Comício para vender lotes








Comício para vender lotes
Cooperativa ligada a candidato a deputado distrital reuniu 5 mil pessoas com a promessa de vender lotes, em lugar ignorado, a preço baixo. Os interessados tinham que fornecer número do título de eleitor. Lei proíbe essa prática

Os moradores de um pacato assentamento rural próximo ao Recanto das Emas viram a praça do vilarejo virar palanque eleitoral. O Combinado Agrourbano de Brasília II (Caub II), que fica às margens da DF-001, entre o Recanto das Emas e o Gama, foi invadido por cerca de cinco mil eleitores, atraídos pela promessa de venda de lotes a R$ 1 mil em lugar não revelado.

No local, os interessados ouviram discurso do candidato a deputado distrital Avenir Rosa (PFL), que distribuiu material de campanha — santinhos, adesivos e um jornal com sua biografia. Depois, tiveram que preencher uma ficha com nome, endereço, número de CPF, da carteira de identidade e dados do título de eleitor (número, zona e seção).

Oficialmente, a venda dos lotes estava sendo feita pela Cooperativa Rural de Trabalho e Habitação do Distrito Federal e Região Metropolitana (Coohapro). A entidade vinha recebendo inscrições desde o início do mês. Um dos postos de atendimento é a casa 34, de Laudeci Nunes de Amorim, uma fervorosa evangélica que animou o público das 8h às 11h, enquanto o candidato Avenir não chegava. Ao tentar explicar o motivo da exigência do número do título de eleitor dos compradores, ela respondeu com uma pergunta: ‘‘Título não é documento, não?’’

Segundo o gerente-geral da Coohapro, um senhor que identificou-se apenas como Nilo, ela é a missionária responsável por ‘‘recrutar’’ os sem-teto.

Moradores de Samambaia, Sobradinho e do Setor P Sul da Ceilândia contam que a associação também anunciou, nessas cidades, a venda dos lotes. Para garantir o benefício, o interessado tinha que desembolsar R$ 100 — pagos em uma entrada R$ 40 e duas parcelas de R$ 30. ‘‘É uma taxa de adesão’’, explicou o presidente da entidade, Olírio Rodrigues.

O passo seguinte é o pagamento de 15 parcelas de R$ 60, organizadas em um carnê. ‘‘Vamos entregar os lotes com rua aberta e água encanada’’, disse ele. Segundo o presidente da cooperativa, os terrenos têm entre 200 m² e 250 m².

Mas a reunião não respondeu à principal dúvida dos eleitores: onde fica a área do assentamento prometido. ‘‘Não vamos revelar onde é o assentamento porque nós já recebemos denúncias e ameaças daquele pessoal que usa uma bandeira vermelha e é acostumado a invadir fazenda de presidente da República’’, desconversou Olírio. Poucos se convenceram com a explicação.

‘‘Eu não pago nada até me dizerem onde é esta área’’, irritou-se Sandra Gonçalves Ribeiro, moradora de Santa Maria. Aos 29 anos, ela está desempregada, assim como o marido. Saiu ontem de casa às 7h com R$ 200 na bolsa, disposta a ingressar na cooperativa. O dinheiro deveria ter sido usado para saldar o aluguel atrasado. ‘‘Tinham garantido que o lote saía antes da eleição. Agora vêm com essa conversa de que temos de esperar 40 dias’’, reclamava.

Os eleitores esperavam ao menos receber uma ‘‘carta’’ com dicas de como proceder para garantir o lote, mas a entrega de papéis foi cancelada, sem explicações. Na fachada da casa da missionária Laudeci, um cartaz (preso à parede com adesivos eleitorais de Avenir) anunciava que as inscrições seriam reabertas no dia 2 de setembro.

