Corregedoria não pune deputados denunciados








Corregedoria não pune deputados denunciados
BRASÍLIA - A Corregedoria da Câmara recebeu este ano 13 denúncias contra deputados, mas até agora não acionou o Conselho de Ética, criado em outubro. Até o fim do mês, o corregedor Barbosa Neto (PMDB-GO) espera reduzir a papelada acumulada nas gavetas. Um dos beneficiados será o deputado Luiz Antônio Medeiros (PL-SP). Barbosa não encontrou provas de que Medeiros abriu conta em Nova York com recursos desviados do Instituto Brasileiro de Estudos Sindicais. ''Não há qualquer documento em nome do deputado'', disse.

Nos casos dos deputados José Aleksandro (PSL-AC) e Silas Câmara (PTB-AM), a assessoria jurídica deu parecer pela cassação de mandato. Barbosa prefere, porém, levar o assunto à Mesa Diretora. Silas é acusado de se apossar dos salários de servidores. Aleksandro teria ajudado o irmão Alexandre a fugir do presídio de Rio Branco.

Na semana passada, Barbosa recebeu denúncia de que o deputado Zenaldo Coutinho (PSDB-PA) tentou tomar dinheiro de garimpeiros. A Justiça do Trabalho acusou o deputado Celso Russomano (PPB-SP) de incluir na folha da Câmara uma funcionária de sua produtora de vídeo.

A Corregedoria investiga a deputada Maria Lúcia Cardoso (PMDB-MG), mulher do vice-governador de Minas Gerais, Newton Cardoso. Ela teria desviado verbas de programas sociais. O deputado Paulo Paim (PT-RS) será investigado por ter rasgado a Constituição no plenário. Nesta semana, novo caso chega à Corregedoria: o deputado Eurico Miranda (PPB-RJ) é acusado de desviar dinheiro do Vasco da Gama.


Comissão vota liberação de transgênicos
BRASÍLIA - Uma comissão especial da Câmara dos Deputados deve votar hoje o projeto de lei que libera, na prática, a produção de alimentos transgênicos no país. De autoria do relator da comissão, deputado Confúcio Moura (PMDB-RO), a proposta é alvo de críticas por parte de organizações não-governamentais (ONGs), especialistas e deputados de oposição.

Ontem, ambientalistas do grupo Greenpeace promoveram um protesto no espelho dágua em frente ao Congresso Nacional contra a aprovação do projeto.

Pelo texto, a responsabilidade pela autorização ou não da produção de transgênicos seria apenas da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio). Ligada ao Ministério da Ciência e Tecnologia, a CTNBIO é publicamente favorável à liberação dos transgênicos.

Impacto - O projeto não determina a realização de estudos de impacto ambiental (EIA/Rima) para a verificação de danos potenciais ao meio ambiente devido à utilização de transgênicos, como requer a Constituição Federal, no artigo 225, inciso IV.

''A precaução manda que se façam estudos de impacto ambiental para avaliar os efeitos no meio ambiente'', diz César Koppe, professor do Departamento de Genética da Universidade de Brasília (UnB). ''As poucas pesquisas existentes não são conclusivas.''

A coordenadora nacional de Engenharia Genética do Greenpeace, Mariana Paoli, também aponta a falta de dados como restrição ao uso de organismos geneticamente modificados. ''Os impactos da utilização de sementes transgênicas são imprevisíveis e, pior, irreversíveis'', alerta.

Cautela - A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) optou pela cautela. Em nota oficial, a entidade afirma que as empresas responsáveis pela produção dos transgênicos devem fornecer dados sobre a manipulação, além da análise de risco relativa ao meio ambiente brasileiro.

O 2° vice-presidente da Comissão designada para estudar a questão, deputado João Grandão (PT-MS), é contra a proposta. ''Um projeto dessa importância não pode ser votado às pressas'', reclama.

Apesar de descrentes de um veto ao texto - a expectativa é a de aprovação ainda hoje -, os parlamentares de oposição vão tentar obstruir a votação. Assim, o projeto seria votado somente em 2002.


