Mercadante: mercado tenta ajudar Serra










Mercadante: mercado tenta ajudar Serra
SÃO PAULO. O candidato do PT ao Senado por São Paulo, Aloizio Mercadante, cobrou ontem firmeza do governo no combate à especulação financeira e insinuou que o nervosismo do mercado tem como objetivo estimular a candidatura de José Serra (PSDB) à Presidência. A Bovespa fechou em queda de 3,35% e o dólar subiu 4,84%, fechando a R$ 3,57. Mercadante afirmou que, se quiser, o Banco Central tem instrumentos para conter a especulação.

— Esse é um processo que combina duas coisas: uma parte do mercado que quer ganhar dinheiro e outra que tenta fazer campanha para o candidato oficial. Não pode haver passividade (do governo) ou omissão nesse processo — afirmou.

Mercadante: terrorismo econômico não ajudou
Mercadante lembrou que Serra avisou que atacaria a candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência, mas disse esperar que o terrorismo econômico não seja uma dessas armas.

— Entre abril e maio, tivemos um movimento parecido com este, mas que não ajudou o candidato oficial a crescer — disse.

Ainda segundo Mercadante, o PT está disposto a dialogar, caso seja convidado pelo governo para um novo encontro, mesmo sabendo que o partido não dispõe de instrumentos de política econômica para resolver o problema.

A executiva do PT se reuniu, examinou a situação eleitoral e concluiu que o partido ainda tem chances de eleger candidatos próprios ou aliados para os governos em pelo menos dez estados. O partido diz também que pode aumentar para até 21 cadeiras no Senado a bancada de apoio a um possível governo petista.

O PT acha que está no páreo no Rio Grande do Sul, em São Paulo, no Estado do Rio, no Piauí, no Pará, em Rondônia, no Amapá, em Mato Grosso do Sul, no Distrito Federal e em Sergipe. O diagnóstico é que o bom desempenho de Lula alavancou os candidatos aos governos estaduais.

Por isso, independentemente de uma vitória ainda no primeiro turno, Lula deverá reforçar as campanhas nesses estados. Além disso, o PT decidiu acelerar a produção de material de campanha para atender à demanda nos estados.

A pesquisa do Datafolha que aponta uma diferença de sete pontos percentuais entre José Genoino e Paulo Maluf (PPB) em São Paulo animou o partido. A expectativa é que, mantidas as tendências apontadas, Genoino chegue à boca da urna disputando palmo a palmo a vaga para enfrentar o governador Geraldo Alckmin (PSDB) no segundo turno.

Em outros estados, como Maranhão, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraná e Amazonas, porém, o partido praticamente jogou a toalha.

Dirceu tenta conter a euforia dos militantes
O partido deu informações sobre a situação da campanha nacional, com enfoque para as últimas pesquisas, que apontam a possibilidade, remota, de vitória de Lula no primeiro turno. Mas o presidente José Dirceu continua prudente:

— Temos que trabalhar como se estivéssemos perdendo.

Em meio à euforia com os resultados das últimas pesquisas, o PT tem se esforçado para evitar o clima de já-ganhou. Ontem, alguns integrantes do comando de campanha informaram que Lula já estaria gravando programas para o horário eleitoral gratuito do segundo turno. Essa informação, no entanto, não foi confirmada.

As gravações têm acontecido dois dias antes de os programas irem ao ar. Os petistas tentam passar a idéia de que descartam uma vitória antecipada e por isso mantêm a programação original da campanha, para evitar que a euforia desmobilize os militantes.


FH: ‘O céu é o limite quando se é candidato’
BRASÍLIA e RIO. Ao discursar ontem no lançamento da IV Campanha Nacional de Doação de Órgãos, no Conselho Federal de Medicina, o presidente Fernando Henrique criticou os candidatos da oposição pela irresponsabilidade de suas promessas. Sem citar nenhum deles especificamente, o presidente afirmou que, para eles, “o céu é o limite”.

