Ciro sobe, Serra cai e Lula continua líder








Ciro sobe, Serra cai e Lula continua líder
Nova pesquisa do Ibope mostra candidato do PPS folgado em 2.º e batendo petista no segundo turno

O candidato do PSDB à Presidência, José Serra, caiu 3 pontos e tem 11% das intenções de votos, segundo a última pesquisa Ibope, divulgada ontem. Ele empatou com Anthony Garotinho (PSB), que se manteve com os 11% da pesquisa anterior, feita entre 21 e 23 de julho. Luiz Inácio Lula da Silva (PT), oscilou negativamente 1 ponto, mas continua na liderança com 33%. Ciro Gomes (PPS) foi o único a ganhar pontos: passou de 25% a 27%, uma diferença que está dentro da margem de erro, de 2,2 pontos porcentuais. O candidato do PSTU, José Maria de Almeida, aparece com 1%. Os votos brancos e nulos somam 5% e 12% dos entrevistados não sabem em quem vão votar ou não responderam.

Nas simulações de segundo turno, Ciro é o único que vence Lula. O candidato do PPS teria 46% e o petista, 41%. Se a disputa fosse com Serra, Lula ganharia por 49% a 36%. Contra Garotinho, Lula teria 50% a 32%.

Para a especialista em pesquisas eleitorais Fátima Pacheco Jordão, esta semana reproduz a “agonia em que a campanha foi mergulhada com a troca de acusações” iniciada no debate de domingo. Na sua opinião, o eleitor pode apresentar um repúdio ao bate-boca, já que prefere ver propostas. “Ele vê isso como uma briga entre os candidatos, quando gostaria que o diálogo fosse com ele, não com os concorrentes”, diz ela, concluindo que o mais prejudicado nesse cenário foi Serra.

A pesquisa, encomendada pela TV Globo, foi feita entre o dia 5 e ontem, e ouviu 2 mil pessoas em 145 municípios.

Garotinho disse que esse “é um bom resultado”. “Está dentro da nossa estratégia de campanha”, afirmou ele. O deputado José Aníbal, presidente do PSDB, disse que a pesquisa “ainda projeta os últimos horários eleitorais”. “A tendência é que se perceba que Serra é o único que tem coerência entre o que fala e o que faz.” Para Ozéas Duarte, coordenador de comunicação do PT, “os resultados para valer começam com o horário eleitoral, quando os candidatos podem apresentar as propostas de modo organizado”. Já o deputado Emerson Kapaz (PPS), comemorou a pesquisa.

“O resultado já estava nas nossas expectativas da continuidade de crescimento do Ciro.”


Ciro agora chama fotógrafos de 'babacas'
Não posso fazer nada por causa desse bando de babacas Ciro Gomes (PPS)Candidato se irrita ao ser fotografado enxugando o rosto e volta a esquecer os bons modos

RIO - Em discurso a uma platéia em São Gonçalo, na Baixada Fluminense, o candidato da Frente Trabalhista (PPS, PTB e PDT) à Presidência da República, Ciro Gomes, disse ontem que tenta se controlar para manter a serenidade e o equilíbrio diante das "calúnias" dos adversários. "Tenho rezado, pedido a Deus para me iluminar. Porque quero confessar aqui que a minha natureza é de responder assim, na testa", defendeu-se ele. Menos de uma hora depois, irritou-se e xingou os fotógrafos que registravam seus movimentos enquanto enxugava o suor com um lenço. "Não posso fazer nada, por causa desse bando de babacas", disse Ciro a um assessor, diante dos fotógrafos.

"Serenidade" - Ao mencionar, antes, seu esforço para manter a calma, Ciro havia dito: "Tenho ouvido a voz e a inteligência do povo brasileiro. Tenho de me preparar para ser o presidente do Brasil.

Portanto, tenho que me manter com serenidade e equilíbrio, o que não confundam esses senhores com qualquer tipo de vacilação."

O candidato passou quatro horas em campanha nos municípios de Duque de Caxias e São Gonçalo, no Grande Rio. Em dois discursos, disse estar sendo caluniado, agredido e insultado.

Cobrou do candidato do PSDB, José Serra, uma resposta para a pergunta que lhe fez no debate da TV Bandeirantes, no último domingo, sobre o destino do dinheiro da venda das estatais. Na ocasião, Serra não respondeu à pergunta de Ciro. Em seguida, o candidato do PPS acusou o governo de "complacente com a corrupção" e prometeu "tomar a presidência dos banqueiros".

