Jader julgará ele mesmo



Jader julgará ele mesmo Aliado fiel, o líder do PMDB, Renan Calheiros, indica o senador para a Comissão de Constituição e Justiça para que próprio avalie seu pedido de amplo direito de defesa O duelo entre pefelistas e peemedebistas continua tensionando o ambiente político no Congresso Nacional. A cúpula do PMDB mostrou ontem que, ao contrário do que repete o líder Renan Calheiros (AL), a manutenção do mandato parlamentar de Jader Barbalho (PA) é mesmo uma questão partidária. A cúpula do PMDB está disposta a defendê-lo com unhas e dentes. Renan indicou o próprio Jader, no início da tarde desta segunda-feira, para integrar a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), em substituição ao senador Pedro Ubirajara (PMDB-MS), suplente do novo presidente do Senado, Ramez Tebet (PMDB-MS), eleito na quinta-feira passada. O gesto foi considerado uma ‘‘provocação’’ por senadores da oposição e até do próprio PMDB, após a leitura da comunicação de Renan pelo vice-presidente do Senado, Edison Lobão (PFL-MA). ‘‘Isso só aumenta o desgaste para o partido’’, lamentou Pedro Simon (PMDB-RS). ‘‘É uma provocação barata, mas que pode sair pela culatra, porque vai gerar mais indignação na Casa e na opinião pública’’, criticou a senadora Heloísa Helena (PT-AL). Ela vai levantar na reunião a suspeição de Jader. ‘‘Ele não pode votar uma matéria em que é parte interessada’’, disse. Em entrevista à Agência Folha, Jader disse que vai se declarar impedido de votar seu requerimento. A afirmação de Jader, porém, não convenceu os senadores. Sua indicação para a CCJ foi interpretada como mais uma manobra do PMDB para atrapalhar os rumos do processo político contra o senador paraense. A CCJ examina amanhã o recurso apresentado por Jader na quinta-feira passada, durante tumultuada reunião do Conselho de Ética. Para atender ao pedido, o presidente do conselho, Juvêncio da Fonseca (PMDB-MS), adiou por uma semana a votação, prevista para ocorrer depois de amanhã. Para evitar manobras, o PFL tratou de entrar no jogo. O presidente da CCJ, Bernardo Cabral (PFL-AM), indicou na sexta-feira o senador Osmar Dias (PDT-PR), para examinar o recurso. Ele deve derrubar o pedido de Jader. Ele recorreu à CCJ sustentando ter sido impedido de exercer o seu direito à ‘‘ampla defesa, como determina a Constituição’’. No fundo, o PMDB tenta ganhar tempo, com o adiamento da votação do relatório da comissão de investigação que recomendou a abertura de um processo político contra Jader. A ameaça vai lhe custar o mandato e os direitos políticos por oito anos. Segundo a oposição, Jader só pode defender-se depois que o processo for aberto pelo Conselho de Ética. ‘‘Agora, se a tese for aceita, significa que o processo político já começou, e Jader Barbalho não poderá renunciar’’, rebate a petista. A indicação de Jader, mais do que uma provocação, é uma tentativa desesperada da cúpula do partido mantê-lo a salvo. A comissão é composta por 23 senadores. A maioria não vai dar sobrevida ao ex-presidente do Senado. Mesmo dentro da bancada peemedebista na CCJ, Jader não conta sequer com os sete votos que o partido detém. Os goianos Maguito Vilela e Íris Rezende, os gaúchos José Fogaça e Pedro Simon, além do paranaense Roberto Requião, vêm enfrentando a cúpula do PMDB. Os outros dois senadores — Gerson Camata (ES) e o próprio Jader agora — não têm força suficiente para virar a tendência de arquivarmento do recurso. Deputado nega ter extorquido Acusado de estar achacando empreiteiras, com o objetivo de excluí-las das investigações da Comissão Parlamentar de Inquéritos das Obras Inacabadas da Câmara, o deputado Damião Feliciano (PMDB-PB), jura inocência. Mas o presidente da Câmara, Aécio Neves (PSDB-MG), determinou ontem ao corregedor-geral Barbosa Neto (PMDB-GO) que apure o caso, acatando o requerimento do deputado Rubens Bueno (PPS-PR). Presidente da CPI, Damião subiu ontem à tribuna da Câmara e denunciou que está sendo vítima de um processo político para desacreditá-lo. ‘‘Abri o esgoto das obras inacabadas no país