Itamar fez que foi. Mas ficou
Itamar fez que foi. Mas ficou
O governador de Minas confundiu a todos, filiando dois aliados no PMDB e dois no PDT. Mas os peemedebistas garantem que ele ficou mesmo no partido e vai brigar para sair candidato à presidência
O prazo de filiação partidária terminou ontem com festa no PSDB, alívio no PMDB e frustração para Leonel Brizola, que esperava a filiação do governador de Minas Gerais, Itamar Franco (PMDB). Embora Itamar tenha mantido o suspense durante todo o fim de semana, o ex-presidente do PMDB, Paes de Andrade, garantiu que o governador ficou no PMDB e vai lutar pela candidatura à Presidência da República na prévia marcada para o dia 20 de janeiro. ‘‘Itamar ficou e montará uma agenda de visitas e contatos com as lideranças do partido e caminhará até o último dia. Agora, temos um rumo’’, afirmou Paes. Vice-presidente do PDT, o ex-deputado Carlos Lupi (RJ) também informou a companheiros de partido que Itamar não se filiou ao PDT.
Enquanto os políticos trocavam informações, o governador mineiro mantinha o suspense em Minas. A secretaria de comunicação informou apenas que ‘‘domingo é dia de descansar e a segunda-feira que é de trabalho’’. No Rio, o ex-governador Leonel Brizola também manteve suspense. Sua assessoria chegou ao ponto de dizer que ele sequer conversou com Itamar no fim de semana. Para reforçar esse clima de fim de novela, dois aliados de Itamar se filiaram ao PDT e dois ao PMDB. Para o PDT, foram o ex-deputado Israel Pinheiro (ex-PTB) e o ex-ministro Paulino Cícero de Vasconcelos. Para o PMDB, o assessor especial do governador, Alexandre Dupeyrat, e o ex-líder do governo mineiro na Assembléia Legislativa estadual Sávio Souza Cruz.
Nos últimos 30 dias, Itamar andou em zigue-zague. Por três vezes, ameaçou deixar o PMDB. A primeira foi logo depois da convenção de setembro, quando os governistas foram vitoriosos. Mas Itamar, aplaudido pelas duas torcidas peemedebistas, anunciou que ficaria na legenda. A segunda crise com a cúpula partidária se deu por causa do programa de TV do partido. Itamar queria criticar o governo Fernando Henrique Cardoso e a parte aliada ao Palácio do Planalto vetou. A terceira foi o insulto recebido da cúpula do partido, especialmente, o líder na Câmara, Geddel Vieira Lima (BA) que chamou Itamar de chantagista. O secretário do governo mineiro, Henrique Hargreaves, recém-filiado ao PMDB, cobrou uma resposta dos peemedebistas do estado em defesa de Itamar, mas, diante do vai-e-vem e o clima de suspense, ninguém atacou a cúpula do partido.
Enquanto no PMDB mineiro o clima é de suspense, o PSDB comemora o último capítulo de outra novela, a filiação do presidente mundial do BankBoston, Henrique Meirelles. Executivo financeiro, ele disse que ainda não sabe se irá disputar um mandato eletivo em 2002. Mas, se decidir ir às urnas, concorrerá ao Senado. ‘‘Meu interesse é participar do debate político nacional. Antes, participava apenas com a perspectiva de banqueiro’’, diz. Esta inclusão no cenário foi discutida inclusive com o presidente Fernando Henrique Cardoso, que foi um dos nomes decisivos para a opção de Meirelles pelo PSDB. Fernando Henrique disse que mais do que na hora de incorporar diferentes tipos de experiência ao mundo da política. E a de Meirelles, acostumado ao mundo dos negócios com 32 países, seria enriquecedora ao debate nacional.
Esquerdas se unem no DF
Os partidos de esquerda do Distrito Federal tentarão dar um passo em direção ao consenso. Na quarta-feira realizam, na sede do PCdoB, no Conic, uma reunião que pretende celebrar a formação de uma chapa única nas eleições do ano que vem. Apesar da iniciativa ser confirmada por oito partidos (PT, PCdoB, PSB, PPS, PDT, PCB, PMN e PHS), as direções partidárias ainda não se entendem sobre qual deve ser o resultado do encontro.
A maioria dos partidos confirma a intenção de assinar, na reunião, um documento de compromisso, no qual estaria prevista a realização de uma pesquisa de opinião pública para atestar qual dos candidatos de esquerda teria maior aceitação junto à população do DF. ‘‘Assim, teremos um lastro científico para o candidato que resolvermos apoiar’’, explica o presidente do PCdoB no DF e pré-candidato ao Buriti, Agnelo Queiroz. Segundo ele, em um mês o nome do candidato único da oposição já seria conhecido.
O candidato do PT ao Buriti, deputado Geraldo Magela, confirma que o partido participa do encontro. Mas prefere não falar em resultados concretos, como assinatura de documentos. ‘‘A reunião é apenas mais uma etapa na tentativa de entendimento’’, explica. Arlete Sampaio, presidente do PT, afirma que o partido vai negociar a transferência da reunião de hoje para quarta-feira, para ter tempo de garantir a unidade do partido em torno das idéias discutidas com os outros integrantes da esquerda.