"Privatizaram bilhões do patrimônio público, aumentaram os impostos, deixaram o funcionalismo público oito anos sem reajuste, mil escândalos, tudo varrido para baixo do tapete. E não querem responder a uma simples pergunta: para onde foi o dinheiro do povo brasileiro ao longo desses últimos oito anos? Ao invés de responder a essa simples pergunta preferem a calúnia, a agressão, o insulto, a mentira", discursou Ciro, em Caxias, depois de percorrer o centro - primeiro em cima de um caminhão e depois andando nas ruas.

De Caxias, o candidato seguiu para São Gonçalo, onde falou a cerca de 500 pessoas em um clube. Fazia muito calor e muita gente se espremia para chegar perto dele. Usando uma linguagem popular, ele fugiu de temas de difícil compreensão da política econômica.

"É egoísmo dos governantes que só falam em dólar, juros, política industrial", declarou. Tornou a dizer que foi "educado na escola pública", apesar de já ter sido divulgado, pela imprensa, que na cidade de Sobral, onde morou, ele estudou em duas escolas particulares, o Colégio Sobralense e o Colégio Marista Cearense.

Mais tarde, reclamou por ser insultado e agredido quando fala em aumento do salário mínimo (o adversário Serra apresentou números mostrando que, em seu tempo no governo, o salário mínimo era de 82 dólares, e não de 100). Às 14h30, saiu sem dar entrevistas. Passou o resto da tarde na casa da namorada, a atriz Patrícia Pillar, na zona sul do Rio, preparando-se para um encontro à noite no Clube Militar.


Ciro abre comitê conjunto com Tasso
Fortaleza - O primeiro comitê conjunto do presidenciável Ciro Gomes (PPS) e do candidato ao Senado Tasso Jereissati (PSDB-CE) foi inaugurado ontem à noite, em Sobral. O convite para inauguração citava Ciro, Tasso, Lúcio Alcântara (candidato ao governo cearense pelo PSDB), Patrícia Gomes (ex-mulher de Ciro e candidata ao Senado pelo PPS), Leônidas Cristino (candidato à Câmara Federal pelo PPS) e Ivo Gomes (irmão de Ciro, candidato à Assembléia Legislativa). O convite é assinado pela Frente Trabalhista (PPS-PDT-PTB), mas não traz nenhum dos dois candidatos a governador dos partidos da Frente (Cláudia Brilhante, do PTB, e Pedro Albuquerque, do PDT).

O comitê fica na principal avenida de Sobral, a Guarany. Ciro passou sua infância e adolescência em Sobral, que fica a 240 quilômetros de Fortaleza.

Nem Tasso nem o presidenciável comparecerão à inauguração, ficando os discursos a cargo do irmão de Ciro, o prefeito da cidade, Cid Gomes (PPS).

Foi dele a iniciativa de montar o comitê conjunto. De acordo com a Assessoria de Imprensa do PSDB cearense, a iniciativa não conta com adesão formal do partido, sendo um ato unilateral do prefeito Cid Gomes, que é aliado de Tasso.

Tasso, porém, já não esconde mais a sua preferência por Ciro, em detrimento do candidato do seu partido, José Serra. Apesar de não admitir que fará campanha explícita para Ciro, Tasso já avisou que não pedirá voto para Serra. O problema, segundo Tasso, é o palanque duplo no Ceará para Serra:

PMDB e PSDB. O PMDB faz oposição ao ex-governador tucano.


Serra ironiza ‘erro de US$ 20 bi’ em cálculo de Ciro
Tática de desqualificar discurso do adversário contesta agora número sobre as privatizações

O candidato do PSDB à Presidência, José Serra, atribuiu ao adversário e ex-ministro da Fazenda Ciro Gomes (PPS) “um erro só de US$ 20 bilhões” nas contas sobre o valor arrecadado com as privatizações durante o governo Fernando Henrique Cardoso. Em entrevista ao Jornal da Globo, na madrugada de ontem, o tucano voltou a apontar incoerências nas declarações e números ci tados por Ciro. Fez isso ao responder a uma pergunta foi feita no domingo pelo candidato da Frente Trabalhista, durante o debate dos presidenciáveis, que ficou sem resposta.

