Ciro ironiza convite a petista, mas também admite diálogo









Ciro ironiza convite a petista, mas também admite diálogo
Para ele, porém, proposta de conversa com Mercadante é um "jogo com cartas marcadas"

O candidato do PPS à Presidência, Ciro Gomes, afirmou que aceitaria conversar com o presidente do Banco Central, Armínio Fraga, se fosse convidado. Mas fez questão de ironizar o convite feito por Fraga ao deputado Aloizio Mercadante (PT-SP). "Isso é jogo eleitoral, porque agora eles entraram em pânico. Tinham planejado um jogo de cartas marcadas, Lula contra o Serra. Aí parece que tem uma população que quer ver um outro ângulo do problema e o governo quer restabelecer esses laços simbólicos."

Ciro disse que já tomou a liberdade de ligar para o ministro da Fazenda, Pedro Malan, mas até o momento não foi procurado por ninguém do governo.

"Claro que converso. Aliás, sou amigo do Fraga, sou amigo do Malan, que serviu ao País na minha gestão no Ministério da Fazenda como presidente do BC."

Apoio - O candidato do PT ao governo de São Paulo e vice-presidente do partido, José Genoíno, disse que Aloizio Mercadante deve aceitar o convite de Fraga para conversar sobre as percepções internacionais sobre o Brasil e o seu processo eleitoral. Na avaliação de Genoíno, para o partido "quanto melhor, melhor". Segundo ele, quanto mais o PT puder contribuir para a melhora da atual turbulência no mercado financeiro, será melhor para o País e também para o próprio partido.

Genoíno disse que Mercadante tem de ir ao encontro, até porque qualquer movimento que diminua a especulação no mercado financeiro tem de ser usado com tal finalidade. Ele reiterou que o PT vai respeitar todos os acordos nacionais e internacionais, caso chegue à Presidência do País, e que a viagem do deputado José Dirceu aos Estados Unidos também tem como foco principal mostrar aos investidores estrangeiros que o PT está mudando com responsabilidade.

O deputado Paulo Delgado (PT-MG) também se mostrou a favor do encontro. Ele disse ter interpretado como "um bom sinal" a iniciativa de Fraga. "Agindo assim, ele (Fraga) dá mais civilidade à competição política", observa Delgado um dos parlamentares petistas que operam há muito como interlocutores do governo na área diplomática e política.


Serra quer tarifa menor para gás e gasolina
Tucano diz que preço atual é 'abusivo' e cálculo da Petrobrás é 'incorreto'

VITÓRIA - O candidato do PSDB à presidência, senador José Serra (SP), condenou ontem a política de preços adotada pela Petrobrás e disse que, se for eleito presidente, vai mudá-la. "Os aumentos que estão ocorrendo no gás e na gasolina são abusivos", disse o presidenciável. "Os aumentos lá de fora vão ser ponderados pela participação que o gás importado tem no consumo doméstico", disse o candidato, ao participar ontem do encontro da Frente Nacional de Prefeitos.

Participou também do evento a sua vice, deputada Rita Camata (PMDB), que é natural da cidade.

Retomando posições que já havia comentado no dia anterior, na televisão, Serra argumentou que a maior parte do gás consumido no País é produzido aqui mesmo. "Se o preço aumenta muito lá fora, não pode aumentar na mesma proporção aqui, porque nosso gás é em reais não é em dólar", explicou.

Como a gasolina - Das sete milhões de toneladas de gás consumidas no Brasil, cinco milhões são de produção nacional, segundo o presidenciável. "Algo parecido está acontecendo com a gasolina", alertou.

"Esse é procedimento incorreto da Petrobrás que prejudica os consumidores".

O candidato tucano disse ainda que os aumentos dos custos de transporte fora do País são incorporados duas vezes no preço do produto aqui. "O transporte é cobrado duas vezes para o gás que vem de fora e uma vez para o gás que vem de dentro", disse Serra. "De alguma maneira, a Petrobrás retira dos consumidores cerca de R$ 1 bilhão só no gás de cozinha", afirmou. "Também temos que fazer estabilização para impedir essa flutuação. Isso não tem cabimento, a Petrobrás tem de mudar essa política".

Distritos - Primeiro candidato a debater os documentos elaborados pela Frente Nacional de Prefeitos (FNP), que tratam da expansão das cidades e de problemas urbanos, Serra prometeu ontem criar distritos ou condados que englobariam vários municípios para facilitar a implantação de políticas públicas. Em sua palestra, presenciada por cerca de cem pessoas - entre elas 38 prefeitos integrantes da FNP - ele disse que esses distritos seriam estruturas intermediárias entre o Estado e as cidades.

