Itamar admite desistir para negociar







Itamar admite desistir para negociar
Governador quer incluir mais eleitores na prévia do PMDB, mas aliados do Planalto na executiva recusam a idéia

BRASÍLIA - O governador Itamar Franco admitiu ontem a intenção de abandonar a disputa pela Presidência da República. Em reunião da cúpula do PMDB, ontem, avisou que desistirá se a ala governista do partido restringir o número de eleitores nas prévias marcadas para 20 de janeiro.
A eleição interna será regulamentada hoje durante encontro da executiva da legenda. Será uma decisão política. Os aliados do Planalto querem limitar aos delegados a escolha do candidato do partido à sucessão de Fernando Henrique em 2002. Itamar deseja que participem os vários diretórios, um colégio eleitoral bem mais amplo e menos suscetível à pressão dos dirigentes partidários. O governador mineiro concorre com o senador gaúcho Pedro Simon pela vaga.

Na reunião de ontem, na casa do presidente do Senado, Ramez Tebet (PMDB-MS), Itamar antecipou que não recorrerá à Justiça se o PMDB optar pelo colégio eleitoral restrito. ''Tomarei uma decisão política '', observou. ''Tenho três alternativas'', avisou, sem revelar os planos. Sabe-se, contudo, que pode escolher entre concorrer à reeleição em Minas, disputar uma cadeira no Senado ou apoiar um candidato de oposição à Presidência.
Qualquer uma dessas três hipóteses agrada aos governistas. Parte deles participou do encontro, como o presidente do partido, deputado Michel Temer (SP), e o concorrente de Itamar, Pedro Simon. O governador de Minas não fez qualquer declaração ao deixar a casa de Tebet. Só vai se pronunciar depois da decisão da executiva do partido.

Votos - O colégio eleitoral do PMDB na prévia, de acordo com os números de Itamar, teria 100 mil votantes. Participariam diretórios estaduais, municipais e nacional. Acredita que um universo maior facilitará sua vitória, por dificultar um acordo da cúpula comandada pelos governistas.
Justamente por isso, a ala do PMDB mais afinada com o Planalto prefere a redução dos eleitores. Seriam 5 mil. Os diretórios municipais não votariam. ''Foi uma conversa sincera, mas amanhã haverá uma divisão de águas'', reconheceu o líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (AL).

Divisor ou não, pelo menos a boa educação imperou no encontro de ontem. ''Itamar foi gentil'', elogiou Temer. Entre goles de refrigerante e muito pãozinho de queijo, coube ao presidente do PMDB expor ao governador a proposta de redução da quantidade de votantes na prévia. Alegou razões operacionais e dificuldade de fiscalização. ''Nem o PT conseguiu fazer prévia'', avaliou, numa referência aos problemas ocorridos durante a eleiçao do presidente petistas José Dirceu, há um mês. Temer antecipou que a maioria da executiva compartilhava seus argumentos.

Subtração - Simon, em parte, referendou os argumentos do presidente da legenda. ''Quem ganha em 60 mil, ganha em 6 mil'', comparou. Tebet e Calheiros defenderam a ampliação do colégio eleitoral. Apesar disso, o grupo de Itamar não chegou afinado. ''Não me venha dar aulas de matemáticas'', reclamou Itamar quando seu vice, Newton Cardoso, tentava convencê-lo que 100 mil eleitores era um universo exagerado. Itamar também lançou farpas a Simon: ''Ultimamente temos divergido muito''.

Se Itamar desistir, Simon estará sozinho na disputa, mas não tem motivos para comemorar. Com apenas um pré-candidato, a prévia será cancelada. Ficará para a convenção nacional, marcada para junho de 2002, a decisão sobre se o partido vai fazer campanha solo ou compor com outra legenda. Temer, por exemplo, adiou para janeiro a definição se disputa a prévia ou não. Só entra com a garantia de apoio total dos aliados do Planalto.


Procurador quer punir Roseana
BRASÍLIA - O Ministério Público Federal do Maranhão encaminhou ao procurador-geral da República, Geraldo Brindeiro, representação a governadora Roseana Sarney, devido à sua participação no programa nacional do PFL na TV. O procurador Alexandre Marques considerou que a governadora deve ser punida por propaganda ilegal por ter participado como candidata à Presidência. Ela teria desrespeitado o calendário eleitoral.

