ACM Júnior diz que audiência pública dissipou dúvidas sobre papel do BC na regulação, normatização e fiscalização do sistema financeiro



O relator dos projetos de lei que tratam da autonomia do Banco Central (BC), senador Antonio Carlos Júnior (DEM-BA), disse que dissipou todas as dúvidas remanescentes sobre a manutenção, na alçada do BC, das funções de regulação, normatização e fiscalização do sistema financeiro. Ele participou de uma audiência pública na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) para debater os Projetos de Lei do Senado (PLS) 72 e 102, de 2007, que tramitam em conjunto. Ambas as propostas são de autoria do senador Arthur Virgílio Neto (PSDB-AM).

A audiência pública contou com a presença do presidente do BC, Henrique Meirelles; dos ex-presidentes dessa instituição Armínio Fraga e Gustavo Loyola; e do ex-ministro da Fazenda Mailson da Nóbrega. Além do assunto em questão, eles comentaram, a pedido dos senadores, o projeto para criação do Fundo Soberano e a Medida Provisória 443, que permite que Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal adquiram participação em outras instituições financeiras - ambos na pauta de Plenário desta terça-feira (16).

O senador Antonio Carlos Júnior defendeu a normatização da autonomia do Banco Central. Argumentou que a autonomia de fato hoje exercida - por concessão do atual presidente da República e de seu antecessor - pode ser retirada, caso haja uma forte pressão para tal.

Comparativo

Em sua exposição, Henrique Meirelles evitou fazer juízo de valor, se atendo a detalhar a atual situação do BC e a comparar sua atuação com a de seus congêneres no mundo. Alegando compromissos institucionais, retirou-se logo após sua exposição, não permanecendo para responder indagações dos senadores.

Meirelles afirmou que existem três tipos de autonomia de bancos centrais: autonomia de objetivo, na qual o próprio BC define seu objetivo primário, como, por exemplo, a estabilidade de preços; a autonomia de meta, na qual o BC define, por exemplo, a meta para a inflação; e a autonomia de instrumento, ou seja, os meios para alcançar o objetivo e a meta traçados.

O presidente do BC trouxe uma lista de 30 bancos centrais, dos quais 25 são autônomos por determinação constitucional ou legal. Disse que 30% desses têm a estabilidade de preços como objetivo único, ao passo que outros 30% têm como objetivo a estabilidade de preços e a estabilidade financeira. Citou, entre os que têm autonomia de meta, os Bancos Centrais dos Estados Unidos, da Europa e do Chile; e, entre os que têm autonomia de instrumento, os BCs da África do Sul, da Austrália, do Canadá e da Colômbia. Informou também que nem sempre os BCs cuidam, ao mesmo tempo, da regulamentação e da fiscalização do sistema financeiro, mas que são poucos esses casos, citando como exemplo o Banco da Inglaterra.

O presidente do BC lembrou que o Tratado de Maastricht, que selou a constituição da União Européia em 1992, estabelecia como pré-condição para ingresso no bloco o banco central independente. Meirelles informou ainda que mais de 90% dos bancos citados têm diretores com mandatos iguais ou maiores que cinco anos.

Pré-requisitos

O ex-ministro Mailson da Nóbrega afirmou que o Brasil tem hoje os requisitos para autonomia operacional do BC, citando a democracia fortalecida, instituições econômicas fortes e a aversão da sociedade à inflação alta. Disse que o BC já desfruta hoje de uma autonomia de fato, necessitando apenas de mandato para seus diretores.

Mailson sugeriu a extinção do Conselho Monetário Nacional (CMN) - que, no projeto e no substitutivo, é chamado de Conselho Financeiro Nacional. De acordo com ele, o CMN é "um resquício de autoritarismo" e "um absurdo institucional".

Armínio Fraga elogiou a parte do texto substitutivo apresentado por Antonio Carlos Júnior que preserva a natureza microeconômica da fiscalização e a natureza macroeconômica da supervisão do sistema financeiro nas mãos do Banco Central. Segundo ele, é a melhor forma de se prevenir e manter a solvência do sistema.

O ex-presidente do BC sugeriu uma "revisão completa" da legislação sobre o papel do BC. Ressalvando não ser o tema da audiência pública, previu que o BC terá espaço, na atual crise financeira internacional, de reduzir as taxas de juros de forma talvez surpreendente.

Gustavo Loyola chamou a atenção para a necessidade de mecanismos de coordenação das ações do Banco Central com o governo. Citou o exemplo da política cambial, cujas decisões, em sua opinião, têm de ser compartilhadas com o Tesouro Nacional. Também disse não ver vantagens em se retirar do BC a supervisão do sistema financeiro. Opinou ainda que o BC não deveria cuidar da liquidação de ativos de bancos sob intervenção.

Loyola defendeu alterações no projeto para deixar mais clara a questão das reservas internacionais do Brasil. As reservas são administradas pelo BC, mas ele indaga de quem são, na verdade, as reservas: se do BC ou da União.

O senador João Tenório (PSDB-AL) afirmou que, se por um lado, a autonomia do Banco Central garante a estabilidade da moeda, por outro, o atual governo - que qualificou como perdulário - se sente à vontade para continuar gastando mal o dinheiro do contribuinte.

Fundo Soberano

Os três expositores que responderam às perguntas dos parlamentares manifestaram-se contrários à aprovação do Fundo Soberano, uma vez que o Brasil não tem superávit fiscal nem superávit na balança de pagamentos. Já a MP 443 - que, entre outros pontos, permite que o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal adquiram carteiras de crédito de outras instituições financeiras - foi criticada por não ter um prazo de validade e por expor as instituições bancárias federais a conflitos de interesses.

O senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) opinou que a MP 443 retira do BC o direito de administrar o sistema financeiro em determinados momentos. O senador José Agripino (DEM-RN) disse que o Fundo Soberano é "uma super DRU ", em referência à Emenda Constitucional da Desvinculação de Recursos da União, que permite ao Poder Executivo gastar livremente uma parcela dos recursos do orçamento que deveria estar vinculada, por lei ou pela Constituição, a determinadas ações.

O senador Arthur Virgílio afirmou que o governo incorre numa "brutal futilidade" ao defender a aprovação do Fundo Soberano enquanto finge não ver a gravidade da atual crise financeira internacional. Ao final, o presidente da CCJ, senador Marco Maciel (DEM-PE), agradeceu a presença dos debatedores e encerrou a reunião.



16/12/2008

Agência Senado


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