"Meu governo vai se jogar nessa idéia", disse Serra. Esse modelo ajudaria a União a trabalhar regionalmente problemas para os quais haja dificuldades de trabalhar exclusivamente em uma cidade. "O que teremos é um ativismo estatal na política urbana", afirmou Serra. Ele afirmou que pretende se apoiar em experiências de outros países para concretizar o plano. Também pediu para que a FNP elaborasse um projeto sobre o assunto.

Hoje, Luiz Inácio Lula da Silva, presidenciável do PT, e Ciro Gomes, do PPS, participam do evento.

A presença de Anthony Garotinho, candidato do PSB, ainda era incerta. Caso ele não possa comparecer, seu vice, deputado José Antonio Almeida (PSB), deve substituí-lo.


‘Ciro é genérico de Collor, com nome diferente’
Candidato do PSDB ataca presidenciável do PPS, que subiu nas pesquisas

VITÓRIA – O bate-boca público entre os dois candidatos que disputam a segunda colocação nas pesquisas de intenção de voto para a Presidência da República – o último levantamento do Ibope dá 18% para Ciro Gomes (PPS) e 17% para o senador José Serra (PSDB) – ganhou força ontem.

Respondendo às últimas declarações do presidenciável da Frente Trabalhista, o tucano afirmou que o adversário é “um genérico” do ex-presidente Fernando Collor de Mello.

“Ciro é um genérico de Collor, com embalagem diferente, nome diferente, mas com o mesmo princípio ativo, o mesmo efeito”, disse o tucano, após participar de debate na Frente Nacional de Prefeitos, em Vitória (ES), numa referência aos remédios mais baratos que concorrem no mercado com as marcas dos laboratórios mais tradicionais.

Na quarta-feira, Serra disse que a proposta de Ciro de alongamento da dívida interna pode ser interpretada como calote. E emendou que nunca entendeu o projeto defendido pelo concorrente: “Se você quiser fazer alongamento da dívida forçado, isso é calote.”

O candidato da Frente Trabalhista voltou a reagir ontem e o tucano não perdeu tempo em dar o troco. “É o candidato do insulto, com ele não dá nunca para debater idéias, só se debate insulto, coisa que eu não faço, porque para mim essa campanha deve ser destinada a debater idéias”, disse o tucano. “É só isso (insultar) que ele (Ciro) sabe fazer, aliás, muito no estilo Collor.”

Não é a primeira vez que Ciro é comparado ao ex-presidente Collor. Serra apenas incorporou o discurso já muito difundido pelos seus colegas de PSDB, partido ao qual o candidato do PPS já pertenceu.


Lula acha positivo para PT viver condição de ‘vidraça’
Candidato afirma no “Jornal Nacional” que se houver culpados em Santo André que sejam punidos

RIO – O candidato do PT à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva, disse ontem que é importante para o partido passar pela experiência de ser acusado, numa referência às denúncias de suposto esquema de propinas que teria existido na prefeitura de Santo André. “Eu sempre disse que o PT precisaria ganhar as eleições para ser vidraça também. Porque fomos estilingue durante muito tempo.”

De acordo com ele, a diferença é que o PT quer a apuração das acusações. “N ós queremos que o Ministério Público aja, que a polícia aja, que o Judiciário aja, que a CPI aja para apurar. Se tiver culpados, pode ser do PT, pode ser de qualquer partido polítco, tem que ser punido. Porque nós precisamos, de uma vez por todas, acabar com a impunidade.” O candidato negou que a direção do partido tenha pedido a destruição de fitas gravadas pela Polícia Federal com conversas de petistas ligados à prefeitura de Santo André, ocupada por Celso Daniel até o seu assassinato, em janeiro. “O PT não quer (a destruição de fitas). O que nós não queremos é que uma fita gravada de forma fraudulenta pela PF seja utilizada politicamente”, disse o candidato, que foi entrevistado ontem no Jornal Nacional.