A atenção do procurador foi despertada pelos comerciais em que Roseana recusava papel subalterno numa possível composição dos partidos aliados. ''Andam dizendo por aí que eu daria boa candidata a vice'', disse ela. Marques reconhece não ter assistido ao programa completo do partido, mas ''as chamadas foram suficientes para caracterizar propaganda eleitoral''.
O caso foi encaminhado ao procurador-geral da República, Geraldo Brindeiro, também procurador-geral eleitoral. ''O programa foi divulgado em todo o território nacional, enquadrando-se em caso de competência do procurador-geral eleitoral'', disse Marques.

O programa do PFL foi veiculado no início do mês. O procurador acusa Roseana de ter desrespeitado a lei 9504, de 1997, que veda a propaganda antes de aberto o período de campanha eleitoral. Se a candidatura de Roseana for confirmada pelo PFL e a Justiça Eleitoral condená-la, ela não poderá concorrer.
Aliados de Roseana reagiram rapidamente. Consideram inadequada a representação do Ministério Público, porque afirmam que Roseana não se anunciou como candidata. Na antecipação da tese da defesa, alegam que ela apenas ''firmou posição''. Ao se recusar a ser vice, estaria interpretando a posição do partido que, ao contrário de 1994 e 1998, não quer ocupar a vice-presidência no próximo governo.


Hugo Napoleão assume governo do Piauí
TERESINA - O ex-senador Hugo Napoleão (PFL) assumiu ontem à noite o governo do Estado do Piauí, duas semanas após a cassação de Francisco de Assis Moraes Souza, o Mão Santa (PMDB). A diplomação de Napoleão foi decidida pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE), por 3 votos a 2, pela manhã. O novo governador prometeu sanear o Piauí. ''Primeiro vamos exonerar os secretários. Depois vamos suspender os pagamentos, com exceção do funcionalismo público estadual'', anunciou. ''Também vamos cortar despesas, arrumar a casa. Não será fácil.''

As brigas judiciais, no entanto, estão longe do fim. O procurador eleitoral regional Tranvanvan Feitosa disse que em no máximo 15 dias vai entrar com recurso no TRE para pedir a cassação de Hugo Napoleão, pelo mesmo motivo que levou à suspensão do mandato do antecessor. ''No mesmo parecer que pedi a cassação de Mão Santa também apontei abuso de poder econômico da coligação de Hugo Napoleão. Isso já havia sido denunciado desde o início do processo contra Mão Santa'', disse Tranvanvan. O advogado Macário Oliveira, um dos defensores de Mão Santa, também prometeu recorrer. Ele entrará com mandado de segurança no Tribunal Superior Eleitoral, que cassou Mão Santa.

Renúncia - O novo governador acompanhou de Brasília o julgamento do TRE. Com o resultado favorável, assinou a carta de renúncia ao mandato de senador - entregue ao cardiologista Benício Sampaio (PPB) - e pegou um jatinho. Ele foi comunicado que seria diplomado em Teresina às 13h30. Às 16h já estava no Estado pronto para tomar posse. Às 18h30 já estava empossado, com seu vice, Felipe Mendes, do PPB. O ex-senador recebeu o cargo do governador interino, Kleber Eulálio (PMDB), no Palácio do Karnak.
Napoleão assegurou que continuará a executar todas as obras iniciadas por Mão Santa. ''Vamos tomar medidas de contenção de despesas. Vamos ter uma idéia de como anda o Estado.''

O julgamento no TRE - que rejeitou recurso de Mão Santa por uma nova eleição - foi acompanhado por quase 5 mil pessoas diante do prédio. Militantes mais exaltados chegaram a se esmurrar, trocar pauladas. Os juízes demoraram três horas para tomar a decisão.
O principal aliado de Mão Santa, Firmino Filho (PSDB), prefei to de Teresina, disse que ficou revoltado com a decisão dos juízes. ''Deveriam ocorrer novas eleições. O povo não está sendo respeitado'', protestou.