e estou pagando o preço, sendo acusado sem provas. Quero ser investigado’’, disse Damião. Ele anunciou que vai abrir mão do sigilo bancário e telefônico para provar sua inocência. ‘‘Quero saber qual empresa e em que circunstância ocorreu essa extorsão que denunciam’’, criticou o parlamentar. ‘‘O culpado da corrupção no Brasil sou eu? Eu que tenho que dar exemplo? No Paraná, a linha de transmissão de Itaipu está inacabada e o responsável sou eu?’’, questionou. ‘‘Querem me crucificar’’. Prorrogação rejeitada A CPI das Obras Inacabadas foi criada em 2 de abril deste ano para investigar possíveis irregularidades em obras públicas, mas deve ser arquivada dentro de 14 dias pelas suspeitas de extorsão surgidas, na semana passada, contra Damião e outros integrantes da própria comissão. Os líderes dos partidos políticos na Câmara rejeitaram o pedido de prorrogação dos trabalhos por 60 dias. ‘‘Nunca conseguimos quebrar nenhum sigilo bancário’’, denunciou o próprio Damião, no pronunciamento de ontem. Formalmente, nenhuma construtora ofereceu denúncia, mas deputados relataram, reservadamente, que foram procurados por emissários das empreiteiras que acusaram Damião de cobrar até R$ 1 milhão para preservá-las no relatório final da comissão. Hoje, a CPI deve se reunir para aprovar uma devassa bancária nas contas das empreiteiras suspeitas de fraudes nas obras públicas. O deputado Norberto Teixeira (PMDB-GO), quer aprovar o requerimento para a quebra do sigilo bancário da Bolognesi Engenharia Ltda, suspeita de fraude na apresentação de 27 notas fiscais. A construtora foi contratada pelo extinto Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER) para o asfaltamento da BR 386, no Rio Grande do Sul. Roseana não é ameaça para Ciro O pré-candidato do PPS à Presidência da República, Ciro Gomes, disse que não se sente ameaçado com o crescimento da governadora maranhense, Roseana Sarney (PFL), nas pesquisas de intenção de voto. ‘‘A governadora tem valor pelo trabalho que vem fazendo em seu Estado, mas, para minha situação, ela é indiferente’’, afirmou Ciro. Pesquisa do Datafolha publicada no fim de semana mostra que Ciro e Roseana estão próximos na segunda colocação, atrás de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Quando Roseana é a única candidata governista fica com 14% das intenções de voto, atrás de Ciro, com 16%, e de Lula, com 31%. Brizola não apóia Britto O presidente nacional do PDT, Leonel Brizola, disse que não irá apoiar o ex-governador Antonio Britto em uma eventual candidatura ao governo do Rio Grande do Sul. Britto trocou o PMDB pelo PPS na semana passada. Brizola é o principal articulador da aproximação entre o PDT e o PPS no cenário nacional. Britto disputou a reeleição para o governo do Estado, em 1998, mas foi derrotado pelo petista Olívio Dutra. Brizola avalia que uma aproximação com o ex-governador seria mal recebida pelo eleitorado gaúcho Simon pode desistir O senador Pedro Simon (PMDB-RS) poderá concorrer ao governo gaúcho, em 2002. A hipótese foi anunciada como reação à decisão do ex-governador Antônio Britto de deixar o PMDB para disputar a sucessão estadual pelo PPS. ‘‘Se eu perder a prévia (para escolha do candidato à Presidência da República) e ele (Britto) for candidato, é uma hipótese admissível’’, afirmou o senador, admitindo que sua pré-candidatura presidencial enfraqueceu-se com o racha no PMDB gaúcho. Simon classificou a saída de Britto como ‘‘uma paulada pelas costas’’. Homem que movia as contas abre o jogo Depoimento de Jairo Torres, ex-funcionário do Banco OK, confirma que Leo Greene e James Towers eram mesmo Luiz Estevão. O dinheiro das contas pagou até o cartão de crédito de Cleucy Meireles, mulher do ex-senador. Ele foi denunciado pelo Ministério Público por crimes contra o sistema financeiro O depoimento de mais uma testemunha e os documentos com movimentações financeiras ilegais complicaram ainda mais o empresário e senador cassado Luiz Estevão. O Ministério Público decidiu ontem denunciá-lo por enviar e manter 17,7 milhões de dólares em