Aliados do Planalto discutem aumentar CPMF









Aliados do Planalto discutem aumentar CPMF
Idéia é não elevar mais a CSLL e usar imposto do cheque para compensar perda com correção do IR

BRASÍLIA - O presidente Fernando Henrique Cardoso decidiu ontem que vai reeditar a medida provisória que corrige a tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física e tirar do texto o aumento da Contribuição Sobre o Lucro Líquido (CSLL) para as empresas prestadoras de serviços. Durante reunião no Palácio da Alvorada, os presidentes dos partidos aliados passaram a discutir com ele uma nova hipótese para compensar a perda de receita provocada pelo reajuste da tabela em 17,5%: a elevação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF).

Criada em 1993 com alíquota de 0,2%, a CPMF está hoje no seu nível mais alto - 0,38%, cobrados de todas as operações bancárias. A possibilidade de aumentar a contribuição foi apontada aos jornalistas pelo presidente nacional do PSDB, deputado José Aníbal (SP), logo depois da reunião no Alvorada, da qual participaram também os presidentes do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC), e do PMDB, deputado Michel Temer (SP), e o vice-líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PPB-PR).

"Nós, dos partidos, teremos que dar uma resposta à sociedade e essa resposta tem de ter consequência. Não pode ser uma ação só de momento", disse Aníbal, que deixou claro não se tratar ainda de uma questão fechada. O problema é encontrar uma fórmula para compensar a perda de R$ 1,8 bilhão com a correção da tabela do IR. O certo é que não haverá mesmo a elevação da CSLL. "Todos os partidos têm posição contrária ao aumento desse imposto", afirmou o tucano.

O presidente do PSDB disse que o dinheiro para cobrir o rombo tem de vir de algum lugar, e rapidamente - como a CPMF acaba em junho, a prorrogação terá de ser aprovada até março. Portanto, a compensação não poderia ter origem em imposto novo, porque a legislação só permite a cobrança um ano depois de sua aprovação. No caso da contribuição, ela pode ser cobrada três meses depois de aprovada. Para os participantes da reunião, a perda de receita do governo será compensada mesmo por uma contribuição.

Mas o senador Paulo Hartung (PSB-ES), autor do projeto que corrigiu o IRPF, considerou a proposta de aumento da CPMF absurda. "No momento em que o País discute como acabar com a cumulatividade de impostos na cadeia produtiva, isso soa muito ruim", argumentou, acrescentando que o efeito cascata prejudica a produção industrial. "Quando mais aumentar a CPMF, pior para o sistema produtivo." Hartung classificou a idéia de mais um "péssimo remendo" e disse ter a certeza de que o Congresso não a aprovará.

Também foi acertado na reunião no Alvorada que o texto da MP do IR será refeito para não eliminar uma dubiedade sobre a data de extinção da alíquota do Imposto de Renda de 27,5%. A alíquota começou a ser cobrada em 1997, para melhorar as contas do governo logo após a crise da Ásia, e devia acabar em 31 de dezembro deste ano, mas a MP deixava dúvidas quanto à sua prorrogação.

Bornhausen ressalvou que existe apenas a certeza de que a data do fim da alíquota de 27,5% é em dezembro. Não há nada definido quanto à possibilidade de o governo tentar prorrogá-la por mais um período. A equipe econômica defende a manutenção dessa faixa. Até já tentou criar mais duas, de 30% e 35%, mas esbarrou na resistência do Congresso.


FHC reúne ministros para ajustar Orçamento amanhã
BRASÍLIA - A programação dos gastos do governo este ano e seu montante serão definidos amanhã, em reunião ministerial que também discutirá a sucessão do presidente Fernando Henrique Cardoso. Com o lançamento da pré-candidatura de três ministros - o tucano José Serra (Saúde), o peemedebista Raul Jungmann (Reforma Agrária) e o pepebista Pratini de Moraes (Agricultura) -, espera-se que o presidente determine o comportamento que o Executivo adotará na disputa e o prazo de desincompatibilização dos ministros candidatos.