Aloysio manda PF apurar gravidez de Glória Trevi
Decisão sepulta história da inseminação. OAB e MP vão acompanhar inquérito

BRASÍLIA - O ministro da Justiça, Aloysio Nunes Ferreira, mandou a Polícia Federal reabrir as investigações sobre a gravidez da artista mexicana Glória Trevi. Ela engravidou quando estava presa na carceragem da PF em Brasília. Uma sindicância interna concluiu que a atriz fez inseminação artificial para gerar um filho brasileiro e evitar a extradição. O ministro considerou suspeita a sindicância e determinou a abertura de inquérito policial a ser acompanhado pelo Ministério Público e pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Inquérito investiga ilícitos penais. Sindicância apura falhas disciplinares. Glória se recusa a revelar como engravidou e diz correr risco de vida. Advogados e amigos da artista afirmam que ela foi estuprada, em várias ocasiões, por policiais federais. Os ataques ocorreriam à noite, com as luzes da cela desligadas para escapar das câmeras de vigilância. Esses amigos dizem que, se o ministro está mesmo interessado em apurar o fato deve, requisitar as fitas, pois, mesmo que as imagens não sejam claras, é possível ouvir o som dos gritos de Gloria.

Câmeras - A sindicância interna descartou o uso das câmeras como prova. Pela versão oficial, a PF não gravava as imagens no sistema interno de vídeo. O relatório concluiu pela tese mais confortável para a PF, a da auto-inseminação. Os policiais que trabalhavam na carceragem não prestaram depoimento. Agora serão intimados. No inquérito, qualquer pessoa pode ser obrigada a depor. Na investigação interna, apenas os funcionários da PF têm tal obrigação.
O inquérito será conduzido pelo delegado Cláudio Ferreira Gomes, da Corregedoria-Geral da PF. A sindicância foi realizada pelo delegado Francisco de Assis Sobrinho, também da Corregedoria.

Jogo - Um dos advogados da atriz, Otávio Neves, elogiou a iniciativa do ministro da Justiça. ''A apuração das irregularidades pode apontar os responsáveis pela gravidez'', disse. Neves afirmou que a sindicância foi ''um jogo de cartas marcadas da Polícia Federal'' para esconder a verdadeira história.
Aloysio Nunes começou a desconfiar do resultado da sindicância ao tomar conhecimento do conteúdo de cartas enviadas pelo preso José Carlos Carlini. Acusado de tráfico de drogas, ele esteve na carceragem da PF.

Na carta, contou a um amigo sobre a gravidez de Glória. Sugeriu que o pai poderia ser um de dois agentes federais que trabalham ali, em plantão noturno. Disse ainda que vários policiais tiveram relação sexual com a mexicana. O texto não foi anexado à sindicância. O delegado Sobrinho afirmou desconhecer a existência da carta.
Desta vez, a PF estará sob vigilância, enquanto realiza o inquérito. O ministro Aloysio disse que a OAB e os procuradores da República poderão sugerir providências à polícia e acompanhar cada passo da investigação.


Devagar, professores voltam às aulas
Algumas universidades e institutos voltam a funcionar e ministro da Educação considera encerrada temporada de negociação
As negociações entre o governo e os professores universitários em greve há 90 dias estão encerradas, anunciou ontem o ministro da Educação, Paulo Renato Souza. ''Os professores perderam a oportunidade do acordo, não há mais tempo'', afirmou durante seminário sobre Educação e Desenvolvimento promovido pela Fundação Getúlio Vargas no Rio. O ministro nem precisava ser tão taxativo. Aos poucos, professores de algumas universidades ou institutos ligados a elas vão retornando às salas de aula.

A Universidade Federal de São Carlos voltou a funcionar ontem. Na UFMG, houve confusão entre grevistas e partidários do retorno ao trabalho. Algumas unidades devem abrir hoje, tal como o Instituto de História, Ciências Sociais e Filosofia da UFRJ. Paulo Bahia, um dos encarregados de divulgar o resultado da assembléia no instituto, no qual trabalham mais de cem professores, atribuiu a decisão ao impasse entre o comando de greve e o MEC. ''Há uma disputa política entre o PSTU, no qual se abrigam os líderes da greve, e o PSDB do ministro Paulo Renato'', criticou. ''Essa briga é estranha aos interesses da universidade.'' Bahia avalia que ''os prejuízos para o processo de aprendizado dos alunos, depois de tantos dias sem aula, é irreversível''.