Ministro resiste à adoção de cotas
Paulo Renato quer cursinho pré-vestibular para permitir acesso de alunos pobres, mas FH defende reserva de vagas

BRASÍLIA - Anunciada em setembro, a proposta de criação do sistema de 20% de cotas para negros no serviço público e nas universidades federais tem um opositor de peso no primeiro escalão: o ministro da Educação, Paulo Renato Souza. O presidente Fernando Henrique Cardoso vai formalizar a idéia dia 19, em cerimônia com pompa e circunstância no Palácio do Planalto. Se vai se transformar em realidade nas repartições públicas, nas instituição de ensino superior esbarra na resistência de Paulo Renato.

A reserva de vaga nas universidade tem um apoio de peso. Será defendida pelo Conselho Nacional de Combate à Discriminação, criado pelo setembro pelo Ministério da Justiça para estudar o impacto da adoção das cotas nos órgãos federais. A causa foi abraçada pelo atual ministro, Aloysio Nunes. A partir do fim do mês, 20% dos funcionários contratados por meio de prestadoras de serviço no Ministério da Justiça serão negros. Gradativamente, a mesma norma valerá para os outros departamentos públicos. É uma decisão importante. Mais da metade dos servidores federais hoje é terceirizada.

Mérito - Apesar disso, Paulo Renato não se convence. ''Não há porque imaginar que os estudantes pobres, negros ou pardos não entrem na universidade pelos próprios méritos'', afirma o ministro da Educação. Ele acredita que as escolas públicas, antes de ser preocupar com a criação de cotas baseadas na raça, devem se abrir para os estudantes mais pobres, independentemente da cor. A questão é social, não racial, entende Paulo Renato. A convicção é tanta que encaminhou projeto ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), no valor de US$ 10 milhões, para financiar cursos pré-vestibulares destinados à população de baixa renda.

Presidido pelo novo secretário nacional de Direitos Humanos, Paulo Sérgio Pinheiro, o Conselho Nacional de Combate à Discriminação se prepara para convencer Paulo Renato. Defende a tese que o Ministério da Educação não tem poder para impedir a adoção do sistema de cotas nas universidades porque as reitorias tem autonomia e algumas já adotam a reserva de vagas para alunos índios - como as do Mato Grosso e do Tocantins.

Sem atrito - Na programação de atividades do conselho em 2002, consta uma série de encontros com reitores para negociar o sistema de cotas. O planejamento é cuidadoso. Aloysio não quer entrar em atrito com o colega Paulo Renato. Espera conquistá-lo ao longo do processo.

A assessoria do ministro da Educação - que passou o fim de semana internado no Incor para exames médicos - informou ontem que Paulo Renato mantém a restrição às cotas nas universidade. Insiste que o melhor é financiar cursos pré-vestibulares para pobres. ''Agora que os pobres e negros estão ingressando em massa no ensino médio, chegou o momento de oferecer um aporte específico para aumentar suas chances de ingresso e de sucesso na universidade'', destacou o ministro, em artigo divulgado pela assessoria.

Está se tornando voz quase solitária no Planalto. Desde a semana passada, seis funcionários terceirizados começaram a trabalhar no Ministério do Desenvolvimento Agrário graças às cotas. ''A criação de cursos para pobres não inviabiliza a proposta de criação de cotas para negros'', afirma a presidente do Centro de Defesa do Negro do Pará, Zélia Amador de Deus, assessora especial do ministro Raul Jungmann e uma das delegadas do Brasil na Conferência Mundial sobre Racismo, promovida em setembro na África do Sul.


Lula adota tática tucana contra prévia
BRASÍLIA - O PT e o governo federal vivem às turras mas adotaram tática semelhante na sucessão presidencial. Assim como os tucanos, o provável candidato do PT à Pres idência, Luiz Inácio Lula da Silva, está decidido a deixar para março de 2002 o lançamento da candidatura. Faz aposta arriscada. Acredita que, até lá, alguns concorrentes da esquerda desistirão. E poderão somar no bloco petista.