O limite de gasto de cada ministério será apresentado pelo ministro do Planejamento, Martus Tavares, e divulgado sexta-feira, no decreto de programação orçamentária e financeira. Os valores que o governo aplicará até dezembro vão incluir um corte nas despesas incluídas no Orçamento pelo Congresso para emendas parlamentares.

Outra preocupação é adotar cuidados para evitar conflito com as Leis Eleitoral e de Responsabilidade Fiscal para a execução orçamentária em períodos eleitorais, principalmente nas obras em parceria com Estados e municípios. Pela legislação, a partir de três meses antes das eleições não podem mais ser repassadas verbas voluntárias da União que não estejam previstas nos convênios firmados até 8 de julho. Todos os procedimentos para a assinatura desses convênios estão sendo apressados pelos ministérios.

Cálculo - O decreto de programação vai adequar os números do Orçamento com a última estimativa de receitas e despesas. Para abrigar a demanda dos parlamentares por verbas neste ano eleitoral, o Congresso elevou em R$ 13 bilhões a previsão de arrecadação, da qual o governo discorda em parte.

Por orientação do Planalto, a equipe econômica teve cautela na revisão do Orçamento, para não descontentar congressistas. Mesmo assim, alguns cortes serão feitos, segundo informou uma fonte da equipe.

O relator do Orçamento, deputado Sampaio Dória (PSDB-SP), disse que o governo pode esperar até o fim de fevereiro para fazer ajustes adicionais, caso a arrecadação do primeiro bimestre indique essa necessidade. "O clima está muito explosivo para um corte de grandes dimensões", afirmou Dória.


Pedido falho atrasa liberação de dados de Maluf
Ministério da Justiça suíço alega que requisição feita pelo Brasil está incompleta

GENEBRA - O governo suíço recusou ontem um pedido formal do Brasil para fornecer informações sobre as contas que o ex-prefeito Paulo Maluf (PPB) manteve em Genebra entre 1985 e 1997. Apesar de reconhecer que "operações financeiras suspeitas" passaram pela Suíça - conforme informou na segunda-feira ao Estado o procurador-geral do Cantão de Genebra, Bernard Betossa -, o Ministério da Justiça do país não dará os dados até que o Brasil apresente provas de que há indícios de atividades ilegais envolvendo o ex-prefeito.

A carta rogatória com o pedido de cooperação foi recebida pelo Ministério da Justiça da Suíça no dia 8. Os dados que interessam aos procuradores brasileiros estão em vasto dossiê preparado pelo governo suíço depois que foram levantadas suspeitas sobre as transações financeiras do ex-prefeito.

Em contatos anteriores - por meio de cartas informais - com as autoridades suíças, os procuradores brasileiros já receberam a informação de que os recursos atribuídos a Maluf teriam sido transferidos em 1997 da agência do Citibank em Genebra para a Ilha de Jersey, paraíso fiscal do Canal da Mancha.

Falhas - Para que o Brasil conseguisse mais dados, especialmente sobre o valor exato da conta e a origem do dinheiro, teria de, então, solicitar oficialmente a cooperação dos suíços, o que ocorreu no começo do ano. "Mas ainda não temos todas as informações de que necessitamos e o pedido brasileiro não pode ser atendido por enquanto", afirmou o porta-voz do Ministério da Justiça da Suíça, Folco Galli.

"Tomamos essa decisão no último dia 17 em uma reunião interna, mas continuamos com a disposição de cooperar com o Brasil", completou o porta-voz.

O rigor dos suíços tem um motivo: não querem passar informações sobre alguém que mantém ou manteve contas no país sem que haja provas de que esse pedido tem uma base penal, e não irá servir apenas para um processo político contra o suspeito. < BR>

Serra fará discurso “à Covas” na volta ao Senado
Estratégia é fazer diagnóstico franco do País e apresentar idéias, diz coordenador de campanha

RIO - O ministro da Saúde e candidato do PSDB à Presidência, José Serra, prepara-se para reassumir sua vaga no Senado, entre 19 e 21 de fevereiro, com um discurso que os tucanos classificam como "à Mário Covas".