Lula afirmou que a PF “cometeu uma insanidade”. “Até eu, pelo que sei, fui investigado durante dois anos. E pelo que me consta eu não cometi nenhum crime.” Ele disse concordar com o uso das fitas para a investigaçãoda morte de Daniel. “Nós, mais do que ninguém, temos interesse em desvendar o que levou nosso querido Celso Daniel a morrer.” Sobre a questão do pagamento da dívida externa, o candidato disse que o PT evoluiu e hoje entende que é preciso honrar os compromissos assumidos pelo País. “Quando você assume um governo, você tem uma relação de Estado para Estado, que não depende apenas da sua vontade. O PT evoluiu para compreender que os contratos firmados pelo nosso País tem que ser cumpridos. É apenas uma questão de amadurecimento, de entender que uma coisa é um cidadão comum dizer uma coisa, outra coisa é um candidato ou um governo agir dessa forma.” Questionado sobre a aliança com o PL, Lula disse que o critério adotado foi o de se unir a partidos que se opõem ao governo de Fernando Henrique Cardoso. “A bancada do PL, nesses anos, tem votado sistematicamente com a bancada da oposição”, afirmou. O candidato disse ter procurado outros partidos desse campo como o PSB e o PPS, mas a aliança não foi possível porque essas siglas optaram pela candidatura própria.


"Não basta vontade política para mudar País"
FHC diz que se seus programas sociais forem mantidos, haverá novos e importantes avanços

BRASÍLIA – O presidente Fernando Henrique Cardoso disse ontem, em discurso no Palácio do Planalto, que “não basta vontade política” para mudar o País e previu que, se forem mantidos os programas sociais lançados em seu governo, a sociedade vai sentir o efeito de um “novo Brasil” dentro de 10 a 20 anos.

“Não podemos pensar a mudança do Brasil como se ela dependesse do governo, ou então, como é moda aqui, do presidente. Se tem vontade política ou não? Tomara que tenha, mas não basta. É preciso que a sociedade assuma desafios”, afirmou Fernando Henrique, em mais uma reação a críticas de seus opositores. Ao lado do ministro da Educação, Paulo Renato Souza, ele participou da cerimônia de lançamento do Provão para cursos supletivos.

Numa defesa de seu governo, Fernando Henrique afirmou que, na Presidência da República, lançou as bases para garantir as mudanças sociais: “Não se faz em 4 anos ou em 12 anos, se fazem décadas. Nós estamos em décadas fazendo um outro Brasil.”

Em seguida, disse que, se os próximos governantes derem “continuidade” aos projetos já iniciados em sua gestão, ocorrerão novos e importantes avanços. E voltou a atacar seus críticos.

“Ramerrão” – “Estou cansado de ouvir discursos e ler artigos que dizem que o Brasil teve mais uma década perdida e que não se avançou nada no social”, declarou o presidente. “Dizem ainda que fizemos só estabilização, como se isso fosse pouco. Por que eles (os críticos) não olham para os números? É melhor ser um pouco mais humilde e menos arrogante, não julgar o esforço de uma sociedade inteira, porque (o esforço) não é de um governo. Eles (os críticos) ficam sempre naquele ramerrão.”

Mais uma vez, o presidente afirmou que há muito o que melhorar no País, mas enfatizou que “alguma coisa foi feita”. Para ele, não é demagogia dizer que seu governo está acabando com o analfabetismo: “Isso é uma coisa sensacional. Em 1960, havia mais analfabetos do que alfabetizados. E 1960 foi ontem. Isso mudou.”

Desde o início da semana, Fernando Henrique tem rebatido, em discursos, críticas da oposição.

Em solenidade no Rio de Janeiro promovida pela Associação Comercial para comemorar o oitavo aniversário do Plano Real, por exemplo, ele ironizou políticos que o atacaram na época do lançamento dos atuais parâmetros econômicos.


Artigos

Os vaivéns nos transgênicos
Washington Novaes

Embora pareça estar-se definindo no Brasil, passo a passo, uma caminhada em direção a uma postura de precaução (recomendada por convenções internacionais) na área dos alimentos geneticamente modificados - que exigirá estudo prévio de impacto ambiental e licenciamento para plantio e comercialização, além de rotulagem -, o panorama ainda não está suficientemente claro.
Nem removidas todas as questões.

A Resolução 305 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), aprovada em junho, adota com clareza o princípio da precaução e estabelece que tanto a pesquisa de campo como "a liberação no meio ambiente de organismos geneticamente modificados ou derivados" dependerão de licenciamento ambiental do Ibama, que leve em consideração "especificidades biogeográficas" - o que, em princípio, não o autorizaria a basear-se apenas em estudos feitos em outro país, como foi o caso da soja autorizada pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio). Além disso, o Ibama deverá consultar os órgãos estaduais da área. E poderá até suspender licenças que venham a ser concedidas, se surgirem novas informações que a isso aconselhem.

