Marco Aurélio lança ultimato ao Congresso



O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Marco Aurélio Mello de Farias, disse, nesta terça-feira (14), na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), que ou o Congresso encontra uma solução viável para que os estados e o Distrito Federal paguem os precatórios judiciais, ou não haverá como se deter o julgamento, no Supremo, de mais de dois mil processos que pedem, corretamente, no seu entendimento, a intervenção federal nas unidades da Federação que deixaram de cumprir as determinações da Justiça. A partir de junho, impreterivelmente, anunciou Marco Aurélio, os processos começam a ser julgados.

O presidente do STF elogiou o projeto do deputado Arnaldo Madeira (PSDB-SP), que apontou uma solução, segundo ele, "viável e tranqüilizadora" para o problema, e criticou as alterações feitas naquela proposta pelo Senado, no substitutivo do senador Romeu Tuma (PFL-SP) que, segundo disse, "procurou apenas proteger os bancos" mas distanciou-se de uma solução para os estados.

Marco Aurélio explicou que os pagamentos dos precatórios de qualquer natureza podem ser parcelados pelos estados em até 10 vezes, à exceção dos precatórios referentes aos créditos alimentares, que devem ser pagos de uma única vez, pois dizem respeito à sobrevivência das pessoas, a maioria delas, aposentados e pensionistas do governo. Muitos desses processos estão arrastando-se por 10 ou 12 anos, e depois de proferida a sentença, não se pode, segundo ele, tolerar a sua não execução. Uma pessoa que se recusa a pagar um título de sentença judicial, lembrou, terá seus bens bloqueados em 24 horas. Já o Estado tem um prazo de 18 meses para pagar, para cumprir a sentença.

O projeto original da Câmara, afirmou o ministro, encontrou uma solução para a quitação desses débitos, que, somente em São Paulo, superam a casa dos R$ 2,5 bilhões em precatórios de natureza alimentar. A proposição, observou, identificou "recursos fáceis e baratos", que são os depósitos feitos em juízo de causas tributárias e sugeriu, então, que 80% daqueles recursos fossem transferidos, pelas instituições bancárias que os detêm, para as contas dos governos estaduais e do Distrito Federal, destinando os 20% restantes à constituição de um fundo, de modo a que o estado dispusesse de forma imediata de recursos para devolver o dinheiro do depósito, corrigido monetariamente, aos contribuintes que obtivessem ganho de causa na Justiça. Com essa medida, disse Marco Aurélio, ele ficou tranqüilo quanto ao destino dos mais de dois mil processos pedindo ao STF a intervenção nos estados que não estão cumprindo as sentenças judiciais, pois os estados contariam com o dinheiro para cumprir as sentenças e a questão seria resolvida.

O presidente do Supremo observou que, no entanto, ao chegar ao Senado, o projeto da Câmara sofreu alterações, em sua opinião incompreensíveis e que somente visaram os interesses dos bancos, pois o substitutivo reduz de 80 para 50% o valor a ser transferido para as contas dos estados e do DF, toma como base de cálculo, não o saldo desses depósitos feito em juízo, mas sim o saldo no período de 1º de janeiro de 2001 até a data de aprovação da nova lei, e destina mais 20% dos recursos para a constituição de um fundo ressalvando, contudo, que, se o fundo ficar deficitário, caberá ao estado suprir-lhe de recursos, sem dizer de onde tirar tais recursos. Pior ainda, disse Marco Aurélio, o artigo primeiro do substitutivo diz que as instituições financeiras "poderão" transferir os recursos para os estados, não sendo, portanto, impositivo. Como os bancos remuneram esses recursos dos depósitos judiciais a 0,5% ao mês e emprestam a 6% e a 8%, eles não vão ter qualquer interesse em cumprir o percentual de repasse. Disse ainda o presidente do STF que a contabilização dos depósitos, segundo o substitutivo, seria feita pelas próprias instituições financeiras.

- É claro que eles não vão cumprir o dispositivo legal - acrescentou.

Marco Aurélio se disse "perplexo" diante do substitutivo de Romeu Tuma, ressaltando que os estados jamais teriam recursos para cobrir os déficits junto ao fundo de reserva destinado ao pagamento dos alvarás.

- O Estado tem de ter postura exemplar. Não pode se transformar num caloteiro oficial, como se transformou nos últimos anos. Se o Estado age assim, descumprindo as decisões da Justiça, o que podemos esperar do cidadão comum? - indagou o presidente do Supremo.

O ministro completou:

- É a lei do mais forte que deve prevalecer? Penso que não. Não podemos admitir um retrocesso desses. Há servidores públicos, pensionistas e aposentados morrendo sem verem cumpridas as decisões que ganharam na Justiça. Uma decisão judicial não pode ser algo lírico. Ela tem de ser executada. Estou comunicando aos senhores que na presidência do Supremo, cumprirei com o meu dever. Se não se avizinhar uma solução quanto à liquidação desses débitos, terei por dever, sob pena de cometer crime de responsabilidade, colocar os mais de dois mil processos em pauta. Se, para prevalecer a Lei Maior, o teto da Corte tiver de cair, então, ele vai cair. O que se quer com esse substitutivo? O impasse? - indagou.

Marco Aurélio disse ainda que, da forma como está, o substitutivo propiciaria apenas R$ 300 milhões para São Paulo, segundo estimativas feitas para ele pelo governador Geraldo Alckmin. Entretanto, o estado deve, em precatórios, R$ 3,5 bilhões. O ministro sugeriu que os estados que não atingiram o limite de 60% de comprometimento das suas receitas com a folha de pagamento de pessoal utilizem-se também desse diferencial para o pagamento dos precatórios referentes aos créditos alimentares.



14/05/2002

Agência Senado


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