Juízes e MP rejeitam projeto que torna crime violar prerrogativas de advogados
Representantes de associações de membros do Judiciário, do Ministério Público e da Polícia Federal pediram a rejeição do projeto que torna crime a violação a direitos e prerrogativas dos advogados, alertando para os riscos de quebra de harmonia no ambiente forense caso a matéria seja transformada em lei. O apelo foi feito em audiência nesta quinta-feira (2), na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), onde o texto começou a tramitar, depois de ser aprovado na Câmara dos Deputados.
- O único objetivo desse projeto é criminalizar o ambiente forense e a convivência pacífica que sempre existiu entre advogados, juízes e integrantes do Ministério Público - afirmou Fernando César Baptista, presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe).
Por meio de alterações no Estatuto da Advocacia, o projeto em exame prevê prisão de seis meses a dois anos para quem praticar atos que impeçam ou limitem a atuação profissional dos advogados, causando prejuízos à defesa dos clientes. Se o ato alegado como infração resultar em prejuízo ao interesse do advogado, a pena pode ainda ser aumentada, de um sexto até a metade da previsão inicial. A proposta determina ainda que as seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) possam solicitar que advogados atuem como assistentes do Ministério Público em ações penais instauradas em virtude da aplicação da lei.
Os expositores foram unânimes em afirmar que já existem mecanismos legais e administrativos para garantir aos advogados a defesa de suas prerrogativas. Além de ações judiciais com base na Lei de Abuso Autoridade, os prejudicados, como lembrado, podem formular denúncias às corregedorias da Justiça e do Ministério Público e fazer representações juntos aos conselhos nacionais que fiscalizam e controlam a atuação dessas instituições e de seus membros - o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).
Conciliação
Como solução conciliatória, o presidente da Ajufe sugeriu que o projeto seja rejeitado e, ao mesmo tempo, seja feita uma ampla discussão em torno da Lei de Abuso de Autoridade, com o estabelecimento de regras mais efetivas. A reforma dessa lei já estaria sendo estudada pelo governo, como informou Marcos Leôncio de Souza, que representou no debate a Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal (ADPF).
Leôncio de Souza lamentou que membros da Polícia Federal não tivessem sido convidados a participar do comitê que, no âmbito do Ministério da Justiça, vem tratando da reforma da lei. Isso porque, na sua avaliação, os delegados são o "elo mais fraco" da cadeia dos agentes que interagem nas investigações ou nos processos na Justiça, muitas vezes em conflito com advogados e sem dispor de prerrogativas profissionais fixadas em lei, ao contrário dos demais segmentos.
- No cumprimento de ordens judiciais, a OAB por vezes entende que há abusos [por parte de delegados]. Outras vezes, o delegado tem que negar acesso a documentos porque o processo tramita em segredo de Justiça - exemplificou.
Para o juiz Francisco de Oliveira Neto, que representou a Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), ao estabelecer como crime "violar" prerrogativas contrárias à atuação profissional dos advogados, o projeto adota termo excessivamente genérico. Desse modo, observou, o texto fere princípio básico do Direito Penal, pelo qual a conduta a ser criminalizada tem que ser taxativamente descrita.
- O Direito Penal é um avanço civilizatório, veio para abolir a barbárie das penas desarrazoadas. Esse projeto vai contra essa orientação - disse.
Conforme o presidente da Associação Nacional dos membros do Ministério Público (Conamp), José Carlos Cosenzo, o governo federal é contrário à matéria e participou de acordo com a OAB para que a iniciativa fosse abandonada. No entanto, a entidade teria descumprido o acerto, continuando a trabalhar pela aprovação da proposta. O acordo teria sido firmado como parte das condições para que o presidente Luis Inácio Lula da Silva sancionasse lei que garante a inviabilidade dos escritórios de advocacia.
O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), Antonio Carlos Alpino Bigonha, classificou a proposta como o último ato de processo em avanço no país, em que se busca a "criminalização" de todas as condutas sociais. Como os demais expositores, ele criticou a OAB pela ausência no debate, contrariando, como assinalou, uma história marcada pela "defesa da democracia e das liberdades civis".
Gorette Brandão / Agência Senado
02/07/2009
Agência Senado
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