Referem-se a um pronunciamento feito em 1989 pelo governador de São Paulo morto no ano passado, quando se candidatou para presidente e lançou sua plataforma de governo.

Covas fez um discurso no Senado que entrou para a história do partido, pregando o "choque de capitalismo" em substituição a velhas práticas protecionistas. Na ocasião, anunciou que se apresentaria ao eleitor "sem maquiagem, para poder olhar e ser olhado nos olhos" e pregou a prática da política aliada a "ética, honra e mudança".

"Nossa preocupação é manter a característica das campanhas presidenciais do PSDB: fazer um diagnóstico franco do País e apresentar idéias para o futuro, com clareza e consistência. Mais que nunca temos de acertar nesse discurso", disse ontem o prefeito de Vitória, Luiz Paulo Vellozo Lucas, que já atua como um dos organizadores da campanha tucana.

Em 1989, até adversários dos tucanos elogiaram as palavras de Covas, que, no entanto, não conseguiu chegar ao segundo turno. A disputa foi entre Fernando Collor e Luiz Inácio Lula da Silva.

Metas - Para a campanha, Serra optou pelo lançamento de um plano de metas como plataforma de governo. Aos poucos, vai anunciar objetivos a serem cumpridos por um possível governo. Ele tem usado o termo "ativismo governamental" para resumir sua idéia de um Estado regulador.

De acordo com o prefeito, os impasses regionais que o PSDB vem enfrentando começarão a ser resolvidos agora. "Com a presença de um candidato do PSDB, nos fortalecemos para discutir as questões nos Estados. As discussões internas não estão só no PSDB, mas em todos os partidos, incluindo os de oposição", lembra.

A partir de 24 de fevereiro, quando será oficializado na pré-convenção do PSDB, Serra intensificará as viagens pelo País.Com a campanha nas ruas, os tucanos decidiram não trabalhar por uma aproximação com o PFL, atualmente embalado pelos índices de intenção de voto da governadora Roseana Sarney.

Até a pré-convenção, o esforço será concentrado em fortalecer o PSDB nos Estados e organizar visitas do ministro. Paralelamente, os tucanos dialogam com o PMDB, hoje prioridade entre as possíveis legendas aliadas.

Na avaliação dos aliados de Serra, o PFL apostou em Roseana para ganhar novo fôlego na disputa política, depois de um momento de desgaste no ano passado, especialmente com a renúncia do ex-senador baiano Antonio Carlos Magalhães.

A estratégia deu certo e a governadora tem o triplo do porcentual de Serra nas pesquisas. Os tucanos, porém, não se abalam com a diferença de 21% contra 7%.

"Ainda vamos ter de conviver com isso durante algum tempo", reconhece Vellozo Lucas. Para o prefeito, no futuro o PFL deverá fazer uma avaliação da candidatura Roseana e decidir se a leva adiante ou se parte para uma aliança. "Mas essa decisão é um problema do PFL, não do PSDB", ressalta.


Tucanos apostam em viagem ao Recife para deslanchar campanha
BRASÍLIA - A cúpula do PSDB aposta que a viagem do ministro da Saúde e presidenciável do partido, José Serra, ao Recife, na próxima segunda-feira, será o evento mais importante da campanha presidencial tucana, até que o candidato abandone de vez o governo para cuidar de sua eleição. A expectativa otimista do alto tucanato tem duas explicações. Os serristas acreditam que a companhia oficial do presidente acabará explicitando a preferência de Fernando Henrique Cardoso por Serra, ao mesmo tempo em que o candidato avança rumo ao apoio do PMDB, com a boa recepção do governador de Pernambuco, Jarbas Vasconcelos.

Além da presença de Fernando Henrique e de Jarbas, o PSDB aposta no sucesso eleitoral da viagem por causa da agenda do ministro da Saúde. A assessoria de Serra está montando uma solenidade para comemorar o sucesso do Programa Agentes Comunitários - o ministério alcançou a meta de formar 150 mil agentes, cerca de um ano e meio antes do prazo previsto. Esse exército de agentes comunitários, com o uniforme do Ministério da Saúde, atua hoje em 4.786 municípios de todo País, cuidando da atenção básica de 88 milhões de brasileiros, metade no Nordeste.