depósitos no Delta Bank, nos Estados Unidos, sem registros na Receita Federal e no Banco Central. Jairo Torres, o homem que movimentava as contas a mando de Estevão, contou tudo para os procuradores. O dinheiro estava em quatro contas. Duas batizadas de Leo Greene, em Miami e nas Ilhas Cayman. Uma outra com o nome de James Towers, em Miami. A quarta, de aplicação, também em Miami, não tinha nome específico. As contas eram usadas pelo ex-senador para, segundo procuradores que investigam o caso, esconder o dinheiro desviado da obra superfaturada do Fórum Trabalhista de São Paulo (TRT-SP). Na denúncia, em que também é acusada a mulher do empresário, Cleucy Meireles de Oliveira, é revelada a abertura das contas e as movimentações financeiras. Os procuradores também incluíram na denúncia, apresentada à 12ª Vara de Justiça Federal, o depoimento do bancário aposentado Jairo Torres, 63 anos. Entre 1982 e 1997, ele trabalhou como diretor do Banco Ok, de propriedade de Estevão. Na quinta-feira passada, Torres contou que movimentava as contas Leo Greene e James Tower a mando de Estevão. É o sétimo depoimento, em menos de um mês, que envolve Estevão na máquina de fraudes do TRT-SP. Nos dias 16 e 17 de agosto, a contadora Jesuína Varandas Ferreira, que trabalhou na contabilidade do Grupo Ok durante 19 anos, revelou como funcionava o esquema de falsificações dos relatórios apresentados por Estevão aos parlamentares da CPI do Judiciário. A CPI investigava o superfaturamento na obra do TRT-SP. DOCUMENTOS BANCÁRIOS Torres foi convocado pelos procuradores Luiz Francisco de Souza e Valquíria Quixadá Nunes para explicar por que o seu nome e sua assinatura constavam dos documentos bancários do Delta Bank, enviados pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos ao governo brasileiro, e repassados à Justiça Federal, no final do ano passado. No seu depoimento, Torres explica que funcionários do Delta Bank, em Miami, ligavam para o Banco Ok para confirmar as ordens de movimentação do dinheiro. Ele então entrava em contato com Estevão, que decidia se ligava pessoalmente ou autorizava Torres a contatar o Delta Bank para confirmar a ordem. No início das investigações, o nome do bancário chegou a ser associado diretamente com a conta batizada de James Towers. No seu depoimento aos procuradores, Torres afirmou nunca ter feito tal associação. Mas admitiu saber da existência das contas. O Leo, da conta Leo Greene, estaria associado às iniciais do nome do ex-senador: Luiz Estevão de Oliveira. Torres disse ainda que não sabia se as contas estavam declaradas à Receita. Não estavam. Documentos da Receita Federal enviados ao Ministério Público mostram que nas declarações de imposto de renda referentes aos anos de 1992 a 1999 do empresário e da sua mulher não constam referências às contas Leo Greene e James Tower ou qualquer outra no Delta Bank, em Miami, ou nas ilhas Cayman. Luiz Estevão disse ontem que a Receita referia-se a declarações de pessoa física e que ele mantém conta no Delta Bank como pessoa jurídica. ‘‘É má-fé ou burrice dos procuradores’’. Ele afirmou que há seis meses tenta obter, sem sucesso, os documentos da movimentação bancária no Delta. ‘‘Se esta conta foi utilizada por alguém para outro tipo de movimentação é o que queremos saber’’, disse. Os documentos demostram que Estevão e Cleucy abriram as contas Leo Greene e James Tower no dia 20 de agosto de 1992. Em 30 de setembro de 1992, por exemplo, Estevão autorizou o repasse de US$ 875 mil da conta Leo Greene, em Miami, para as Ilhas Cayman. As movimentações das contas ocorreram até o ano passado. Em 14 de setembro de 2000, ainda existiam 136 dólares na conta Leo Greene. Em 31 de agosto do mesmo ano, US$ 658 estavam na James Tower. A partir da denúncia, assinada pelos procuradores Luiz Francisco, Adriana Brockes e Marcelo Serra Azul, o empresário e a sua mulher podem ser condenados a até 48 anos de prisão. Artigos Não à matança infinita Fidel Castro Quaisquer que fossem as causas profundas, os fatores de ordem econômica e política e os grandes