MOEDA DE TROCA
Nas últimas semanas, eleitores denunciaram casos de candidatos que prometem empregos, lotes e benefícios sociais em troca de votos. Moradores de Planaltina afirmaram que o candidato a distrital Wigberto Tartuce (PPB) está cadastrando eleitores com a promessa de fornecer um cartão que daria direito a emprego e moradia. Vigão não se pronunciou sobre a acusação. Em Taguatinga, eleitores contaram ter recebido promessas de emprego caso se filiassem ao Movimento dos Inquilinos do DF, liderado pelo distrital José Edmar (PMDB), que negou participar do esquema. Em outras cidades do DF, inscritos nos programas de cesta básica, pão e leite e no Renda Minha disseram estar sendo pressionados para votar em candidatos governistas, sob pena de perder o benefício.


Os sertões e seus votos
Problemas fundiários, ambientais e urbanos atormentam a vida dos oito milhões de eleitores do centro-oeste, o pedaço mais esquecido no coração do Brasil

Vael Ament, 47 anos, caminhoneiro desde os 20, conhece cada milímetro do centro-oeste. Sabe da solidão de quem vive por essas paragens de muita terra e pouca gente. ‘‘É um povo simples que abre a casa para desconhecidos e oferece a mais deliciosa das comidas’’, resume Vael, amante de arroz com piqui, nascido em São Paulo e crescido no mundão. ‘‘Passeio em casa, moro no mundo’’.

O mundo de Vael é a estrada, anda mais de quatro mil quilômetros por semana. Vive entre Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Distrito Federal. São1,6 milhão de quilômetros quadrados, ocupados por 11 milhões de pessoas, quase 60% na área rural.

O centro-oeste é um Brasil diferente. No passado, era chamado de
sertões, foi desbravado pelos bandeirantes no século XVII e esquecido na fúria da urbanização. Hoje sofre dramas particulares.

A fronteira seca atiça o narcotráfico nas terras mato-grossenses. A soja devora o cerrado e ameaça o pantanal. O problema mais grave é fundiário.

Mais de 70% das propriedades estão com os latifúndários. Plantam grãos e tocam o gado, 51% do rebanho bovino brasileiro pasta por aqui. Os pequenos produtores reclamam da falta de incentivos e ameaçam debandar para as cidades. Brasília é mais sitiada das metrópoles da região. Só na periferia do Distrito Federal existem 70 mil famílias abaixo da linha da pobreza.

Em temporada de campanha, os políticos disputam os quase oito milhões de eleitores da região.Na semana passada, Ciro Gomes fez carreata no Mato Grosso e no Mato Grosso do Sul. Ao lado do cantor sertanejo Zezé di Camargo, Lula subiu no palanque em Cuiabá, fez carreata em Campo Grande. Hoje, os cinco candidatos estarão no Distrito Federal debatendo soluções para a agricultura.De noite, Lula fará seu primeiro comício em Brasília, cidade que até a eleição passada votava no petista e agora ameaça migrar para hostes de Ciro Gomes.

A seguir, um pouco da lida dos homens e mulheres que vivem e sobrevivem nos sertões do centro-oeste.


Justiça sob suspeita
Corregedor eleitoral acusa colegas do TRE de envolvimento com o narcotráfico e exige que eles abram os sigilos bancário, fiscal e telefônico. O Tribunal cassou a candidatura à reeleição do petista Jorge Viana

‘‘Uma monstruosidade.’’ Assim o corregedor eleitoral do Acre, Pedro Francisco da Silva, definiu a decisão do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do estado que impugnou a candidatura à reeleição do governador Jorge Viana (PT). A cassação aconteceu na madrugada de quinta para sexta-feira. Por cinco votos a um, os juízes do TRE acreano condenaram Viana por uso da máquina administrativa e abuso do poder econômico por utilizar a logomarca do governo nas peças publicitárias da campanha. A resposta petista foi imediata. ‘‘É uma reação do crime organizado, que eu sempre combati’’, revoltou-se Viana, ao saber da decisão.