Lula reafirmou ontem, durante visita à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que não se inscreverá na prévia. Dia 16 termina o prazo para formalizar a participação. Até agora, só o senador Eduardo Suplicy (SP) cumpriu a exigência. ''Se tiver vontade, vou me inscrever, se não, o mundo continua girando'', brincou Lula.

Para evitar a disputa e dar mais tempo a Lula, a direção do PT planeja propor a prorrogação do prazo de inscrição durante o encontro nacional do partido que se inicia sexta feira, no Recife. Lula teme desgastar-se no confronto e os petistas ainda esperam convencer Suplicy a desistir.

''Nem todo mundo que era candidato há três meses será no futuro'', afirmou Lula, numa referência a Ciro Gomes (PPS), ao governador de Minas, Itamar Franco (PMDB) e ao do Rio, Anthony Garotinho (PSB). Na tentativa de ampliar a coligação, o petista participou, ontem à noite, no Rio, do encerramento do congresso do PCdoB, parceiro eterno do PT em campanhas eleitorais.


Empresa vira polícia privada no Pará
Seguranças de firma particular investigam ocupações de fazendas, agridem, torturam, prendem e atiram em sem-terra

XINGUARA, PA - Dia 19 de julho de 2001. O agricultor Carlos Pereira Teles está em um bar no povoado de Fogão Queimado, no município de Bannach, Sul do Pará, quando é abordado por um grupo de seguranças da empresa Marca. Eles vestem macacões marrons e coturnos e procuram um grupo de sem-terra que invadiu uma das 13 fazendas da família Bannach, no município do mesmo nome - o de um paranaense que chegou à região há 30 anos.

Comandados por Nazareno Ribeiro, que se apresenta como Diabo, os vigilantes ameaçam o lavrador. Este tenta explicar que não faz parte do movimento dos sem-terra. Teles corre, mas é atingido por um tiro na perna e outro nas costas.

''Não sei por que eles fizeram isso comigo. A vida para mim é dura. Trabalho para criar duas filhas, uma delas viúva com dois filhos. Não merecia isso. Além de não ter invadido terra, estava a 15 quilômetros da fazenda'', contou o agricultor ao Jornal do Brasil. Gravemente ferido, ele foi levado pelos próprios vigilantes ao Hospital Santa Luzia.

No dia seguinte, sempre sob o comando de Diabo, os seguranças já estão em Ourilândia do Norte, a 30 quilômetros da fazenda invadida pelos sem-terra. Dessa vez as vítimas são os agricultores Raimundo Rodriguez Silva e Benedito de Jesus. Eles estão pescando num rio do município.

Mal chegam, os vigilantes vão dando socos e pontapés em Raimundo e tentam fazê-lo engolir um cartucho de espingarda. Os dois são detidos, torturados e levados para a delegacia pelos seguranças. Acusado de participar de invasões de terras da família Bannach, Raimundo é detido por determinação de um delegado de Redenção presente na região para dar apoio aos seguranças. Já Benedito, em péssimas condições físicas devido às torturas, é deixado no Hospital Santa Maria.

Rotina - Episódios como esses se tornaram rotina no Sul e no Sudeste do Pará, onde firmas de segurança substituem a força pública no policiamento ostensivo. Em Bannach, esse papel é desempenhado pela empresa Marca, com sede na Grande Belém. O município é cercado pelas 13 fazendas dos Bannach, que ocupam área de 2.500km.

Ameaçado de morte pela família Bannach, o diretor do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, Geraldo Garcia, conta que os seguranças chegaram ao município em julho deste ano, quando 300 sem-terra de Redenção invadiram uma das propriedades da família. Segundo Garcia, diante do pequeno número de policiais no município - apenas um sargento e um soldado da Polícia Militar -, os seguranças da Marca não se limitam a proteger as propriedades da família Bannach. ''Eles fazem blitz nas estradas, prendem pessoas inocentes. Só se acalmaram um pouco depois de terem expulsado à força os trabalhadores rurais'', conta Garcia. ''Denunciados pela Prefeitura à Secretaria de Segurança Pública, os seguranças agora estão atuando mais perto das fazendas.''

