Camata cita manifestações das diferentes religiões sobre a ortotanásia
Na justificação do projeto de lei em favor da ortotanásia, o senador Gerson Camata (PMDB-ES) apresenta manifestações favoráveis a esse procedimento em documentos da Igreja Católica, no pensamento predominante nos diversos ramos do judaísmo e em textos do islamismo, na posição das igrejas cristãs dos Estados Unidos, das igrejas orientais ortodoxas, do hinduísmo e do budismo.
Em relação à Igreja Católica, Camata refere-se a quatro documentos. O primeiro, um discurso de Pio XII em 1958, no qual o Papa afirma que existe uma obrigação de conservar a vida e a saúde, "porém isso não obriga habitualmente mais que o emprego de meios ordinários (segundo as circunstâncias de pessoas, de lugares, de época, de cultura), ou seja, de meios que não imponham uma carga extraordinária para si mesmo ou para outro". Para o pontífice, "se parece que a tentativa de reanimação constitui para a família uma carga que em consciência não se lhe possa impor, ela pode licitamente insistir para que o médico interrompa suas tentativas, e este último pode licitamente ceder a isso."
O segundo documento é a Declaração de 5 de maio de 1980, da Congregação para a Doutrina da Fé, na qual se condena a eutanásia e a "obstinação terapêutica" e se aceita a ortotanásia - "É lícito interromper a aplicação de meios desproporcionais quando os resultados não correspondem aos esforços aplicados" - e a legitimidade de deixar morrer em paz: "É lícito contentar-se com os meios normais que a Medicina pode oferecer".
Camata cita em seguida o "Catecismo da Igreja Católica", aprovado pelo papa João Paulo II em 25 de junho de 1982 e publicado pela Constituição Apostólica Fidei depositum, de 11 de outubro de 1992, no qual se considera a eutanásia direta "moralmente inadmissível", mas se entende que "a interrupção de procedimentos médicos onerosos, perigosos, extraordinários ou desproporcionais aos resultados esperados pode ser legítima". Trata-se da rejeição da "obstinação terapêutica", de acordo com o texto. "Não se quer dessa maneira provocar a morte; aceita-se não impedi-la".
O senador refere-se ainda à encíclica Evangelium Vitae, de 25 de março de 1995, na qual o Papa João Paulo II afirma que se opõe ao "excesso terapêutico" e que "a renúncia a meios extraordinários ou desproporcionados não equivale ao suicídio ou à eutanásia; exprime, antes, a aceitação da condição humana defronte à morte".
Direito à morte
Segundo Camata, os diversos ramos do judaísmo concordam em fazer uma clara distinção entre os atos positivos que aceleram a morte e a não-realização de ações que possam impedir a morte em paz. A religião proíbe toda classe de homicídio, mas admite que se possa interromper suportes vitais que configuram impedimentos à morte do doente terminal. Ainda conforme o senador, de acordo com o espírito da tradição judaica, da mesma forma que existe o direito à vida, há também o direito à morte, e o médico não tem obrigação de forçar o doente a viver algo mais. A eutanásia não é aceita sob nenhuma circunstância no judaísmo.
No Corão, fonte da doutrina islâmica, não existe texto explícito sobre a eutanásia ativa. Segundo o autor do projeto, "há textos que proíbem tirar a vida do muçulmano; porém, se o médico tem a certeza de que não pode restaurar-se a vida, seria uma prática fútil manter o estado vegetativo do paciente por meios artificiais".
Camata registra ainda que para os cristãos ortodoxos, nada permite tirar a vida, inclusive no caso de doença terminal, mas é possível interromper tratamentos para poupar energia, tempo e recursos num esforço mal dirigido a evitar a morte: "Quando os sistemas principais do organismo debilitam-se e não existe perspectiva razoável de que possam ser restaurados, os cristãos ortodoxos podem permitir, com justiça, que sejam removidos os aparelhos mecânicos extraordinários". O senador afirma também que praticamente todas as igrejas cristãs dos Estados Unidos rejeitam a eutanásia ativa e aceitam a ortotanásia.
Já no hinduísmo, conforme Camata, a eutanásia ativa produz karma negativo no doente e no médico que a pratica, mas, por outro lado, deve-se permitir ao doente a morte em paz, já que a vida mantida artificial ou mecanicamente é de pouco valor. E o budismo, que também não aceita a eutanásia ativa, não exclui a intervenção médica para aliviar a dor, embora impedindo a administração de doses letais.
17/09/2009
Agência Senado
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