Único juiz a votar contra a impugnação, Pedro Francisco pedirá hoje aos outros seis integrantes do TRE que, a exemplo dele, abram mão de seus sigilos bancário, fiscal e telefônico num prazo de cinco dias. O juiz pretende encaminhar os dados com um relatório sobre o caso ao corregedor eleitoral do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, e ao procurador-geral da República, Geraldo Brindeiro.

‘‘Hoje o TRE está sob suspeita e, como corregedor, tenho o dever de pedir que seja apurado se há envolvimento de integrantes do Tribunal com o crime organizado’’, explicou Pedro Francisco, em entrevista na Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), em Brasília. No início da noite de ontem, a presidente do TRE do Acre, Miracele de Souza Borges, divulgou nota na qual declara que seu sigilo bancário dos últimos cinco anos está à disposição da Justiça. Ela disse, ainda, que pedirá aos colegas que façam o mesmo ainda hoje.

Crime organizado
Há suspeita de que a cassação da candidatura do Jorge Viana tenha sido política, organizada e patrocinada pelo narcotráfico. Foi durante a administração do governador petista que o ex-deputado federal Hildebrando Paschoal foi preso, acusado de envolvimento com o crime organizado e o narcotráfico na região. Pedro Francisco foi o juiz responsável pelo julgamento e a prisão do ex-deputado.

O corregedor aponta pelo menos quatro irregularidades na elaboração do processo contra Viana que teriam sido ignoradas pelo TRE. De acordo com ele, o caso deveria ter sido iniciado por uma ação de investigação judicial eleitoral e não por uma ação de impugnação, já que Viana não havia sido antes condenado pela Justiça e considerado inelegível. A medida, segundo Francisco, impediu que ele fosse o relator do caso. ‘‘Se tivessem apresentado uma ação de investigação eleitoral, eu seria automaticamente nomeado relator’’, afirmou. A relatoria do processo acabou com o juiz Carlos Pompêo.

Sobre a acusação de abuso do poder econômico, o juiz disse que Viana deveria ser processado por uso da máquina administrativa como governador, não por ser candidato. Francisco contou também que foram incluídas provas no processo sem o conhecimento dos advogados de Viana, comprometendo o amplo direito de defesa.

Além disso, o corregedor defende que o processo encontra-se prejudicado pelo fato de uma das juízas, Odenilde Flores Praça, ter trabalhado para o escritório de advocacia de Ruy Duarte até 2001. Duarte trabalha para Flaviano Melo (PMDB), adversário de Viana na disputa pelo governo e responsável pelas denúncias que o tornaram inelegível pelos próximos três anos. ‘‘A juíza Flores Praça deveria considerar-se impedida de votar a questão’’, afirmou Silva.


Paulinho não abandonará o bate-boca
Nada de melhorar seu desempenho nas pesquisas eleitorais. A preocupação mais imediata do presidenciável Ciro Gomes (PPS-PTB-PDT) é acabar de vez com o bate-boca entre integrantes da sua campanha e a do candidato José Serra (PSDB-PMDB). Mas, antes de tudo, ele terá que convencer seu companheiro de chapa, o sindicalista Paulo Pereira da Silva, a aceitar calado novas críticas que virão da campanha de Serra. ‘‘Queremos discutir propostas, mas é difícil ficar calado. Ninguém gosta de apanhar e ficar sorrindo‘‘, disse o vice de Ciro ao Correio.

Neste final de semana, Ciro e seus estrategistas concluíram que a troca de ataques verbais com a candidatura de José Serra só beneficia o petista Luiz Inácio Lula da Silva. Líder nas pesquisas eleitorais, Lula acaba sendo poupado à medida em que Ciro, Serra e seus respectivos companheiros de campanha polemizam sobre todo e qualquer assunto. O domingo foi de trégua entre as duas candidaturas, mas os ataques do vice de Ciro e do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) feitos anteontem contra Serra foram considerados uma ‘‘infeliz truculência’’ pelo staff de Ciro.

