o que importa é o debate suscitado na sociedade - afirmou Zé Maria.
O candidato do PSTU acha que a entrada do Brasil na Alca não vem sendo discutido de forma correta e responsável. Segundo ele, os adversários na eleição presidencial estão escondendo o tema da população. Além da Alca, ele destaca o debate em torno da utilização da base militar de Alcântara, no Maranhão.
Em um momento no qual o governo dos Estados Unidos planeja invadir o Iraque, os brasileiros estão preocupados em ter de ceder parte de seu território para a construção de uma base militar - complementou.
O coordenador nacional do MST, João Pedro Stédile, além de D. Franco Masserdoti (Conselho Indigenista Missionário), Sandra Quintela (Instituto de Políticas Alternativas para o Cone Sul) e representantes da CUT, da UNE e do Sindicato dos Advogados de São Paulo participarão da divulgação dos números finais do plebiscito.
Na parte da tarde, as entidades vão se reunir com um grupo de aproximadamente 700 famílias de trabalhadores sem-terra. Eles estão marchando em direção a Brasília desde a madrugada de domingo. Partiram do acampamento Oziel, próximo ao rio Pipiripau, saída norte do Distrito Federal. São 54 km até chegar à capital federal.
O grupo marcou audiências com o secretário-geral da Presidência, Euclides Scalco, e com o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Marco Aurélio. Eles pretendem encontrar-se, ainda, com os presidentes da Câmara, Aécio Neves (PSDB-MG) e do Senado, Ramez Tebet (PMDB-MS).
Amanhã, estão previstas novas reuniões para definir, a partir da divulgação do resultado final do plebiscito, quais serão os próximos passos para impedir a entrada do Brasil na Alca. Às 11 horas, uma comissão irá encontrar-se com a embaixadora dos Estados Unidos, Donna Hrinak, para apresentar o documento.
Artigos
A quebra e o muro
Jarbas Passarinho
Até há 20 anos, quem ingressara no Serviço Público Federal, (normalmente por concurso universal), desfrutava três vantagens importantes: recebia os vencimentos em dia, adquiria a estabilidade e a União bancava a sua aposentadoria. Os militares contribuíam para a pensão, como forma de assegurar que, por sua morte, os dependentes não ficassem totalmente ao Deus dará. Os civis, para a pensão e pecúlio. Ninguém para a aposentadoria. A carreira castrense e a dos servidores civis proporcionavam-lhes segurança e tranqüilidade quando passassem desta vida para melhor, na suposição de obter saldo justificável na contabilidade das virtudes e dos pecados perante o justo tribunal divino. Ademais, gozavam de status social, mas não de riqueza, a que se habilitavam os espertos conjugadores dos tempos e modos do verbo surrupiar, que o padre Vieira vulgarizou...
Tais vantagens - verdadeiros privilégios - vieram a desaparecer à medida que o Tesouro nacional enfraquecia, por falta talvez de arrecadadores eficientes e vorazes, como Everardo Maciel, ou - o que é mais certo - por efeito de administrações públicas desastrosas dos campeões de promessas em palanques eleitorais que, antes da posse, beberam a água do Rio Letes, que a mitologia diz servir para perder a memória, ou banharam-se no Rio Preguiça, do Maranhão, e ficaram lentos e demorados. Com o caixa cada vez mais baixo, o país quebrou, no início dos anos 90 do sangrento século XX. O governo taxou o serviço ativo. Não bastou. Pretendeu fazer com que inativos e pensionistas passassem a contribuir para o custeio da previdência social dos servidores públicos. A grita foi geral. O presidente esbarrou na resistência do Congresso, que negou aprovação ao projeto de lei, reiteradas vezes, por iníquo, ou - quem sabe? - pelo temor de pagar nas eleições o preço da aprovação. Os parlamentares ouviram o clamor popular sob pena de minguarem, nas urnas, os preciosos votos para a reeleição, retirando-lhes o mandato com que servem à nação e jamais aos seus próprios interesses...