— Os recursos são finitos, e não infinitos. É preciso dividir (os recursos) entre salários, transferência para estados e municípios, ministérios. É uma ginástica complexa que só é boa para quando a gente é candidato.

Porque aí o céu é o limite e se oferece tudo. Quando chegar na hora de realizar, vai ver que as restrições são muito grandes — disse.

Ele advertiu para o risco da volta de inflação caso a Lei de Responsabilidade Fiscal não seja cumprida:

— É preciso que o Brasil não perca o rumo da responsabilidade fiscal. Que não volte a um processo inflacionário. E se o governo solta a rédea e começa a gastar mais do que pode, é questão de poucos meses e o povo paga sob a forma de inflação.

FH confirma conversa com Dirceu sobre alta do dólar
Fernando Henrique anunciou ontem, por meio do porta-voz, Alexandre Parola, que está disposto a convidar o presidente eleito para acompanhá-lo em viagens internacionais no fim do ano. Parola disse que, havendo interesse do eleito, não haveria razão para o presidente não convidar seu sucessor para integrar a comitiva oficial.

Segundo o Palácio do Planalto, Fernando Henrique tem pelo menos duas viagens já marcadas: Europa em novembro e Santo Domingo, para participar de mais uma Cúpula Ibero-Americana.

Parola confirmou que Fernando Henrique conversou com o presidente do PT, José Dirceu, no fim de semana, exclusivamente sobre a alta do dólar, segundo o porta-voz. Para o presidente, não há razão para um novo encontro de Fernando Henrique com os principais candidatos. Segundo o PT, Dirceu conversou duas vezes com Fernando Henrique: uma sobre o tom da campanha, quarta-feira, e outra sobre o dólar. Mas o Planalto disse que só houve um telefonema.

Diante da possibilidade de a eleição ser decidida no primeiro turno, o Palácio do Planalto está agilizando a transição. Fernando Henrique decidiu antecipar a assinatura da medida provisória criando os 51 cargos especiais que serão ocupados pela equipe do presidente eleito. Ele só editaria a medida provisória depois do segundo turno.

FH critica ignorância sobre economia
Mais cedo, em discurso de abertura na 36 edição da Convenção Nacional de Supermercados (Expo-Abras 2002), que começou ontem no Riocentro, o presidente já mandara recado aos candidatos. Ele criticou aqueles que colocam “poeira nos olhos do povo” quando apresentam números sem fundamento.

— O desenvolvimento do setor supermercadista é um exemplo do desenvolvimento da economia. É um bom antídoto para tantas críticas infundadas, tanta demonstração de ignorância sobre o que acontece na economia.

Dá até certa pena ver se repetirem jargões que não correspondem aos processos reais pelos quais o Brasil passa — disse.

O presidente também acusou indiretamente os candidatos de manipularem dados.

— Uma coisa é a divergência honesta sobre qual é o melhor caminho a seguir. Outra coisa é a manipulação de dados. A única coisa que não ajuda é a cegueira, é quando se coloca poeira na frente dos olhos. E pior, nos olhos do povo, dando a sensação de que não estamos caminhando — assinalou.

Fernando Henrique continuou o discurso afirmando que o modelo construído em seu governo ofereceu oportunidades a todos, graças ao controle da inflação.

— Há até quem fale de um outro modelo. Mas que modelo é esse? De obstáculo ao desenvolvimento, desfavorável ao investimento, que aumenta a exclusão? É fácil expandir gastos sem controle, prometer tudo a todo mundo, dizer que vai fazer todas as reformas necessárias — criticou.

O presidente terminou o discurso enfatizando que para governar é preciso ter competência, sem falso nacionalismo:

— Tudo o que os brasileiros conquistaram foi com um modelo de crescimento que não tem medo de competir. Não aceitamo s um falso nacionalismo que leva o país para trás. Nosso nacionalismo é de quem quer ser grande para o povo, e não para alguns aproveitadores de slogans.