Anteontem, Paulinho — como o vice de Ciro é conhecido — e Jefferson ameaçaram o presidenciável do PSDB. ‘‘Ele está pedindo para apanhar’’, disse Paulinho. ‘‘Serra está enlouquecendo. Ou pára ou vamos partir para o confronto. Ele tem de tomar umas bolachas’’, disparou Jefferson, que é um dos coordenadores da campanha de Ciro. Serra chamou as ameaças de ‘‘falta de compostura e truculência’’ e considera a possibilidade de tomar medidas legais contra os aliados de Ciro Gomes.

Por trás da estratégia de Ciro está a intenção de polarizar o debate político com Lula. É o chamado ‘‘Projeto 2º Turno’’, conforme definem assessores do candidato. A idéia é identificar inconsistências no discurso e no programa de governo do candidato petista e explorá-las com o objetivo de abocanhar votos de Lula. Dessa forma, Ciro acredita que poderia chegar ao segundo turno das eleições à frente de Lula e com melhores chances de reunir novos apoios para a reta final da sucessão presidencial.

Apesar da resistência de Paulinho, a nova estratégia de Ciro conta com o apoio do petebista Walfrido dos Mares Guia, um dos seus coordenadores de campanha, e do presidente do PPS, o senador Roberto Freire (PE). ‘‘Um debate político sobre propostas só pode acontecer com Lula. O que estamos disputando é o primeiro lugar do primeiro turno das eleições’’, diz o senador.


Crédito seca nos EUA
Malan e Fraga tentam trazer dólares para o país e derrubar as cotações da moeda norte-americana, que se mantêm acima dos R$ 3. O retorno das linhas de crédito facilitariam a queda dos juros e dariam ânimo à campanha do tucano José Serra

O ministro da Fazenda, Pedro Malan, e o presidente do Banco Central, Arminio Fraga, dão início hoje a uma missão nada agradável, na sede do Federal Reserve — o BC dos Estados Unidos —, em Nova York. Os dois terão de convencer os bancos norte-americanos a retomarem as linhas de crédito para o Brasil, como único caminho para o país sair da grave crise cambial que o obriga a ostentar a mais alta taxa real de juros do mundo e a conviver com o fantasma da inflação.

Os três maiores bancos dos EUA — Citibank, Bank of America e JP Morgan-Chase — foram os primeiros a pularem fora do barco quando a economia brasileira foi sacudida pela desconfiança, em maio. Ao fugirem do Brasil, levaram, em uma espécie de efeito manada, o capital necessário para financiar o comércio exterior do país. Pior: com relatórios alarmantes sobre os riscos da economia, ajudaram a fechar as portas às empresas privadas, que não conseguem renegociar dívidas. ‘‘É justo o governo se sentir traído e injustiçado’’, admite o ministro da Agricultura, Marcus Vinícius Pratini de Moraes.

Somente o Citibank cortou US$ 3 bilhões das linhas de comércio exterior que fornece ao país, com a desculpa que já havia perdido mais de US$ 2 bilhões na Argentina. A diretoria do Citi no Brasil, no entanto, não se manifestou oficialmente sobre os cortes. Alegou que o assunto seria tratado com toda a transparência na reunião de Nova York. Os representantes do JP Morgan também optaram pelo silêncio. O Bank of America informou que foi convidado para o encontro e que pretende ratificar seus compromissos com o país.

No BC, o clima é de descontentamento com a postura dos bancos norte-americanos. O diretor de Assuntos Internacionais, Beny Parnes, afirmou que os bancos que cortaram crédito para o país seriam retaliados. A ordem, no entanto, é não polemizar. O Brasil é extremamente dependente do financiamento externo. Malan e Fraga vão centrar o discurso de convencimento nos números do ajuste fiscal brasileiro — sempre acima das metas do Fundo Monetário Internacional — e da melhoria nas contas externas do país, com o superávit comercial estimado em mais de US$ 7 bilhões para este ano. Poucos, porém, acreditam no sucesso da empreitada de Fraga e Malan a curto prazo.