Mas a resolução também estabelece que "a avaliação de risco é responsabilidade da CTNBio e será considerada pelo órgão ambiental competente como parte do processo de análise do risco ambiental".

Pergunta-se: sendo "parte do processo de análise do risco ambiental", essa avaliação do risco poderá ser contrariada pelo órgão licenciador, em direção oposta a parecer da CTNBio? Como distinguir entre risco na área de biossegurança e risco ambiental ou de saúde?

Talvez a ambigüidade seja fruto da difícil negociação no Conama. É possível, por isso, que a controvérsia não se extinga com a resolução. Até mesmo porque cabe perguntar o que acontecerá às legislações estaduais e municipais, já aprovadas, que estabelecem moratórias ou proibições para transgênicos. E a sentença que terá de ser proferida pela Justiça, em que a relatora já votou pela legalidade da liberação do plantio de soja transgênica pela CTNBio, sem necessidade de estudo de impacto ambiental feito aqui? Poderá contrariar a resolução do Conama? E o projeto em discussão no Congresso? O governo federal se empenhará para que não afete essa decisão?

Ainda na área da resolução do Conama, fica uma pergunta: como os órgãos estaduais a serem consultados pelo Ibama se equiparão para ter condições de responder adequadamente às consultas - já que os pedidos envolverão quase todo o País?

Neste momento mesmo, a Secretaria de Agricultura do Paraná acaba de decidir que toda semente de soja procedente de outro Estado, para ser comercializada em território paranaense, precisará de laudo de análise de transgeníase, emitido por laboratório oficial ou privado reconhecido. O Paraná teme perder mercados na Europa e no Oriente se houver mistura da soja convencional com a modificada, produto de sementes contrabandeadas.

Há federações de agricultores em posições diferentes. A do Rio Grande do Sul quer liberar o plantio de transgênicos; a de Goiás quer um debate público, mas seu presidente já tomou posição co ntra os transgênicos; os produtores de algodão estão pedindo ao governo federal a liberação para plantio das variedades transgênicas. E há casos como o de Minas Gerais, onde o governo estadual, depois de tomar posição a favor de moratória para os transgênicos, vetou lei nesse sentido, sob a alegação de que oneraria as empresas de biotecnologia, farmacêuticas e agroindustriais a obrigatoriedade de promover estudos prévios de impacto ambiental.

Complicando ainda mais o quadro, a Organização para Alimentação e Agricultura (FAO) da ONU decidiu, em resposta a consulta, que operações de embarque de soja iniciadas na Argentina e complementadas no Brasil (esse tipo de operação responde por 50% dos embarques no Porto de Rio Grande e 20% no de Paranaguá) não serão prejudicadas se houver registro de ervas daninhas na origem. Mas a soja terá de ser internalizada e reexportada. E isso poderá significar problemas para o Brasil na Europa e no Oriente. Por isso, o Ministério da Agricultura não gostou da resposta. Que fará?

O Parlamento da União Européia (onde 94% dos consumidores não querem transgênicos) decidiu há poucos dias baixar de 1% para 0,5% o limite abaixo do qual produtos que contenham transgênicos ficarão isentos de rotulagem obrigatória e declaração de conteúdo. A obrigação vale também para derivados como o açúcar e alguns tipos de óleo, assim como para rações que alimentam animais. Diante dessa exigência, o embarque conjunto no Brasil poderá significar problemas no destino, já que 90% da soja argentina é modificada geneticamente. Também a China está exigindo testes de campo para os grãos que comprar e proibiu, por motivos "fitossanitários", a importação de sementes de soja.

Não bastassem as complicações legislativas, mortadela produzida por um frigorífico nacional e testada pelo Greenpeace em dois laboratórios de outros países acusou a presença de 12% de soja transgênica. Teste com o mesmo produto, do mesmo lote, num laboratório de Belo Horizonte não acusara a presença de nenhuma porcentagem de transgênicos. E ele não estava rotulado, embora a legislação nacional o exija, se contiver mais de 4% de transgênicos.

Diz aos jornais o professor Toshio Mukai, da USP, que nenhuma empresa no País adotou a rotulagem, embora a obrigatoriedade legal esteja em vigor há seis meses. "O Brasil não sabe como pôr em prática essa obrigatoriedade, nem como fiscalizar", observa ele.

Muito chão, portanto, ainda terá de ser percorrido nessa matéria. No trajeto, poderá haver prejuízos irreparáveis.