Ciro afirma que é contra flexibilização da CLT
Em entrevista ontem à noite ao “Jornal Nacional”, da Rede Globo, o candidato da Frente Trabalhista à Presidência, Ciro Gomes, disse que é contra a flexibilização da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e afirmou que, para ser o vice de sua chapa, o sindicalista Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, precisou mudar de opinião e condenar o projeto do governo que tramita no Congresso.

— Sou a favor de modernizar a CLT, mas flexibilização pode-se entender como sinônimo de enfraquecer o poder dos trabalhadores — disse Ciro, lembrado pela apresentadora Fátima Bernardes de que Paulinho era a favor das mudanças na legislação trabalhista propostas pelo governo.

— Era, mas, para ser vice, inclusive, concordou que essa era uma idéia errada — disse Ciro.

Ciro cita FH para defender-se da fama de pavio curto
Perguntado por Fátima sobre a fama de ter pavio curto e se não deu munição para os ataques de adversários, Ciro disse que suas declarações foram usadas fora de contexto. Lembrou afirmações polêmicas do presidente Fernando Henrique Cardoso, acrescentando que até agora ninguém o acusou de ser desonesto.

— Fernando Henrique chamou os aposentados brasileiros de vagabundos; os adversários, de neobobos; o povo brasileiro, de caipira, e nunca se fez contra ele um ataque de desequilíbrio ou de intempestividade ou de pavio curto.

Por duas vezes, Ciro — que nessa campanha criticou a criação de cotas para negros e se envolveu numa polêmica com um militante negro — referiu-se à população, à religião e à cultura de origens africanas. Disse que pretende retirar da pobreza a maioria da população negra que vive na pobreza. Ao responder a um telespectador, que enviou uma pergunta pela internet, sobre o ensino religioso, Ciro voltou a referir-se aos negros. Disse que é favorável ao ensino religioso, não obrigatório.

— Há lugares importantes em que a população majoritária é de negros. Faz parte da afirmação da identidade da raça negra, para que ela possa ter auto-estima. Os negros, que deram uma contribuição essencial à formação da vitalidade cultural brasileira, têm direito de colocar seus filhos para que eles possam aprender os rituais, os ícones, os símbolos, os mitos, os deuses que eles cultivam.

Voto facultativo favorece clientelismo, diz Ciro
Na entrevista, que durou dez minutos e 30 segundos, Ciro criticou os candidatos do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, e do PSDB, José Serra.

— Achamos que continuar o que está aí não é possível, o que significaria o voto em José Serra. E votar em Lula pode até ser uma expressão de revolta compreensível, mas, depois da revolta e do protesto, a gente lembra que há um país para governar — disse, frisando que tem a experiência de ter sido prefeito, ministro e governador.

Respondendo a outra pergunta feita por um telespectador pela internet, e sorteada por ele próprio, Ciro disse ser a favor do voto obrigatório.

— Em função do clientelismo e das pressões, esse eleitor menos politizado viria às urnas. Talvez a classe média, indignada como está com mil razões, com a corrupção, com a falta de verdade na política, com as baixarias, não votasse. Ainda acho que é importante para o Brasil o voto obrigatório.

Em entrevista ao “Jornal das Dez”, da Globonews, Ciro disse que, se eleito, adiará a rodada de negociações para a criação da Área de Livre Comércio das Américas (Alca), marcada para fevereiro. O candidato afirmou que, sem tempo para traçar uma estratégia, o país será prejudicado nas negociações, em benefício dos Estados Unidos.

Na segunda entrevista da série promovida pelo “Jornal Nacional”, o entrevistado de hoje será José Serra.