Agricultura em debate
Os principais candidatos à Presidência da República vão discutir hoje propostas para o setor agropecuário em debate promovido pela Confederação Nacional da Agricultura (CNA), em Brasília. Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Ciro Gomes (PPS), José Serra (PSDB) e Anthony Garotinho (PSB) responderão a perguntas sobre crédito rural, tributação, comércio exterior e reforma agrária , escolhidas em pesquisa com 15.140 produtores rurais. O presidente da entidade, Antônio Ernesto de Salvo, disse que a intenção do debate é tirar dos candidatos posições claras sobre os assuntos que preocupam o setor rural, como a reforma tributária e o protecionismo dos países desenvolvidos.


Artigos

O fantasma do confisco
Flávio Dino

A Crônica de uma Morte Anunciada, escrita por Gabriel García Márquez, realizada. Tal como Santiago Nasar, a economia brasileira está estendida no chão. Cadáveres às vezes geram fantasmas. No caso, um ronda o Brasil, neste momento pré-eleitoral: um novo confisco da poupança e de outros ativos financeiros. As páginas de política e de economia dos jornais trazem o fantasma para os nossos lares diariamente, resultando em pesadelos de muitos e espertezas lucrativas de poucos.

Dicas e mandingas são transmitidas aos pequenos e médios investidores, enquanto os grandes tomam o caminho do lado Norte da linha do Equador. Os presidenciáveis gastam precioso tempo jurando que não pensam como ‘‘aquelle’’. Será que os juristas nada têm a sugerir para ajudar a exorcizar o fantasma?

Voltemos a 1990. Primeiro, a Medida Provisória nº 168; depois, com sua célere aprovação pelo Congresso, a Lei nº 8.024, de 12/4/90; assim, em co-autoria entre Executivo e Legislativo, foi feito o confisco conhecido como o ‘‘bloqueio dos cruzados novos’’. Ultrapassada a perplexidade inicial, os cidadãos foram à Justiça Federal como nunca havia ocorrido antes em nossa história. Daquelas filas nas portas dos fóruns nasceu a jurisprudência que agora pode afugentar o fantasma ‘‘ressuscitado’’.

A Justiça Federal de 1º grau e os Tribunais Regionais Federais rejeitaram o ‘‘bloqueio’’ com uma quase unanimidade raras vezes verificada. Todos os fundamentos então utilizados em dezenas de milhares de decisões permanecem válidos e constituem cláusulas pétreas, vale dizer nem mesmo por emenda constitucional podem ser revogadas. Para lembrar apenas as mais importantes, fiquemos com a proteção ao ato jurídico perfeito, a exigência de um devido processo legal para que alguém seja privado dos seus bens e a vedação à tributação com efeito de confisco. Além disso, muitos juízes federais consideraram ser o bloqueio um empréstimo compulsório disfarçado, que, em conseqüência, só poderia ter sido instituído por intermédio de lei complementar e com a observância do princípio da anterioridade.

Em outro plano, embora a jurisdição constitucional concentrada não tenha funcionado eficazmente neste caso, desde a primeira hora vários ministros do STF entendiam ser inconstitucionais as medidas restritivas em foco. O ministro Celso de Mello, por exemplo, disse na ADIMC nº 534/DF: ‘‘O poder normativo reconhecido à União Federal para atuar, legislativamente, sobre a disciplina da moeda, quer para adaptar o volume dos meios de pagamento às reais necessidades da economia nacional, quer para regular o seu valor intrínseco, prevenindo ou corrigindo os surtos inflacionários ou deflacionários (...), quer para impedir situações de anormalidade e outros desequilíbrios oriundos de fenômenos conjunturais, não dispensa e nem exonera o Estado, na formulação e na execução de sua política econômico-financeira, inclusive monetária, de observar e de respeitar os limites impostos pela Constituição’’.