Chegam, agora, suas excelências os candidatos ao Palácio do Planalto, prometendo-nos a salvação da Previdência Social. Só no que se refere aos regimes do setor público (os três poderes, Estados e municípios ) encontrarão um déficit enorme. Em 2001, foi da ordem de 48 bilhões de reais, ao que se adicionaram 15 bilhões correspondentes ao INSS, responsável por 20 milhões de pensionistas e aposentados. Muitos milhões destes jamais contribuíram para os cofres do instituto. São os favorecidos pelos benefícios sem custeio próprio. Algo louvável, como política pública social, mas condenável por fazer da contribuição de patrões e empregados a fonte única de custeio. O presidente FHC, não faz muito tempo, citou o Fundo Rural como o maior projeto de renda mínima, no mundo. Criado por Jango, sem recursos, e transformado, pelos militares, no único sustento de milhões da pobre gente do campo, com a criação da Previdência Rural, em 1969, e da aposentadoria de meio salário mínimo, por Médici, duplicada pela Constituição cidadã de 1988. Só que deveria ter sido custeada por fundo específico e não como parasita do INSS. Refiro-me a um só benefício sem custeio, mas Geisel criou outro (Renda Mensal Vitalícia) e os constituintes outros mais, todos generosos. A Constituição aumentou o rombo da Previdência Social com a Seguridade Social, cujas fontes são insuficientes para atender a todos, contribuintes ou não, do berço ao túmulo. Um passo maior que as pernas podem dar.
As propostas dos candidatos, por inócuas, levam-me a imitar o pessimista que se sentia mal quando estava bem pelo medo de ficar pior ao esperar ficar melhor. Um, resolve tudo com a incorporação da economia informal ao INSS. Outro, extinguindo a corrupção. O terceiro, falando difícil para não iniciados, dizendo mudar o regime de repartição para o de capitalização. O último, tornando a Previdência um sistema totalmente público. Ah! Petrarca, porque há seis séculos em teu soneto advertiste o homem que ''Tra la spiga e la man, qual muro he messo''? Os promesseiros não vêem o muro, que Reinhold Stephanes estima poder chegar a 2 trilhões de reais...
Colunistas
COISAS DA POLÍTICA – Dora Kramer
Objetivos muito bem definidos
Política e eleitoralmente falando, estão corretos os candidatos Luiz Inácio Lula da Silva e José Serra nas táticas que adotaram para se enfrentarem mutuamente: o PT, ao criar um clima de provável vitória do primeiro turno e a aliança PSDB-PMDB ao insistir em chamar o adversário para a briga de conteúdo.
Os respectivos marqueteiros e correligionários sabem perfeitamente bem que Lula é imbatível na emoção - notadamente vis-à-vis os predicados (ou falta deles) neste quesito daquele que, por enquanto, é seu mais provável adversário no segundo turno -, e Serra um páreo duro no que tange à razão.
Portanto, ambos estão recorrendo aos armamentos legítimos que têm à mão. Cada qual procurando ressaltar o que há de melhor em si. Não obstante Ciro Gomes revolte-se porque o petista não o tenha defendido da ofensiva tucana, em disputa por vaga única quem não cuida da própria vida acaba perdendo o bonde.
Lula, na é poca, precisava cuidar de preservar suas relações com os governistas, a fim de resguardar apoios importantes para a etapa final. Se daquele que parecia seu oponente mais provável havia quem cuidasse - no caso, o tucano - seria muita tolice de Lula imbuir-se da, no dizer de Ciro, ''tarefa republicana'' de atacar uma candidatura que, em tese, não o ameaçava diretamente.
O cenário mudou. Não sabemos ainda se mudou em definitivo. Estranhamente, quem fornece elementos para que raciocinemos com certa segurança a respeito de um embate Serra-Lula é a própria campanha da Frente Trabalhista.
As brigas públicas entre os partidos da aliança, o discurso de derrotado que faz o candidato e a carga pesada sobre o marqueteiro de Ciro, soam desproporcionais aos índices até então apresentados pelas pesquisas.