FMI: ‘Não daremos as costas ao Brasil’
WASHINGTON. O diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Horst Köhler, afirmou ontem que esse organismo “jamais dará as costas ao Brasil”, vença quem vencer as próximas eleições presidenciais e “aconteça o que acontecer” em termos de futuras e eventuais crises financeiras. A declaração foi feita numa entrevista a jornalistas brasileiros e argentinos.

Retomada do crescimento deve ser rápida, diz Köhler
Ao revelar o resultado de uma avaliação do quadro brasileiro, feita pela cúpula do Fundo, Köhler disse que os mercados financeiros permanecerão voláteis em relação ao Brasil por mais algumas semanas, até que seja conhecido o resultado das eleições presidenciais e que se defina o processo de transição política.

Segundo Köhler, uma vez que o vencedor reafirme que manterá a política econômica que vem sendo implementada pelo governo, e garanta que endossa as principais medidas contidas no novo programa acertado com o FMI, a retomada do crescimento acontecerá mais rapidamente do que se imagina.

Köhler disse ainda que não há necessidade de o país renegociar sua dívida externa. Ao seu lado, a vice-diretora-gerente do FMI, Anne Krueger, concordou e revelou que esse assunto sequer tem sido cogitado pelo governo ou pelos credores:

— Acredito que a maioria dos mercados está reagindo à incerteza política, e se o novo presidente, ao ser eleito, aparecer e der garantias aos mercados, eu creio que as coisas vão voltar a valores mais normais muito rapidamente — disse Anne.

Köhler, por sua vez, disse que está pronto para conversar com quaisquer dos presidenciáveis, e preparado para dialogar com quem vencer:

— Quero ser muito claro a esse respeito. O Fundo está preparado para cooperar totalmente com o governo que o povo do Brasil escolher para representá-lo. Nós não pensamos em apoiar um candidato específico e também achamos natural que qualquer presidente eleito terá a sua própria visão sobre o que é melhor para o país. E nós teremos uma conversa a esse respeito assim que o eleitorado brasileiro se decidir — disse.

O número um do FMI lembrou a ajuda financeira de US$ 30 bilhões ao Brasil e disse confiar que o país vença suas dificuldades. Indagado sobre o que aconteceria se a aposta do Fundo não se concretizasse, respondeu:

— Não, não vamos virar as nossas costas ao Brasil, aconteça o que acontecer — frisou o diretor-gerente do FMI.


Artigos

Uma política da cultura
Renato Janine Ribeiro

Os artistas se queixam da pouca importância que os candidatos dão à cultura, em seus programas de governo.

E infelizmente o próprio fato de que a reclamação venha deles já atesta o caráter secundário do tema. Porque não são eles quem deveriam defender a cultura — mas nós, o público. Se essa defesa cabe aos artistas, sua demanda acaba se tornando corporativa — o que não significa que seja ilegítima, mas apenas que falta ainda, no Brasil, a percepção de que a cultura é gênero de primeira necessidade.

É o público que deve pedir, nos programas de governo, por cultura. A idéia-chave é que ela aumenta a democracia e amplia a liberdade. Por isso mesmo, vai além do mero entretenimento. Nada contra nos distrairmos, nos divertirmos, mas o importante mesmo é podermos sair de uma experiência cultural diferentes de como éramos antes. Isso, aliás, vale mesmo para os meios de comunicação mais populares. Não fossem as novelas das últimas duas ou três décadas, a condição feminina no Brasil seria pior do que é. A TV foi criticando o machismo, valorizando a mulher que trabalha, que defende seus direitos, que escolhe o amor contra a conveniência.

Seria bom um ministro ou um secretário de Cultura promover uma espécie de censo cultural, mesmo que por amostragem. A hipó tese é que haja, digamos, quatro faixas de trabalho com a cultura em nosso país.

Primeira, e numericamente a menor: a dos criadores culturais, aquelas pessoas, talvez dezenas ou centenas de milhares, que criam ou ajudam a criar. Eles vivem da cultura, talvez vivam para a cultura.