Além dessa clara orientação jurisprudencial construída pela Justiça Federal brasileira, outro importante aspecto jurídico deve ser realçado para repelir a idéia de novo confisco. De acordo com a Emenda Constitucional nº 32/2001, é vedada a edição de medida provisória ‘‘que vise a detenção ou seqüestro de bens, de poupança popular ou qualquer outro ativo financeiro’’. Descartada essa via normativa, na prática nenhuma outra resta, uma vez que após a tramitação de um projeto de lei sobre o tema nada mais sobraria nos bancos para ser bloqueado.

Estamos, em conclusão, diante de um confisco impossível em um contexto democrático, pois, para fazê-lo, seria necessário confiscar conjuntamente a Constituição e o Poder Judiciário. Assim, ou o fantasma é mais feio do que parece, pois ameaça a democracia, ou deve apenas nos divertir enquanto não volta para o seu mundo. Considerando o presente momento histórico e os atuais presidenciáveis, prefiro preconizar a segunda opção.


Editorial

ENCONTRO PARA O FUTURO

Líderes do mundo todo se reúnem a partir de hoje, em Johanesburgo, na África do Sul, para a Cúpula Mundial do Desenvolvimento Sustentável, mais conhecida como Rio+10. O nome faz referência aos dez anos passados da Rio—92, no Rio de Janeiro, quando a Organização das Nações Unidas (ONU) convocou, pela primeira vez na história, uma conferência global para discutir como conciliar o crescimento econômico com a proteção ao meio ambiente.

O encontro avaliará os progressos obtidos na última década e estabelecerá metas para o futuro. A cúpula começa com uma grande ausência: a do presidente dos Estados Unidos, George W. Bush. A opção do presidente de faltar à Rio+10 pode evitar alguns constrangimentos ao governo norte-americano. Bush temia ser questionado sobre posições em relação ao meio ambiente, como a recusa em aderir ao Protocolo de Kyoto. O documento fixa metas de redução da emissão de gases causadores do efeito estufa. Sem os EUA, maior poluidor da atmosfera terrestre, o protocolo perde eficácia.

Nem todos os sinais emitidos pela única superpotência do mundo, entretanto, são negativos. O estado da Califórnia, responsável pela maior parcela da produção de carros nos EUA, aprovou rigorosa legislação estadual para reduzir os níveis de poluição. Todos os veículos fabricados no estado, bem como a frota que circula por lá, terão de se adaptar. Um passo importante para reduzir a poluição causada pela maior economia do mundo.

A iniciativa do estado da Califórnia também demonstra a disposição da população norte-americana em investir pesado para tornar sua indústria mais limpa. Grande parte dos ambientalistas esperados na Cúpula da África do Sul também atuam nos EUA. Mais uma demonstração da prioridade dada ao tema meio ambiente pela sociedade civil organizada daquele país.

O Banco Mundial (Bird) publicou na última semana um documento que aumentará a pressão sobre os líderes mundiais para chegar a um consenso em Johanesburgo. O estudo alerta para a possibilidade de ocorrerem grandes catástrofes sociais e ambientais nos próximos 50 anos caso os atuais padrões de produção e consumo sejam mantidos.

O Bird coloca grande parte da responsabilidade pela reversão desse cenário nas mãos dos países ricos. Eles seriam os responsáveis por transferir tecnologia aos pobres e abrir seus mercados para produtos agrícolas do Terceiro Mundo. A Cúpula do Desenvolvimento Sustentável é o momento ideal para decidir como fazer isso. Cabe aos líderes mundiais aproveitar bem os próximos dias para que a humanidade possa sonhar com um futuro melhor.


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08/26/2002


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