culpados que o trouxeram ao mundo, ninguém pode negar que o terrorismo constitui hoje um perigoso fenômeno, indefensável do ponto de vista ético, que deve ser erradicado. É compreensível o estado de irritação unânime pelo prejuízo humano e psicológico causado ao povo norte-americano pela morte inesperada e insólita de milhares de cidadãos inocentes, cujas imagens estremeceram o mundo. Em benefício de quem? Da extrema direita, das forças mais retrógradas e direitistas, dos partidários de esmagar a crescente rebeldia mundial e arrasar com tudo que reste de progressista no mundo. Foi um enorme erro, uma colossal injustiça e um grande crime, independentemente de quem sejam os organizadores e responsáveis de tal ação. Mas, em nome da justiça e sob o singular e estranho título de ‘‘Justiça Infinita’’, não se deve utilizar a tragédia para, de modo irresponsável, iniciar uma guerra que, na realidade, poderia converter-se em uma matança infinita de pessoas também inocentes. As bases, a concepção, os verdadeiros propósitos, os ânimos e as condições para tal guerra foram se estabelecendo de maneira precipitada nos últimos dias. Ninguém poderia afirmar que não era algo pensado há certo tempo e que só esperava uma oportunidade. Aqueles que, depois do chamado fim da guerra fria, continuaram armando-se até os dentes e desenvolvendo os mais sofisticados meios para matar e exterminar seres humanos estavam conscientes de que a inversão de fabulosas somas em gastos militares daria a eles o privilégio de impor um domínio completo e total sobre os demais povos do mundo. Os ideólogos do sistema imperialista sabiam bem o que faziam e para que faziam. Depois da comoção e da dor sincera de todos os povos da Terra ante o atroz e demencial ataque terrorista contra o povo dos Estados Unidos, os ideólogos mais extremistas e os falcões mais belicosos, já colocados em posições privilegiadas de poder, tomaram o controle do país mais poderoso do planeta, cujas possibilidades militares e tecnológicas parecem ser infinitas. Sua capacidade para destruir e matar são enormes; por outro lado, seus hábitos de equanimidade, serenidade, reflexão e contenção são mínimos. A conjunção de fatores — em que não se excluem a cumplicidade e o desfrute comum de privilégios de outros países poderosos e ricos —, o oportunismo, a confusão e o pânico reinantes tornam já quase inevitável um desenlace sangrento e imprevisível. Sejam quais forem as ações militares que se desatem, as primeiras vítimas serão os bilhões de habitantes do mundo pobre e subdesenvolvido, com seus incríveis problemas econômicos e sociais, suas dívidas impagáveis e o preço degradado de seus produtos básicos; suas crescentes catástrofes naturais e ecológicas, suas fomes e misérias, sua desnutrição maciça de crianças, adolescentes e adultos; sua terrível epidemia de Aids, sua malária, sua tuberculose, suas enfermidades infecciosas, que ameaçam com o extermínio de nações inteiras. A grave crise econômica mundial era já um fato real e indiscutível, que afetava, sem nenhuma exceção, todos os grandes pólos de poder econômico. Essa crise inevitavelmente se aprofundará nas novas circunstâncias e, ao tornar-se insuportável para a imensa maioria dos povos, trará caos, rebelião e ingovernabilidade por toda parte. O preço será impagável também para os países ricos. Durante anos não se poderá falar, com a ênfase necessária, de meio ambiente e ecologia, nem das idéias, pesquisas realizadas e comprovadas, nem dos projetos para proteger a natureza, porque seu espaço e possibilidades seriam ocupados por ações militares, guerras e crimes, tão infinitos quanto a ‘‘Justiça Infinita’’, nome com que se pretende desatar a operação bélica. Pode restar alguma esperança, depois de haver escutado, há apenas 36 horas, o discurso do presidente diante do Congresso dos Estados Unidos? Não usarei adjetivos, julgamentos ou palavras ofensivas para o autor do discurso, que seriam totalmente desnecessárias e inoportunas em momentos tensos e graves como estes que requerem reflexão e equilíbrio. Limitar-me-ei a sublinhar algumas frases breves, que dizem tudo: ‘‘Vamos utilizar qualquer arma de guerra que seja necessária.’’ ‘‘O país não deve esperar apenas uma batalha, mas uma campanha prolongada, uma campanha sem paralelo em nossa história.’’ ‘‘Qualquer nação, em qualquer lugar, tem agora que tomar uma decisão: ou estão conosco, ou estão com o terrorismo.’’ ‘‘Pedi às Forças Armadas que estejam em alerta, e há uma razão para isso: aproxima-se a hora de entrarmos em ação, e vocês vão nos deixar orgulhosos.’’ ‘‘Esta é uma luta do mundo todo, esta é uma luta da civilização.’’ ‘‘Peço-lhes que tenham paciência [...] no que vai ser uma longa campanha.’’ ‘‘As conquistas de nossos tempos e a esperança de todos os tempos dependem de nós.’’ ‘‘Não sabemos qual será o caminho deste conflito, mas sabemos qual será o desenlace [...] E sabemos que Deus não é neutro.’’ Peço a todos os nossos compatriotas que reflitam com profundidade e serenidade sobre as idéias contidas em várias das frases mencionadas: ‘‘Estão conosco ou estão com o terrorismo.’’ Nenhuma nação foi excluída do dilema, nem mesmo Estados grandes e poderosos; nenhuma deixou de ser ameaçada com guerras ou com ataques. ‘‘Vamos utilizar qualquer arma.’’ Nenhum procedimento, sem importar qual sob o ponto de vista ético, nenhuma ameaça, por mortífera que seja — nuclear, química, biológica ou outras —, foi excluída. ‘‘Não será um breve combate; será uma guerra prolongada, de muitos anos, sem paralelos na história.’’ ‘‘É a luta do mundo todo, é a luta da civilização.’’ ‘‘As conquistas de nossos tempos e a esperança de todos os tempos dependem de nós.’’ Por último, uma confissão jamais escutada em um discurso político, às vésperas de uma guerra, senão em épocas de riscos apocalípticos: ‘‘Não sabemos qual será o caminho desse conflito, mas sabemos qual será o desenlace. E sabemos que Deus não é neutro.’’ A afirmação é assombrosa. Ao meditar sobre as partes reais ou imaginárias dessa estranha guerra santa que está prestes a iniciar-se, penso que é impossível distinguir de que lado há mais fanatismo. Quinta-feira, diante do Congresso dos Estados Unidos, projetou-se a idéia de uma ditadura militar mundial sob a égide exclusiva da força, sem leis nem instituições internacionais de qualquer índole. A Organização das Nações Unidas, totalmente ignorada na atual crise, não teria nenhuma autoridade ou prerrogativa; haveria um único chefe, um único juiz, uma única lei. Todos recebemos a ordem de aliar-nos com o governo dos Estados Unidos ou com o terrorismo. Cuba, com a moral que lhe outorga haver sido o país que mais ataques terroristas sofreu, durante mais tempo, cujo povo não treme diante de nada, nem há ameaça ou poder no mundo capaz de intimidá-lo, proclama que está contra o terrorismo e está contra a guerra. Ainda que as possibilidades já sejam remotas, reitera a necessidade de evitar uma guerra de imprevisíveis conseqüências, cujos autores confessaram que não têm sequer idéia de como se desenvolverão os acontecimentos. Reitera igualmente sua disposição de cooperar com todos os demais países na erradicação total do terrorismo. Algum amigo objetivo e sereno devia aconselhar o governo dos Estados Unidos a não lançar os jovens soldados norte-americanos a uma guerra incerta, em remotos, recônditos e inacessíveis lugares, como em uma luta contra fantasmas, os quais não se sabe onde se encontram, nem mesmo se existem ou não, e se as pessoas que venham a matar têm ou não alguma responsabilidade com a morte de seus compatriotas inocentes caídos nos Estados Unidos. Cuba não se declarará jamais inimiga do povo norte-americano, submetido hoje a uma campanha sem precedentes para semear ódio e espírito de vingança, a tais extremos que se chega até a impedir a música que se inspira na paz. Cuba, em compensação, tornará sua essa música, e suas canções pela paz serão cantadas até por suas crianças, enquanto dure a cruenta guerra que se anuncia. Aconteça o que acontecer, não se permitirá jamais que nosso território seja utilizado para ações terroristas