Delegado de Xinguara, distante 30 quilômetros, Emerson Garçon Alvarenga afirma que os seguranças se apresentam na região como policiais de Belém. Na delegacia de Xinguara deixaram o seguinte endereço: Conjunto Guajará 01, WE 63 número 2002, Ananindeua, na Grande Belém. O Jornal do Brasil apurou que o endereço não existe.

''São empresas de fachada comandadas por policiais'', diz o coordenador da Comissão Pastoral da Terra em Xinguara, Frei Henri des Leuziers.


Artigos

Legitimidade
Gama Malcher

Todos os anos, e em todos os tribunais - já é até tradicional -, se comemora o Dia da Justiça: solenidades, medalhas, missas, coquetéis e, às vezes, até banquetes. Discursos, sempre os há; melhor seria se, ao lado deles, houvesse reflexões; e principalmente neste momento histórico em que novas agências de soluções de conflitos vão surgindo na sociedade.

O que significa o nascimento de ''tribunais'' (entre aspas, mesmo) arbitrais, comissões paritárias de conciliação etc.? Creio que tudo advém de como a sociedade nos percebe, vale dizer, da nossa própria legitimidade. Para que um poder se afirme como tal não basta que esteja formalmente estabelecido pela Constituição nem que as leis lhe dêem forma e decidam seus limites. Isso é problema de legalidade.

A existência das instituições envolve os valores que elas cultivam e, principalmente, o reconhecimento social de que desfrutem. Instituições são um complexo de valores, normas, atitudes, crenças, que as distinguem no meio social; mas elas não vivem apenas por si; são construções do espirito dos homens cujos valores intrínsecos as mantêm em um processo de constante reconhecimento pela sociedade.

O fenômeno do poder se mede pela capacidade que apresente no sentido de alterar concretamente a realidade, de influir sobre a vida das pessoas e das próprias estruturas sociais. O fenômeno do poder não é simplesmente axiológico, é objetivamente finalístico. Tido como um dos poderes do Estado, o Judiciário tem como objeto tutelar direitos, declarar sua existência concreta e assegurar seu pleno exercício; sua finalidade é realizar o bem comum, síntese das condições necessárias a uma vida digna. Para sociedade, Justiça e Judiciário se confundem: o homem comum vê o Judiciário como o instrumento da certeza da paz social. Quando ele falha no cumprimento desse papel, enfraquece, no espirito social, a crença de sua necessidade e, então, de nada valem atitudes externas de auto-afirmação.

Não é necessário reformar o Judiciário; o que se precisa é reformar os juízes; se não todos, pelo menos alguns. Juiz não é aquele que apenas domina as técnicas das leis, que pontualmente comparece às audiências e, burocraticamente examina e decide qual a parte que tem razão. Juiz é muito mais do que isso: é renuncia a posições cômodas da vida; é quem se integra no drama daqueles que o buscam como a última trincheira capaz de abrigar suas esperanças.

No Judiciário não há lugar para o prepotente, para o arbitrário, para o trânsfuga, o tímido ou o fraco; e muito menos para o complacente, já o disse uma vez, e o repito: o verdadeiro juiz é o que tem a força moral como lança e a lei como escudo, aquele que só presta contas à sua consciência. Só merece o alvor do capelo aquele que sabe manter a pureza da neutralidade diante da Constituição e das leis, expressa na cor negra de sua toga; que age com modéstia, mas com sabedoria; com independência mas com destemor; escravo da lei sendo seu intérprete; muralha e abrigo ao perseguido; fonte de quem tenha sede de Justiça e que tudo faz ciente de que a nação em si depositou a ordem e a segurança pública, a paz e a liberdade.
Se faltam juízes que correspondam a esses ideais eternos, a sociedade os vai, inexoravelmente, buscar em outros meios.