O objetivo oficial da viagem é a condecoração de um agente de saúde que representará os 150 mil. O ponto alto da solenidade será a apresentação de um projeto de lei regulamentando a profissão desses agentes. O projeto, com assinatura conjunta do presidente Fernando Henrique e do ministro, será enviado ao Congresso em 15 de fevereiro.

De volta à política, o senador Serra tratará de defender a proposta, que tem arrancado aplausos insistentes dos agentes, sempre presentes em todas as solenidades do ministério. Hoje, esses profissionais participam das 13.168 equipes do Saúde da Família, participando de visitas para verificar as condições de saúde e de vida da população mais carente, orientando sobre nutrição e prevenção de doenças. Até o fim do ano, haverá mais 50 mil contratações.

Definição - A data em que o ministro deixará o governo ainda não está acertada. Mas, mesmo que Serra consiga cumprir o cronograma que planejou, saindo no dia 20, não terá chance de desfilar com o apoio de Fernando Henrique pelo Nordeste - reduto da candidata do PFL à Presidência e governadora do Maranhão, Roseana Sarney.

Segundo o presidente nacional do PSDB, deputado José Aníbal (SP), Serra será forçado a antecipar sua saída do cargo à medida em que a campanha se intensificar. Mas isso não significa que a cúpula esteja preocupada com o comportamento do candidato. "Quando Serra se desloca para alguma atividade partidária, ele pede que o partido assuma os gastos."


Garotinho lança cunhado de Roseana
Governador garante mais um palanque com Ricardo Murad, inimigo da pefelista no MA

RIO - Depois de garantir palanque estadual em São Paulo e Minas, o governador do Rio e presidenciável, Anthony Garotinho (PSB), avança agora para o reduto eleitoral da governadora do Maranhão, Roseana Sarney, segunda colocada nas pesquisas de intenção de voto à Presidência. Ontem, Garotinho anunciou que seu partido decidiu lançar Ricardo Murad ao governo maranhense. Ricardo é irmão e adversário político de Jorge Murad, marido de Roseana. "Não contamos apenas com nomes próprios no Rio, São Paulo e Minas, mas em 13 Estados da federação", contaliliza Garotinho.

Jorge Murad ocupa uma das principais secretarias do Estado, a gerência de Planejamento e Desenvolvimento Econômico. "Eu diria que o Ricardo tem coisas mais graves para contar do que o Pedro Collor (irmão do ex-presidente Fernando Collor de Mello)", provoca o governador fluminense.

No Nordeste, o PSB terá candidato próprio no Ceará, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Alagoas, onde o governador, Ronaldo Lessa, concorrerá à reeleição. Dos seis Estados da Região Norte, o partido será cabeça de chapa em três - Rondônia, Pará e Amapá.

Os socialistas só não têm candidato definido no Centro-Oeste e no Sul. No Rio Grande do Sul, segundo o próprio Garotinho, a situação tende a ser delicada, porque o governador terá de dividir palanque com o petista Luiz Inácio Lula da Silva. Lá, o PSB apóia o candidato do PT - ainda indefinido entre o atual governador Olívio Dutra e o ex-prefeito de Porto Alegre Tarso Genro.

A maior atenção de Garotinho está no Sudeste, onde se estão os maiores colégios eleitorais do País. Nos quatro Estados da região, o governador conta com fortes candidatos. No Espírito Santo, o partido lançará o senador Paulo Hartung, ex-prefeito de Vitória, que conseguiu eleger seu sucessor na cidade e deixou o cargo com mais de 80% de aprovação. Em Minas, o nome escolhido é o do presidente regional do PSB, João Leite.