Segunda, e a mais importante: a de quem precisa da cultura para viver, isto é, para sua qualidade de vida.

Talvez esses se meçam em apenas alguns milhões de brasileiros. Mas são quem tem experiências culturais: aqueles que saem de um concerto, de um filme, da leitura de um livro modificados. Para eles, a cultura é vital.

Faz parte de sua identidade. Amplia o sentimento de sua dignidade. Sofrem, sim, abalos (quem sai alegre de um filme como “Abril despedaçado”?), mas a longo prazo suas vivências culturais os fortalecem.

É por isso que a cultura, qualquer cultura, dá algum poder a quem a freqüenta. Um projeto de cidadania, isto é, de constituição dos brasileiros enquanto reais detentores de direitos, deve ter um lugar importante para a pintura, a música, o cinema, o teatro.

Terceira faixa, talvez a mais numerosa: a de quem vê na cultura apenas o entretenimento. Isso não é errado. É bom que as pessoas relaxem, se distraiam, sintam prazer com a cultura. Ninguém cultiva a cultura só pelo soco no estômago que de vez em quando ela lhe dá. Mas é pena que dezenas de milhões de brasileiros não retirem, de seu contato com as artes, mais que um passatempo.

Passar, preencher e matar o tempo não são as melhores coisas a fazer com o tempo livre. O preço desse tipo de experiência rala é que as pessoas nessa faixa não consigam tanta dignidade, tanto poder em suas vidas, quanto poderiam e deveriam ter.

Finalmente, quarta faixa: a das pessoas que mal têm contato com a cultura, nem mesmo como passatempo.

São os excluídos, reduzidos a um analfabetismo em termos de seu imaginário.

O que deve ser uma política governamental de cultura? É claro que ela deve apoiar os criadores culturais, nossa primeira faixa. E deve também suprimir a quarta faixa, dando a todos os brasileiros pelo menos o direito ao entretenimento. Mas sua legitimidade democrática não virá de dar dinheiro aos criadores, e sim de tornar estas obras acessíveis — e mais que isso, enriquecedoras — para nós, o público. A meta deve consistir, então, em fortalecer o que eu chamei de segunda faixa, isto é, a das pessoas que crescem pelo contato com a cultura.

No planejamento da área de cultura, essa ação deve ser definida como prioridade, fixando-se até mesmo metas quantitativas. O objetivo é levar quem se distrai com as obras de arte a também se enriquecer humanamente com elas — isto é, a “subir” da terceira faixa para a segunda, da cultura-passatempo para a cultura-vida.

Pode-se exigir, dos programas apoiados com dinheiro público, incluindo a renúncia fiscal, que tornem públicos seus resultados e benefícios. Um exemplo: cansei de ver igrejas barrocas, nas cidades históricas de Minas Gerais, fechadas à visitação. Foram construídas com o que era dinheiro público, no século XVIII, e restauradas, nos últimos anos, também com nosso dinheiro. Não podem abrir ou fechar ao arbítrio de seus vigários, ou só quando há missa. São de todos nós, inclusive dos brasileiros não católicos.

E cada programa que for apoiado, dentro ou fora da estrutura de governo, deve ter explicitado seu benefício para a sociedade. Mais um exemplo: museus que fecham no final de semana (que hoje são poucos) ou de noite (quase todos) talvez respeitem mais os seus funcionários do que os seus freqüentadores. Quem trabalha no horário comercial dificilmente tem tempo, durante a semana, para ver uma exposição.

Mas o importante é a idéia: que fique cada vez mais claro que a cultura não se faz para o bem de quem a faz, por exemplo, os artistas, mas para o bem de quem a vê, consome ou vivencia. É só isso o que lhe dá força social. E que fique claro qual é esse bem: a cultura fortalece. Dá dignidade.