contra o povo dos Estados Unidos. E faremos tudo que estiver a nosso alcance para evitar ações desse tipo contra ele. Hoje lhe expressamos nossa solidariedade, com nossa exortação à calma e à paz. Algum dia nos darão razão. Nossa independência, nossos princípios e nossas conquistas sociais, nós os defenderemos com honra até a última gota de sangue se formos agredidos! Não será fácil criar pretextos para fazê-lo. E já que se fala de guerra com emprego de todas as armas, é bom lembrar que nem mesmo isso seria uma experiência nova. Faz quase 40 anos, centenas de armas nucleares, táticas ou estratégicas, apontavam contra Cuba, e ninguém se lembra de haver visto um único compatriota perder o sono por isso. Somos os mesmos filhos desse povo heróico, com uma consciência patriótica e revolucionária mais elevada que nunca. É hora de serenidade e de coragem. O mundo tomará consciência e fará ouvir sua voz, diante do drama terrível que o ameaça e que está a ponto de sofrer. Para os cubanos, é o momento preciso de proclamar, com mais orgulho e decisão que nunca: Socialismo ou Morte! Pátria ou Morte! Venceremos! Editorial O xadrez da Ásia É preciso saber história e ter noções básicas de geografia para entender o conflito que está por acontecer no Afeganistão. Os vizinhos do país transformado em alvo da retaliação norte-americana são quase todos dominados por regimes ligados no todo ou em parte a líderes muçulmanos. O Irã é um regime teocrático. Mas a antiga Pérsia é um país de arianos onde se fala farsi. O Irã é um país grande e rico. Até 1979, quando ocorreu a revolução dos aiatolás, era o principal aliado dos Estados Unidos na região. O xá Reza Pahlevi tentou modernizar o país, mas utilizou à larga sua polícia secreta para perseguir, prender e matar adversários. Os religiosos tomaram o poder e o antigo governante foi obrigado a exilar-se. O país mergulhou nas trevas de um fundamentalismo que submeteu a política à religião. Em Teerã, ocorreu o seqüestro dos diplomatas e funcionários da Embaixada dos Estados Unidos. Eles ficaram presos entre dezembro de 1979 e janeiro de 1981. O presidente Jimmy Carter, democrata, perdeu a condição de ser reeleito em parte por causa de sua desastrada política na região. O reinício de conversas entre Washington e Teerã é novidade. O país é forte e tem pesada influência regional. E mantém prudente distância dos talibãs do Afeganistão. A reintrodução do Irã no contexto regional é assunto novo que vai gerar conseqüências na Ásia Menor. O governo condenou os atentados a Washington e Nova York e se disse disposto a integrar a frente internacional antiterrorismo, desde que seja coordenada pela Organização das Nações Unidas (ONU). Em 1991, o regime dos aiatolás não participou do esforço de guerra para expulsar o vizinho Iraque do território do Kuweit. No quebra-cabeças que está sendo montado para isolar o Afeganistão, a reação dos iranianos tem importância. A política de Washington tenta repetir na Ásia Menor coalizão semelhante a que atacou o Iraque em 1991. Ao norte, Uzbequistão, Casaquistão e Tadjiquistão, países novos resultantes do fim da União Soviética, já manifestaram seu apoio. O Paquistão caminha para integrar a frente. Os chineses têm pequena fronteira com o Afeganistão. São cautelosos. Mas o Irã, no sudoeste, possui enorme linha divisória com o país-alvo. Sua adesão é estratégica e fundamental para o sucesso do plano dos norte-americanos. O Irã experimenta, além da guerra, problemas políticos internos. A nova geração quer abertura e mais democracia. A adesão, com ressalvas, aos Estados Unidos, aponta no sentido de que os liberais poderão estar começando a ganhar. São opções de Teerã: abrir o regime ou se voltar para o fundamentalismo, fechar fronteiras e se isolar do mundo. A renda originária do petróleo é suficiente para financiar qualquer das opções. Mas a retomada do diálogo entre iranianos e norte-americanos insinua a redução da grande instabilidade na Ásia Menor. Topo da página

09/25/2001


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