Além de considerar encerrado o diálogo com os grevistas, o ministro Paulo Renato afirmou não ter competência para autorizar o pagamento dos salários de outubro. Em ofício enviado ao Tribunal Regional Federal ele informa que tal atribuição cabe ao Ministério do Planejamento, responsável pela folha de pagamento dos servidores públicos.

Tempo - Com isso, o governo adiou por alguns dias o desembolso. A Advocacia Geral da União vai recorrer da sentença do tribunal, Como deixou claro Paulo Renato, ele não concorda com o pagamento antes de os professores voltarem ao trabalho.
O aumento de 34% na gratificação, oferecido na contraproposta do governo aos grevistas, ''é o limite possível no momento'', reafirmou o ministro da Educação. Reconheceu que o plano de carreira está defasado, disse ser urgente a criaççao de novos níveis para a progressão funcional dos docentes mais graduados, mas deixou como uma possibilidade o envio de projeto ao Congresso, talvez no ano que vem, para corrigir essas deficiências.

O semestre letivo não será cancelado, garantiu o ministro. As férias, sim. ''Os únicos prejudicados com a greve são os alunos da graduação'', acusou. ''Até por isso sou contra a idéia de pagar os salários. Alguém tem de fazer alguma coisa pelos alunos e exigir que se volte ao trabalho.'' Na quarta-feira, o ministro vai se reunir com reitores para avaliar o quadro. ''Podemos optar por contratações temporárias no caso de trabalhos operacionais'', antecipou Paulo Renato.

Reação - Com a suspensão das negociações, a Associação Nacional dos Docentes de Ensino Superior (Andes) vai entrar hoje com duas ações contra o ministro da Educação no Superior Tribunal de Justiça (STJ). A primeira exige o pagamento de multa diária pelo não depósito do salário de outubro.A outra, pede a remessa do processo contra o ministro à Procuradoria-Geral da União. A Andes acusa Paulo Renato de crime de responsabilidade.

A guerra judicial não deve parar por aí. Até o fim da semana, os advogados dos docentes devem pedir o impeachment do ministro da Educação no Supremo Tribunal Federal (STF). Ontem, o ministro Marco Aurélio Mello, presidente do STF, voltou a criticar o governo. ''É inimaginável que uma greve dure tanto assim'', afirmou.


Maluf se defende no programa do PPB
SÃO PAULO - A imagem do tocador de obras foi substituída pela do político encurralado e em franca defesa. O ex-prefeito Paulo Maluf usou mais da metade dos 20 minutos a que o PPB teve direito na TV, ontem à noite, para tentar afastar as suspeitas de que seja beneficiário de uma conta bancária com mais de US$ 200 milhões na Ilha de Jersey, paraíso fiscal britânico.
Maluf não discursou sozinho. Pela primeira vez, sua mulher, Sílvia, apareceu num programa político. ''O Paulo é um marido, pai e avô maravilhoso, um incansável'', elogiou. ''Agradeço por tudo que vivemos juntos nesses 46 anos.''

A interpretação constrangida de Sílvia não conteve a retórica de Maluf. ''Você pode até não gostar de mim, mas exija provas do que estão dizendo. Não caia no jogo sujo'', repetiu quatro vezes, ''Querem me tirar da vida pública com mentira e calúnias. Só saio pelas mãos do povo ou de Deus.''
Maluf considerou as investigações do promotor Sílvio Marques uma campanha do PSDB. Responsabilizou o governa dor Geraldo Alckmin pela ''armação''. Sem citar pesquisa ou instituto, atribuiu a apuração ao fato de liderar a campanha pela sucessão paulista. ''Já disse mais de mil vezes que não tenho conta no exterior'', desabafou. Reclamou que, cinco meses após o início da investigação, nenhuma prova foi apresentada. ''Vou processar esses promotores por abuso de autoridade.''