Colunistas

PANORAMA POLÍTICO – Tereza Cruvinel

Labirinto eleitoral
O dilema em que se debate a campanha do candidato José Serra é sobre qual estratégia seguir depois que os ataques a Lula resultaram em um tiro no pé. Quando foi adotada, muitos ali disseram que, mesmo não sendo a melhor, era a única disponível. Agora se fala em suavizá-la, evitando ataques pessoais, mas questionando, do mesmo modo, o preparo do candidato petista.

Mas, contra esta, a pesquisa de avaliação conceitual feita pelo instituto Vox Populi para o “Correio Braziliense” mostra já estar Lula imunizado, na medida que foi apontado como o mais preparado para enfrentar todos os problemas apresentados, exceto o da saúde, área em que Serra é tido como a melhor opção. Lula foi apontado como o mais preparado para manter a inflação sob controle (apesar das reações do mercado), reduzir o desemprego, melhorar o ensino fundamental e médio, a situação dos pobres e até a dos empresários. E ainda para fazer a reforma agrária, construir moradias e enfrentar o problema da segurança.
Pode ser difícil para o senador e ex-ministro assimilar essa avaliação, mas ela reflete a percepção dos que votam, e na eleição eles são a banca examinadora.

A pesquisa foi feita entre os dias 15 e 17, ouvindo 2.900 pessoas em 172 municípios. Pode-se argumentar que naquele momento os eleitores ainda não tinham visto e ouvido os programas de Serra que compararam sua trajetória com a de Lula, mencionando até o fato de o petista não ter diploma; apontado José Dirceu como insuflador dos ataques a Mário Covas; e sugerindo, com o filmete sobre a farmácia popular defendida também por Maluf, que o publicitário Duda Mendonça é de fato quem elabora os programas e o discurso do candidato do PT. Os ataques começaram na terça-feira 17, dia em que o trabalho de campo da pesquisa foi encerrado.

Mas se depois deles Lula cresceu e a rejeição a Serra aumentou, como mostrou a pesquisa Datafolha, num sinal de que o eleitorado reprovou os ataques, os conceitos captados pelo Vox Populi não devem ter mudado para pior, em relação ao petista, depois dos programas que estão dividindo a campanha tucana.

Mesmo assim, parece não restar outro caminho a Serra senão insistir, com outro discurso, no debate sobre o preparo e a experiência do candidato adversário. O programa de hoje dirá o tom que será adotado. Os tucanos, que agora discutem o bater-ou-não-bater, antes disso já tiveram conflitos com a área de marketing sobre colar-ou-não-colar Serra a Fernando Henrique. As duas táticas já foram testadas. E agora o tempo é muito curto, embora o segundo turno ainda esteja no horizonte.O tira-teima de hoje

Havia indicações ontem de que a pesquisa Ibope/Rede Globo a ser divulgada hoje trará resultados mais próximos da pesquisa Datafolha de domingo, em que Lula apareceu com 44% e José Serra com 19% e rejeição em alta, elevando ontem a adrenalina do mercado financeiro, levantando o dólar e derrubando as bolsas.

Ney Figueiredo, consultor político da CNI, contratante da pesquisa Ibope divulgada sexta-feira, que trouxe resultados contraditórios com a do Datafolha, diz ter sido cobrado o dia todo ontem por agentes do mercado a explicar o que aconteceu. Pois, de fato, na CNI/Ibope, feita nos dias 18 e 19 e divulgada no dia 20, Lula tem viés de baixa (cai de 41% para 39%) e Serra mantém seus 19%. Na pesquisa Datafolha, feita nos dias 19 e 20 e divulgada no dia 21, dá-se o oposto. Lula com viés de alta (subindo de 40% para 44%) e Serra com viés de baixa (de 21% para 19%). Outro detalhe, aponta Figueiredo, é o fato de Lula colher seu pior resultado na Região Sul, segundo a pesquisa CNI/Ibope (34%), e o melhor, segundo a do Datafolha (46%).