“A pergunta era uma grande confusão e tinha números errados. O dinheiro da privatização não foi US$ 70 bilhões, foi US$ 50 bilhões. É um erro só de US$ 20 bilhões e ele (Ciro) falou também do aumento da carga tributária, deu números errados”, acusou Serra. “É uma confusão que esse candidato sempre faz quando vem com números ou com economia. A questão fundamental é a seguinte: o dinheiro da privatização foi para amortizar dívida, de acordo inclusive com a legislação.

Quando Ciro foi ministro e a Embraer foi privatizada, o dinheiro foi para abater dívida.”

Serra foi muito pressionado pelos jornalistas, que cobraram não só a resposta sobre as verbas da privatização, como seu apoio ao governo Fernando Henrique e a viabilidade da sua candidatura. O tucano negou manter posição dúbia sobre apoiar ou não o governo. “Sempre tive as minhas posições e as transmiti ao presidente”, disse, apesar de admitir uma “proximidade mínima” com alguns ministros e criticar a falta de atuação na área de segurança. “A questão do governo tem de ser encarada no atacado e o governo acertou muito mais que errou.”

Em mais um round de confronto com Ciro, o tucano voltou a culpar a gestão do candidato no Ministério da Fazenda – 116 dias, no fim de 1994 – pelos problemas da economia nacional.

Lembrou que, por exemplo, a taxa de juros nesse período era de 27,6%, muito acima dos 18% atuais. “Os problemas da economia brasileira, a origem deles, o principal, está naquele período.

Não dá, então, para simplesmente dizer que está tudo errado sem que (Ciro) tivesse nada com isso”, alegou Serra. E reafirmou o compromisso apresentado em seu programa de governo, prometendo reduzir as taxas para entre 6% e 7% na primeira metade da próxima década. “A taxa vai baixar porque vamos trazer mais dólares.”

BNDES – Dados do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), mostram que os cálculos de Serra também estão errados, mas menos que os do adversário. As vendas de estatais incluídas no Programa Nacional de Desestatização (PND) e o leilão do Sistema Telebrás totalizaram US$ 58,725 bilhões. Segundo o banco, só com as companhias incluídas no PND o País arrecadou US$ 27,807 bilhões. Os restantes US$ 30,918 bilhões referem-se ao montante da venda das empresas de telefonia.

O Sistema Telebrás não foi incluído no PND porque, na época, foi criada uma legislação específica para o setor – uma vitória do então ministro das Comunicações, Sergio Motta, que defendia que os recursos obtidos com a venda das telefônicas fossem reinvestidos no setor, e não utilizados no abatimento da dívida pública.

No primeiro ano de mandato do presidente Fernando Henrique, em 1995, oito empresas foram privatizadas, com arrecadação total de US$ 1,628 bilhão. Em 1998, a União registrou a maior arrecadação com a venda de estatais, US$ 37,542 bilhões.


"Eu sou um mai ator de mim mesmo"
Candidato acha que pode ter ficado com fama de antipático porque 'não se representa bem'

O candidato do PSDB à Presidência, José Serra, disse ontem que não sabe “se representar”. “Sou um mau ator de mim mesmo, não me represento muito bem”, afirmou, durante entrevista ao na Rádio Jovem Pan, em São Paulo. A pergunta era sobre como Serra pretende se apresentar aos eleitores em sua campanha. “Não sei me representar, e toda vez que se tenta fazer isso, dá errado.”

Quando perguntado se era por isso que tem fama de antipático, Serra disse que talvez fosse.

“Talvez, fui antipático com laboratório, com indústria de cigarro”, respondeu, referindo-se a ações tomadas por ele no Ministério da Saúde, como o lançamento dos medicamentos genéricos e aumento da propaganda antitabagista.

Mais tarde, em palestra na sede da Organização dos Advogados do Brasil, em São Paulo, Serra defendeu a participação do governo federal na área de segurança pública, hoje uma atribuição dos Estados. Afirmou que essa participação se dará principalmente com verbas. “Vai ter muito dinheiro e muito controle desse dinheiro”, afirmou. “Porém, não vou propor a vinculação para Segurança no Orçamento porque aí não vai sobrar muita coisa.”

O programa de segurança de Serra inclui ainda a criação de um Ministério da Segurança Pública, ao qual ficarão subordinadas a Polícia Federal e a Polícia Rodoviária Federal. O candidato prometeu “expandir a oferta de prisões com 100 mil novas vagas” e defendeu a possibilidade de transferência de presos para outros Estados.