Célio deixa CTI mas há risco de seqüelas
BELO HORIZONTE - O prefeito de Belo Horizonte, Célio de Castro (PT), deixou no final da tarde de ontem o Centro de Tratamento Intensivo (CTI) do Hospital Mater Dei, na capital mineira. Ele vai ficar por tempo indeterminado na unidade de cuidados intermediários.
O boletim divulgado às 11h da manhã de ontem informava que o prefeito estava recebendo alta do CTI. No entanto, a transferência para outra unidade só aconteceu três horas depois.

O neurologista Guilherme Cabral, um dos que assistem o prefeito, afirmou que Célio poderá sofrer seqüelas na fala devido ao derrame, mas a lesão poderá ser corrigida posteriormente com tratamento fonoaudiológico.
O prefeito, que é médico de profissão e tem 69 anos, está internado há 12 dias. Ele foi submetido a uma cirurgia de emergência para drenagem de um coágulo no cérebro. Amanhã pela manhã será divulgado outro boletim médico.

Célio é prefeito de Belo Horizonte desde 1997, quando se elegeu pela legenda do PSB. No ano passado, reelegeu-se, com o apoio do PT, partido para o qual se transferiu recentemente, descontente com a candidatura do governador Anthony Garotinho à Presidência da República. Célio é considerado um dos principais interlocutores do governador Itamar Franco.


Ministro quer manter maioridade aos 18 anos
Aloysio Nunes considera infratores vítimas da violência

BRASÍLIA - Os 16 projetos apresentados no Congresso para redução da maioridade penal vão encontrar no Executivo um adversário de peso: o presidente Fernando Henrique. Ontem, na abertura da 4ª Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, o ministro da Justiça, Aloysio Nunes Ferreira, defendeu o atual limite de 18 anos, antecipando a posição do governo federal. ''Toda infração envolvendo um jovem produz um furor nacional'', disse. ''Mas as pesquisas mostram que ele não é autor, mas vítima da violência''.
A taxa de homicídios e outras mortes violentas no Brasil é de 26,2 para cada cem mil habitantes, segundo o Mapa da Violência, publicado em 2000 pela Unesco. Na faixa etária entre 15 e 24 anos, sobe para 47,8. ''Não é muito comum países que exterminam sua juventude como o Brasil'', disse Julio Jacobo Waiselfisz, autor do estudo e representante da Unesco em Pernambuco. Entre os 38 países comparados, só a Colômbia apresenta situação semelhante.

Agravamento - No caso brasileiro, o problema se agravou na última década. De 1979 a 1981, 22,4% dos mortos entre 15 e 19 anos foram vítimas de assassinato. Em 1998, esse percentual subiu para 52,9%. ''Está na hora de implantar uma política nacional de redução da morbidade e da mortalidade por acidentes e violência'', diz a professora Maria Helena Prado Mello Jorge, da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo.

A violência também foi tema da abertura da conferência do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda). Segundo os números reunidos por Jacobo, em 1998 foram assassinados, em média, 120 brasileiros por dia. O ministro Aloysio assistiu a uma encenação feita por crianças de rua.

Estatísticas - O evento do Conanda reunirá representantes do governo, atores sociais e adolescentes no Colégio Militar de Brasília até a quinta-feira. Eles firmarão um Pacto Social pela Paz, com dez metas para os próximos três anos no combate à violência envolvendo crianças e adolescentes. Enfrentam, no entanto, a falta de estatísticas confiáveis para traçar um perfil da violência no país.

O módulo do Sistema de Informação para a Infância e Adolescência (Sipia) é alimentado por informações enviadas pelos conselhos tutelares. Mas eles dependem de verbas municipais e não funcionam bem na maior parte do país. O Distrito Federal, por exemplo, não está representado na conferência porque as eleições dos conselheiros foram anuladas. O cenário pode piorar no ano que vem. ''Estão usando a máquina pública para colocar gente do governo dentro do conselho, de olho nas eleições'', acusa a coordenadora nacional do Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua, Jussara de Goiás.

O módulo do Sipia com informações sobre adolescentes infratores não foi implantado pelo Departamento da Criança e do Adolescente (DCA) do Ministério da Justiça. As últimas informações revelam que 71,8% das infrações cometidas por adolescentes são contra o patrimônio. Os chamados crimes contra a vida respondem por 11,6% das sentenças contra menores. Os dados, do primeiro semestre de 2000, foram compilados entre 131.625 menores infratores.