Gama Malcher, desembargador, é ex-presidente e decano do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro e presidente do Instituto de Pesquisas Jurídicas da UniverCidade


Colunistas

Coisas da Política – Dora Kramer

O Brasil está indo para a quarta eleição direta da era pós-redemocratização sem que a imprensa tenha encontrado uma forma eficiente de relatar o que se passa nas campanhas, os pensamentos dos candidatos e o comportamento do eleitor. Depois da descoberta das pesquisas dos marqueteiros e das alegorias das declarações de impacto de candidatos, ficamos dispensados de usar a cabeça. Principalmente a parte de dentro, na qual o ideal é que haja inteligência.

E, de preferência, cultivada com carinho, esforço e empenho solitário e coletivo. O problema é que seu uso implica o risco do erro, o que torna bem mais fácil a padronização dos trabalhos, tanto da parte dos veículos quanto no que diz respeito aos profissionais encarregados de transmitir a informação eleitoral.
Esta, hoje, muito mais preocupada em mostrar como cada candidato pretende, tática e estrategicamente, se sobrepujar ao outro, do que em desvendar e pôr à prova razões e capacidades para governar. O exemplo, gasto, mas inevitável por clássico, foi o da eleição de Fernando Collor de Mello.

Péssimo prefeito de Maceió - em cujo currículo havia 5.000 contratações feitas nos últimos dias de mandato -, sofrível governador de Alagoas - entre outros motivos por ter falido o Estado com um acordo pelo qual os usineiros estavam dispensados de pagar ICMS até sobre mercadorias vendidas em butiques de suas filhas - Collor foi tratado pelos meios de comunicação como um ''fenômeno''.

De quê, de competência administrativa ou política? Não, de desempenho nas pesquisas. Tudo o que dele se dizia no Estado era atribuído à ação dos adversários, do coronelato, morto de medo daquele moderníssimo espécime de paladino da moralidade. A partir de abril de 1989, quando Collor efetivamente deslanchou nas pesquisas, aí mesmo é que não se aprofundou mais nada.

Discutia-se, no máximo, primeiro, os nomes daqueles que iam aderindo por gravidade - buraco em que por um triz não se enfiou o PSDB - e depois os personagens que eventualmente fariam parte do governo. Tanto não houve inteligência para somar A com B nos meios e modos das contradições do ''fenômeno'' que, no dia seguinte à eleição, pegou todos de surpresa com um confisco de fazer corar argentino.

Na era Fernando Henrique debateu-se um tema só, que era a derrubada da inflação. Importantísssimo, mas quem não prestou atenção nem questionou o significado - aqui de juízo de valor - de uma aliança com o PFL, perdeu o direito depois de ficar dizendo-se decepcionado com as concessões da socialdemocracia aos liberais pefelistas. Pressupunham o quê, que o acordo teria mão única?

Sobre Luiz Inácio Lula da Silva ocorre o mesmo. Há 12 anos ele muda de posições a cada campanha - tentando ampliar o eleitorado - e o que continua se discutindo é se sua força de largada nas pesquisas é suficiente para garantir a vitória na reta de chegada. Tanto que a opção do partido para que fosse mais uma vez candidato baseou-se nos tais 30% e, não, na capacidade de despertar no eleitorado a confiança de que ali há um governante competente, avançado e coerente.

A suspeita é a de que não há, porque pelas declarações que produz e pelas admirações mundiais que exibe, ainda tem concepções com prazo de validade há muito vencido. Mas não se pode questionar muito Lula, sem correr o risco da acusação de governismo explícito. Por isso, segue ele à vontade em seu simbolismo de lutas passadas, sem que o eleitor saiba direito, afinal de contas, o que significa eleger Lula.

Justiça seja feita, também não sabe direito por que eleger Ciro Gomes ou Itamar Franco - a não ser pelo horror que ambos nutrem por FH -, Anthony Garotinho - pleno de promessas, carente de comprovações -, Roseana Sarney - até agora bem-sucedida pelo fato de ser mulher -, ou mesmo um candidato tucano, a não ser pelo risco menor de mudanças bruscas no rumo do país.

E não há muito jeito, a não ser atribuir essa responsabilidade a nós, que trabalhamos com informação, mas tratamos o eleitor como percentual de pesquisa ou pilotos de provas de marqueteiros. Não foi uma nem duas vezes neste país em que, quando se arriscou a investir na reportagem, elas apresentavam realidades inteiramente diferentes daquelas antecipadas pelas pesquisas.