Editorial

A TELEVISÃO TESTA OS CANDIDATOS

As entrevistas ao vivo com os candidatos a presidente da República, no Jornal Nacional e no Bom Dia Brasil da Rede Globo, proporcionaram a uma boa parcela do eleitorado, cuja fonte primária de informação ainda é a mídia eletrônica e, nela, os telejornais dessa rede, a primeira visão desembaçada do que são e pretendem os aspirantes ao lugar de Fernando Henrique. As sabatinas, embora breves, deram ao grande público uma amostra de como os presidenciáveis lidam com questões e cobranças incômodas, numa situação que escapa ao seu controle.

Ainda que exígua em cada um dos seus segmentos, a série representou um contraponto ao ciclo de programas partidários encerrado em junho que, ao arrepio da lei, serviram não para divulgar o que cada agremiação teria a dizer sobre as questões nacionais, mas para exibir - sob a luz mais favorável que as técnicas de marketing televisivo fossem capazes de produzir - as personas de seus candidatos.

É impossível, obviamente, antecipar os efeitos eleitorais dessas entrevistas. Mas, para todos quantos esperam que o voto popular reflita antes um juízo sobre a substância das propostas de governo e o preparo dos proponentes do que uma reação epidérmica ao teatro manipulador da propaganda eleitoral, as entrevistas, que se repetirão em setembro - assim como o debate programado para agosto pela Rede Bandeirantes -, contêm o auspicioso potencial de falar à inteligência do eleitor em vez de apelar às emoções baratas das platéias desprevenidas, como fizeram, com intensidade e talento variáveis, os programas partidários, cuja prioridade era "humanizar" os respectivos candidatos.

Essa contrafação - na qual não faltaram o discurso pseudofeminista da então presidenciável Roseana Sarney, as lágrimas de Lula pela morte de sua primeira mulher (há 32 anos!) e a cabeça raspada da atriz Patrícia Pillar, a namorada de Ciro Gomes em luta com o câncer - gerou conseqüências igualmente artificiais, porém entendidas como se fossem o oposto disso, em grande parte por culpa da imprensa. Trata-se do sobe-e-desce dos candidatos nas pesquisas. De Roseana a Ciro, em ordem cronológica, todos avançaram no ranking das intenções de voto na semana seguinte àquela em que suas figuras, devidamente trabalhadas pelos experts da dramatização política, monopolizaram o tempo de televisão dos partidos.

Formou-se, nesse ambiente, um duplo equívoco. Primeiro, o da supervalorização das sondagens, que apresentam porcentagens que o leitor comum tende a entender como parcelas do total do eleitorado, quando, na verdade, metade dos pesquisados não tem candidato e a maioria dos que escolhem um nome da lista que lhes é exibida admite mudar de idéia até outubro. O segundo equívoco, o da avaliação superficial das pesquisas, resulta da forma como a imprensa expõe os números, deixando o público alheio à "letra miúda" dos resultados. Por exemplo, passou em geral despercebido o desgaste do candidato petista junto a um setor em que ele sempre foi especialmente forte - o eleitorado masculino. No Ibope, Lula vem perdendo votos de homens há duas rodadas consecutivas, um indício talvez significativo de fragilização eleitoral.

De há muito se sabe que a mídia eletrônica tem um poder extraordinário de suscitar paixões políticas. Hitler foi um produto do rádio; Kennedy, da tevê. Hoje em dia, as refinadas técnicas de persuasão de massa nesses meios de comunicação - a videopolítica, de que fala pejorativamente o cientista italiano Giovanni Sartori - são recursos de uso corrente nas disputas eleitorais, e as pesquisas captam o seu formidável impacto. Mas seria subestimar a inteligência do público presumir que o mais telegênico ou histriônico entre os candidatos, ou o que tiver contratado o melhor marqueteiro, será sempre o favorito.

As normas para campanhas eleitorais no Brasil desincentivam o debate de idéias. Mas, de alguma forma, o País encontrou caminhos para forçar os partidos e os candidatos a debaterem e se definirem sobre algumas das questões - sobretudo as econômicas - mais candentes em jogo nesta eleição.

Quanto mais a campanha deixar de se limitar aos horários oficiais, graças a intervenções jornalísticas acessíveis também às grandes massas, mais o público terá a oportunidade de confrontar as imagens construídas pelos marqueteiros, carregadas de fáceis estímulos sentimentais, com o desempenho dos candidatos, obrigados a se confrontar com seu próprio passado e a se pronunciar sobre questões espinhosas que a sociedade, em última análise, lhes impõe.


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07/12/2002


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