Artigos

Desertores da política?
Francesco Conte

A pior mentira é aquele que contamos a nós mesmos. Quantas vezes nos flagramos, distantes da razão, tentando nos inseminar a idéia de que o sufrágio universal basta ao regime democrático? Quando nos convencemos de que o voto, embora importante conquista civil, é suficiente à democracia, é porque já não tivemos coragem para resistir à tentação do mito. Um engano a mais. O sufrágio universal é um método eleitoral, consubstancia um expediente formal da democracia, mas, visto com olhos de ver, não é a sua essência. O voto é o ponto de partida, e não o de chegada, do caminho a ser percorrido.

A sociedade almeja mais, quer a democracia real, que, por sua vez, precisa de instituições fortes, duradouras, eficientes e confiáveis. Instituições de Estado conciliadas com o princípio da soberania popular e comprometidas com a prestação de serviços de qualidade. Na democracia real, o cidadão é educado para a liberdade, não para a ilusão.
Somente o compromisso radical com a educação, priorizando-se investimentos financeiros maciços nesse setor, pavimentará o acesso à democracia substancial. A educação do povo, a politização da sociedade e a conscientização do cidadão são as três filhas da democracia real. O costume é o seu quarto filho. A democracia integral, vigorosa, não prescinde da participação ativa de cada indivíduo no poder, como sujeito da vida pública, inspirando e determinando as diretrizes políticas do governo. A democracia não pode ficar no céu da abstração, prisioneira de modelos teóricos, nos artigos da Constituição: deve, antes, enraizar-se no costume do povo, plasmando, no cotidiano, a sua consciência constitucional. Ou se tem um costume democrático ou não se tem nada, nem democracia tampouco Constituição válida e efetiva.

Vê-se, hodiernamente, a silenciosa multidão dos indiferentes, fascinada pelo fenômeno do absenteísmo, que, fruto da desilusão e do distanciamento asséptico de políticos corruptos travestidos de paladinos da moralidade pública, se revela na indiferença diante dos grandes temas, renunciando a toda atividade política, com partido ou sem partido. É, mais que um erro crasso, uma insensatez orgulhar-se da própria apoliticidade, descansando à sombra do tecnicismo. Lavar as mãos nas águas da apatia talvez não nos ajude na superação do absenteísmo, mas, certamente, nos condenará à condição de menoridade política.

Devemos depurar a política - como ideologia do espetáculo e tradicional vertente de corrupção e de impunidade - para, depois da regeneração e capilarização do poder político, transformá-lo, alicerçado em novos fundamentos jurídico-filosóficos, em eficaz instrumento de justiça social e de justa sociedade.
Como o fermento da esperança, devem integrar a agenda de cada cidadão cônscio de suas responsabilidades públicas a reorganização das forças políticas populares, a labareda idealista e progressista dos movimentos sociais, o confronto entre programas políticos e plataformas de governo, e as imprescindíveis questões sociais, como a educação, a geração de empregos, o combate à pobreza, a redistribuição equânime de renda e a inadiável reforma agrária. Os temas econômicos, como as taxas de crescimento e de inflação, e a irreversível globalização, figuram na pauta, assim igualmente a séria discussão jurídica da dívida externa - a nova forma de escravidão do século 21 -, inclusive no contexto dos direitos humanos, mormente o da supremacia do direito à vida, e dos direitos dos povos, sobretudo no ângulo do direito ao desenvolvimento e da autodeterminação.

É imperiosa a reconstrução vigorosa das instituições de Estado, com a reformulação do sistema de defesa do interesse público. Eis aí o retorno ao campo político, para consolidar, no povo, o costume democrático e impregnar, nos indivíduos, o próprio valor da liberdade, capaz de garantir a democratização da sociedade. Precisamos prosseguir. Não somos desertores da política.