Descontraído, Serra falou das ansiedades pessoais de ser pai para demonstrar sua preocupação com a segurança. “Toda noite, quando estou em São Paulo, fico preocupado quando meu filho demora para chegar em casa, quando não avisa ou desliga o celular ”, relatou.

Serra entrou em temas polêmicos, como a defesa de trabalho para presos e a privatização de presídios. “Preso que não trabalhar tem de perder as regalias, como possibilidade de redução de pena”, afirmou.

Arrepios – Na defesa dos presídios privados, no entanto, o candidato provocou arrepios em sua companheira de partido e deputada Zulaiê Cobra, presente à mesa no auditório da OAB. “Estou aberto a discutir a possibilidade de presídios privados, é uma experiência que precisa ser avaliada”, disse Serra. “Eu sou contra porque depois preso tem de dar lucro”, retrucou a deputada.

Quanto à reforma do Poder Judiciário, Serra prometeu aparelhar a Justiça de primeira instância e os juizados de pequenas causas. O candidato arrancou aplausos da platéia ao defender o fim das férias forenses. “Já imaginou se os hospitais entrassem em férias. A Justiça é tão importante quanto a Saúde para a vida das pessoas.”


Maluf fala até em derrubar praça de pedágio com trator
SOROCABA – O candidato do PPB ao governo de São Paulo, Paulo Maluf, prometeu derrubar com um trator, se for eleito, um pedágio instalado na Rodovia Francisco Alves Negrão, que liga Capão Bonito a Itararé, no sudoeste do Estado. “Depois da eleição, a primeira coisa que vou fazer é passar com um trator e derrubar aquela praça.” Ele discursava para cerca de 300 moradores da Vila Aparecida, na periferia de Capão Bonito. A frase foi dita quando criticava as tarifas dos pedágios e voltava a prometer a suspensão da cobrança no período noturno para ônibus e caminhões.

“Foi o Maluf que construiu essas estradas todas, mas eu não pus pedágio”, disse. A praça, que fica no município de Taquarivaí, ainda não cobra tarifa. “É por causa da eleição.” Ele criticou os governos tucanos “pelo abandono” da malha rodoviária na região.

O candidato do PPB chegou à vila depois de realizar uma carreata pela área central da cidade. O evento foi organizado pelo ex-prefeito José Carlos Tallarico Júnior, do PPB. Maluf retribuiu lançando-o candidato a deputado estadual.

Ele não foi à prefeitura, administrada pelo PSDB, mas localizou na praça a sogra do prefeito tucano Roberto Tamura. “Está aqui dona Piedade, a sogra do prefeito.” Maluf posou para fotos ao lado da mulher e jogou beijinhos para o público.

Depois que seu helicóptero teve de fazer um pouso de emergência, no dia anterior, no Vale do Ribeira, ontem o candidato tomou outro susto. O palanque onde se encontrava ameaçou ceder. “O palanque do Maluf balança, mas não vai cair.”


Artigos

Os custos da biodiversidade
Washington Novaes

"Os grandes discursos (...) são cada vez mais freqüentes. Mas nada disso tem repercussões práticas, sequer remotamente, em proporção à magnitude da hecatombe natural que ameaça o futuro da humanidade", escrevem Marc J. Dourojeanni e Maria Tereza Jorge Pádua no recém-publicado livro Biodiversidade - A Hora Decisiva (Editora UFPR). E, nestas vésperas da Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio + 10), em Johannesburg, jogam lenha na fogueira, ao criticarem "soluções baseadas na miragem criada pelo entorpecente conceito de desenvolvimento sustentável".

O professor Dourojeanni chefiou o setor florestal público do Peru e ocupou posições importantes no Banco Interamericano de Desenvolvimento e na União Internacional para a Conservação da Natureza. Ex-presidente do Ibama, Maria Tereza Jorge Pádua tem larga experiência na gestão de ONGs e muitos trabalhos publicados. Eles sugerem caminhos para a conservação da biodiversidade nesta hora difícil. Entre eles:

Aumentar rápida e fortemente as áreas protegidas por unidades de conservação de uso indireto (fechadas); criar corredores ecológicos, inclusive a partir do zoneamento ecológico-econômico e dos planos diretores municipais; incluir o setor privado no manejo florestal sustentável; exigir o cumprimento da legislação sobre reserva legal e proteção de mananciais.