Afinal, Ciro trocou de lugar com Serra, mas a distância não é nada de tão espetacular que justifique, por exemplo, o PFL já marcar uma data (10 de outubro) para reunir seu comando e definir o destino do partido no segundo turno.
Por essas e por outras é que surge a desconfiança de que talvez a campanha tenha informações mais precisas que os índices de intenções de voto, para criar um clima de desânimo e um desacerto, à primeira vista, excessivos.
Mas, voltando a Lula e Serra, examinávamos os respectivos movimentos na fase de apronto para o provável enfrentamento.
Não há motivo algum para que qualquer um dos candidatos adote a posição de vítima frente ao adversário. O PT, chamado ao debate sobre questões concretas, estará tergiversando se tentar argumentar que Serra age com preconceito ao cobrar preparo de seu adversário e pôr em xeque seus atributos administrativos.
Afinal, o profundo conhecimento e manejo da causa a que está se propondo é fator fundamental para o candidato a chefe da nação. O concurso não é de beleza nem Suas Excelências disputam a posse de estatuetas por desempenho performático.
Da mesma forma, o tucano precisará medir bastante bem a ênfase e o enfoque a serem adotados para fazer o PT sair da postura plástica que tem dado certo até agora. Isso porque Lula não comete crime algum ao assumir um papel que lhe parece mais adequado junto ao eleitorado.
Durante anos a fio, o que se cobrou do PT foi exatamente uma conexão com as demandas reais da sociedade e não com os interesses das tendências internas do partido. Agora que Lula afia o discurso externo, pode ser até compreensível que o oponente explore o dado para ressaltar incongruências. Só não pode esperar que o petista aceite, de livre a espontânea vontade, lutar em terreno desfavorável.
Críticas , quando guardam relação com a realidade e fazem sentido na percepção do eleitorado, dificilmente deixam de render resultados. Mas queixumes de vítima vilipendiada por conspirações inexistentes, denotam fragilidade de conteúdo e tendência a certo tipo de psicopatia que, convenhamos, não sabem bem ao paladar de quem escolhe um presidente da República.
Podemos incluir aí tanto as acusações de que as decisões da Justiça Eleitoral têm relação direta com a amizade entre o presidente do TSE e Serra, quanto a conclusão antecipada de que o procurador Luiz Francisco de Souza avaliza denúncias contra o tucano porque um dia já foi filiado ao PT.
Em termos de eficácia, até eleitoral, não há suposição simplista que substitua uma convincente e, principalmente, consistente defesa.
Linha dura
O major da Polícia Militar indicado para dirigir o Departamento do Sistema Penitenciário do Rio, Hugo Freire de Vasconcelos Filho, deu o seguinte aviso aos navegantes:
''Vamos explicar ao preso que ele não manda mais na cadeia. Vamos acabar com as mordomias.''
De duas, uma: ou o major errou a mão na ironia ou não entendeu que o problema não é suspender mordomias, é a existência delas.
Editorial
À MARGEM DA LEI
O risco crescente despertou a sociedade para a invasão da Mata Atlântica - sul do Estado do Rio - por favelas e loteamentos clandestinos. A consciência do perigo reuniu ambientalistas e empresários do litoral sul para, mais do que denunciar, deter a expansão descontrolada do comércio clandestino de lotes. O desagrado dos turistas cresce.
Com a paisagem desfigurada, sobre a Mata Atlântica pesa ameaça definitiva. A ocupação predatória da natureza privilegiada se fez sem alarde, mas as fotografias aéreas revelam o que se esconde sob o verde que se pode ver da rodovia Rio-Santos.
Não é difícil imaginar o que em breve mostrará a ocupação irregular do solo em matéria de saneamento básico. Entre Angra e Mangaratiba, a degradação da paisagem prenuncia catástrofe ecológica que não se fará esperar por muito tempo. Mas não bastará apenas o governo: será indispensável que a iniciativa privada tenha normas para agir preventiva e corretivamente. Quanto mais cedo, melhor.
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09/17/2002
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