— Disse a todos que alguma delas está mesmo errada, diante dessas discrepâncias, e que as próximas vão esclarecer o que houve — diz Figueiredo.

O PT não se incomodou. Seu coordenador de pesquisas, Marcus Flora, atribui tudo a alguma diferença metodológica secundária. Os tucanos dizem ter pesquisas contrariando o Datafolha. Sobretudo por isso, o Ibope de hoje desperta altas ansiedades.

Os hematomas de Ciro
O candidato Ciro Gomes fez uma apresentação correta ontem no “Jornal Nacional”, derrapando apenas ao declarar-se contra as alterações na CLT. Ante a lembrança dos entrevistadores de que seu vice, Paulinho, defendera ardorosamente o projeto do governo, disse que ele teve que mudar de idéia como condição para ser candidato. Paulinho tem convicções volúveis, pelo visto. Mas Ciro esteve leve, respondeu a todas as perguntas concisa e objetivamente, criticou os adversários com sobriedade e falou das feridas deixadas pelos ataques sofridos. Mencionou levantamentos que indicariam um grande empate pelo segundo lugar. Mas o Ibope, nas pesquisas segmentadas por estado, informa que Ciro agora está caindo até no Ceará, embora mantenha o primeiro lugar. Entre 26 de agosto e 21 de setembro, caiu de 57% para 41%, Lula subiu de 28% para 37%, Serra de 5% para 6% e Garotinho de 4% para 9%.

EM MINAS, Aécio Neves usa a tática de Lula. Os adversários batem, ele não responde e seu programa avisa aos eleitores que manterá o alto nível da campanha. O petista Nilmário Miranda, que cresceu na esteira de Lula, mas não os 19% aqui registrados no domingo (saiu de 2% para entre 14% e 15% nas pesquisas), avisa que vai bater mais na reta final.


Editorial

CUSTO REAL

Tão intenso tem sido o crescimento da criminalidade e da violência, nas grandes cidades brasileiras, que é perfeitamente compreensível que os candidatos à Presidência da República anunciem programas de segurança extremamente ambiciosos. Não era de se esperar uma opção por propostas modestas, mais ajustadas à realidade da escassez do dinheiro público. Faz parte do jogo eleitoral que a adoção do mais estrito realismo não seja uma estratégia muito promissora de angariar votos.

Mas a distância entre as promessas e a realidade é tão brutal que reserva para os eleitores uma profunda decepção, seja qual for o resultado das eleições. Para um orçamento do Ministério da Justiça de R$ 3,6 bilhões, os projetos de segurança dos quatro principais candidatos implicam cada um gastos de pelo menos R$ 7 bilhões anuais, mostrou O GLOBO.

De onde virá o dinheiro? Remanejar recursos será mais do que difícil. A proposta orçamentária da União para 2003, que prevê um crescimento da receita de 3,7%, foi montada sobre a previsão de uma inflação de 7,4%, isto é: haverá queda em termos reais. Os gastos serão em média 3,6% maiores do que a estimativa de hoje.

Assim, o espaço para novos projetos é ainda menor. Para ter- se uma idéia das dificuldades, está prevista a redução da alíquota máxima do Imposto de Renda de 27,5% para 25%, e não se pode contar com receitas extras como o pagamento dos tributos atrasados da Previ, dinheiro que só vem uma vez.

Grandes aumentos no efetivo e no aparelhamento da Polícia Federal, construção de prisões federais de segurança máxima, criação de cem mil vagas para suprir o déficit dos presídios — estes são pontos comuns nos programas, e fazem sentido. Mas custam caro. Além disso, cada candidato tem projetos próprios adicionais, como criar mais um ministério ou secretaria, elevar salários dos policiais às custas do Tesouro federal, reforçar o policiamento em fronteiras, portos e aeroportos etc.

A rigor, tudo pode ser resumido na busca de maior segurança para a população com base em recursos que são mais do que inseguros: são inexistentes.


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09/24/2002


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