Colunistas

COISAS DA POLÍTICA – DORA KRAMER

Um vendedor de ilusões
Traiçoeiro que ele só, algoz de quase todas as memórias, o tempo é um competente vendedor de ilusões. Ele passa, supera os fatos e o que fica são as versões. Que, às vezes, nos fazem esquecer de que os acontecimentos repetem-se como se impressos em papel carbono.
Uma rápida consulta às edições dos jornais publicadas entre novembro de 1993 - a distância em que estamos da eleição presidencial - e abril de 1994 - prazo final para a desincompatibilização dos candidatos ocupantes de cargos públicos - derruba a versão de que o candidato governista tinha 2% das intenções de votos ao se decidir a concorrer à presidência.

Dias antes de deixar o Ministério da Fazenda, em abril, Fernando Henrique Cardoso tinha 19% e Luiz Inácio da Silva, 37%. FH já estava tendo a imagem construída como a do candidato anti-Lula pelo menos um mês antes, no auge das vitórias de suas negociações com o Congresso para a aprovação do Plano Real.
Outra falsa comparação é alegada hoje pelo PSDB, a fim de justificar a falta de um candidato natural. FH não era essa pessoa, em novembro de 1993. Ao contrário, na época, enviou carta ao então presidente Itamar Franco garantindo que não seria candidato. Itamar dava-se bem com seu ministro, mas queria o então governador do Rio Grande do Sul, Antônio Britto, como concorrente. Tanto que seu líder no Senado, Pedro Simon, foi o primeiro a lançar um nome, justamente o de Britto, antes do fim daquele ano.

Ano, aliás, tumultuadíssimo, com pouco espaço - quase nenhum - reservado na imprensa para a sucessão presidencial. As manchetes eram ocupadas pela CPI do Orçamento, na qual, aliás, a família Sarney (incluindo Roseana) freqüentava as manchetes como alvo de toda sorte de acusações.
A ponto de, a certa altura, registrarem-se versões de bastidor segundo as quais José Sarney estaria numa conspirata com Orestes Quércia contra Itamar. Nada foi confirmado e, mais à frente, no mês de março, depois de FH ter comunicado sua mudança de planos ao presidente, Itamar tenta dividir o PMDB propondo o lançamento de Sarney como vice, já que Britto postara-se fora do jogo.
Mas essas foram conversas que só começaram a freqüentar o noticiário a partir de janeiro de 1994, dividindo espaço com o fracasso da revisão constitucional.

Antes disso, falava-se em cassações, em assassinatos (de Ana Elizabeth Lofrano por seu marido, José Carlos Alves dos Santos, autor das denúncias que geraram a CPI), e apenas numa pequena nota, aqui a ali, alguém abordava a sucessão.
Ainda tucano, Ciro Gomes ensaiava tentativa de aliança com o PT de Lula e, quando não deu certo, partiu para o ataque, dizendo que o petista, quando prometia aumentar os salários das Forças Armadas, estava, na verdade, ''subornando os militares''.

Aliás, na época, Ciro usou sua ousadia verbal para, a propósito das investigações que ocorriam no Parlamento, diagnosticar: ''O Congresso apodreceu.'' E quem ousará desmenti-lo agora?
Mas voltemos à versão da ''naturalidade'' da candidatura FH. Tanto não era que PMDB e PSDB chegaram, e isso já no ano da eleição, a tentar uma aproximação que fracassou porque os pemedebistas quiseram candidatura própria, com prévias habilmente manejadas. Contra Roberto Requião e em favor de Orestes Quércia, devidamente abandonado aos primeiros acordes da campanha.
Antes de, já em abril, sentar-se para acertar os ponteiros com FH, o PFL falava na candidatura de Antonio Carlos Magalhães. O PP chegou a lançar Álvaro Dias, Paulo Maluf queria Jarbas Passarinho, mas o PPB acabou indo de Esperidião Amin.

Em março, Leonel Brizola lança-se candidato ''antitudo'', e a primeira palavra sobre a candidatura de Fernando Henrique sai da boca de Mário Covas, em fevereiro, defendendo o lançamento apenas em abril.
FH precipitou um pouco as coisas, contando, no dia 10 de março a Itamar, que seria candidato, e este, 21 dias depois, avaliza a decisão: ''Apóio Cardoso (FH era chamado assim em alguns jornais) sem restrições. Nossa amizade é antiga e fraternal, confio nele e no seu trabalho.''
Como se vê, além de imprimir ilusões à História, o tempo nem sempre é o senhor da razão.