A deputada federal Luiza Erundina, com quem Garotinho almoçou ontem no Palácio Guanabara, concorrerá ao governo paulista. A situação ainda continua indefinida no Rio. A direção regional do PSB escolheu em uma prévia interna, por ampla maioria, a primeira-dama Rosinha Matheus, secretária estadual de Ação Social. Rosinha, porém, está indecisa e disse que só dará resposta em fevereiro. Uma pesquisa de intenção de votos, encomendada pelos socialistas, mostra que a primeira-dama teria 32% dos votos. "Com ela ganharíamos no primeiro turno", aposta o presidente regional do partido, deputado Alexandre Cardoso.


Artigos

Desafio aos pré-candidatos
Gaudêncio Torquato

Convenhamos que os pré-candidatos Lula da Silva (e Eduardo Suplicy), Roseana Sarney, José Serra, Anthony Garotinho, Ciro Gomes, Itamar Franco (e Pedro Simon ou Raul Jungman) possuam grandes qualidades, sejam bem-intencionados e, portanto, estejam todos habilitados a pleitear o cargo de presidente da República. Pois bem, se querem passar no vestibular eleitoral, eles terão de responder a duas questões que, seguramente, ocuparão o centro do discurso político nas eleições de outubro próximo.

Primeira: como equilibrar receita e despesa, mantendo a estabilidade da moeda, promovendo o crescimento econômico e o pleno emprego, reforçando os programas sociais e melhorando o desempenho das instituições sociais e políticas?

Segunda: como debelar ou atenuar a criminalidade no País, que assume proporções catastróficas, diminuindo a violência nos grandes centros e assegurando a implantação de um programa sólido de segurança?

A primeira pergunta abriga o desafio principal das administrações, particularmente no âmbito das experiências latino-americanas, em que os governantes tendem a adotar políticas populistas, que rendem frutos apenas imediatos, comprometendo os horizontes futuros, mais duradouros. A resposta à questão implica manejar, de maneira adequada, os três cintos de governo: o político, o macroeconômico e o dos serviços públicos, cuja demanda está a exigir eficácia das estruturas. Ou seja, o candidato dirá como vai garantir a governabilidade, dar respostas às demandas políticas, fazer girar o motor do desenvolvimento, sem impor sacrifícios econômicos à população, e ainda melhorar a infra-estrutura de amparo social.

A segunda questão é imperiosa e urgente, ante a comoção nacional que tomou conta do País com o assassinato bárbaro do prefeito Celso Daniel. Uma resposta chocha, sem fundamento, poderá corroer a imagem de qualquer candidato. São assassinadas no País, por ano, cerca de 40 mil pessoas, quantidade maior que a das vítimas das guerras contemporâneas. A indústria do seqüestro já insere o País no quarto lugar do mundo nessa espécie de crime. No campo dos homicídios, com 24 assassinados por 100 mil habitantes, o Brasil só perde para a Colômbia, onde o índice chega aos 78 mortos. E, entre nós, o verbo da promessa caiu no vazio e no descrédito.

As respostas dos candidatos deverão evitar a trapaça ou o sofisma. Por isso mesmo, condições preliminares se fazem necessárias para enquadrar as respostas, dentre elas a exeqüibilidade, os custos, o tempo, as populações atingidas e, dentro destas, os grupos mais necessitados. Importa, sobretudo, demonstrar a viabilidade das ações. As propostas cairão no descrédito caso seus efeitos ultrapassem o tempo além do horizonte de quatro anos, que é o período do mandato. A população clama por soluções imediatas, particularmente para o combate à criminalidade. Urge acabar com a cultura de "empurrar com a barriga". Basta ver o que ocorreu com o tão propalado programa de segurança, que previa recursos de R$ 800 milhões para conter a gigantesca onda de violência que dissemina uma cultura de terror e medo.

Onde está o dinheiro? Será que os mandatários não se envergonham diante das promessas feitas e não cumpridas?