Tal como o primeiro dos grandes temas da Rio + 10 - convenção sobre mudanças climáticas, comentado na semana passada -, a questão da biodiversidade também enfrenta momentos dramáticos. O mundo continua a perder 150 mil quilômetros quadrados de florestas tropicais (seu maior repositório) por ano. E não se consegue levar à prática o que está escrito na respectiva convenção, desde 1992.

O governo brasileiro tem dito que, até o final do mandato do atual presidente da República, pretende ter sob regime de proteção integral 10% da área de cada um dos grandes biomas brasileiros, sem contar áreas indígenas, que já somam mais de 10% do território. Significaria dobrar o número de hectares protegidos. Não será fácil. E, mesmo que se consiga, restará o problema de tirar do papel as decisões e levá-las à prática.

Basta ver o caso da Amazônia, onde se tem consolidado um nível de desmatamento entre 15 mil e 20 mil quilômetros quadrados por ano - um terço dos quais sem nenhuma utilização posterior, aproximando-se já dos 200 mil quilômetros quadrados (um terço dos 600 mil desmatados). Em números absolutos, é o maior desmatamento do planeta - embora não o seja em termos reativos, dada a extensão amazônica. A pecuária responde por 77% da área desmatada.

Nessa Amazônia, estudos recentes - principalmente Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia (Iamazon) - têm contribuído para derrubar alguns mitos. Eles mostram, por exemplo, que a atividade madeireira não tem a expressão na composição do PIB amazônico que se costuma apregoar: é de 15% do total. O segundo mito derrubado é o de que as exportações respondem por quatro quintos do consumo de madeiras amazônicas; na verdade, são apenas 14%. Ou seja, o mercado interno é que responde por mais de 80% do consumo, inclusive dos 80% de madeiras extraídas ilegalmente. E só depende de decisões políticas internas coibir a exploração ilegal e predatória.

Segundo o Iamazon, a Amazônia "pode ter tranqüilamente 30% de sua área em regime de proteção integral", até mesmo porque 45% de suas terras são devolutas, pertencem ao poder público. Mais de 1 milhão de quilômetros quadrados seriam aptos para florestas nacionais. E 38% desse espaço coincide com áreas de alta prioridade para a conservação da biodiversidade, identificadas em trabalho recente. Em 50% da área, poderia ser implantado o manejo florestal sustentável, certificado, com manutenção da cobertura. E em 20% poderia haver agricultura e sistemas agroflorestais, na área já praticamente toda ela ocupada, nas bordas ao sul - já que no restante do espaço (83%, diz a ciência) as condições climáticas desaconselham a agropecuária.

Ainda assim, a atuais políticas públicas federais continuam a estimular a expansão da fronteira agropecuária em regiões amazônicas inadequadas.

Para o Iamazon, a mudança de postura é urgente, até mesmo porque "em dois anos a madeira de extração predatória vai ser expulsa do mercado". E o Brasil deveria ser a favor de uma convenção de proteção das florestas - tema até aqui tabu para a área militar e diplomática. Não há dúvida, porém, de que essa proposta vai voltar à cena em Johannesburg, levada pelos 70 mil ambientalistas que ali estarão.

Também deve voltar ao centro da discussão, na África do Sul, a absorção interna e externa dos custos ambientais pelos consumidores de produtos que contribuem para a perda da biodiversidade - madeiras, eletrointensivos, grãos, carnes.

"O Brasil está sentado sobre uma mina de ouro (a biodiversidade)", costuma dizer o diretor de Conservação da Biodiversidade no Ministério do Meio Ambiente, Bráulio S. Dias. "Precisamos agregar valor às nossas exportações, não podemos continuar a ser eternos exportadores de matérias-primas" - e sem que os importadores paguem os custos de sua extração. Mas para isso, diz ele, precisamos colocar no centro das nossas preocupações uma "estratégia da biodiversidade", que a leve em conta não apenas como fornecedora de alimentos, medicamentos e materiais, mas também como mantenedora de serviços naturais (regime hidrológico, fertilidade dos solos, fixação de nitrogênio, polinização e controle biológico de pragas, entre muitos outros), não contabilizados e não pagos.

A última reunião das partes da convenção sobre biodiversidade, em Haia, estabeleceu 131 metas a serem cumpridas pelos países signatários (entre eles o Brasil). Mas ninguém pode obrigá-los a cumprir. E esse é exatamente um dos termos do impasse que vivemos: sabemos o que fazer; mas quem ou o que nos obrigará a todos, ganhadores e perdedores?