Santa complicação
Caetano Veloso, em entrevista a O Globo de domingo, mostra que o artista não pode ser um simplificador de idéias, embora diga-se admirador de quem o faz. Depois de balizar suas opiniões entre Lula e Fernando Henrique, atribuindo qualidades a ambos sem cair no maniqueísmo, cuja resultante, em geral, é o equívoco, Caetano diz o seguinte:
''Não sou cientista político. O certo é o sujeito ser como Chico Buarque, um grande artista: a posição dele é quase nenhuma, mas é muito nítida. Já eu não tenho elementos para contribuir numa discussão política séria. Não consigo ter uma posição simples e aí apresento a minha complicação que não ajuda ninguém, não serve para nada.''
Aí reside o grande engano de Caetano Veloso, que chama de ''complicação'' exatamente as nuances que enriquecem uma discussão política, bem além de certas simplicidades que não fazem o mundo mudar de lugar.


Editorial

Estopim Aceso

A bomba, com o estopim aceso, foi parar na mão do Congresso. As medidas provisórias do Executivo para romper o impasse das greves de servidores públicos vai acabar envolvendo o Legislativo que descuidou da lei específica. A questão adquiriu peso político porque as greves dos professores universitários e dos servidores previdenciários alcançarão, em suas conseqüências, o processo eleitoral de 2002. Todos os lados têm isso em conta. Há 12 anos o Congresso negligencia a regulamentação do direito de greve dos funcionários públicos.
Os presidentes da Câmara e do Senado estão conseguindo, na última etapa do ano, recuperar parte da produção legislativa que caiu no curso de 2001. Mais do que números, o deputado Aécio Neves e o senador Ramez Tebet destacaram-se pela preocupação ética. A recuperação da credibilidade institucional não se limita ao volume produtivo mas na natureza moral que atende ao anseio da cidadania. O fim da imunidade parlamentar para crimes comuns é dessas iniciativas que consagra os que conseguiram viabilizá-la. É feito histórico. A distância entre a opinião pública e o Congresso foi reduzida sensivelmente e mostrou que é possível, com dirigentes atentos ao sentido da própria representatividade política, devolver aos cidadãos a confiança na eficácia do voto. A democracia agradece a valorização da Câmara e do Senado.

O restante deste mês e as três semanas de dezembro são, porém, insuficientes para votar leis que dizem respeito a greves de servidor público. Só agora os dirigentes dos movimento grevistas se lembraram do Congresso. A longa paralisação - em torno de 100 dias - calcificou a intermediação que os dirigentes evitaram por erro de avaliação. Medidas Provisórias têm prazo formal que também não ajudam solução rápida. Lei de greve específica para o serviço público também não seria viável. O senador Ramez Tebet entende que é matéria para amplo debate, dada a natureza politicamente delicada. A solução política foi trancada pela intransigência que dinamitou as pontes.

O fato, porém, é que a greve terá de ser encerrada para não corroer a confiança dos cidadãos na própria Constituição. As decisões de juízes no dia-a-dia dia não restabeleceram a confiança da sociedade por várias razões. Mandar pagar salários por dias de paralisação está além do alcance médio dos cidadãos. A greve nasce da divergência entre empregado e empregador, e é o recurso legal do empregado para forçar a empresa a negociar. No caso dos previdenciários e dos professores, a greve é contra os cidadãos que contribuem para sustentar a Previdência e contra os alunos de escolas federais. Não recai sobre o Executivo o prejuízo da greve.

Nas greves do metrô de Paris a paralisação foi trocada pela liberação das roletas para que a população não precise pagar. O prejuízo da receita vai, em última análise, para o governo por via da empresa. A negociação tem custo e preço para os dois lados. Do empregado, é o salário. Da empresa, o prejuízo. A esta altura da greve e do ano, os cidadãos passam a preferir o fim da greve à greve sem fim, depois de três meses que exasperaram a impaciência dos alunos, intranqüilizaram as famílias e irritaram os cidadãos. O fim da greve tem prioridade.


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11/20/2001


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