Na área macroeconômica, se o PT quer mudar o modelo, há de esclarecer muito bem como vai implantar um sistema capaz de garantir as conquistas do Plano Real e, ao mesmo tempo, proporcionar melhor distribuição da riqueza nacional. Se o efeito demonstração for adequado, vai criar impacto e Lula, saindo do seu tradicional estilo diagnóstico, se estará habilitando ao cargo de presidente. Pode diminuir a enorme rejeição a seu nome e ainda ganhar espaços de simpatia caso o programa de segurança do PT seja aplaudido.

Roseana não poderá discriminar São Paulo apenas porque este é o carro-chefe da Federação. Aqui estão os maiores contingentes de trabalhadores, as maiores classes médias, o maior ajuntamento industrial, de comércio e de serviços do País, enfim, o maior PIB. Qualquer programa para o Brasil passa, necessariamente, por uma análise exaustiva das demandas de um Estado que abarca 24 milhões de eleitores. São Paulo é um laboratório dos problemas brasileiros. Além disso, é preciso ter cuidado com o marketing de ênfase no gênero feminino. Mulher não é fator racional de campanha. É apelo emotivo.

Não adianta forçar emoção e se apresentar como sabonete.

José Serra, um político preparado, vai ter de provar que quatro não é apenas a soma de dois mais dois. Há de demonstrar ser possível baixar juros sem diminuir o fluxo de capitais internacionais ou comprometer a política tributária e o programa de ajuste fiscal da administração. Mais do que outros, pois faz parte do núcleo central do governo, cabe-lhe desfazer as amarras que prendem o Executivo numa fechada engrenagem monetarista, cuja imagem é a de um monstro voraz a avançar sobre o bolso dos consumidores.

Monstro com uma boca que engoliu, em 2001, uma carga tributária de 33,72% do PIB. O saco de dinheiro do governo aumenta, mas os benefícios sociais não se têm expandido. Serra, com sua cara técnica, terá de imantar seu discurso com o fator social, para se aproximar de contingentes angustiados e inseguros.

Ciro Gomes desmonta as idéias que expressa, consideradas de boa definição, com a força do estilo desequilibrado. Tem contra ele a voz da Escritura: "A boca do insensato fere-o a ele mesmo: e os seus lábios são a ruína de sua alma." Garotinho há de entender que a população brasileira, crente em Deus e de grande força mística, sabe distinguir oração religiosa de discurso de palanque. E o refrão "povo em primeiro lugar", que ilustra sua propaganda na mídia, é tão batido e gasto como bigorna de ferreiro. Ademais, é perigoso assentar o perfil sobre a moldura da religiosidade. De Itamar, se for candidato, se espera que seu conhecido viés nacionalista não seja usado para derrubar as fronteiras da inserção internacional do País ou fazer meia volta em direção ao passado. O franciscano Pedro Simon, o ministro Raul Jungman, da Reforma Agrária, e o senador Suplicy, que também querem a cadeira de presidente, podem aventurar-se, também, a fazer suas propostas. Quem sabe não surpreenderão com idéias novas?

Se os pré-candidatos querem levar a sério a contenda, que façam a lição de casa. O desafio está lançado.


Colunistas

RACHEL DE QUEIROZ

Esse estranho animal
Ah, o animal urbano humano é mesmo essencialmente gregário, como os carneiros e as andorinhas. Só esse instinto ancestral, que se traz enrustido nos ossos e na carne (ou nos nervos e na pele?), é que explicará nossa absurda paixão por morar amontoados em edifícios de mais de 20 andares, ou formigando pelas ruas numa massa fechada de carros que se entrechocam, se amassam, se batem com fúria, matando e ferindo não apenas quem está d entro deles, mas o infeliz pedestre que não pertence à aristocracia rodante, e se arrisca pelo asfalto, território privativo das feras de rodas.

Você já estudou, do alto de um edifício, um engarrafamento, lá embaixo? Não dá para entender porque eles se obstinam naquela fúria impaciente, em se concentrar todos na mesma pista, como se no mundo só existisse aquele caminho, como se fugissem de um perigo invisível que por trás os açoitasse; a cada rua transversal entrem mais carros - em vez de saírem, fugirem, por aquele caminho aberto!

