Implantação de alterações tributárias deve ser gradual, diz economista
A reforma tributária deveria gerar regras capazes de melhorar a qualidade do sistema em vigor, preservando, porém, o nível de arrecadação atual. Foi o que defendeu nesta terça-feira (3) o economista do BNDES José Roberto Afonso, em reunião da Subcomissão Permanente de Avaliação do Sistema Tributário Nacional, que funciona no âmbito da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE).
Para o economista, que foi detalhar o trabalho de subcomissão temporária de reforma tributária, que funcionou no período de 2007 a 2008, um projeto de reforma deve ser implantado de forma gradual e progressiva, a partir do aperfeiçoamento das leis e de gestão adequada, associada a alterações na esfera administrativa, na Constituição e no Código Tributário Nacional (CTN). José Roberto Afonso lembrou que, desde 1988, ano da promulgação da Constituição, mais de 68 mudanças já foram feitas no capítulo que trata do sistema tributário.
- Foram quase sempre mudanças pontuais, muitas vezes voltadas para a ampliação da carga tributária - afirmou o economista, observando que poucos países emergentes arrecadam tanto como o Brasil.
Ele listou deficiências do atual sistema tributário, que onera exportações e investimentos, beneficiando as importações; que distorce a alocação de recursos e preços pelo fato de ser neutro quanto à escolha do local e do método de produção; que dispõe de obrigações acessórias complexas e onerosas; e que promove a centralização crescente de recursos e poderes, além de uma injusta distribuição da carga tributária.
Para que uma proposta de reforma tributária possa prosperar, recomendou, é preciso primeiro chegar a consensos sobre princípios, fazer simulações e, por último, detalhar o texto final da matéria.
- Na linha de consenso, é preciso escolher um objetivo básico para um projeto de mudança, um Norte, uma meta número um, um objetivo, que é fazer a simplificação profunda do sistema tributário nacional - defendeu.
Alterações
José Roberto Afonso destacou ainda que aspectos ligados à qualidade da tributação passam pela Constituição, mas que o tamanho da carga tributária depende de legislação infraconstitucional.
- A mudança do sistema tributário tem que ser encarada como um processo, uma única alteração não vai resolver todos os problemas - afirmou.
Quanto a alterações na esfera infraconstitucional, ele lembrou que relatório da subcomissão que funcionou entre 2007 e 2008 propõe a adoção de um imposto de valor agregado (IVA) que reuniria o IPI, Cofins e PIS em um só imposto. O relatório também recomendou maior transparência ao propor que notas fiscais e recibos de compras explicitem quanto de tributo está embutido no preço do produto vendido ao consumidor.
- Ninguém sabe hoje ao certo a carga tributária, cada serviço pago por isso, são vários impostos e contribuições, taxas que incidem sobre a mesma base, muitas vezes um sobre o outro. Quando se calcula, a carga tributária hoje é simplesmente desconhecida - afirmou.
José Roberto Afonso que também listou várias medidas que deveriam ser tomadas na esfera administrativa, disse que é preciso consolidar toda a matéria tributária contida na Constituição em um único capítulo da Carta Magna.
- É preciso enxugar ao máximo o capítulo tributário da Constituição, ele é enorme, não há país que tenha tantas regras no mundo como o nosso. O resultado é que quase todas as matérias tributárias acabam batendo no STF [Supremo Tribunal Federal] - afirmou.
Ele também apontou a necessidade de conciliar a vigência dos dispositivos constitucionais com as alterações a serem feitas no CTN, de 1965.
- O código passa a ter função chave. O atual foi esquecido. Toda matéria tributária deveria estar nessa lei. Código, na prática, não é, porque hoje a legislação está dispersa - afirmou.
Transparência
O senador Luiz Henrique (PMDB-SC) disse que o brasileiro não sabe quanto paga de imposto. Frisou que em cada produto está embutido um imposto e que isso precisa ser mostrado à população.
- O cidadão não sabe que ao tomar um copo de água está tomando 40% de imposto. Ao pegar ônibus, 50%. Ao abastecer seu carro, metade é gasolina, metade é imposto - afirmou.
Luiz Henrique defendeu um novo sistema tributário com natureza progressiva, para os mais pobres paguem menos.
Já o senador Armando Monteiro (PTB-PE) criticou as propostas "ingenuamente simplificadoras de fórmulas exóticas do imposto único", segundo ele comuns no início da década de 1990.
- O Brasil precisa construir um sistema que se harmonize com a experiência internacional e que possa convergir para modelos que o mundo de alguma forma consagrou como os mais adequados - afirmou.
Na avaliação de Armando Monteiro, a reforma tributária é um tema complexo que se esbarra em uma questão essencial: as contradições da federação, as assimetrias regionais.
Embora o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) responda por apenas 20% da arrecadação, Armando Monteiro disse que esse tema ganha vulto e torna-se crítico porque "toca nos interesses dos atores políticos que atuam na questão": os parlamentares, representantes dos estados.
Já o senador Marcelo Crivella (PRB-RJ) disse que a carga tributária no Brasil é "perversa e ilógica".
- Temos no país a Lei Kandir, que permite que cada estado legisle sobre o seu ICMS. A arrecadação é regressiva no Brasil, os pobres sempre pagaram e continuam pagando mais impostos - afirmou.
A elevada carga tributária também foi apontada pelo senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), que ressaltou a incidência em cascata de impostos no país.
Subcomissão
A Subcomissão Permanente de Avaliação do Sistema Tributário Nacional é presidida pelo senador Aloysio Nunes (PSDB-SP). Seu vice-presidente é o senador José Pimentel (PT-CE).
A subcomissão teve origem em colegiado temporária criado na CAE em 2007 para avaliar o desempenho e a funcionalidade do sistema tributário nacional, trabalho que contou com a participação de José Roberto Afonso. Em dezembro de 2008, a subcomissão aprovou relatório que prevê a elaboração de um novo sistema tributário, em vez da adoção de reforma e texto de emendas.
Esse relatório faz parte de livro editado pelo Senado em 2010. No ano seguinte, a subcomissão passou a ter caráter permanente para atender ao dispositivo constitucional que incumbe o Senado de avaliar de forma contínua o desempenho da atividade tributaria no país.
03/05/2011
Agência Senado
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