O que todos os partidos concordam, no entanto, é na importância de se definir essa união das esquerdas. ‘‘A maior crítica que faço ao meu partido é que estamos há tempo demais voltados para questões internas. Com a eleição da nova regional, não há mais tempo a perder. A definição da união das esquerdas é urgente’’, avalia Magela.
‘‘O cenário atual já não conta com nomes de peso que estariam alinhados ao centro ou à centro-esquerda, como José Roberto Arruda e Paulo Octávio (ambos do PFL). A eleição será, de fato, polarizada. Permitir uma fragmentação na esquerda é suicídio’’, emenda Agnelo. ‘‘A idéia de entrar em várias frentes de esquerda não prosperou. A saída que se mostra mais forte contra o governo de Joaquim Roriz é de fato a união de todos’’, acredita o presidente do PSB no DF, Rodrigo Rollemberg.
Para o presidente do PPS no DF, Amaury Pessoa, a aliança não será costurada em um único dia, mas a reunião de hoje deverá marcar o compromisso de união dos partidos. ‘‘O acordo político só é bom quando todos ganham, e isso precisa ser negociado devagar’’, opina. Segundo ele, o PPS vai pleitear, na aliança, uma chapa distrital própria, a composição na chapa federal e a disputa por um lugar para o Senado Federal.
Apesar de fazer parte do grupo de oposição ao governo do Distrito Federal, o PL do deputado distrital Renato Rainha ficou de fora da reunião das esquerdas. Segundo o deputado, o partido apenas foi convidado a participar do grupo quando os primeiros entendimentos entre os partidos já haviam sido feitos. ‘‘Me apresentaram uma minuta de trabalho pronta, e isso nós não podemos aceitar. O PL não está a reboque de nenhum partido no DF’’, afirmou Rainha. Ele informa que o PL continua defendendo a união de partidos em um grupo independente do PMDB e do PT.
Trégua entre MST e governo
Depois de 14 de protestos em Buritis, Minas Gerais, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra e governo federal firmaram uma trégua e voltaram a negociar. Os protestos do MST incluíram invasões de agências bancárias e ameaça de cerco à fazenda Córrego da Ponte, propriedade dos filhos do presidente Fernando Henrique Cardoso. A retomada do diálogo foi garantida em reunião com representantes do Ministério do Desenvolvimento Agrário e a coordenação nacional do MST. O governo não aceitava negociar com os sem-terra ameaçando invadir a Córrego da Ponte e os integrantes do MST só aceitavam deixar o local se o governo negociasse. Pelo acordo, os cerca de 150 integrantes do MST que permaneciam desde sexta-feira acampados a 5 quilômetros da fazenda, retornaram ontem ao centro de Buritis, cerca de 60 km da Córrego da Ponte.
Justiça do Acre afasta prefeito
A Justiça do Acre afastou por 60 dias o prefeito de Xapuri, Júlio Barbosa, do PT, sucessor do líder sindicalista Chico Mendes, morto em dezembro de 1988. Barbosa é suspeito de diversas irregularidades que ainda estão sendo investigadas pela polícia e o promotor de Justiça da cidade, Almir Blanco. Ex-seringueiro, ele foi eleito por duas vezes prefeito de Xapuri, onde também nasceu Chico Mendes. As investigações em torno de Barbosa começaram a partir do momento em que o Ministério Público descobriu irregularidades na Secretaria de Finanças do município, chegando até mesmo a prender a titular da pasta, Senáurea Bezerra. Ela também é acusada de queimar centenas de documentos, inclusive notas fiscais e recibos comprometedores.
Jader será indiciado
Apesar de ter renunciado ao mandato, o ex-senador Jader Barbalho continuará como alvo do Ministério Público Federal e da Polícia Federal. O ex-senador deverá ser indiciado no inquérito que apura fraudes na extinta Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam). O mesmo acontecerá com seu suplente, Fernando de Castro Ribeiro, que pode assumir o cargo até sexta-feira. Ribeiro é acusado de ter sido beneficiado com cheques administrativos do Banco do Estado do Pará (Banpará), quando era secretário particular de Jader. Para a PF já existem indícios suficientes para que o ex-senador seja arrolado no inquérito da Sudam. A suspeita é que ele tenha recebido dinheiro de empresários financiados pela Sudam utilizando as contas do ranário Touro Gigante, de sua mulher Márcia Cristina Zaluth Centeno.
Artigos
O terrorismo inocente
Rubem Azevedo Lima
Ao redigir este artigo — dia 4 último, por motivos técnicos —, dizia-se estar iminente o ataque dos Estados Unidos ao Afeganistão. Tudo pode ter acontecido após essa data, mas o presidente Bush advertiu que a guerra ao terror seria longa.