Mas não, e você vê com espanto que eles desdenham as possibilidades de fuga, fazem questão de ficar no sufoco sem sentido, numa velocidade de cem metros por hora. Outra comparação que nos lembram são aqueles enxames de abelhas africanas que atacam uma árvore, uma cerca, até um telhado, em vôo cego, e ficam tentando se mover para diante ou para os lados, num zumbido que já parece um rugido; e do local onde se concentram caem muitas mortas, mas parece que isso lhes é indiferente, são tantas que nem podem olhar para as vítimas. Igualzinho aos engarrafamentos.

Numa cidade grande qualquer, pequeno embaraço é uma tragédia. Se falta água, se há uma pane na eletricidade, se os ônibus se declaram em greve, tudo pára e entra em crise. Com as torneiras secas, mesmo só por algumas horas, os restaurantes não podem servir comida, nas residências o pânico se instala, desde as crianças gritando que não podem ir para a escola sem escovar os dentes! E os hospitais que não têm como acudir os doentes - sem água?

Pois embora a gente não seja peixe, a água é, depois do ar, o elemento mais indispensável à nossa sobrevivência. E faltando luz? Já experimentou subir, sem elevador, ao seu apartamento no quinto, décimo, vigésimo andar? E os que se arriscam, se arriscam mesmo a um enfarte, a uma crise respiratória, a todos os males que ameaçam o citadino sedentário, que só sabe "andar" sentado no carro, no ônibus, na moto.

Agora, em todas as cidades, anda o povo exigindo que lhe abram os metrôs, subterrâneos, onde poderão continuar se engarrafando, descarrilando, debaixo da terra, como se não lhes bastasse o que fazem lá em cima...

E como cai a qualidade de vida na cidade grande. Desde o ar que se respira, poluído, envenenado, à água que vem (ou não vem!) pelos canos, o pequeno espaço dentro dos apartamentos, o leite engarrafado, a carne congelada.

O pior de tudo é que esse frenesi "civilizatório" já está até perturbando a condição de vida nas cidades de pequeno porte. As ruas se enchem de carros e a maior glória dos prefeitos é instalar sinal luminoso nos cruzamentos. Já não se pode comprar leite mungido nas vacarias; os supermercados já invadiram tudo, passaram até a se chamar de "shopping" e só vendem leite de caixa.

Creio que a psicologia do homem urbano pode se traduzir com especial fidelidade numa frase de Pedro Nava, num baile carnavalesco no salão de cima do velho "High Life" (ah, saudosas décadas passadas!), vestido num macacão cáqui, Nava suava e sufocava empurrado e empurrando num cordão; a gente lhe propôs sair dali, ir para o jardim, lá embaixo: "Aqui está muito quente, muito apertado!" E o Nava o suor em bicas, enxugando a cara na manga, parou um instante para recusar: "Mas eu gosto é do quente e do apertado!" E seguiu no cordão.


Editorial

MOBILIZAÇÃO, SEM EXPLORAÇÃO POLÍTICA

O imenso cortejo fúnebre de 50 mil pessoas, que parou Santo André para prestar uma homenagem ao prefeito Celso Daniel, brutalmente assassinado por seqüestradores, foi o registro simbólico de uma absolutamente justificada indignação popular - daquele município, de todo este Estado e do País - ante a tragédia diária que se abate sobre os cidadãos, de quaisquer classes sociais, que é o permanente risco de vida em suas casas, em seu trabalho, na rua e em todos os lugares onde estejam, em razão da sanha irrefreável de bandidos e facínoras - para os quais a Segurança Pública do Estado vem perdendo quase todas as batalhas. No entanto, como era de se esperar - talvez mais cedo do que se supunha -, manifesta-se de várias formas, seja pelas costumeiras declarações de impacto de políticos, destinadas a produzir emotivas manchetes, seja pelas análises e avaliações contidas em artigos ou em entrevistas, debates e talk shows na televisão, uma tentativa de "ideologizar" a tragédia de Santo André, dando-lhe uma conotação eminentemente política - o que no corrente ano significa, necessariamente, político-eleitoral.