A vitória de Maria Luiza Fontenelle para a Prefeitura de Fortaleza é um exemplo. Como este, há inúmeros. Só que quando acontece, a tendência é culpar os institutos por erro, o candidato vencedor por fraude ou o eleitor por produzir o imponderável.

Este, pobre criatura, continua desinformado, votando ao sabor das circunstâncias locais ou da impressão - em geral falsa - que o candidato causa nos horários gratuitos de televisão. Não recebe sequer uma única proposta de debate a respeito da obrigatoriedade do voto, assim como também ninguém lhe explica o que muda em sua vida o voto distrital ou a fidelidade partidária. Está tão alijado dessa discussão quanto distante dos critérios que deveriam valer numa eleição.


Editorial

Brasil Afônico

Pelo tom anacrônico, a Voz do Brasil parece vir do além-túmulo. Desde 1935, quando foi criado, o programa radiofônico oficial não fez nada para melhorar. Apenas deixou de chamar-se Hora do Brasil. O país deu um saldo do rural para o urbano, no pós-guerra, mas a Voz continua a ser eco do atraso tecnológico na era da internet e da televisão. O sotaque oficial soa impróprio na democracia que pede transparência e não o formalismo como sinal de respeito pela sociedade.

A queda vertical da audiência, assim que a Voz do Brasil entra no ar, pede mais do que a velha alegação de que leva informações oficiais a todo o território nacional. Quando tem interesse público, as notícias correm. As emissoras radiofônicas cobrem todo o país 24 horas por dia. Além do mais, o rádio assumiu utilidade informativa direta, tornou-se prestação de serviço. Ficou indispensável às grandes cidades e áreas metropolitanas, pela versatilidade em fornecer informações. A orientação vinda de helicópteros nas horas de ponta no trânsito é essencial e insubstituível. Rádio é entretenimento mas é também utilidade pública. Tem a vantagem da presteza porque o som passa à frente da imagem na competição de chegar primeiro ao cidadão.
Quando a Voz do Brasil se faz ouvir às 19 h, a audiência média anda em 20%, mas cai verticalmente para 5%. Dura uma hora o programa e a seqüela é irrecuperável: o ouvinte não volta depois de ter fugido. O prejuízo das emissoras é permanente. Caracteriza cerceamento da liberdade de imprensa. A Voz do Brasil foi útil quando a comunicação engatinhava no imenso território nacional, mas ninguém defende - a não ser os políticos - a manutenção desse privilégio de poucos, porque os ouvintes simplesmente desligam o aparelho. Uma hora sem informação de interesse público, metade com burocracia do Executivo e metade de propaganda pessoal de parlamentares, não justifica o sacrifício.

A OAB moveu ação de inconstitucionalidade contra o programa. Mas a pressão política da periferia parlamentar esfriou o empenho da OAB. O procurador-geral da República diz que não se sente capaz de dar o parecer. Como diz o diretor da Rádio Eldorado (SP), João Lara Mesquita, ''ainda estamos no tempo do coronelismo''. A única utilidade do pro grama é ajudar a reeleição de parlamentares medíocres. A Eldorado conseguiu a tutela antecipada, até que o STF decida, e deixou de transmitir o programa. Mais ainda, a maioria das 5 mil emissoras de radio por todo o país continua transmitindo o programa.

É hora, portanto, de ser revista a obrigatoriedade (que não data do governo Vargas mas do curto período de Jânio Quadros). As emissoras estão prejudicadas no seu horário nobre porque a queda de audiência leva à queda de receita. Rádio vive de publicidade e de confiança. A Voz do Brasil não ficou sabendo, dia 11 de setembro, do ataque terrorista que fez 5 mil mortes em Nova York. Desconheceu o fato. O sistema radiofônico e a rede de televisão da Câmara e do Senado fazem muito mais e muito melhor. Arquive-se a Voz do Brasil.


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12/11/2001


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