Editorial

O PRESIDENTE É O AVALISTA DO PAÍS

Pelo tempo recorde que levou para ser fechado (uma semana), pelo seu montante inédito (US$ 30 bilhões), pela suavidade das condições exigidas do governo brasileiro, pela conjuntura duplamente desfavorável (as sérias dúvidas sobre as chances de êxito do candidato do governo na sucessão presidencial brasileira e as não menores incertezas sobre os rumos da economia americana), pela atitude de "negligência benigna" reinante em Washington em relação à América Latina (o presidente George W. Bush - contrariando promessas do candidato - sempre deixou claro que os países da região pouco poderiam esperar de sua administração em matéria de alívio para as suas aflições financeiras), o acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI) anunciado na quarta-feira é um evento literalmente excepcional não apenas na história das relações do Brasil com o organismo, mas também na história do Fundo Monetário Internacional. Tomara que represente também um ponto de inflexão no quadro geral das políticas da potência hegemônica diante daquelas poucas nações que têm tudo para se tornarem atores respeitáveis na cena econômica global - menos a capacidade de se alçarem a essa condição sem depender do aporte continuado de recursos externos, o que as mantém permanentemente expostas aos vagares da irracionalidade intrínseca dos movimentos especulativos do capital.

Mudaram os Estados Unidos ou mudou o Brasil? O insuspeito Wall Street Journal, que - a partir de uma óptica altamente contestável - se manifestara contra a ajuda do Fundo ao Brasil, sob o argumento de que ela não conseguirá evitar que o País decrete moratória "se os brasileiros quiserem entrar no pântano da febre socialista", elegendo um dos dois "populistas de esquerda que lideram as pesquisas", parece endossar o ponto de vista segundo o qual "o governo (de Washington) finalmente cedeu à pressão cada vez maior de banqueiros americanos, que temiam que uma mo ratória brasileira pudesse devastar economias na América Latina e ter repercussões nos Estados Unidos".

Além disso, "num momento em que o nervosismo no mercado acionário americano ameaça a recuperação econômica do país, a Casa Branca estaria menos inclinada a assumir o risco de que a turbulência na América Latina possa ter efeitos perversos ao norte". Prova disso também seria o empréstimo-ponte de US$ 1,5 bilhão ao Uruguai, deixando apenas a combalida Argentina em prolongado compasso de espera. Conquanto esse raciocínio seja, sem dúvida, plausível, é certo que a volta atrás do governo Bush foi - enfim - decisivamente influenciada por dois aspectos fundamentais do panorama brasileiro.

Um é que, muito diferente do que se passa na Argentina, a crise de confiança dos mercados financeiros no Brasil nada tem que ver com a situação e as perspectivas da "economia real" do País e nem com a condução da política econômico-financeira do atual governo. O segundo aspecto é o do prestígio internacional conquistado pelo presidente da República. O acordo fora de série com o FMI outra coisa não é, em última análise, se não o reconhecimento do quanto o Brasil mudou, sob a liderança de Fernando Henrique, e uma prova de confiança no seu papel de avalista do amadurecimento da democracia brasileira. E isso, embora ele seja, entre todos os chefes de governo do mundo ocidental, o crítico mais sistemático e consistente não só do unilateralismo e das políticas protecionistas de mão pesada do presidente Bush, como também dos critérios que presidem o funcionamento do sistema financeiro criado em Bretton Woods.

Os Estados Unidos sabem distinguir entre as críticas construtivas de um estadista e objurgatórias ideologizadas do reles populismo queimador de bandeiras. "O mal que os homens fazem lhes sobrevive", disse Shakespeare, pela boca de Marco Antonio, no enterro de César. "O bem, com freqüência, é enterrado com os seus ossos." Mas há sinais de que a racionalidade que Fernando Henrique começou a injetar na vida pública brasileira poderá sobreviver ao seu governo. Agindo como estadista, ele fez o que estava ao seu alcance para persuadir Lula e Ciro Gomes a não criarem obstáculos ao acordo - e nenhum dos dois, de fato, se manifestou contrário a ele, mesmo porque sabem que o principal beneficiário do acordo agora concluído será o sucessor de Fernando Henrique Cardoso. Se o sucessor mantiver o compromisso com as "políticas econômicas sadias" de que fala o comunicado do FMI e já prometidas pelo menos por Lula, ele terá passado pelo "teste de maturidade política" que, nas palavras do economista Paulo Rabello de Castro, espera a próxima administração, qualquer que ela seja.


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08/09/2002


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