É certo que o fato de a execução do prefeito Celso Daniel ter sido precedida de outro não menos brutal assassínio de um prefeito pertencente aos quadros do Partido dos Trabalhadores, Antônio da Costa Santos, o Toninho do PT, de Campinas, tem fomentado todo tipo de especulação dentro dessa linha, embora as investigações sobre o crime de Campinas - que já duram meses - e as circunstâncias até agora divulgadas sobre a execução do prefeito de Santo André em nada autorizem precipitadas conclusões a respeito de tratarem-se de "crimes políticos". Pelo contrário, as sinistras peripécias que culminaram com a execução de Celso Daniel - em local habitualmente utilizado por criminosos comuns para esse fim - tiveram todas as características de um seqüestro para "fins lucrativos" com "erro de pessoa". Os seqüestradores não sabiam quem estavam seqüestrando e, quando souberam e conheceram a intensa repercussão do seu crime através dos jornais, rádios e televisões, assustaram-se e decidiram pela execução - 24 horas depois do seqüestro, note-se. É difícil para uma pessoa normal entender o que se pode chamar de "lógica da bestialidade", mas o fato é que os executores de Celso Daniel tiveram reação semelhante à dos assassinos da senhora Rosana Melotti, a cigana de Campinas, fuzilada porque não pagaram o seu resgate.

Muito se fala de uma hipotética Frente de Ação Revolucionária Brasileira (Farb), com base em cartas ameaçadoras enviadas por correio eletrônico a líderes petistas - e anuncia-se que a Polícia Federal busca dados sobre a "organização" em Santos. Que tipo de entidade seria essa? Pelos termos da carta, seriam radicais de extrema esquerda, inconformados com o excesso de "moderação" da corrente petista dominante (o que significaria uma terrível dissidência interna), e não radicais de direita, cuja intenção seria impedir o crescimento político-eleitoral do PT - mesmo porque atentados só podem ajudar eleitoralmente suas vítimas partidárias. Mas, por enquanto, não há motivos para se levar a sério essa "Frente de Ação", que até tem um site na Internet.

O maior mal do enfoque político-ideológico, no caso, é o desvio da verdadeira mobilização que deve haver, por parte de todas as instituições do Estado relacionadas à área, de todos os Poderes - Executivo, Legislativo e Judiciário -, e de todas as esferas de poder - federal, estadual, municipal -, envolvendo também as entidades representativas, os setores organizados da sociedade civil e a opinião pública, em torno do combate às causas e aos efeitos da tragédia permanente da insegurança pública brasileira - e particularmente a paulista, que nos toca mais de perto. Por outro lado, essa mobilização não pode deixar que arrefeça o ora intensificado poder de cobrança da sociedade, ante o anúncio estentórico de medidas paliativas ou de soluções de efeito tão aparente quanto a retirada do sofá da sala para impedir o adultério.

O ponto de partida de qualquer esforço para tornar mais eficiente o combate ao crime de seqüestro deve ser a constatação de que, em São Paulo, esse é o único tipo de crime que continua se alastrando. Todos os demais, inclusive homicídio, latrocínio, roubo e furto estão em decréscimo desde 1999. E um estudo - de mais de 500 seqüestros - do tenente-coronel da Polícia Militar, Wanderley Mas carenhas de Souza, comentado no Jornal da Tarde de ontem, explica por que, ao chegar à conclusão de que, enquanto o risco de um ladrão ser preso logo depois de cometer um roubo é de 47%, nos casos de seqüestro essa probabilidade é de 0,2%. Além disso, a possibilidade de fugir da cadeia nunca foi tão grande quanto hoje.

O seqüestro de tipo "clássico", digamos assim, com cárcere privado e negociação de resgate com a família da vítima, é hoje um dos investimentos mais seguros e mais rendosos no "mercado do crime".

O seqüestrador, em São Paulo, perdeu o medo. É a partir dessa constatação que devem ser analisadas as novas medidas cogitadas para combater o crime.

Esse é tema para outro editorial.


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01/23/2002


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