Cercado de montanhas e produzindo ovelhas, algodão, papoula e gás natural, além do mais belo lápis-lazúli do mundo — a safira dos antigos —, o Afeganistão e seu povo enfrentaram muitos invasores: Dario, Alexandre, Gengis Kan, Tamerlão, ingleses e russos. Com 16 milhões de habitantes e 647 mil km2 de território, o país perdeu, em 20 anos, um milhão de afegãos, vítimas da geopolítica das guerras.
Agora, pobre, só e contra todos, acusado de abrigar Bin Laden, a quem responsabilizam pelos atos de terrorismo em Nova York e Washington, as chances de resistência do Afeganistão são quase nulas. O talibã estaria disposto a enfrentar os atacantes na base de guerrilhas, com armas que, aliás, lhes foram dadas pelos americanos para lutarem contra os russos, quando isso convinha aos EUA. Os analistas temem — o que é improvável — que os milicianos tenham artefatos nucleares, vendidos pelas máfias russas, após a implosão da antiga URSS.
Em outubro de 2000, o Pentágono revelou, entre outros sumiços inexplicáveis ocorridos nos EUA, o de um destróier, de tanques de combate e carros blindados, metralhadoras, munição pesada, lançadores de granadas e mísseis terra-ar, tudo avaliado em US$ 8 bilhões. E, pasme o leitor, perdeu-se, ainda, a pista de algumas bombas de hidrogênio, com poder de destruição cem vezes maior do que as lançadas em Hiroshima e Nagasaki na Segunda Guerra Mundial.
Tais desaparecimentos, alguns ocorridos em bases americanas, como em Tule (Noruega), Palomares (Espanha) e Geórgia (EUA), podem ter proporcionado armas poderosas aos terroristas. Não se puniu, porém, nenhum dos irresponsáveis que as extraviaram. Para os EUA, todos eram inocentes, como os mafiosos, na Rússia.
Com Bush à frente, o belicismo impôs-se ao mundo e criou um Nuremberg às avessas. Esse tribunal provou publicamente a culpa de criminosos de guerra. Sua versão nova decidiu, em segredo e sem exibir provas, que Bin Laden é culpado. Pode ser. E, para puni-lo, faz-se a guerra. Essa nem começou e já insulta a inocência dos pobres afegãos e das vítimas do terror ao destruir a essência da justiça. Para poupar os senhores da guerra e, talvez, os verdadeiros terroristas. Os dos ataques aos EUA e os produtores de terrorismo socioeconômico. Esse último — parece — é julgado legal.
Editorial
A guerra anunciada
Desde 11 de setembro, o mundo esperava a resposta dos Estados Unidos ao brutal e cinematográfico ato terrorista que pôs abaixo as torres do World Trade Center e parte do Pentágono. Com ele, foram feridos dois símbolos do poderio americano. Um: o econômico. O outro: o militar. E ruiu a crença na invulnerabilidade da maior potência do mundo.
George W. Bush prometeu retaliação. Em discurso belicoso, conclamou as nações a apoiarem a luta contra o terrorismo. Quem não se aliasse a Washington estaria a favor dos terroristas. Costurou alianças. Mobilizou assimétrica força militar para a Ásia Central. Mediante milionário pagamento de dívidas atrasadas, conseguiu o apoio do Conselho de Segurança da ONU. Só faltava puxar o gatilho.
Às 13h30, horário de Brasília, mísseis foram disparados contra Cabul e outras povoações afegãs. Vários objetivos militares foram atingidos. As cidades ficaram às escuras. O ataque, comandado pelos Estados Unidos com a participação da Inglaterra, recebeu aprovação dos países mais ricos do mundo. Tudo indica que as demais nações do Ocidente hipotecarão solidariedade a Washington.
Na capital americana, eram 12h30 de domingo. A tevê mostrou, na hora do brunch, as cenas de videogame para os milhões de norte-americanos que ansiavam pelo revide. Considerados os resultados — modestos para o aparato bélico mobilizado — o ato de guerra mais parece uma satisfação ao público interno.
O Afeganistão é um país miserável, arrasado por vinte anos de conflitos e pelo fundamentalismo de um governo que, durante a guerra fria, recebeu treinamento, armas e munição dos Estados Unidos. Bin Laden, hoje inimigo número um dos americanos, foi homem da CIA, encarregado de reforçar os afegãos contra o exército soviético.
George W. Bush tinha de dar uma resposta ao ataque a Nova York e Washington. Poderia optar por ações de inteligência visando derrubar o regime talibã e minar focos de terrorismo — câncer que apavora as consciências civilizados do mundo. Conseguiu suporte para bloquear a movimentação financeira de suspeitos. Mas preferiu a via militar. É a mais perigosa. E, mal conduzida, pode se mostrar desumana. Sacrifica a população civil e oferece mais riscos para futuro.
Sem assumir a autoria intelectual dos atentados, Bin Laden conclamou os muçulmanos para a guerra santa. Não se sabe ainda a reação das populações islâmicas. Se for entendido como uma guerra contra o maometismo, o ataque ao Afeganistão servirá de adubo para o surgimento de focos terroristas. O jihad ganhará força, municiado pelos mísseis e bombas da Paz Duradoura. Ter-se-á feito o jogo de Bin Laden.
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